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PAULO F. STACCHINI
SÃO CARLOS - SÃO PAULO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
EM 03/01/2023
Importante salientar que o aumento de preços notados no primeiro semestre de 2022 foi amplamente noticiado e justificado como uma reação à queda acentuada da captação e da renda do produtor observada nos últimos 3 anos! Curiosamente, no segundo semestre a curva se inverteu e sucessivas quedas no preço ocorreram reduzindo substancialmente os ganhos obtidos no 1o semestre. A subida acentuada e súbita de preços de março a julho de 2022 teria realmente impacto para promover uma explosão de produção tão rápida a ponto de reestabelecer o volume de produção perdido durante quase 3 anos, a ponto da oferta ficar tão grande em relação ao consumo e pressionar quedas sucessivas no preço até dezembro? Na minha humilde opinião não! É fácil cortar e reduzir o volume produzido na fazenda, mas recuperar atrasos na reprodução, acelerar a recria e aumentar a média diária individual e o número das matrizes em lactação são processos lentos, difíceis!
Sendo assim, fica evidente o comportamento oportunista de alguns elos da cadeia láctea. Tanto no aumento do preço no atacado e varejo, quanto na redução do preço pago ao produtor. É a ganância dirigindo as políticas de preço sempre no curto prazo, sem planejamento e sem qualquer previsibilidade para o médio e longo prazo. Ruim para o produtor, ruim para indústria, ruim para consumidor que vai alterando e adaptando seus hábitos alimentares e deixando de consumir mais por começar a ter uma percepção que pode estar sendo enganado. Afinal como pode o preço quase dobrar e depois retornar em poucos meses a patamares anteriores?
Não tardará até uma nova alta de preços ocorrer e as indústrias voltarem a se duelar pela compra de matéria prima, novamente escassa, motivada pelo desestímulo de preços e altos custos no segundo semestre de 2022, instabilidade de câmbio, política e climáticas.
Mais uma vez esses players preferem a possibilidade de ganhos elevados em curtos momentos a ganhos maiores para toda cadeia num horizonte mais amplo. Mas essa estratégia acaba alijando os produtores menores e menos capitalizados, concentrando a captação “estratégica” no leite SPot e grandes produtores. E esses podem se beneficiar tb de movimentos abruptos por terem maior poder de negociação e preços mais elevados. No fim, essa estratégia tende a ser negativa no longo prazo para as indústrias caso a economia interna e demanda não estejam aquecidas. Estarão cada vez mais espremidas para negociar com grandes produtores e fornecedores de leite spot e simultaneamente pressionados para vender aos grandes grupos atacadistas. Embora comprar leite de grandes produtores reduza o custo de captação com transporte/frete, o preço costuma ser sempre maior, R$ 0,10, 0,20 até R$ 0,30 / L em comparação com produtores de menor volume. Depender de Spot e uns base menor composta mais por médios e grandes produtores expõe a indústria a um risco maior em momentos de queda de oferta. E o que observamos no campo não é uma tendência de oferta crescente e a todo vapor. E movimentos alternados e súbitos de preço, aliada a falta de previsibilidade, reduz investimentos de longo prazo necessários para garantir aumento contínuo da oferta. No medio e longo prazo os preços deflacionados deverão ser sempre maiores que no ano anterior mas sem necessariamente trazer margem para o produtor, pois a inflação medida nos índices não reflete os mesmos aumentos de preços no custo de produção.
Tal política oportunista e “predatória” é ruim para todos elos e no fim das contas os produtos lácteos perdem espaço na dieta do brasileiro no longo prazo! Quando o preço sobe muito reduz o consumo, mas quando cai muito o preço, não há o mesmo estímulo para aquecer e recuperar novamente a demanda perdida.
Está mais que na hora dos players entenderem que é preciso atuar mais coordenadamente e com mais estratégias sustentáveis de longo prazo!
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