A inclusão de critérios verdes na estratégia das empresas tem se transformado em peça fundamental para continuar a fazer negócios. Por isso, dizem representantes do setor industrial, as empresas vêm adotando medidas sustentáveis para aprimorar processos, reduzir o impacto ambiental e atrair consumidores conscientes.
A Danone, que tem a meta de descarbonização de toda sua cadeia de valor até 2050, vem avançando nesse programa com a implementação da agricultura regenerativa em mais de 1,4 mil hectares de terras em fazendas parceiras e, assim, ter uma produção de leite mais sustentável. Também pretende alcançar 100% de embalagens recicláveis, reutilizáveis e compostáveis até 2030.
“Nossas iniciativas incluem reduzir pela metade o uso de embalagens virgens de origem fóssil até 2040, acelerando a reutilização de materiais reciclados, além de liderar o desenvolvimento de sistemas de coleta eficazes para recuperar ao máximo os plásticos”, diz Michael Behrndt, diretor de sustentabilidade e transformação de negócios da Danone Brasil.
Segundo ele, a empresa investiu, desde 2019, mais de R$ 2,3 milhões em ações de capacitação de agricultura regenerativa com foco no produtor de leite e, em 2022, cerca de R$ 1,2 milhão em recuperação de embalagens. Entre outras medidas tomadas pela Danone estão ainda o uso de energia elétrica renovável – parte gerada por 1,5 mil painéis solares –, a compensação de emissões diretas de carbono remanescentes por meio de apoio a projetos de conservação e instalação de um sistema para coletar, tratar e armazenar 4 milhões de litros de água da chuva. A empresa vem também minimizando a geração de resíduos, além de separá-los em fluxos definidos para maximizar a reciclagem e não mandá-los para aterros.
Já a Ambev desenhou em 2018 uma agenda de governança ambiental, social e corporativa (ESG) ambiciosa para 2025, afirma Caio Miranda, diretor de sustentabilidade. As maiores iniciativas estão ligadas à ação climática, gestão hídrica, agricultura sustentável, circularidade de embalagens e empreendedorismo. “Cada uma dessas frentes representa o que costumamos reforçar: a sustentabilidade não faz parte do negócio, ela é o nosso negócio”, destaca.
Na questão climática, a empresa estabeleceu a meta de ter 100% de eletricidade de fontes renováveis e decidiu reduzir em 25% as emissões na cadeia até 2025. “Hoje, temos 11 operações carbono neutro, sendo oito no Brasil. Também firmamos o compromisso de atingir zero emissões líquidas de carbono em nossa cadeia de valor até 2040”, relata.
Na logística, a Ambev conta com mais de 250 caminhões 100% elétricos para distribuição urbana, evitando a emissão de 2,8 mil toneladas de CO2. Nas ações de circularidade de embalagens, Miranda diz que a empresa conseguiu alcançar 50,15% de material reciclado e 43% de material retornável em 2022. “Desde 2003, reduzimos 63% das nossas emissões dos escopos 1 e 2. Só nos últimos quatro anos, conseguimos reduzir 49% do volume em toneladas de CO2 liberado em nossas operações.” Segundo ele, a partir de 2003, a empresa iniciou a reestruturação de sua matriz energética, com a substituição de combustíveis fósseis nas caldeiras de vapor por óleo vegetal, biomassa e biogás.
A Ajinomoto também tem a meta de reduzir seus impactos ambientais em 50% até 2030. Isso inclui redução de emissões de gases do efeito estufa (GEE), além da redução de resíduos plásticos, de perdas e desperdícios de alimentos. Janaína Padoveze, gerente de sustentabilidade, explica que entre as principais ações está a substituição de caldeiras a gás natural por outras de biomassa. A empresa deixou de emitir mais de 130 mil toneladas de CO2 na atmosfera devido ao uso de vapor proveniente da biomassa.
“Atualmente, estamos concentrando esforços na redução do consumo de energia e vapor em nossos processos internos, enquanto avaliamos a necessidade de novas reduções por meio de investimentos em caldeiras de biomassa. Com relação à energia, a meta é alcançar 100% do uso de energia proveniente de fontes renováveis, o que está próximo de se concretizar”, diz Padovezi.
Outro objetivo é fazer com que 100% do plástico utilizado para a fabricação de produtos seja reciclável. Para este ano, a Ajinomoto estima reduzir mais de 425 toneladas desse material. Segundo ela, a companhia iniciou estudos para substituir embalagens consideradas não recicláveis. Outra iniciativa é o trabalho com catadores para reciclar 20 toneladas de embalagens flexíveis pós-consumo ao longo de três meses, o equivalente a 2,4 milhões de embalagens.
A Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia) informa que, embora as empresas do setor não tenham sua emissão mensurada oficialmente de forma isolada, porque historicamente não figuram entre os principais emissores de GEE, um estudo recente aponta que as atividades de processos industriais e uso de produtos (PIUP) são responsáveis por apenas 4% do total das emissões. O estudo do Observatório Brasileiro do Clima, realizado em 2021, mostra que o Brasil emitiu 2,4 bilhões de toneladas brutas de GEE.
“A Abia, por meio de seu comitê de sustentabilidade, trabalha para identificar e disseminar melhores ações e projetos relativos à agenda ESG desenvolvidos pela indústria brasileira de alimentos”, afirma João Dornellas, presidente-executivo da entidade. “Além disso, busca preparar o setor para a estruturação do futuro marco legal de crédito de carbono regulado no país, visando ainda o cumprimento da futura legislação e o financiamento de projetos de redução de emissões”, diz.
Startups como a Food To Save e Connecting Food, e até mesmo supermercados como o St. Marche, criaram soluções inovadoras para unirem a indústria e o comércio com o consumidor com o objetivo de reduzir toneladas de alimentos que são jogadas fora todos os dias. “Dados da FAO [Food and Agriculture Organization, na sigla em inglês] apontam que 41 mil toneladas por dia são jogadas fora no Brasil”, afirma Lucas Infante, CEO da Food To Save, que em menos de dois anos de atuação evitou que mais de 1,4 mil toneladas de alimentos parassem nas latas de lixo.
A plataforma da Food To Save conecta hoje quase 4 mil estabelecimentos comerciais parceiros (supermercados, restaurantes, cafeterias, confeitarias e hortifrutigranjeiros, entre outros) com o consumidor final. O objetivo é vender ou revender produtos que estejam com prazos próximos de seu vencimento (para os industrializados) e aquele considerados imperfeitos (machucados em frutas, verduras, hortaliças, tubérculos) com descontos que variam de 50% a 70%.
Infante diz que, no meio alimentício, o desperdício de mercadorias varia de 3% a 7%, gerando volumes significativos de desperdício. E é aqui onde entra a Food To Save. Segundo ele, os negócios efetivados por ela permitem recuperar 80% do prejuízo. Ou seja, se o prejuízo de um negócio a grosso modo é calculado em R$ 10 mil por mês, o montante da perda cai para apenas R$ 2 mil, recuperando os R$ 8 mil restantes. “Com isso, conseguimos gerar uma receita incremental de R$ 18 milhões para os estabelecimentos parceiros.”
A Connecting Food também foi criada para não deixar que alimentos percam valor comercial e acabem na lata de lixo. “Alimentação adequada é um direito que deve ser assegurado a todos, e desperdiçar comida nunca deve ser uma opção”, diz Alcione Pereira, CEO da foodtech. Desde a sua fundação em 2016, a Connecting Food redistribuiu mais de 9 mil toneladas de alimentos que seriam desperdiçados, volume que gerou um complemento de cerca de 17 milhões de refeições para quem precisa. Entre seus clientes estão o Grupo Pão de Açúcar, Assaí Atacadista, Nestlé, Camil e iFood. “Atualmente, 440 organizações da sociedade civil, presentes em 144 cidades de 23 Estados, são beneficiadas. Mas precisamos avançar mais”, diz.
O St. Marche trabalha em parceria com a Infineat e a ONG Banco de Alimentos, responsáveis por recolher os alimentos das lojas dessa rede de supermercado e por mapear a instituição que será beneficiada. Em 2022, quase 155 toneladas de alimentos foram doadas e complementaram mais de 247 mil refeições. Das 29 lojas do St. Marche em São Paulo, 19 utilizam a plataforma da Infineat. Já a Banco de Alimentos é responsável pela coleta de doações realizadas por clientes do St. Marche e disponíveis nas lojas do supermercado. Em 2022, mais de 30 toneladas de alimentos não perecíveis foram arrecadadas. Até junho, foram quase 15 toneladas.
As informações são do Valor Econômico, adaptadas pela equipe MilkPoint.