O que é Neosporose?
A neosporose bovina é uma doença parasitária causada pelo protozoário Neospora caninum, parasito coccídio formador de cistos, que foi descrito e caracterizado pela primeira vez em cães nos EUA.
Atualmente, essa enfermidade é considerada uma das principais causas de aborto em bovinos de todo o mundo, podendo também raramente causar distúrbios neurológicos em neonatos, sendo responsável por expressivos prejuízos econômicos a rebanhos de corte e, especialmente, à pecuária leiteira.
O principal efeito negativo da neosporose bovina é o aborto, mas pode provocar também morte embrionária e reabsorção, redução na produção de leite, nascimento de bezerros com anormalidades congênitas e menor taxa de crescimento dos animais jovens.
As perdas econômicas por neosporose em bovinos não se limitam apenas aos abortamentos, mas o descarte prematuro de matrizes, a mortalidade neonatal de bezerros, os gastos indiretos incluindo honorários profissionais, gastos com estabelecimento do diagnóstico e reposição de animais também devem ser incluídos.
O N. caninum tem como hospedeiros definitivos o cão e o coiote, que eliminam oocistos não esporulados nas fezes após a ingestão de tecidos ou órgãos dos hospedeiros intermediários, como membranas placentárias de vacas contaminadas com cistos teciduais.
Qual a principal forma de transmissão do Neospora caninum?
O N. caninum é transmitido de forma vertical ou congênita nos bovinos, durante algumas gerações, sendo esta a principal rota de infecção no rebanho. No entanto, a transmissão horizontal que ocorre por ingestão de oocistos eliminados nas fezes do cão parece ser necessária para sustentar e introduzir novas infecções no rebanho. Além do mais, estudos epidemiológicos e observações a campo têm demonstrado evidência cada vez maior da ocorrência de infecção horizontal nos bovinos.
A transmissão transplacentária pode causar aborto, mas na maioria das vezes ocorre o nascimento de um bezerro saudável, porém congenitamente infectado. Fêmeas infectadas congenitamente podem transmitir verticalmente a infecção para suas crias em sucessivas parições.
Entretanto, ocorre um decréscimo na proporção de bezerros infectados congenitamente, em vacas com maior número de partos, que pode ser explicado pelo aumento da imunidade protetora contra a transmissão transplacentária, ou seja, a transmissão vertical é mais eficiente em fêmeas mais jovens.
Até o presente momento a transmissão de N. caninum de animal para animal não foi descrita. DNA de N. caninum foi detectado no colostro de vacas soropositivas. Esse achado sugere a possibilidade de transmissão via colostro, apesar de não ser considerada uma rota de infecção natural importante.
Poucos estudos sugerem que o sêmen de touros infectados pode ser potencial fonte de transmissão venérea do N. caninum. De qualquer modo, DNA de N. caninum pode ser encontrado no sêmen de touros naturalmente expostos; no entanto, os resultados sugerem que a viabilidade destes parasitos quando presentes é pequena.
Quais os sinais clínicos da Neosporose em bovinos?
Aborto devido ao N. caninum é o único sinal clínico observado em vacas adultas e pode ocorrer em qualquer estágio da gestação, sendo mais frequente entre o 5o e 6o mês de prenhes. Problemas de abortamentos associados à neosporose em rebanhos bovinos podem ser caracterizados como epidêmicos ou endêmicos.
Geralmente, abortos epidêmicos ocorrem pela infecção horizontal primária por meio da ingestão de oocistos presentes em alimentos ou água, enquanto abortos endêmicos ocorrem em animais persistentemente infectados (transmissão transplacentária endógena) pela recrudescência da infecção durante a gestação.
O estágio da gestação no qual ocorre a infecção pelo N. caninum é importante no resultado da doença. Infecções adquiridas no início da prenhez, antes do feto bovino desenvolver o sistema imune, comumente causam morte fetal e reabsorção. Infecção no meio da gestação pode resultar em aborto ou no nascimento de um bezerro persistentemente infectado. Contudo, no período final da gestação, quando o feto é imunocompetente, ocorre o parto normal, porém o bezerro pode ser congenitamente infectado.
O nascimento de bezerros infectados congenitamente que podem nascer clinicamente normais é de grande importância na epidemiologia da enfermidade por poderem transmitir a infecção a sua descendência. Vacas infectadas com o parasito têm de três a sete vezes mais chances de abortar se comparadas com aquelas não infectadas, sendo que o maior risco de abortamento ocorre em novilhas de primeira cria.
O feto pode morrer no útero, ser reabsorvido, mumificado, autolizado, morrer após o nascimento, desenvolver a doença após o nascimento ou então nascer clinicamente normal, porém cronicamente infectado. A neosporose em bezerros neonatos apresenta sinais clínicos como os membros posteriores e/ou anteriores flexionados ou hiperestendidos, ataxia, diminuição do reflexo patelar, perda da consciência, exoftalmia, assimetria ocular e deformidades associadas com lesões de células nervosas, na fase embrionária.
Como diagnosticar Neospora?
O diagnóstico clínico pode ser realizado através da observação dos sinais clínicos comuns a infecção por Neospora caninum. Nas fêmeas que abortaram não são observados sinais clínicos posteriores e o cio ocorre normalmente. No entanto, o aborto ou nascimento de animais infectados, com ou em sinais clínicos, pode se repetir em futura prenhez.
A partir do primeiro isolamento de N. caninum, testes sorológicos como a reação de imunofluorescência indireta (RIFI), teste de aglutinação de Neospora (NAT) e vários ELISAs, foram desenvolvidos para o diagnóstico em bovinos. A RIFI foi o primeiro teste utilizado para demonstração de anticorpos anti-N. caninum, sendo considerado o teste de referência quando outros ensaios são comparados.
Como controlar e prevenir a Neosporose em bovinos?
Uma das melhores formas de controlar a introdução da infecção no rebanho é a realização de testes diagnósticos e atestados negativos da doença em animais provenientes de outras propriedades.
Também como alternativas de controle são sugeridas algumas práticas de manejo relacionadas à interrupção do ciclo de transmissão do N. caninum. Uma delas é evitar a interação de cães com o rebanho, a fim de prevenir a contaminação fecal de água, pastagem; recomenda-se o isolamento dos galpões de armazenagem de sal mineral, ração e/ou silagem.
Outra alternativa de controle baseia-se na prevenção da aquisição da infecção pelos cães, evitando que os mesmos consumam restos placentários, fetos abortados, bezerros natimortos, carne e vísceras de vacas e bezerros mortos, e deve-se evitar o consumo de carcaças bovinas.
O estabelecimento de um programa de monitoramento para confirmação da ausência do N. caninum é recomendado. Este programa deve incluir testes sorológicos, de todas as vacas que abortaram e exames histopatológico e imunoistoquímico de tecidos fetais e placentários para confirmação da presença do parasito. Nas propriedades onde já foi diagnosticada a infecção o monitoramento deve ser realizado no sentido de prevenir abortos e minimizar os riscos de transmissão vertical e horizontal.
Com estas medidas a prevalência da infecção pode ser reduzida em longo prazo. A medida mais indicada para controlar a infecção congênita é a redução do número de animais infectados mediante o descarte e a reposição seletiva.
As medidas de controle devem atingir todo o rebanho, sempre em função das taxas de soroprevalência e aborto. A eliminação das vacas soropositivas pode ser a medida mais adequada se a soroprevalência for baixa, porém se for elevada, as ações a serem tomadas não devem ser tão drásticas.
Nos animais soropositivos podem ser encontrados diferentes tipos de manifestações, que influirão na decisão a ser tomada. Vacas que abortaram uma ou mais vezes devem ser priorizadas para descarte. Vacas soropositivas sem antecedentes de aborto, porém podem atuar como portadoras da infecção, devendo-se, portanto, evitar a utilização de sua descendência para reposição.
Garantir um bom estado nutricional das vacas prenhes vai ajudar a reduzir os riscos de aborto entre os animais contaminados por esse parasito. Rebanhos que utilizam a prática de transferências de embriões devem ter o cuidado de utilizar fêmeas doadoras e receptoras soronegativas.