Vacas felizes e meio ambiente feliz tem uma relação muito mais próxima do que se imagina. Quando falamos sobre “felicidade” de um animal, estamos nada mais dizendo que este possa expressar sua natureza e viver em paz, ou seja, ter acesso a comida, água, se sentir confortável, estar livre de doenças ou qualquer tipo de ameaça.
Isso é profundo pois se trata de manter animais dentro de um padrão zootécnico de excelência, que nesse caso envolve manejo, nutrição, instalações, saúde entre tantos outros pontos discutidos há anos e que se resumem numa vaca feliz. Ambientalmente falando a questão é um pouco mais complexa e profunda pois, além de contar com o bem-estar dos animais, busca o “bem-estar” da natureza como um todo e sua capacidade de regeneração. Isto é, o ambiente feliz inclui vacas felizes mas muito mais do que isso.
Agenda ambiental é hoje
A pauta ambiental já não é mais tratada como algo futuro, como moda e sim como uma exigência da sociedade que tem se materializado em forma de leis e medidas globais. Antes a legislação era vista apenas como um sistema de punição, hoje de forma global já começa a incentivar a bonificação pensando em mitigar efeitos ambientais negativos.
De maneira geral, o setor leiteiro ainda está descolado desse assunto, mantendo um discurso de que é importante mas efetivamente agindo pouco. Vale lembrar que um dos principais entraves para engajar mais pessoas na questão ambiental é mostrá-la como oportunidade de ganho financeiro a quem está investindo nessa luta. Porém, quanto mais se pesquisa, mais se descobre que é possível fazer dinheiro com conceitos de preservação ambiental como: aumento de produtividade, uso de gases de efeito estufa para geração de energia, agricultura regenerativa e entre outros.
A partir desse ponto é possível ganhar ritmo e escala, pois se o mercado começa a ver ganhos, a sustentabilidade sai da posição utopia (complicada e difícil) e assume a posição de ganha-ganha. Ou seja, havendo congruência entre preservação ambiental, bem-estar animal e lucratividade começa-se a revelar um caminho virtuoso.
O Compost e confinamentos de forma geral entram nesse caminho?
O Compost Barn e confinamentos de forma geral entraram nesse barco como uma opção que agrada produtores, animais, meio ambiente e funcionários em geral. O Compost em especial, virou febre no Brasil há alguns anos pois na época significava uma construção um pouco mais simples que o Free Stall e que permitia maior liberdade de movimentação aos animais. Inicialmente, foi aderido pelos mais inovadores e ao longo do tempo fazendas foram se encorajando a adotar o sistema que trazia muitas dúvidas consigo, mas também muitas soluções.
Pensando nos animais, as vacas podem deitar como quiserem, não há baias individuais e elas esterçam na própria cama, que com o processo de revolvimento e compostagem, se torna uma opção interessante como fertilizante e relativamente segura do ponto de vista de sanidade.
Pensando no meio ambiente, a cama de serragem se feita com resíduos de serralheria por exemplo não representa um risco ambiental no sentido de ter que derrubar árvores para fabricar e mesmo quando são derrubadas isso vem de plantações de eucalipto ou outra árvore plantada exatamente para esse fim (pela rapidez de crescimento, perfil de madeira, etc). Outro ponto importante é que a incorporação de urina e fezes na cama, promove a retenção de carbono e nitrogênio diretamente e que após um tempo de compostagem irão retornar ao solo, não indo nem para água, nem para o ar. O que é um ganho importante pensando na proteção ambiental.
Quanto do leite é captado de sistemas confinados?
Assim, uma pergunta recorrente é: “Os sistemas confinados realmente representam uma massa significativa de produtores? Pois se o volume de leite for baixo isso não é de fato uma solução viável a curto prazo”. Não apenas sistemas de compostagem, mas observa-se a evolução dos sistemas de confinamento em geral e o reflexo disso no volume de leite captado pelos laticínios. Veja o gráfico abaixo:
Segundo o gráfico, apenas 9,5% dos produtores que fornecem para estas empresas representam sistemas de produção confinados, com produção de 46% do total, ou seja, quase metade do leite captado já vem de sistemas confinados.
Conforme o gráfico abaixo, observamos que a média de produtores em confinamento é quase 5 vezes maior do que a média total de produtores. Isso evidencia que a produção em confinamento, por exemplo, aumenta a produção leiteira e portanto diminui o impacto ambiental por litro de leite produzido, já que requer menor área, menos animais, etc. (obviamente se bem manejado)
Fonte: pesquisa MilkPoint Mercado
Além de sistemas confinados mostrarem ganhos de produtividade, há ganhos no bem-estar e longevidade dos animais e satisfação dos funcionários. Do ponto de vista ambiental, já mencionado, há menor emissão de gases de efeito estufa por litro de leite produzido além da diluição de outros co-produtos e isso pode gerar oportunidades reais para capitalização. No caso de fazendas de leite, a emissão de NO2 (dióxido de nitrogênio) e CH4 (metano) é diminuída em comparação com sistemas não confinados, já que a maior parte dos dejetos é incorporada a cama e não liberada para a atmosfera, permitindo que não apenas o Carbono mas outros elementos como Nitrogênio retornem à terra no momento da utilização como adubo orgânico.
De acordo com o médico veterinário Adriano Seddon: “Eu vejo dois pontos muito importantes quanto ao compost e toda a questão de dejetos e produção de gases de maneira geral. Primeiro, uma vez que aumentamos a produção por vaca, aumenta-se a eficiência na relação a emissão de gases por quilo de leite produzido. Outro ponto, se estamos com médias maiores em relação às demandas no Brasil, por estarmos oferecendo conforto às vacas, seja em compost, ou resfriamento, e tem-se um impacto significativo na média das vacas, daí precisamos de um rebanho menor. Nesse caso, com um menor rebanho vamos ter uma maior eficiência e uma melhor relação de produção de leite x gases emitidos. Além dos gases, o compost vem mostrando que consegue, com o processo de compostagem, mineralizar os nitritos e nitratos, impedindo que eles vão diretamente para o solo, evitando assim, a contaminação. Com isso, temos um resíduo sólido mais seguro e efetivo no uso da agricultura.”
Mercado de carbono é uma opção?
Hoje o mercado de carbono começa a despontar como fonte de renda para empresas que entendem e aproveitam o conceito. Trata-se de uma iniciativa global. Crédito de carbono nada mais é do que transformar o montante “economizado” de emissões em uma moeda de troca entre quem polui mais e quem polui menos. Assim, a ideia é integrar mercados de diferentes naturezas, buscando a neutralidade de emissões e remunerando quem põe mais esforços na não emissão de Carbono.
Cooperativas e indústrias podem protagonizar a união de produtores que concordam em trabalhar nessa visão e podem gerar programas robustos nesse sentido. Não apenas a entrada no mercado de carbono, mas utilizar todo esse combo de informações que o consumidor desconhece a favor dos lácteos é uma inovação. O consumidor, por exemplo, não sabe que camas orgânicas podem ser utilizadas nas lavouras como alternativa aos fertilizantes químicos, ou que sistemas confinados podem ajudar as vacas serem mais felizes simplesmente não gera valor para a cadeia.
Os Composts Barns, apesar de mostrarem diminuição na emissão de gases, ainda por si só não podem ser uma medida que vá viabilizar a produção de créditos de carbono, porém quando pensamos de forma mais ampla no aumento da produtividade seja pelo confinamento, pela melhoria genética, nutricional e técnica de maneira geral e medidas como melhor gestão hídrica e de dejetos, é possível neutralizar uma quantidade interessante de Carbono que além de ser potencialmente um gerador de receita pode melhorar e muito a imagem do leite ao mercado consumidor.
Os gráficos acima mostram que já existe uma massa crítica e é crescente que possibilita programas massivos. Obviamente nem todos os produtores entendem que esse é um caminho sem volta, mas grupos como associações e cooperativas podem promover essa ideia.
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