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Riscos e benefícios da transfusão sanguínea em bovinos

POR VIVIANI GOMES

E KAREN NASCIMENTO

VIVIANI GOMES

EM 06/05/2021

8 MIN DE LEITURA

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A transfusão de sangue, ao contrário do que vemos em humanos, ainda é pouco realizada na Medicina Veterinária, principalmente em pequenas propriedades e fazendas.

Grande parte dos produtores e colaboradores ainda tem receio em realizar a transfusão sanguínea, que muitas vezes pode ser crucial na sobrevida do animal. A transfusão de sangue em bovinos é parte integrante na terapia de bovinos que manifestam anemia intensa, devido à Tristeza Parasitária Bovina.

O protocolo é ainda mais importante em bezerras, com idade entre 100 a 170 dias de vida, pois esse é um período crítico e de adaptação pós-desaleitamento. Ao contrário do que todos pensam, a transfusão não é nenhum “bicho de sete cabeças”, e muitas vezes o que realmente falta é treinamento para habilitar a equipe na execução do protocolo, com o menor risco possível de reações adversas indesejáveis.

A transfusão de sangue é indicada para bovinos que apresentam anemia intensa com hematócrito abaixo de 15%, geralmente decorrentes de coagulopatias (distúrbios no sistema de coagulação sanguínea), hemorragias e doenças hemolíticas, as quais resultam nas anemias. A anemia é caracterizada pela diminuição no número de glóbulos vermelhos (ou hemácias/eritrócitos).

A principal causa de anemia hemolítica em bezerras é a Tristeza Parasitária Bovina, devido a infecção isolada ou mista por Babesia bigemina, Babesia bovis e Anaplasma marginale, transmitidas por carrapatos e insetos hematófagos.

Os glóbulos vermelhos são as células sanguíneas responsáveis pelo transporte de oxigênio dos pulmões aos tecidos, elemento essencial nos processos metabólicos no qual os nutrientes são usados para a geração de energia.

O animal anêmico apresenta uma diminuição proporcional do número de glóbulos vermelhos circulantes e oxigenação tecidual. Um dos mecanismos compensatórios do organismo é aumentar a frequência respiratória (movimento respiratórios por minutos) na tentativa de aumentar a captação de oxigênio. Muitas vezes esta fase é confundida com doença respiratória.

As bezerras tornam-se letárgicas (lentas) com baixa atividade em relação a ingestão de água e consumo, o que pode gerar também um quadro de desidratação. Por este motivo é muito importante incluir o soro oral na terapia da Tristeza Parasitária Bovina.

O monitoramento das bezerras deve ser feito pela mensuração da temperatura retal e exame das mucosas, pois as bezerras doentes apresentam rósea-clara até esbranquiçada. Alguns animais acometidos pela Babesia spp. podem apresentar mucosas amareladas e urina com coloração avermelhada à acastanhada.

Fig 1 - Bezerra apresentando mucosas esbranquiçadas, devido a anemia decorrente da Tristeza Parasitária Bovina (Fonte: Gomes, 2021)

A intensidade da anemia nestes animais precisa ser medida pelo hematócrito (Ht %). O hematócrito é representado pela porcentagem de glóbulos vermelhos em relação ao volume sanguíneo de 100%). Em geral, o valor normal do hematócrito em bovinos é de 24 a 46%.

A transfusão é indicada para bezerras com valores menores que 15%. O hematócrito nas fazendas pode ser determinado com o uso de uma microcentrífuga ou por meio de analisadores de hemoglobina portátil (o qual também estima o valor do hematócrito). A hemoglobina é um outro biomarcador importante para a detecção da anemia, sendo o intervalo de normalidade para bovinos entre 8 a 15 g/dL.

O perfil hematológico das bezerras é um pouco diferente do bovino adulto. Em uma pesquisa desenvolvida pela nossa equipe observamos que na fase da Tristeza Parasitária Bovina (entre 60 dias até 160 dias de vida), as bezerras saudáveis apresentam valores de hematócrito de aproximadamente 28% e valores de hemoglobina ao redor de 10g/dL (Baccili et al. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária, 2018). Os analisadores automáticos podem ser mais utilizados se além do hematócrito, os valores de hemoglobina também fossem interpretados.Na detecção de hematócrito abaixo de 15% deve-se realizar a transfusão de sangue.

Os kits com o material necessário para a transfusão sanguínea podem ser encontrados em diferentes fornecedores, sendo os mesmos utilizados para humanos. Os kits geralmente contêm a bolsa (com capacidade para 500mL) e um equipo específico para transfusão sanguínea (+ agulha própria), com custo variável entre R$ 25,00 a R$ 45,00. A bolsa de transfusão deve conter o anticoagulante CDPA-1 (citrato fosfato dextrose adenina) ou CAD (citrato ácido dextrose).

Os bovinos possuem pelo menos 13 diferentes tipos sanguíneos, e possuem menor riscos de reações alérgicas por incompatibilidade de sangue entre doador e receptor (animal doente) na 1ª transfusão de sangue, quando comparado com outras espécies. O risco de reações alérgicas aumenta a partir de repetidas transfusões a partir de 7 dias da 1ª administração de sangue. O risco aumenta com o uso do mesmo doador em transfusões repetidas. Em bovinos, estima-se que pelo menos 15% dos animais transfundidos apresentem algum tipo de reação transfusional.

O 1º passo para a transfusão de sangue é a escolha do doador. O ideal é que o doador seja a mãe da bezerra, pela similaridade genética e menor risco de reação de incompatibilidade sanguínea. Caso não seja possível, optar pela seleção de uma fêmea adulta saudável e de preferência um que tenha bom temperamento, o que irá ajudar no momento da coleta. Dar preferência por fêmea não gestantes ou infestada por carrapatos.

O ideal é que a doadora seja livre de doenças infecciosas, como por exemplo Vírus da Leucose Enzoótica Bovina, Vírus da Diarreia Viral Bovina, Brucelose, Tuberculose, Paratuberculose, Anaplasmose e Babesiose. A doadora bovina não gestante pode doar entre 10 a 15mL de sangue/ Kg de peso vivo. Exemplo: doadora com 500 kg pode doar pelo menos 5000mL de sangue, o que equivale a 5 litros.

O procedimento da coleta do sangue é bem simples e facilitado com o trabalho em duplas. A doadora de sangue deve ser levada para o tronco de contenção na área de manejo. Sempre o deixar o animal em estação (de pé). O sangue deverá ser coletado da veia jugular.

Capriche no processo de limpeza e desinfecção, antes da coleta para evitar a contaminação do sangue coletado. A limpeza local da pele pode ser feita com detergente neutro, e a antissepsia com álcool 70%. Lembre-se sempre de movimentar levemente a bolsa de sangue durante o período de coleta com o objetivo de garantir a mistura adequada do anticoagulante e do sangue.

O volume de sangue recomendado é entre 10 a 20 mL/kg de peso vivo, ou seja, o volume a ser transfundido em uma bezerra com 100 kg varia entre 1000 a 2000 mL de sangue.

A velocidade de transfusão deve ser lenta nos primeiros 10 minutos, pois no início do processo as bezerras podem desenvolver reação alérgica imediata. Nesta fase inicial recomenda-se administrar o volume de 1mL para cada 10 kg de peso vivo.

No nosso exemplo, uma bezerra de 100 kg deve receber apenas 10mL de sangue nos primeiros 10 minutos da transfusão. Na prática deve-se ajustar o equipo para a administração de 20 gotas de sangue por minuto. Depois destes 10 minutos iniciais, se a bezerra não apresentar nenhum tipo de reação alérgica, o equipo deve ser reajustado para a velocidade de 100 a 200gotas/minutos.

Cada bolsa de sangue de 500mL deve ser transfundida em 40 a 60 minutos, caso a velocidade de aplicação seja superior ao recomendado existe maior risco de reações alérgicas imediatas, o que pode levar o animal a morte no momento da transfusão sanguínea. Muitas vezes este evento fatídico ocorre nas fazendas, e os colaboradores não sabem qual a razão para tal fatalidade.

O ideal é monitorar a bezerra durante todo o processo de transfusão sanguínea. A intensidade das reações transfusionais é dose-dependentes, por isso devemos administrar o volume em uma velocidade lenta nos primeiros 10 minutos de administração do sangue. As reações alérgicas imediatas ocorrem durante o ato transfusional até as primeiras 24 horas. Quando suspeitar de reação adversa, a transfusão deve ser interrompida imediatamente.

A reação adversa imediata inicia-se com possíveis soluços, seguida de dificuldade respiratória, tremores, salivação, tosse, lacrimejamento e febre. Pode ocorrer também reações hemolíticas pós-transfusionais, manifestada por mucosas amarelas e urina com coloração avermelhada ou acastanhada. A detecção precoce da reação anafilática evita maiores complicações, como a morte do animal.

Na suspeita de reação adversa deve-se suspender imediatamente o processo de transfusão sanguínea. Iniciar fluidoterapia com a dose de 20mL/Kg de peso vivo por via intravenosa. Aplicar cloridrato de adrenalina (Sorolina, UBC Vet) na dose de 0,01 mL/Kg de peso vivo, o que equivale a 1 mL para cada 100 Kg de peso vivo. A bezerra deve ficar em observação por 48 horas. O médico veterinário é o responsável pela realização do tratamento das bezerras com reações adversas pós-transfusionais.

Existem algumas recomendações sobre o uso de anti-inflamatórios pré-transfusional para a prevenção das reações adversas indesejáveis, porém os corticóides são imunossupressores. A imunossupressão é caracterizada com alteração na distribuição das células no organismo e menor resposta proliferativa e funcional dos linfócitos.

Fig 2 - Bolsa com o anticoagulante CDPA-1 (citrato fosfato dextrose adenina), recomendada para a coleta de sangue total. Bolsa após a coleta de sangue. Processo de transfusão em bezerra, com Tristeza Parasitária Bovina. O processo de administração do sangue pode ser feito com a bezerra em estação ou decúbito (Fonte: Elizeuda Nascimento Severino, 2020)

Em geral não recomendamos o armazenamento de sangue nas fazendas, pois exige o armazenamento do sangue a 4oC e um rigoroso controle diário de temperatura. Porém existem indicações para o armazenamento do sangue em geladeira por até 35 dias, quando o sangue é coletado em bolsas com CPDA. Já as bolsas com o CAD podem ser armazenadas por até 25 dias.

Antes da transfusão sanguínea, a bolsa de sangue armazenada em geladeira deve ser aquecida em banho maria com temperatura entre 22º a 37ºC. A temperatura não pode exceder o valor indicado, pois pode ocorrer desnaturação dos componentes presentes no sangue e aumentar o risco de reação transfusional.

Se a fazenda optou pelo banco de sangue, deve-se sempre verificar a cor do sangue armazenado nas bolsas. O ideal é que o sangue esteja vermelho vivo. Sangue com coloração amarronzada, preto ou muito escuro devem ser descartados, pois provavelmente ocorreu contaminação no momento da coleta devido à má higienização do local.

A transfusão sanguínea é essencial na terapia de bovinos com anemia intensa (hematócrito abaixo de 15%), porém existem cuidados essenciais que não podem ser negligenciados durante a realização deste procedimento à campo, por colocar a vida do animal em risco.

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VIVIANI GOMES

Professora Clínica Médica de Ruminantes da FMVZ-USP. Coordenadora GeCria - Grupo Especializado em Medicina da Produção aplicada ao período de transição e criação de bezerras. Tel: (11) 3091-1331

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JEAN CLÁUDIO DA COSTA

MOEMA - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 26/05/2021

Descrição muito clara de todos procedimentos, as informações estão ai, continua leigo quem quer, parabéns Viviani e Karen.
MILTON CESTARI

TOLEDO - PARANÁ - INDÚSTRIA DE INSUMOS PARA A PRODUÇÃO

EM 10/05/2021

Este é o típico trabalho que o produtor precisa de atendimento especializado de um Veterinário e não deve arriscar supondo amplo conhecimento por ter lido um artigo a respeito.

Milton Cestari
FELIPE TEIXEIRA DE SOUZA

GOIÂNIA - GOIÁS - ESTUDANTE

EM 10/05/2021

Ótimo conteúdo!
RODRIGO BERMA DE OLIVEIRA

BETIM - MINAS GERAIS - ESTUDANTE

EM 10/05/2021

Excelente artigo, muito rico em informações de plena importância!!!
Parabéns Karen e Viviani??????
JOÃO LEONARDO PIRES CARVALHO FARIA

MONTES CLAROS - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 06/05/2021

Excelente artigo!

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