Como estão os preços e vendas de lácteos no varejo?

O preço de venda dos produtos lácteos no varejo, destinado ao consumidor final, é um tema constantemente debatido no setor. Em alguns momentos, há a alegação de que "os supermercados estão praticando preços muito elevados, travando o consumo na ponta". Em outras ocasiões, argumenta-se que "as promoções agressivas e preços baixos depreciaram a categoria".

Essa dinâmica de flutuação de preços no varejo impacta diretamente na variação dos demais elos da cadeia, conforme abordado neste artigo. Cada elo busca valorizar cada vez mais seus produtos, embora nem sempre a redução de preços seja totalmente prejudicial, podendo, inclusive, desempenhar um papel importante na reativação do consumo.

Diante disso, vamos analisar a variação dos preços dos lácteos no varejo em 2023, o reflexo nas vendas e o que essa variação recente tende a refletir nos preços de 2024.

A deflação dos lácteos em 2023

O ano de 2022 foi caracterizado por uma significativa elevação nos preços dos produtos lácteos, o que impactou no consumo das famílias. Essa escalada de preços exerceu pressão em toda a cadeia, resultando em um início de 2023 com uma inflação anual elevada para a categoria, registrando um aumento de 21,4% no índice de "Leite e Derivados" do IPCA, em janeiro de 2023.

No entanto, ao longo do último ano, observou-se correções nos preços de venda no varejo, tornando os produtos lácteos mais acessíveis à população. Enquanto em 2022 o preço do leite esteve em evidência na mídia devido ao seu aumento, sendo considerado um vilão na composição dos custos alimentares, o cenário em 2023 se mostrou distinto, com a categoria de lácteos apresentando deflação. Esse comportamento contrasta com o índice geral do IPCA e o grupo de alimentação e bebidas, indicando uma mudança positiva nos preços ao consumidor final para os lácteos.

Gráfico 1. Inflação acumulada em 12 meses (IPCA – dez/2023)

Abaixo, também podemos observar a tendência da inflação acumulada em 12 meses para a categoria de leite em derivados ao longo de 2023. Inicialmente elevada, essa taxa foi gradualmente reduzindo ao longo do 1º semestre.

Gráfico 2. Inflação acumulada em 12 meses da categoria “Leite e Derivados” (IPCA – dez/2023)

Analisando por produto, dentro da categoria de “Leite e Derivados”, o leite em pó, leite longa vida e leite condensado encerraram o ano em deflação. As categorias de queijo e manteiga permaneceram praticamente estáveis. Por outro lado, os leites fermentados, iogurtes, bebidas lácteas e requeijões foram as categorias que apresentaram aumento acumulado durante o período.

Gráfico 3. Inflação acumulada em 12 meses por produtos (IPCA – dez/2023)

Na mesma tendência do observado para o IPCA, ao analisar os preços de forma nominal, os dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) para a cidade de São Paulo mostram que, no início de 2024 (dados parciais até a 2ª semana), os preços ao consumidor final começam em níveis inferiores em comparação ao início do ano anterior. Esse cenário tende a estimular a aquisição desses produtos pelas famílias.

Gráfico 4. Preços Nominais do UHT no Varejo (FIPE)

Gráfico 5. Preços Nominais da Muçarela no Varejo (FIPE)

O impacto nas vendas

Em teoria, com preços mais acessíveis, espera-se uma resposta positiva no volume de vendas, e isso tem ocorrido, em certa medida, para a maioria das categorias. Conforme os dados divulgados pela Scanntech em seu Radar Mensal, em dezembro de 2023, o volume de vendas do varejo ao consumidor final apresentou crescimento em relação ao mesmo período de 2022 para parte das categorias analisadas. Entretanto, chamam a atenção os dados referentes ao leite UHT, que, mesmo com a redução dos preços, registrou um volume de vendas ainda inferior ao observado no mesmo período do ano anterior.

Figura 1. Variação do Preço Unitário e Volume de Vendas no Varejo (dez/23 vs dez/22)

Fonte: Radar Scanntech – retirado do LinkedIn

A maior dificuldade para o giro de vendas do leite UHT, em comparação com os demais produtos, também se refletiu nos níveis de estoques da indústria. Conforme o benchmark mensal do Milki, o estoque de UHT começou o ano de 2024 em patamares superiores aos do início do ano anterior, além de também apresentar um aumento em relação a dez/23. Por outro lado, a muçarela registrou estoques mais confortáveis, tanto em comparação ao ano anterior quanto em relação ao último mês.

Gráfico 6. Leite UHT - Dias de produção em estoque nas empresas participantes (no 1º dia do mês)

Gráfico 7. Muçarela - Dias de produção em estoque nas empresas participantes (no 1º dia do mês)

Impactos atuais no mercado

O início da recuperação do consumo tem gerado um otimismo crescente na indústria. Além disso, o mercado visualiza uma oferta de leite mais enxuta nos próximos meses, seguindo o padrão sazonal da produção interna, além da expectativa de redução das importações.

Essa conjuntura tem impactado positivamente nos preços de venda da indústria, evidenciado nas primeiras semanas deste ano, inclusive para o leite UHT, que vinha mostrando maiores dificuldades no mercado.

Os aumentos realizados pela indústria devem ser repassados ao consumidor final pelo varejo, sinalizando uma possível reversão do cenário de deflação da categoria de leite e derivados do IPCA nos próximos meses, conforme observamos.

A valorização dos derivados já se reflete nos preços do leite no mercado spot, o que tende a influenciar também os preços pagos aos produtores.

Dessa forma, os preços do leite ao produtor, os preços praticados pela indústria e os preços dos derivados estão desenhando o início de um ciclo de altas neste momento – o que era esperado ansiosamente por muitos.