A forma mais assertiva de padronizar os dois componentes protagonistas da composição do leite para a fabricação de queijos, as caseínas e a gordura, é pela relação caseína/gordura (C/G), uma vez que estes teores isoladamente sofrem variações diversas durante a produção do leite, seja por fatores do animal, período de lactação e/ou sazonalidade.
Com todo o conhecimento adquirido e avanço da tecnologia disponíveis às indústrias de queijos atualmente, a maioria delas realiza a padronização do leite para a fabricação de seus queijos somente pelo teor de gordura, desprezando completamente aquele componente tão nobre, as caseínas. Essas proteínas colaboram muito para as características típicas de cada queijo juntamente com a gordura, além dos aspectos da composição final e no rendimento de fabricação.
A partir de prática relativamente simples e rápida de analisar o teor de caseínas do leite e padronizar o de gordura em cima deste resultado, consegue-se balancear a composição do leite no tanque. Consequentemente, otimiza-se a produção do queijo e entrega-se ao consumidor um produto mais homogêneo dentro de uma indústria, e entre unidades da mesma empresa.
Principalmente, diminui as variações de composição do leite ao longo do ano, influenciadas pelas estações seca e chuvosa, e que com certeza, trarão como resultados, maior fidelidade a um queijo assim produzido.
Com base nas tecnologias publicadas de queijos produzidos no Brasil, e em médias históricas do teor de caseínas no país, este artigo se propõe a demonstrar as variações da relação C/G no leite e suas possíveis consequências na produção dos queijos, de forma a aproximar mais a padronização e torná-la mais acessível às indústrias, para que estas possam, dentro de suas realidades, adotar esta prática e assim contribuir para a melhoria da qualidade do setor no país.
Teores variáveis de gordura e caseínas do leite ao longo do ano no Brasil
No Brasil, ao contrário do que acontece no hemisfério norte, o período seco ou aqueles meses mais próximos do inverno, o teor de gordura médio do leite é maior, aumentando mais significativamente a partir de abril, e começando uma queda após agosto.
Por outro lado, na estação chuvosa, essa média de teor de gordura do leite atinge seus menores valores nos meses de dezembro e janeiro. Os fatores mais incisivos para essa variação são: genética, condições ambientais/conforto dos animais e a nutrição da vaca leiteira. (MILKPOINT, 2022).
Já no tocante às proteínas, os maiores teores médios situam-se entre abril e julho, ou seja, assim como no comportamento sazonal da gordura, no período seco. Os menores teores de proteínas concentram-se, no período chuvoso, de novembro a fevereiro (MILKPOINT, 2022).
Se fizermos uma relação entre os teores de proteína e gordura (P/G) do leite brasileiro, em média, a maior relação entre eles se dá no mês de dezembro, ou seja, P/G 0,88 e a menor em janeiro, P/G 0,86. Se alterarmos a raça do animal, essa média pode chegar a ser até P/G 0,76 no gado Gir leiteiro e P/G 0,81 no Jersey (FUNDAÇÃO ROGE, 2022).
Visto desta forma não parece muita diferença, nem mesmo se estimarmos que os teores de caseínas são 80% do valor da proteína, o que resultaria em médias de relações caseína/gordura (C/G) de 0,70 (dezembro) e C/G 0,69 (julho), o que estreita ainda mais ao longo ano.
Porém, na indústria de queijos quase nunca se trabalha com leite integral como foi feita a estimativa explícita acima, uma vez que se variam as tecnologias de fabricação, e que cada tipo de queijo requer variações tais que permitam conferir características próprias e intrínsecas aos diferentes tipos destes produtos disponíveis no mercado.
Ao se padronizar o leite tão somente pelo seu teor de gordura, três coisas merecem destaque:
- I - normalmente se trabalha com um intervalo no teor de gordura, por exemplo, 3,2% a 3,4%, o que não garante tanta precisão, além de possíveis variações normais no processo de desnate de grandes volumes;
- II - não é considerado, neste caso, a variação sazonal do teor de caseínas, já que se o teor de gordura estiver constante, essa relação irá variar muito mais. No mesmo exemplo dos meses de dezembro e julho, se considerarmos uma média do leite padronizado quanto ao teor de gordura em 3,3% (entre 3,2% e 3,4%), as relações C/G seriam, respectivamente, 0,78 e 0,80, o que poderia ser muito baixa para alguns tipos de queijo como o Parmesão, e muito alta para outros como os queijos azuis e Gorgonzola; e
- III - quando se diminui em 1% o teor de gordura do leite, em média, há redução de 0,4% no de caseínas, ou seja, desbalanceando ainda mais a relação (CHAPMAN, 1981).
Quais análises precisamos realizar para padronizar o leite pela relação Caseína/Gordura?
Em um laboratório básico de controle de qualidade de um laticínio produtor de queijos, é possível realizar a padronização do leite com base na relação C/G, de forma rápida, simples e a custo reduzido, como demonstra a Figura 1.
Figura 1. Etapas da padronização da relação C/G do leite para fabricação de queijos.
Inferindo sobre a importância da relação C/G do leite na composição de queijos
Ao se padronizar o leite para obtenção de queijos baseando-se na relação C/G do leite, muitos problemas que atormentam os queijeiros e os gestores das indústrias podem minimizar ou até acabar. Um deles é na composição do queijo, que se manterá em intervalos menores de variação de seus principais constituintes, como os teores de proteína e gordura, que controlam e direcionam o rendimento, fato importantíssimo que se busca rotineiramente.
Também, evitar as perdas de "finos" da coalhada na transição para o soro e torná-la mais capaz de aprisionar a proporção devida de gordura e caseínas nos grãos, para aumentar rendimento. Leite despadronizado, ou seja, com excesso de caseínas para pouca gordura e vice-versa é forte fator para queda no rendimento.
Outro reflexo na composição dos queijos são valores mais variáveis no teor de gordura no extrato seco, ou GES, um dos mais importantes para adequação de queijos nos seus regulamentos técnicos de identidade e qualidade (RTIQ), exigidos pela legislação.
Queijos quando embalados, sejam eles maturados ou não, mantém os teores de umidade e de gordura após a fabricação até o consumo. Mesmo que estes isoladamente variem pouco, o GES é sempre fixo, pois à medida que a umidade possa ser diminuída, e consequentemente os sólidos totais aumentem no queijo, a gordura que faz parte destes irá aumentar proporcionalmente, mantendo o GES constante.
Por isso, a legislação e as indústrias se preocupam mais com o GES, do que propriamente com teores isolados de um constituinte do queijo, como o teor de umidade. À medida que se aumenta a relação C/G do leite, tem-se uma diminuição no GES do queijo e vice-versa (COSTA JÚNIOR; PINHEIRO, 1997).
A umidade na massa desengordurada do queijo (UMDQ) é outro parâmetro importante para controle de processo produtivo e indicativo da composição do queijo, além de também auxiliar na classificação dos queijos quanto à umidade deles no RTIQ.
A UMDQ é uma relação percentual entre o teor de umidade de queijo e sua massa sem gordura, de forma a permitir avaliar a tendência do queijo a sofrer proteólise. Quanto maior a UMDQ, maior será essa tendência, além de contribuir proporcionalmente para a maciez do produto. No caso de relação C/G mais alta, mais alto será este índice, ou seja, diretamente proporcional (COSTA JÚNIOR; PINHEIRO, 1997).
O teor de caseínas do leite no Brasil e as dificuldades em conhecê-los
A literatura já demonstrou e vem demonstrando que o leite no Brasil tem melhorado a qualidade, e consequentemente aumentado o teor médio de caseínas em relação aos países de produção leiteira relevantes, como a Argentina na América do Sul e os países europeus.
Nesses, o teor médio de proteínas é mais alto, resultando consequentemente num teor caseínico mais elevado, como 2,6% (m/v) em média. Para efeito de estimativa das relações C/G do leite para fabricação de queijos, iremos adotar a variação média de 2,2% do teor de caseínas do leite brasileiro (FURTADO, 2016) até 2,4%, por conta da melhoria da qualidade e até para facilitar adoções desta padronização.
Cabe lembrar, como já mencionado, que o teor de caseínas varia muito entre raças, períodos do ano, clima, dentre outros inúmeros fatores. A melhor e mais assertiva forma de conhecer o teor real de caseínas do leite de uma indústria, região, estado e do país, é sem dúvida por meio de análises cotidianas implantadas no controle de qualidade das indústrias por um determinado período que englobe estações seca e chuvosa. Desta forma tem-se a adoção de valores reais e resultados serão ainda melhores e mais assertivos.
Embora ainda seja um campo imenso a explorar no Brasil, alguns estudos já foram realizados com queijos brasileiros como Prato e Coalho, ou com aqueles fabricados sob condições do nosso país (COSTA et al., 2021).
Estimando as relações Caseína/Gordura dos queijos produzidos no Brasil
Para iniciar o estudo, como já justificamos, vamos adotar o intervalo de 2,2% a 2,4% de teor de caseínas do leite brasileiro. Para o teor de gordura, serão adotados os intervalos médios sugeridos para cada queijo, podendo variar entre tecnologias propostas de cada autor ou autores.
A Tabela 1 apresenta os principais queijos sem maturação, os teores de caseínas no leite no Brasil (mínimo e máximo) e a variação do teor de gordura no leite sugerido pela literatura para cada tipo de queijo. Baseado nestes dados, foram calculadas as relações C/G (mínima e máxima) do leite para os queijos.
Tabela 1. Teores de caseínas estimados, variações nos teores de gordura segundo tecnologias e estimativas de relações C/G esperadas em leite para fabricação de queijos não maturados.
Com base nos resultados estimados das relações C/G, percebe-se diferenças entre processos de fabricação de Muçarela, que variam na relação C/G de 0,65 até 0,89. Essa relação impacta na composição, por exemplo, para queijo Muçarela, o GES sugerido por Furtado (2022) deve estar situado entre 40% a 44%.
Ou seja, esse valor é superior ao que preconiza a legislação, que é de no mínimo 35% e ao que recomenda a Associação Brasileira das Indústrias de Queijos (ABIQ) que é de 40% no mínimo. Ademais, para atender atualmente a principal finalidade deste queijo, que é o fatiamento, além do GES, deve-se atentar ao teor de umidade média que deve estar em 45%, com variação entre 44% e 46% (FURTADO, 2016).
No caso das três tecnologias de Muçarela mais específicas quanto ao processo de produção citadas, ou seja, de curta e longa fermentações e por acidificação direta (Tabela 1), todas descritas por Dutra (2017), a amplitude do teor de gordura aumenta em 0,2% nas duas últimas tecnologias (de 3,2% para 3,4% de gordura) em relação a primeira, o que faz com que a relação mínima da C/G diminua em 0,4 (de 0,69 para 0,65).
Com isso, o autor estima nas produções, variações no GES de 44% a 47%. Diminuindo um pouco as relações máximas de C/G em ambas as tecnologias de Dutra (2017), para em torno de até 0,78, provavelmente consegue-se atingir o GES de 40% recomendado para o queijo Muçarela, e inclusive para permitir o fatiamento e para ralar como ingrediente de pizza.
A estimativa de UMDQ na tecnologia de Furtado (2022) para o queijo Mussarela será de 56% a 60% e nas de Dutra (2017), para o mesmo tipo de queijo será de 59% a 61%, ambas muito próximas.
No queijo de Coalho, devido a amplitude extensa de teor de gordura proposta por Dutra (2017) de 2,1 até 3%, essa também se reflete na relação C/G, como pode ser visto na Tabela 1, o que permitirá fabricar queijos mais macios a extremamente duros, e que demonstra ainda muita despadronização deste queijo industrialmente. Como Furtado (2022) já fixa o teor de gordura em 3,0%, a amplitude da relação C/G cai significativamente e ainda encaixa dentro da primeira citada, que é extremamente ampla.
Na Tabela 2, vamos dar ênfase aos queijos maturados por fungos, seguindo a mesma linha de raciocínio da Tabela 1 para estimar os valores da relação C/G.
Tabela 2. Teores de caseínas estimados, variações nos teores de gordura segundo tecnologias e estimativa de relações C/G esperadas em leite para fabricaçãob de queijos maturados por fungos.
Nesta classe dos queijos azuis e no Cambozola, predominam-se teores mais altos de gordura (de 3,8 até 6,0%), que fazem com que as relações C/G sejam de fato mais baixas (de 0,37 a 0,60). Um fato importante neste caso, é que o intervalo entre elas não é grande, e a adoção de uma média regional ou real de teor de caseínas, tornará a relação C/G mais estreita, o que permite muito boa padronização.
Os queijos de mofo branco apresentam intervalos um pouco maiores, porém, pode-se fazer este mesmo ajuste fino a partir de dados mais reais de teor de caseínas. A Tabela 3 apresenta a relação C/G estimada para os queijos de casca lavada.
Tabela 3. Teores de caseínas estimados, variações nos teores de gordura segundo tecnologias e estimativa de relações C/G esperadas em leite para fabricação de queijos de casca lavada.
Pode-se observar, nos três primeiros queijos, intervalos maiores nas relações C/G, pela maior variação sugerida nos teores de gordura. Já a Raclette, por fixar o teor de gordura do leite em 3,5%, ocorre menor variação.
Em nenhum destes queijos da Tabela 3 tem-se recomendação ou estudo em condições brasileiras da relação C/G para fabricação, o que reforça ainda mais o acompanhamento analítico das indústrias produtoras para estreitar as relações em condições reais, e assim melhorar a padronização para atender quesitos de qualidade e GES destes queijos. Na Tabela 4, encontram-se queijos muito produzidos no país, como os semiduros e as estimativas das relações C/G para esses queijos.
Tabela 4. Teores de caseínas estimados, variações nos teores de gordura segundo tecnologias e estimativa de relações C/G esperadas em leite para fabricação de queijos semiduros.
O queijo Prato Bola (Furtado, 2022) permite variação inferior maior na relação C/G do leite (0,61) que o Prato da tecnologia de Furtado (2022) (relação C/G 0,65). Isso é explicado, pois no Brasil o Prato Bola é de mesa, consumo direto e permite maior teor de gordura e consequentemente maior GES.
Na tecnologia do Prato Bola proposta por Dutra (2017) com a redução no intervalo do teor de gordura (3,2% - 3,4%), a relação C/G aumenta tanto no limite inferior (de 0,61 para 0,65), quanto no superior, passando de 0,71 para 0,73.
No queijo Prato, de maior consumo indireto e que atualmente fatia-se muito para venda no Brasil, Furtado (2022) fixa o teor de gordura (3,4%), diminuindo o intervalo da relação C/G entre 0,65-0,71. Dutra (2017) sugere teores mais baixos de gordura (3,2-3,4%), aumentando-se o intervalo da relação C/G (0,65-0,75).
Já Costa Júnior, Pinheiro (1999) sugeriram para o queijo Prato, intervalo na C/G entre 0,68 a 0,74, quando o teor real de caseínas foi de 2,25%, com o GES atingindo o mínimo de 45% segundo RTIQ deste queijo, e ainda mais 2% de margem de segurança sugerido pela Federação das Indústrias de Laticínios (FIL-IDF), ou seja de 47%.
Segundo Landin et al. (2022) que estudaram a melhor relação C/G para atendimento as propriedades funcionais do queijo Prato, a relação C/G 0,68 apresentou maior derretimento e liberação de óleo livre do que relações mais altas. A relação C/G 0,72 foi sugerida para a produção de queijo Prato, por apresentar derretimento aceitável e menor liberação de óleo livre.
Deve-se atentar muito para como se quer produzir o Prato, devido às variações para relações C/G mais altas ou mais baixas, além do teor real de caseínas do leite da indústria, esse queijo pode se apresentar, com maior GES e menor UMDQ, ou seja mais gordo, mais macio e com maior controle da proteólise ou vice-versa.
Também deve se atentar como será o consumo deste queijo, se direto (mesa), no qual será mais macio, se aproximando daquele Prato de décadas atrás produzidos no Brasil, ou para consumo indireto, para fatiamento, que se enquadra mais o queijo Prato atual, produzido pelas indústrias e segundo Furtado (2022), mais seco.
O mesmo autor ainda salienta para outro detalhe, as variedades do queijo Prato, como Cobocó e Lanche, que são de consumo direto e, portanto, mais úmidos e, altera também a composição do queijo, e consequentemente requer uma relação C/G mais específica.
Para o queijo Gouda, outro queijo de massa semi-cozida e lavada, as variações nos teores de gordura do leite das duas tecnologias sugeridas conforme Tabela 4 impactam também nas relações C/G, porém, com coerência, pois Furtado (2022) com a sugestão de teor de gordura mais elevado e intervalo mais baixo de C/G, estima GES maior do que aqueles de relações C/G mais alto, com menor intervalo de GES (DUTRA, 2017). Para o queijo Edam, o mesmo raciocínio do Gouda se aplica, e em ambas as tecnologias propostas, os valores se assemelham muito.
No queijo Meia Cura, encontram-se a maior divergência dentre as tecnologias, uma vez que os teores de gordura sugeridos se diferem bastante, com relações C/G bem distintas, sendo que o limite superior da tecnologia de Furtado (2022), C/G 0,63 refere-se ao inferior de Dutra (2017).
Desta forma, tem-se queijos com GES distintos, muito mais elevado na primeira tecnologia (49% a 54%) que na segunda (48% a 51%), uma vez que se sugere leite integral ou com teor mais alto de gordura na primeira tecnologia, contra leite padronizado, da segunda. Os teores de umidade também serão bastantes diferentes, com queijos mais secos segundo Furtado (2022) do que aqueles das fabricações sugeridos por Dutra (2017).
Já no queijo Minas Padrão, as tecnologias são muito semelhantes, portanto, as relações C/G são também bem próximas. Os teores de GES variam um pouco pois o limite inferior de teor de gordura do leite para este queijo, segundo Dutra (2017) é menor que o da tecnologia proposta por Furtado (2022), 48% a 51% de variação contra 43% a 49%, respectivamente.
Para os demais queijos semiduros citados, menos populares entre os laticínios do país, o mesmo pensamento é válido e já mencionado anteriormente, o de adotar a sistemática rotina de analisar em cada produção o teor de caseínas do leite para confrontar com os teores de gordura sugeridos nas tecnologias, e assim encontrar faixas estreitas e mais precisas das relações C/G para leite destinado aos queijos produzidos.
Finalmente, a Tabela 5 apresenta as relações estimadas de C/G para os queijos duros. No tocante ao Cheddar, Furtado (2017) relata que a relação C/G deva estar entre 0,69 e 0,70, ou seja, valores muito próximos aos encontrados para limite superior neste estudo de estimativa.
Com o conhecimento do real teor de caseínas do leite, consegue-se estreitar este limite. Amenu; Deeth (2007) relatam intervalos próximos para o queijo, C/G 0,64 a 0,72, porém, no estilo britânico de fabricação, ou seja, em condições diferentes daqui. Furtado (2022) recomenda teor de gordura de 3,77% quando o de caseínas for mais elevado, como na Europa, onde atinge 2,6% de caseínas, em média, para que a relação C/G permaneça entre 0,69 e 0,70.
Tabela 5. Teores de caseínas estimados, variações nos teores de gordura segundo tecnologias e estimativa de relações C/G esperadas em leite para fabricação de queijos duros.
No queijo Reino, os intervalos muito se assemelham, pois em ambas as tecnologias os intervalos também de padronização da gordura são muito próximos e que permitem variação maior no GES entre ambas, de 48% a 52%, segundo Dutra (2017) a 40% a 51%, de acordo com Furtado (2022), sendo que no segundo caso, se preconiza um queijo mais duro, como os mais tradicionais queijos Reino. Atualmente, encontram-se diferentes formas de consumo deste queijo, inclusive fatiado, algo impensável há décadas atrás.
Para o queijo Gruyére, segundo as tecnologias propostas, verifica-se grande divergência de variação na matéria gorda do leite destinado às fabricações desse queijo. Isto resulta em diferentes intervalos de relações C/G, com consequente composições de GES esperadas. Enquanto Furtado (2022) estabelece que o queijo obtenha entre 43% e 49% de GES, Dutra (2017) relata intervalo entre 47% e 50%, ou seja, no primeiro, queijos mais firmes.
O queijo Emmental, também apresenta distinta variação de teor de gordura recomendados pelas tecnologias, resultando em diferentes intervalos das relações C/G. Entretanto, nas duas tecnologias propostas, Dutra (2017) e Furtado (2007) relatam composição do GES próximas, de 45% a 49%, e de 43% a 49%, respectivamente.
Dutra (2017) relata uma relação C/G do leite entre 0,8 e 0,9, estimando em 2,4% o teor de caseínas do leite para atingir estes valores, e Furtado (2007) já preconiza empregar a relação C/G histórica da região, que só se consegue com regularidade nas análises cotidianas de fabricação.
Enquanto que, para o queijo Provolone, Furtado (2022) fixa o teor de gordura, Dutra (2017) recomenda intervalo maior, abrindo e alargando a relação C/G do leite até 0,89. Quanto ao GES esperado, a situação se inverte um pouco, sendo que Dutra (2017) reduz o intervalo de 47% a 53% neste queijo, enquanto que, para Furtado (2022), esta variação pode ir de 43% a 54%. Estes valores maiores no limite superior da relação C/G, permitirá produzir Provolone mais duro, com GES mais baixo.
No queijo Parmesão, devido às tradicionais tecnologias nacionais de leite com teores reduzidos de gordura, as relações C/G passam de 1,0 em ambas as tecnologias propostas. Com estreitamento do teor de gordura proposto por Furtado (2022), o GES do Parmesão também é achatado para 39% a 41%. Na tecnologia de Dutra (2017), aumentam-se ligeiramente os limites inferior e superior, e a resultante é um intervalo maior de GES, de 38% a 42%.
Furtado (2011) relata que o Parmesão deva ser fabricado com até 2,4% de teor de gordura no máximo, e assim, o intervalo da relação C/G passaria para 0,92 a 1,0. Este mesmo autor relata que no Brasil, o queijo é muito descaracterizado, sendo fabricado muitas vezes, dentre outros fatores, com leite de má qualidade, leite integral e aspectos tecnológicos dos mais variados, resultando em queijos muito atípicos e distintos daqueles que lhe deram origem na Itália.
Considerações finais
Todo processo de padronização de lácteos requer muito estudo, muitos dados levantados de produção, como análises da matéria-prima e dos queijos e persistência, até porque em se tratando de leite, diversos fatores contribuem para modificações inesperadas na composição, ainda mais em leite de conjunto para fabricações com maiores volumes.
Este artigo nada mais objetivou, do que o de fazermos uma reflexão acerca da padronização do leite para fabricação de queijos. Embora muitos números foram apresentados, a ciência do leite não é exata, e depende de fatores biológicos, químicos, bioquímicos, físicos, físico-químicos dentre outros, que devem permitir variações.
Porém, com maior controle do conhecimento da composição do leite, mais particularmente dos teores de caseínas e gordura, e com dados de composição esperada, pode-se melhorar a produção e torná-la mais regular, com menos variações e interferências sazonais.
Implantar a rotina e conhecer profundamente o leite de uma determinada região é fundamental e requer tempo, mas geram frutos que certamente diferenciarão a produção local.
As indústrias laticinistas brasileiras que ainda não adotam esta padronização sugerida, devem-se atentar para a sua importância, pois só assim poderão ganhar novos e mais competitivos mercados no país e em outros países.
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*Fonte da foto do artigo: Freepik