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Leite A2 e o mercado brasileiro: desafios e perspectivas

ILCT/EPAMIG

EM 05/03/2024

11 MIN DE LEITURA

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O leite A2, também designado como A2A2, é obtido a partir de vacas com o genótipo A2A2. O gene CSN-2, presente nos bovinos e demais mamíferos, desempenha o papel de controlar a síntese da proteína β-caseína, a qual apresenta 13 variantes distintas, sendo as mais comuns denominadas A1 e A2. A divergência entre essas duas variantes é atribuída a uma alteração na sequência de nucleotídeos, que influencia a construção da cadeia de aminoácidos da β-caseína. A β-caseína A1, presente no leite comum, tem histidina na posição 67 da sequência de aminoácidos, enquanto a A2 tem prolina na mesma posição (VERCESI FILHO, 2011).

Como consequência dessa alteração na sequência de aminoácidos, após a hidrólise da β-caseína A1, o peptídeo β-casomorfina-7 (BCM-7) é liberado, o que pode causar reações adversas em seres humanos, como alergias à proteína do leite. O leite A2, por sua vez, não produz o BCM-7 durante a digestão ou, se produz, resulta na forma inativa do BCM-9, que não causa efeitos adversos. Isso indica que o leite A2 pode ser mais bem digerido em comparação ao leite convencional (KAMINSK et al., 2007).

Muitas vezes, a alergia às proteínas do leite de vaca (APLV) é confundida com intolerância à lactose, condição mais comum numa parcela significativa da população mundial. Logo, é importante distinguir a intolerância à lactose e a alergia às proteínas do leite de vaca (APLV). A intolerância à lactose é causada pela incapacidade de digerir o açúcar do leite, enquanto a APLV é uma reação imunológica anormal às proteínas do leite. Sendo assim, apesar da substituição do leite convencional pelo leite A2 ser benéfica para pessoas com APLV, não é eficaz contra a intolerância à lactose. Contudo, o consumo de leite A2 pode ser uma opção para aqueles que apresentam reações alérgicas, especialmente ao BCM-7 produzido via hidrólise da β-caseína do leite A1.

Neste contexto, o artigo tem o objetivo de apresentar aspectos relevantes em relação ao mercado de leite A2 no Brasil, desafios e perspectivas para o setor.

Mercado, desafios e perspectivas do leite A2 no Brasil

O Brasil é um grande produtor de leite, ocupando o quinto lugar no mundo, com uma produção anual de cerca de 35 milhões de toneladas (EMBRAPA, 2023). No entanto, o mercado de leite A2 ainda está em desenvolvimento, representando uma fração pequena da receita total do leite, aproximadamente 100 milhões de reais anuais, o que corresponde a cerca de 1% do total. Apesar disso, o país tem potencial para investir nesse setor, com produtores interessados e fazendas implementando programas de rastreamento para assegurar a qualidade (DORNELAS; MENDONÇA, 2021).

A comercialização de leite A2 é uma realidade internacional, com empresas que produzem e comercializam esse tipo de leite com êxito. Embora muitos produtores demonstrem interesse, a introdução desse produto no mercado brasileiro enfrenta desafios complexos, que abrangem desde questões técnicas e de produção até aspectos regulatórios, comerciais e de conscientização do consumidor (Figura 1) (MILKPOINT, 2018; CORBUCCI, 2017).

Para superar esses obstáculos, é necessário um esforço conjunto de diversas áreas envolvidas para fortalecer esse segmento no país. A seguir, serão abordados os desafios apresentados na Figura 1, bem como as estratégias que podem ser usadas para superá-los.

Figura 1. Principais desafios do leite A2 no mercado brasileiro.

Principais desafios do leite A2 no mercado brasileiro.

 

Obtenção do leite A2

Em relação à obtenção do leite A2, um dos principais problemas enfrentados pelo mercado brasileiro está intimamente relacionado à seleção e criação de rebanhos leiteiros geneticamente predispostos a produzir β-caseína A2 em maior quantidade. Há animais (A1A1) que exclusivamente produzem o leite A1, enquanto os animais (A1A2) produzem o leite A1A2. Por outro lado, animais com o gene (A2A2) produzirão exclusivamente o leite A2 (VERCESI FILHO, 2011).

O leite A2 é obtido por meio da genotipagem dos animais, sendo observado por Lima e Lara (2015) que 100% do alelo A2 é encontrado na raça Sindi, destacando-se pela menor incidência de alergias e contendo apenas β-caseína A2. Outros estudos demonstraram também a presença de 96% desses alelos na raça Gir e 93% na raça Guzerá (RANGEL et al., 2017). As raças Holandesa e Pardo-suíça têm 50% de chance de produzir leite A2, enquanto Jersey tem 75%, indicando maioria A2. Guernsey, embora rara no Brasil, produz exclusivamente leite A2. Portanto, esses animais apresentam um notável potencial para a produção de leite com o alelo A2, além de exibirem características bem estabelecidas de rusticidade e resistência a parasitas externos.

Preços e Rentabilidade

Para o fortalecimento do mercado de leite A2 no Brasil, é importante levar em conta aspectos relacionados à concorrência com produtos já existentes, como o leite de vaca tradicional. No cenário atual, o investimento no custo de produção do leite A2 no Brasil é maior, o que resulta em preços mais elevados para os consumidores. No entanto, até que valor o consumidor pagaria por esse tipo de produto? Para responder a essa questão, é crucial que os produtores e empresas de laticínios avaliem de forma criteriosa o custo-benefício do produto, para que possam estabelecer preços que os consumidores estejam dispostos a pagar e, ao mesmo tempo, proporcionem retorno financeiro para os produtores e empresas do setor. Isso requer uma análise aprofundada dos custos de produção, processamento, distribuição e marketing do leite A2, bem como das preferências e comportamentos de compra dos consumidores.

Pesquisa e Desenvolvimento

Apesar de haver um consenso na comunidade científica quanto aos benefícios do consumo de leite A2, esses estudos ainda são incipientes, sendo importante investir em pesquisas científicas mais robustas para compreender melhor e demonstrar os fatores que proporcionam maior saudabilidade para o consumidor.

Paralelamente, essas pesquisas devem abranger também temas como seleção genética de rebanhos. Isso porque a seleção das raças para a produção de leite A2 requer um processo cuidadoso, uma vez que é necessária uma técnica específica para a identificação e codificação dos alelos A1 e A2, além de um manejo nutricional e sanitário adequados para assegurar a máxima expressão do gene responsável pela produção da proteína A2.

Para determinar a variante da β-caseína produzida pelos animais, é essencial realizar a análise do perfil genético por meio do teste de genotipagem. Este teste examina tecidos biológicos dos animais para identificar sua composição genética relacionada à β-caseína. Embora este teste genético seja o método mais comum, ele implica em tempo de espera, representando um obstáculo para a produção em larga escala nos laticínios. Além disso, é preciso investir no melhoramento genético do gado, realizando um mapeamento genético através de exames de sangue para determinar se o animal é homozigoto, condição necessária para a produção de leite A2 (RIBEIRO & SANTOS, 2022).

Por fim, outro aspecto relevante é o desenvolvimento de novas técnicas e métodos de produção para aumentar a eficiência e qualidade desse tipo de leite.

Parcerias

A intensificação de parcerias entre diversos setores é outro fator importante para o crescimento do mercado de leite A2 brasileiro. Vale ressaltar que o número de produtores de leite A2 é insuficiente para atender à demanda nacional. Isso ocorre, muitas vezes, devido à falta de cooperação entre os produtores e outros setores, como órgãos reguladores, indústrias de laticínios, instituições de pesquisa e consumidores, o que dificulta o desenvolvimento de soluções para os problemas enfrentados em relação ao leite A2. Dessa forma, é importante que esses setores atuem sinergicamente, compartilhando conhecimentos e recursos para promover o progresso da produção, processamento e comercialização do leite A2 no Brasil.

Aceitação de mercado

Os consumidores têm se mostrado cada vez mais atentos à origem e à qualidade dos alimentos que consomem, o que estimula a procura por novos produtos, como o leite A2. No entanto, apesar de existir um mercado específico, a maioria dos consumidores não tem familiaridade com este tipo de produto, além de desconhecer os seus benefícios para a saúde. Desta forma, conquistar esses consumidores representa um desafio para o setor.

Neste contexto, é importante que as marcas, sobretudo das indústrias de grande porte, adotem estratégias de marketing e comunicação claras com os consumidores, de modo a tornar o produto conhecido e acessível. Isso requer investimentos em pesquisas e desenvolvimento, bem como campanhas publicitárias que destaquem as potencialidades do leite A2, principalmente quanto à sua digestibilidade.

Regulamentação e Certificação

A falta de uma legislação específica para o leite A2 representa um desafio adicional para a produção e comercialização deste tipo de leite. Contudo, há uma certificação nacional que valida a qualidade do produto e confirma a presença exclusiva do genótipo A2A2, criada em 2019 pela Integral Certificações. Essa certificação foi regulamentada apenas em outubro de 2021 por meio da Resolução 3.980 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) (ABRALEITE, 2021).

O selo VACAS A2A2 (Figura 2) assegura a qualidade do produto e confirma a presença exclusiva do genótipo A2A2. Este selo garante a origem e rastreabilidade do leite A2 por meio de uma certificação de terceira parte, ou seja, auditoria realizada por uma organização independente. Para tornar o processo de certificação mais transparente e robusto, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) assinou um acordo de cooperação com a Integral Certificações (DORNELAS; MENDONÇA, 2021).

Figura 2. Selo VACAS A2A2.

Selo VACAS A2A2.
Fonte: Revista Leite Integral.

 

Deste modo, os produtores rurais e indústrias devem cumprir com as regras estabelecidas no protocolo VACAS A2A2 para que a certificação seja cedida. No entanto, apesar da certificação nacional, a obtenção de uma regulamentação específica para o leite A2, bem como a elaboração e implementação de diretrizes específicas, são essenciais para garantir a qualidade e segurança do alimento.

Processamento e distribuição

Além dos desafios mencionados, também é importante considerar questões relacionadas ao processamento e distribuição do leite A2. Atualmente, diversos produtos têm como objetivo incentivar uma produção ecologicamente correta, transparente e acessível aos consumidores. Essa é, de certa forma, uma das estratégias que podem ser empregadas para a conquista de novos consumidores.

Para o leite A2 não é diferente, porém, para atender a esses requisitos, é imprescindível uma infraestrutura adequada para a sua produção, processamento e distribuição. Isso compreende a disponibilização de tecnologias adequadas para a ordenha e refrigeração do leite, bem como a eficiência logística para o transporte e armazenamento em condições ideais. Especialmente em áreas descentralizadas, essa infraestrutura pode ser inexistente, dificultando a produção e comercialização do produto.

Com o objetivo de atender às necessidades dos consumidores cada vez mais exigentes quanto à aquisição de alimentos com alta densidade nutricional e, consequentemente, benefícios para a saúde, o estímulo ao desenvolvimento de novos produtos torna-se imperioso. Este cenário cria uma oportunidade de produção de derivados lácteos a partir do leite A2.

O leite A2 ainda é pouco conhecido, o que requer uma atenção especial por parte dos pesquisadores da área para uma maior compreensão acerca das suas potencialidades, oferecendo novas opções de produtos para esse segmento de mercado. Além disso, é fundamental uma intensificação das estratégias de marketing e de um incentivo conjunto ao comércio de leite A2 no Brasil, por parte dos diversos atores da cadeia de laticínios, aumentando a versatilidade de produtos ofertados e geração de renda para as indústrias de laticínios.

 

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Agradecimentos

Os autores agradecem o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – FAPEMIG.

Autores:

Dra. Tatiane Teixeira Tavares, Bolsista de pesquisa nível I do Instituto de Laticínios Cândido Tostes – EPAMIG-ILCT.

Analice Aparecida Vitória Sipriano, Graduanda de Tecnologia em Laticínios, do Instituto de Laticínios Cândido Tostes – EPAMIG-ILCT.

Helen Gomes Alvares, Graduanda de Tecnologia em Laticínios, do Instituto de Laticínios Cândido Tostes – EPAMIG- ILCT.

Prof. Dra. Ana Flávia Coelho Pacheco, Professora/pesquisadora do Instituto de Laticínios Cândido Tostes – EPAMIG-ILCT.

Prof. Nelson Luiz Tenchini de Macedo, Professor do Instituto de Laticínios Cândido Tostes e Coordenador da Expolac / Minas Láctea - EPAMIG-MG.

Prof. Dr. Paulo Henrique Costa Paiva, Professor/pesquisador do Instituto de Laticínios Cândido Tostes - EPAMIG-ILCT.

Referências bibliográficas

CARVALHO, J. M. et al. Leite tipo A2A2: desafios e inclusão de novos produtos no mercado. II SICITAL – Simpósio de Ciência e Tecnologia de Alimentos, 2023.

CORBUCCI, F. S. Beta-caseína A2 como um diferencial na qualidade do leite. 2017.

CRUZ, A. G., et al. Química, bioquímica, análise sensorial e nutrição no processamento de leite e derivados. Elsevier, 2016.

DORNELAS, M & MENDONÇA, L. Leite A1 e A2: quais as suas principais diferenças? Rehagro/Blog. 2021. Disponível em:  https://rehagro.com.br/blog/leite-a1-e-a2-quais-as-principais-diferencas/. Acesso em 30 de janeiro de 2024.

EMBRAPA. Anuário Leite 2023: leite: baixo carbono. Juiz de Fora: Embrapa Gado de Leite, 2023.

KAMINSKI, S. et al. Polymorphism of bovine beta-casein and its potential effect on human health. Journal of applied genetics, v. 48, n. 3, p. 189-198, 2007.

LIMA, A. C. J.; LARA, M. A. C. Polimorfismo do gene ß-Caseína em bovinos. Actas Iberoamericanas de Conservación Animal. AICA, v. 6, p. 280–285, 2015.

MILKPOINT. Vinamilk produz primeiro leite A2 no Vietnã. 2018. Disponível em: https://www.milkpoint.com.br/noticias-e-mercado/giro-noticias/vinamilkproduziu-primeiro-leite-a2-no-vietna-209572/. Acesso em 31 de janeiro de 2024.

MILKPOINT. Conquista para o leite A2: benefícios podem constar no rótulo. 2021. Disponível em: https://www.milkpoint.com.br/noticias-e-mercado/giro-noticias/leite-de-digestao-mais-facil-ja-pode-ter-essa-informacao-no-rotulo-227780. Acesso 31 de janeiro de 2024.

MOURA, R. C. et al. O efeito de fórmulas nutricionais utilizadas no tratamento de crianças com alergia à proteína do leite de vaca: uma revisão sistemática. Research, Society and Development, v. 11, n. 2, p. e26511225594-e26511225594, 2022.

PEREIRA NETA, I. B. et al. Aplicação das boas práticas agrícolas na produção de leite. Pubvet. 2018. Disponível em: https://doi.org/10.22256/pubvet.v12n5a94.1-8. Acesso em: 30 de janeiro de 2024.

RANGEL, A. H. N. et al. Polymorphism in the Beta Casein Gene and analysis of milk characteristicsin Gir and Guzerà dairy cattle. Genetics and Molecular Research, v. 16, n. 2, 2017.

RIBEIRO, M. P., DOS SANTOS, P. A. Dificuldades da difusão do leite A2 nos laticínios. 2022. MilkPoint. Disponível em: https://www.milkpoint.com.br/artigos/industria-de-laticinios/dificuldades-da-difusao-do-leite-a2-nos-laticinios-228691. Acesso em 31 de janeiro de 2024.

VERCESI FILHO, A. E. Identificação de Alelos para o Gene da β-Caseína na Raça Gir leiteiro. Pesquisa e Tecnologia, São Paulo, v. 8, n. 2, 2011.

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BRUNO VICENTINI

LAVRAS - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 05/03/2024

Muito bom artigo! Bem explicado e conciso!

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