O que é mastite ambiental?
A mastite ambiental é causada por agentes cujo principal reservatório é o ambiente em que a vaca vive, principalmente onde há acúmulo de esterco, urina, barro e camas orgânicas.
Ao contrário da mastite contagiosa, grande parte das infecções ocorre durante o período entre as ordenhas, embora também haja ocorrência de novos casos durante a ordenha, especialmente em situações nas quais há problemas de funcionamento do equipamento.
Visto que os patógenos ambientais estão disseminados por todo o ambiente da vaca, é praticamente impossível erradicar esse tipo de mastite, ao contrário de alguns agentes contagiosos passíveis de erradicação.
Além disso, dada a grande disseminação desses agentes ambientais, todas as categorias animais estão sob risco: vacas em lactação, vacas secas e novilhas.
Quem são as bactérias causadoras das mastite ambiental?
As bactérias causadoras de mastite ambiental mais frequentes são os estreptococos (exceto o Streptococcus agalactiae) e as Gram negativas, principalmente os coliformes.
Streptococcus uberis e Streptococcus dysgalactiae são as espécies de estreptococos mais associadas à mastite. As bactérias Gram-negativas são a Escherichia coli, Klebsiella pneumoniae, Enterobacter aerogenes, Serratia spp., Pseudomonas spp. e Proteus spp. O Arcanobacterium pyogenes, Nocardia spp., Bacillus spp., fungos, leveduras e algas também são microrganismos ambientais causadores de mastite.
Em virtude da grande diversidade de agentes ambientais causadores de mastite, a discussão a seguir se concentra nos estreptococos ambientais e nos coliformes, uma vez que tais patógenos são responsáveis pela maioria das infecções ambientais.
Quais as características da mastite ambiental?
Geralmente, a mastite ambiental é de curta duração quando comparada a mastite contagiosa, com maior tendência a evoluir para um quadro clínico que para a forma subclínica. A maioria das infecções por estreptococos ambientais tem duração menor que 30 dias, e sua prevalência em qualquer período do ano raramente excede 10 a 15% do total de quartos de um rebanho.
Entretanto, em rebanhos com Contagem de Células Somáticas (CCS) maior que 750.000 céls./mL podem ser acometidos por alta prevalência de infecções causadas por estreptococos ambientais. Cerca de 20% das infecções por estreptococos ambientais persistem por mais de 100 dias e evoluem para uma mastite crônica não responsiva ao tratamento com antibióticos, sendo que 40 a 50% delas apresentam sintomas clínicos, frequentemente moderados e raramente graves.
Mais da metade das infecções intramamárias causadas por coliformes duram menos de 10 dias. Devido a essa curta duração, raramente a prevalência da mastite por coliformes acomete mais de 1 a 2% dos quartos em qualquer momento que se analisa um rebanho e causa alta CCS de tanques.
Os sinais clínicos da mastite por coliformes durante a lactação estão presentes em aproximadamente 90% dos casos, sendo que a maioria deles são afecções moderadas e 10% graves.
Alguns estudos demonstram que de 30 a 40% dos casos de mastite clínica são isolados coliformes nos rebanhos mais tecnificados e, sobretudo, nos confinados. Entre as mastites por coliformes, as causadas pela Escherichia coli são as mais comuns, entretanto é a bactéria menos prevalente entre os casos crônicos de infecções intramamárias por coliformes.
A mastite por Klebsiella spp. acomete geralmente rebanhos manejados em camas de serragens, com evolução crônica, podendo permanecer no animal mesmo após a secagem. Serratia spp., Pseudomonas spp., Proteus spp. e Citrobacter spp. tendem a ser de duração mais longa que as mastites causadas por Escherichia coli e são geralmente isoladas em menos de 10% dos casos clínicos nos rebanhos.
Ocasionalmente um rebanho pode ter problemas mais complexos por mastites causadas por uma das bactérias desses gêneros, e geralmente a fonte de contaminação desses patógenos é a água ou as soluções dipping contaminadas.
A bactéria Actynomices pyogenes está presente em menos de 1% dos rebanhos, sendo um problema particular na Inglaterra e países do norte europeu, causando infecções conhecidas como "mastite de verão".
Onde estão esses patógenos?
O principal reservatório dessas bactérias é o ambiente da vaca, de modo que o número de infecções intramamárias por estes patógenos está relacionado à exposição e à contaminação dos tetos. O esterco, barro, locais de permanência da vaca onde se formam poças são fontes da bactéria ambiental.
A cama de repouso também se torna uma fonte importante, uma vez que os tetos estão em contato frequente e prolongado com ela. Tanto os coliformes quanto os estreptococos sobrevivem e se desenvolvem em camas de material orgânico, as quais são normalmente usadas em sistemas de estabulação.
Camas de palha têm se mostrado um importante reservatório de Streptococcus uberis. Já a serragem, maravalha, o esterco sólido reciclado e os resíduos sólidos aproveitados de biogeradores, material que vem sendo bastante utilizado em rebanhos norte-americanos e europeus, geralmente aumentam a exposição dos tetos à Escherichia coli e Klebsiella spp..
Normalmente as populações de estreptococos ambientais e coliformes estão em menores quantidades em camas de material inorgânico, como areia e calcário.
Instalações mal planejadas contribuem para a maior incidência da mastite ambiental, uma vez que não priorizam o conforto dos animais. As construções devem minimizar o estresse e as injúrias físicas sofridas pelos animais durante todas as estações do ano. Em sistemas de estabulação, a ventilação e o declive muitas vezes não são suficientes para manter seco o ambiente e diminuir o estresse entre os animais.
Já em sistemas de criação em pastejo, onde geralmente se pressupõe a menor prevalência de mastite ambiental, locais em que se verificam o sobre-pastejo ou a permanência excessiva dos animais, principalmente nas estações mais chuvosas do ano, podem expor os tetos ao risco de contaminação com agentes ambientais com igual ou maior intensidade da que ocorre em sistemas de confinamento.
Mastites ambientais também podem ser causadas pela inoculação da bactéria por meio de seringas, cânulas e sondas contaminadas. Sendo assim, as técnicas inadequadas de aplicação de bisnagas intramamárias, associados à limpeza e desinfecção deficientes do orifício do teto no momento da aplicação dos produtos também podem introduzir o patógeno ambiental na glândula.
O que contribui para o acometimento do animal?
Muitas infecções intramamárias por patógenos ambientais se originam no período seco, e geralmente as taxas de mastite ambiental nessa fase são maiores que durante a lactação. A taxa de infecção ambiental não é constante no decorrer do período seco da vaca, mas se eleva nas duas primeiras semanas pós-secagem e nas duas semanas do pré-parto.
São raros os novos casos de mastite por Escherichia coli que surgem no meio do período seco, mas a grande maioria dos casos da doença que aparecem na lactação se originam nos 10 últimos dias antes do parto.
Já as mastites causadas pelas outras bactérias Gram-negativas parecem estar igualmente distribuídas entre o início e o final do período seco. No primeiro mês de lactação, a incidência de casos clínicos de mastite ambiental é alta, decrescendo à medida que a lactação avança. Nessa fase, são mais pronunciadas as infecções intramamárias ocasionadas por coliformes que pelos estreptococos ambientais.
A mastite ambiental geralmente acomete mais frequentemente as vacas mais velhas do que as novilhas, inclusive durante os períodos pré-parto e de lactação desses animais.
A prevalência da doença é maior em rebanhos confinados que em animais manejados em sistemas de pastejo. Entretanto, nas situações em que se verifica o acúmulo de lama ou a aglomeração de vacas em busca de sombra aumentam a exposição dos tetos do rebanho aos patógenos ambientais, especialmente nos meses mais quentes e úmidos do ano, período de maior desenvolvimento das bactérias no ambiente.
Como combater a mastite ambiental?
Visto que os patógenos ambientais estão disseminados por todo o ambiente da vaca, torna-se óbvio que é praticamente impossível erradicar esse tipo de mastite, ao contrário de algumas bactérias causadoras de mastite contagiosa.
É evidente, portanto, que o controle da mastite ambiental é conseguido pela diminuição da exposição do teto ao risco de ser contaminado e, para isso, deve-se atentar para todos os aspectos relacionados ao ambiente do animal, desde o local onde se alojam as vacas secas, os piquetes de parição, o ambiente dos animais em lactação e a sala de ordenha.
Para isso, de modo geral, a manutenção de ambientes limpos e secos é a chave para o sucesso de um programa de controle da mastite ambiental, uma vez que a bactéria necessita de alimento, umidade e temperatura apropriados para sobreviver e se multiplicar.
O manejo e o sistema de ordenha também influenciam a instalação da doença no rebanho, de modo que o funcionamento inadequado dos equipamentos predispõe ao aparecimento de novos casos de mastite ambiental por meio de flutuações de vácuo na ponta do teto.
Isso pode ser decorrente do mau dimensionamento do sistema de ordenha, mau funcionamento de regulador de vácuo ou pulsadores, e da ordenha de vacas com tetos sujos e úmidos. Durante a ordenha, é fundamental que as teteiras sejam colocadas em tetos secos e limpos. Uma estratégia bastante eficiente de controle de mastite ambiental é a desinfecção dos tetos antes da ordenha (pré-dipping).
A terapia da vaca seca apresenta efeito limitado sobre o controle da mastite ambiental, especialmente nos casos que surgem nas duas semanas pré-parto, mas é bastante eficaz na prevenção de novas infecções causadas por estreptococos ambientais no período de duas semanas pós-secagem.
Uma das formas de aumentar a resistência da vaca contra os patógenos ambientais é o fornecimento de dieta balanceada, especialmente em termos de minerais como o selênio, cobre e zinco, vitamina A e vitamina E.
Outra estratégia de controle da mastite ambiental é o aumento da resistência da vaca contra coliformes por meio da vacinação. Estudos demonstraram que o uso correto da vacina à base de uma cepa de Escherichia coli denominada J5, reduziu a incidência de mastite clínica nos 100 primeiros dias de lactação de 12,8%, em animais não vacinados, para 2,6% em animais vacinados.
Além da redução de 70 a 80% da ocorrência de casos clínicos, a vacina permite a diminuição da gravidade dos quadros clínicos e redução dos riscos de morte dos animais com sintomas agudos de toxemia.
Sendo assim, quando a incidência de mastite clínica causada por coliformes ultrapassa 1% do rebanho, pode-se afirmar que o uso dessa vacina é economicamente viável. No caso dos estreptococos ambientais, ainda não há vacinas disponíveis para melhorar a resistência da vaca contra esses patógenos.
Em resumo, o controle da mastite ambiental deve basear-se principalmente em métodos preventivos, especialmente em técnicas de melhoria da higiene, ambiência e conforto dos animais.
Além disso, as medidas tradicionais de controle são relativamente efetivas, tais como correto manejo e higiene na ordenha (pré-dipping e ordenha de tetos limpos e secos). Cabe destacar o papel importante desempenhado pelo sistema imune das vacas e, neste particular, o correto balanceamento da dieta e a utilização da vacinação.
Fontes:
Smith & Hogan NMC Regional Meeting Proceedings, 2008.
Santos & Fonseca. Estratégias para o controle de mastite e melhoria da qualidade do leite, 2006.