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Tripanossomose bovina: causa, prevenção e tratamento

POR THIAGO S. AZEREDO BASTOS

PRODUÇÃO DE LEITE

EM 09/11/2020

9 MIN DE LEITURA

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Atualizado em 29/03/2021

A tripanosomose ou tripanossomose bovina é uma doença que causada pelo protozoário Tripanosoma vivax. Os animais apresentam anemia, perda de peso, queda na produção de leite, abortos, problemas reprodutivos, alterações neurológicas e mortes, gerando grandes prejuízos econômicos. 

 

Prejuízo causado pela tripanossomose 

A tripanossomose bovina é uma doença que atualmente está chamando a atenção dos produtores de leite, pelo fato de causar grande impacto na produção de leite diária (queda de 50% ou mais), redução nos índices de fertilidade do rebanho, rápida disseminação nas propriedades e, ainda, alta taxa de mortalidade em vacas (Abrão et al., 2009).

 

Qual o agente da tripanossomose?

A Tripanossomose é causada por um tipo de parasito conhecido como protozoário. Este protozoário, chamado Trypanosoma vivax (Figura 1), é um ser vivo com características de vida muito diferentes. Isso faz com que sua forma de crescimento, reprodução, resistência, tratamento e prevenção sejam desconhecidas por muitos.

Figura 1. Vinte e cinco exemplares de Trypanosoma vivax em amostra de sangue de bovino (Bastos et al., 2017).

trypanossoma vivax em sangue de bovino

Para exemplificar, Trypanosoma vivax não consegue viver na água, ar ou solo. Ele habita o sangue dos animais parasitados (veja o vídeo abaixo), pois é neste local que encontra todos os nutrientes que precisa e, consequentemente, permite sua rápida multiplicação.

 

Como a tripanossomose surgiu?

Trata-se de uma doença africana, que chegou com a importação de animais infectados. Os primeiros relatos dela no Brasil foram feitos em 1946. Contudo, permaneceu com o registro de poucos casos – em búfalos e bovinos de corte – até final da década de 1990.

Foi no início do novo século que ela reapareceu, de forma incomum, causando doença em bovinos de leite. Desde então, pode-se ver no Quadro 1 que a quantidade de casos foram aumentando (Bastos et al., 2017).

Quadro 1. Distribuição, ano de ocorrência e referência bibliográfica dos primeiros relatos de Trypanosoma vivax nos diferentes estados brasileiros.

ocorrência de tripanossomose bovina no Brasil

 

Como a tripanossomose é transmitida?

Por conta de um comportamento parecido na África, já sabemos que no Brasil as mutucas são insetos que transmitem este parasito, enquanto se alimenta de sangue. Assim, essa mosca pode se contaminar na propriedade vizinhança e trazer a doença para seus animais (Desquesnes, 2004).

Mas, como mencionado anteriormente, o comportamento desta doença mudou nestes últimos anos. Então, foi necessário voltar a estudar e observar este protozoário, para entender como ele faz para chegar em locais onde, por exemplo, não se tem mutuca.

Várias hipóteses foram levantadas por diversos pesquisadores brasileiros. Algumas confirmadas, outras descartadas e ainda temos uma série em investigação. De forma resumida, até hoje sabemos pouco.

Mas, com as poucas comprovações que conseguimos, podemos dizer que a venda de animal assintomático parasitado, juntamente com o uso de uma só agulha em vários animais são os principais motivos para a doença ter se espalhado no Brasil nos últimos anos (Bastos et al., 2017).

 

Fontes de Tripanossoma vivax nos rebanhos

Fonte de infecção ou reservatório é o nome que atribuímos ao local onde os parasitos podem ficar “escondidos”, enquanto aguarda o momento certo para invadir o organismo de um novo animal. Mas esperar não é algo fácil para este protozoário que vive no sangue dos bovinos.

Para ilustrar essa dificuldade, pensando na atual situação da doença em território nacional, faço a seguinte brincadeira e comparação: Trypanosoma fora do sangue é como um peixe fora da água. Assim, fica mais fácil entender o quanto este parasito depende do sangue para se desenvolver e reproduzir.

Portanto, em condições normais, a água, solo e ar não são fontes de infecção, pois o parasito não sobrevive nestes ambientes por muito tempo. Fonte de infecção será o próprio sangue de animal já parasitado1.

 

Que animais podem ter tripanossomose?

Na América do Sul, assim como na África, este protozoário infecta principalmente bovinos. Mas, pode ser também detectado em equinos, ovinos, caprinos, búfalos, lhamas, alpacas e veados2. Nos bovinos brasileiros, tripanossomose já foi identificada afetando rebanhos de corte (Nelore, Angus, Brahman) e de leite (Pardo Suíço, Gir e Girolando)3,4,5.

 

Como ocorre a transmissão da tripanossomose?

A resposta pode ser bem simples: basta fazer o uso compartilhado de uma mesma agulha entre os animais, durante aplicação de vacina ou medicamento, por exemplo (Figura 1). É através desta agulha contaminada com sangue que o protozoário pode sair de um animal parasitado e rapidamente contaminar todo o rebanho1.

Mas, será que isso é comum? Sim! Podemos citar, como exemplo, os manejos de vacinação sem boas práticas e a aplicação diária de ocitocina em vacas lactantes (que é feita pela via endovenosa) (Figura 2). É interessante pensar que a tripanossomose bovina se disseminou no mesmo período em que este último manejo se popularizou nas vacas em lactação2.

Basta uma pequena gota de sangue fresco para contaminar uma agulha, permitir que o protozoário fique vivo durante alguns minutos, e ser inoculado na pele, músculo ou veia de outro animal1.

Figura 2. Seringa, agulha e frasco de medicamento contaminados com sangue de animal infectado (Bastos et al., 2017).

 

Figura 3. Uso compartilhado de agulha durante aplicação de ocitocina (Bastos et al., 2017).

 
 

Então preciso me preocupar só com as agulhas?

Não! Por exemplo, a transmissão também pode acontecer pela inoculação de sangue fresco e contaminado, que fica retido no aparelho bucal de mutucas (mosca grande que alimenta de sangue)2.

Com relação às outras moscas menores, que também alimentam de sangue, ainda não temos certeza para confirmar que elas podem fazer o mesmo que as mutucas. Entretanto, existe a suspeita.

 

Quais os sintomas da tripanossomose nas vacas?

Nas vacas em lactação, poucos dias depois que o protozoário invade seu organismo e alcança o sangue, surgem os primeiros sinais da doença: febre e anemia (Figura 1)1. Estes dois sinais acabam reduzindo a capacidade do animal andar e alimentar bem.

Então, por conta disso, os próximos sinais que geralmente aparecem são desidratação, fraqueza, prostração (Figura 2), perda de peso, aborto e queda na produção de leite, por exemplo2. Como sabemos bem, uma vaca que fica deitada, sem beber água e sem comer bem, tem grande chances de resultar em morte.

Figura 4: Sinais de anemia e febre em bovinos: mucosa ocular e bucal pálida, temperatura acima de 38,5 graus (Bastos et al., 2017).

 

Figura 5. Vaca em decúbito, após manifestar febre alta e deixar de se alimentar (Bastos et al., 2017).

 

"Mas, estes sinais são os mesmos de outras doenças!"

Exatamente! Os sinais clínicos que tripanossomose causa, são os mesmos que várias outras doenças causam.

Por exemplo, ela pode ser confundida com verminoses, tristezinha, raiva, deficiência nutricional e intoxicações por plantas3. Isso faz com que ela seja facilmente confundida e, por isso muitos tratamentos não funcionam.

 

Como saber se uma vaca está com tripanossomose?

Já que apenas com sinais clínicos o diagnóstico não é possível, a melhor forma de confirmar a presença do parasito no rebanho é pelo apoio de um médico veterinário que esteja familiarizado com essa nova parasitose.

Durante a visita técnica, ele precisará observar os animais, alimentação, ambiente e outros fatores que podem ajudar a diferenciar tripanossomose das demais doenças1. A colheita de sague e a escolha do exame certo também é fundamental para a confirmação.

Como existem vários exames e cada um deve ser utilizado em um certo momento da doença (alguns funcionam só nos primeiros dias de febre, por exemplo), o atendimento médico veterinário é fundamental.

 

Foi confirmado tripanossomose em meu rebanho. Fico preocupado ou não?

Logicamente não existe doença que desejamos para os nossos animais. Então, é importante lembrar que quanto mais cedo descobrirmos o problema, mais rápido será possível agir para tratar ele. O que não podemos deixar acontecer é demorar para diagnosticar a doença. Pois, quando mais tempo demorar, mais ela pode se espalhar.

 

Como tratar a tripanossomose?

No mercado brasileiro, hoje, existem dois tipos de produtos com efeito tripanocida: diminazene e cloridrato de isometamidium. Entretanto, cada um oferece uma contribuição diferente no combate à doença.

Por exemplo, um dos medicamentos possui efeito curativo ou preventivo, dependo da dose aplicada. Já o outro, oferece apenas efeito curativo1. Mas, como este último possui menores efeitos colaterais, ele acaba sendo altamente indicado em animais mais debilitados.

Além disso, existem outros fatores de igual importância que devem ser levados em consideração durante a escolha do tratamento, como por exemplo:

  • Será feito com uma dose ou mais?
  • Devo tratar o animal doente ou o rebanho inteiro?
  • Mantenho animal tratado no rebanho ou devo descartar?

Então, os desafios são muitos e as opções de tratamento também. Por isso, é importante que um médico veterinário habituado a trabalhar com esta doença possa ajudar a tomar a decisão mais adequada.

Afinal, cada propriedade rural tem suas próprias características ambientas e de manejo, então não é possível ter um protocolo de tratamento único para todos. Aquilo que funciona para seu vizinho, geralmente não funciona para sua propriedade. Por isso reforçamos sempre: cada caso é um caso!

Figura 6. Tratamento de um bovino durante experimento realizado na Universidade Federal de Goiás (Bastos et al., 2017).

 

Basta fazer o tratamento que esta doença vai sumir?

Tratamento correto é fundamental para manter o animal vivo e reduzir a disseminação da doença. Por outro lado, um tratamento mal elaborado pode resultar no desenvolvimento de resistência do parasita e, consequentemente, perda da eficácia do medicamento tripanocida. Como só temos dois produtos disponíveis no mercado hoje, se não utilizarmos eles corretamente, logo deixarão de ser uteis2.

Por isso, estamos trabalhando muito para conscientizar todos os produtores sobre a importância dessa medida. Fico feliz em dizer que muitos já se informaram e estão colaborado no controle da tripanossomose. Entretanto, alguns ainda não foram adequadamente preparados para ajudar com este desafio e, consequentemente, tem adotado medidas que interferem negativamente no controle.

Como exemplo, eu cito outra prática que precisa ser combatida: a venda de animais infectados (Figura 2)1. Algumas propriedades, onde animais sobrevivem à doença e não são adequadamente tratados, estão comercializando animais com o parasita. Esta é a principal causa da disseminação do Trypanosoma nos diferentes estados brasileiros3.

Figura 7. Painel representando a venda de todos os animais de uma propriedade como medida adotada para controle da doença (Bastos et al., 2017).

 

Estamos preparados para ajudar!

Felizmente, desde que a doença vem se disseminando, médicos veterinários em todo o país estão constantemente divulgando e capacitando-se para trabalhar no controle da tripanossomose bovina. Assim, o produtor não fica desamparado e a doença não se torne algo comum na rotina do bovinocultor.

 

Referências

Abrão DC, de Carvalho AÚ, Facury Filho EJ, Bartholomeu DC, Ribeiro MFB. ASPECTOS CLÍNICOS E PATOLÓGICOS DA INFECÇÃO NATURAL EM BOVINOS LEITEIROS POR Trypanosoma vivax EM MINAS GERAIS, BRASIL. Ciência Animal Brasileira. 2009;1:666-71.

Bastos TSA, Faria AM, Madrid DMdC, Bessa LCd, Linhares GFC, Fidelis Junior OL, et al. First outbreak and subsequent cases of Trypanosoma vivax in the state of Goiás, Brazil. Revista Brasileira de Parasitologia Veterinária. 2017;26(3):366-71.

Desquesnes M. Livestock trypanosomoses and their vectors in Latin America: OIE (World Organisation for Animal Health); 2004.

Linhares GFC, de Carvalho Dias Filho F, Fernandes PR, Duarte SC. Tripanossomíase em bovinos no município de Formoso do Araguaia, Tocantins (relato de caso). Ciência Animal Brasileira. 2006;7(4):455-60. 

Silva ASd, Costa MM, Polenz MF, Polenz CH, Teixeira MMG, Lopes STDA, et al. Primeiro registro de Trypanosoma vivax em bovinos no Estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Ciênc rural. 2009;39(8):2550-4. 

Davila AMR, Ramirez L, Silva R. Trypanosoma vivax en Amérique: morphométrie et spectre d'hôtes. Revue d’élevage et de médecine vétérinaire des pays tropicaux. 1998;51(1):29-35.

Hurtado OJB, Castro PDJ, Giraldo-Rios C. Reproductive failures associated with Trypanosoma (Duttonellavivax. Veterinary parasitology. 2016;229:54-9.

Osório ALAR, Madruga CR, Desquesnes M, Soares CO, Ribeiro LRR, Costa SCGd. Trypanosoma (Duttonellavivax: its biology, epidemiology, pathogenesis, and introduction in the New World-a review. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz. 2008;103(1):1-13.

THIAGO S. AZEREDO BASTOS

Médico Veterinário pela UFG. Possui doutorado com ênfase em diagnóstico e prevenção de doenças infecciosas e parasitárias, principalmente tripanossomose bovina. Professor e Coordenador do curso Med. Veterinária na Faculdade Anhanguera de Anápolis.

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LUCIANO DE PAULA TRIGO

GUAÇUÍ - ESPÍRITO SANTO - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 16/11/2020

Gostaria de saber quais os sintomas da doença tripanossomíase em bovinos ! Pois o tema não foi abordado na matéria! Obrigado
THIAGO S. AZEREDO BASTOS

GOIÂNIA - GOIÁS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 16/11/2020

Bom dia Luciano,
pela grande quantidade de informações, dividimos este conteúdo em 4 partes.
Esta primeira foi uma apresentação inicial. A reposta para sua pergunta sai na próxima semana.
Na terceira abordaremos sobre diagnóstico e na ultima será sobre tratamento.
Espero que possamos atender suas expectativas com esta série de informações sobre a doença.

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