Marcos Veiga dos Santos
A mastite causada por Prototheca spp. pode se apresentar de forma clínica ou subclínica podendo causar inflamações intramamárias agudas ou crônicas com presença de grumos. Vacas com mastite causada por Prototheca spp. apresentam redução da produção de leite e aumento da contagem de células somáticas (CCS), mas. não apresentam resposta ao tratamento intramamário. Protocolos antimicrobianos destinados a eliminar patógenos bacterianos causadores de mastite não são eficientes para o tratamento de vacas infectadas por Prototheca spp.
Atualmente, as únicas práticas de manejo efetivas na eliminação de IIM por Prototheca spp. são a secagem definitiva de quartos infectados e/ou descarte de vacas infectadas do rebanho. Devido ao alto custo para reposição de vacas e a perda de produção devido ao descarte de animais infectados, a prevenção da mastite causada por Prototheca spp. ainda é a melhor medida de controle em rebanhos leiteiros.
Apesar de contagiosa, a Prototheca spp. tem como fonte primária de infecção o ambiente com alto teor de umidade. Prototheca spp. se desenvolve em ambiente úmido com presença de matéria orgânica, multiplicando-se aceleradamente em instalações com condições precárias de higiene ou em locais de armazenamento de esterco. A espécie P. zoopfii é isolada no ambiente, particularmente em áreas com acúmulo de barro nos arredores das instalações da fazenda. Assim, intervenções como a limpeza dos locais de circulação das vacas e a manutenção e troca periódica da cama utilizada nos estábulos são práticas de manejo economicamente mais efetivas em nível de rebanho do que a reposição de vacas.
Uma vez que a via de transmissão de mastite causada por Prototheca spp. ocorre pela invasão do micro-organismo pelo canal do teto, a exposição do úbere à cama contaminada pode aumentar o risco de infecção. Mesmo em baixa contagem, a contaminação por Prototheca spp. no ambiente pode ser um risco à sanidade do úbere de vacas leiteiras. Um estudo demonstrou que vacas desafiadas com inoculações intramamárias de P. zopfii (40 a 480 ufc) apresentaram mastite de grau leve caracterizada pelo aumento da consistência do tecido mamário e presença de grumos no leite. Visto que a baixa carga de Prototheca spp. pode desencadear uma IIM, o tipo de cama utilizado nas instalações, bem como outras práticas de higiene importantes nas áreas de circulação das vacas são fatores de risco de mastite que não podem ser negligenciados.
O tipo de cama utilizada nos currais ou áreas de descanso pode aumentar o risco de IIM causadas por Prototheca spp. devido à capacidade de sobrevivência e multiplicação destes micro-organismos no ambiente. Baseado na possibilidade de infecção da glândula mamária por Prototheca spp. ocorrer pelo contato com a cama contaminada, um estudo realizado nos Estados Unidos avaliou o crescimento de P. zopfii gt1 e gt2 em materiais comumente utilizados como cama em rebanhos leiteiros.
Para avaliação da capacidade de crescimento de Prototheca spp. em diferentes tipos de cama, foram avaliadas cepas conhecidas de P. zopfii gt2 e cepas de P. zopfii gt1 isoladas do leite de uma vaca naturalmente infectada. Quatro tipos de cama foram avaliados no estudo: aparas de madeira (maravalha) seca em estufa, serragem de madeira sem processamento, esterco de vaca processado e areia. Antes da avaliação dos tipos de cama no experimento, culturas microbiológicas foram realizadas para comprovação da ausência de contaminação. Após, para cada tipo de cama, três alíquotas foram separadas em sacos estéreis, nos quais foram inoculadas e cultivadas as cepas de P. zopfii gt1 ou P. zopfii gt2.
Os resultados do estudo demonstraram que ambos os subtipos de P. zoopfi apresentaram crescimento reduzido na maravalha comparado ao esterco seco, à serragem sem processamento e à areia. O subtipo de P. zopfii gt1 apresentou maior crescimento na serragem sem processamento, na areia ou maravalha que o subtipo gt2. Com base nestas observações, o tipo de cama influencia no crescimento de Prototheca spp. in vitro, e este efeito foi associado com um crescimento mais pronunciado no esterco seco, na serragem e na areia.
Fatores como o pH, área de superfície de contato ou teor de matéria orgânica para o crescimento de Prototheca spp. não foram avaliados no estudo. Contudo, a área de superfície de contato é relativamente menor em volumes iguais de maravalha em comparação com a areia, fato que poderia explicar o menor crescimento de Prototheca spp. na maravalha. Mesmo sendo um material improvável em fornecer nutrientes para o desenvolvimento de Prototheca spp., a areia pode ter funcionado primariamente como substrato para tais microalgas neste estudo.
A incidência de mastite causada por Prototheca spp. tem aumentado nos últimos anos, o que despertou maior preocupação, tanto de ordem econômica, quanto de saúde pública. A dificuldade de tratamento de IIM causadas por Prototheca spp. implica na necessidade de uso de medidas preventivas em rebanhos leiteiros, principalmente na sala de ordenha e locais de descanso e de circulação das vacas. A utilização de tipos de camas com menor predisposição ao desenvolvimento de Prototheca spp. pode reduzir a invasão destes patógenos no úbere. O custo-benefício da troca de camas irá depender de vários fatores, os quais incluem o preço do material a ser utilizado como cama e o risco de mastite causado por Prototheca spp. em cada fazenda. Apesar do tipo de cama não ser considerado o principal fator de risco para IIM causadas por Prototheca spp., a escolha de materiais que dificultem o desenvolvimento de tais micro-organismos pode ser uma ferramenta auxiliar na prevenção de mastite em rebanhos com maior risco de IIM por este patógeno.
Fonte: Adhikari, N.; Bonaiuto, H. E.; Lichtenwalner, A. B. Dairy bedding type affects survival of Prototheca in vitro. J. Dairy Sci. 96:7739–7742, 2013.
*Doutorando do Programa de Pós-graduação em Nutrição e Produção Animal, FMVZ-USP.