O colostro pode ser definido como uma solução formada a partir de secreções lácteas e constituintes do soro sanguíneo (imunoglobulinas e proteínas séricas) que se forma pouco antes do parto, sendo secretado através da glândula mamária.
Essa substância é de extrema importância para bezerros, uma vez que por conta da placenta do tipo sindesmocorial presente nos ruminantes não há passagem de anticorpos para o feto durante a gestação, ou seja, esses animais nascem agamaglobulêmicos e necessitam receber de forma passiva os anticorpos necessários para se defender dos desafios que surgirão.
Contudo, nem sempre há êxito na transferência passiva desses anticorpos em fazendas. Em países mais desenvolvidos em pecuária leiteira como os Estados Unidos, um estudo realizado pelo Departamento de Agricultura mostrou que cerca de 13% das propriedades leiteiras realizam avaliação da qualidade do colostro materno, o que é uma taxa muito baixa de monitoramento.]
Isso somado a fatores como não alimentar o neonato com colostro dentro de 2 horas após o nascimento, ofertar colostro com menos de 150g de IgG (menos de 18% quando mensurado no refratômetro brix) ou ainda ofertar quantidades menores que 10-12% do peso vivo do animal em litros de colostro, promovem a falha da transferência passiva nos bezerros recém nascidos, o que pode acarretar em mortalidade no período pós-desmame, diminuição da taxa de ganho de peso, aumento da idade no primeiro parto, impacto negativo da produção de leite na primeira e segunda lactação, aumento de descarte durante a primeira lactação dessa vaca.
Por conta disso o produtor deve ter uma boa equipe para procurarem formas de otimizar o processo de colostragem nos animais recém nascidos, melhorar o manejo dos animais que estão em condição de pré-parto e monitorar a transferência de imunidade passiva, além de mensurar a qualidade do colostro materno.
Uma má colostragem pode aumentar as chances de diarreias neonatais, doenças respiratórias, aumentar a morbidade e mortalidade do rebanho, visto que a criação de bezerros é o ponto chave para tornar as fazendas mais produtivas e saudáveis.
Para isso, separamos alguns pontos principais em que o produtor deve ter maior atenção para melhorar seu rebanho.
Nutrição e manejo pré-parto da vaca
Os cuidados com a gestante são essenciais para um bom pós-parto, ao pensar na saúde da mãe também pensamos na saúde de sua cria. Portanto, transferir as vacas para um piquete maternidade cerca de trinta dias antes do parto, fornecer um tratamento especial, garantindo boa ambiência, alimentação e tranquilidade, são pontos chaves para um parto tranquilo, sem grandes complicações.
Quando se fala em alimentação, o fornecimento de concentrado nos dois meses que antecedem o parto não interfere na produção e concentração de imunoglobulinas (IgG), e nem mesmo na composição do colostro. Entretanto, o fornecimento de suplementação com concentrado, aumenta a quantidade de colostro produzida. A suplementação das mães também não afetou a concentração de IgG sérica das bezerras, mas interferiu na taxa de broncopneumonia, sendo esta maior em bezerros nascidos de vacas que não receberam suplementação.
Quando o assunto é a alimentação de bezerros holandeses, aqueles que receberam 10% de seu peso vivo de colostro, apresentaram maior concentração de IgG quando comparados com animais que receberam apenas 5%. A incidência de diarreia em animais que receberam maior quantidade de colostro também foi menor, porém, ainda são necessárias mais pesquisas sobre quantidade e qualidade da alimentação de vacas no período pré-parto .
Vacinação
A vacinação dos animais no pré-parto pode não aumentar a quantidade de total de IgG, contudo, autores sugeriram que a vacinação sendo utilizada de oito a três semanas antes do parto em vacas e novilhas, aumentou a quantidade de anticorpos que combatem patógenos como Pasteurella haemolytica, Salmonella typhimurium, Escherichia coli, rotavírus e coronavírus.
Uso de colostro em pó
O colostro materno é o principal responsável no fornecimento de imunidade passiva, mas pode também ser o agente causador de exposição dos animais a microrganismos patogênicos. O colostro em pó sabidamente não tem patógenos e além disso, se torna uma boa opção quando a vaca não produz colostro em quantidade suficiente ou qualidade adequada.
Geralmente o colostro em pó é produzido através de um processo chamado “spray dried”, onde o colostro é desidratado, sem perder suas características importantes, removendo totalmente a água deste leite.
Ao optar por utilizar um colostro em pó, é recomendável observar a composição do produto, pois além das imunoglobulinas, também são essenciais para o desenvolvimento do animal a proteína, energia, vitaminas e minerais.
Como avaliar a qualidade do colostro e transferência de imunidade passiva em bezerros?
Avaliando o colostro
Para o sucesso em um programa de colostragem é necessário métodos de avaliação da qualidade do colostro ofertado aos animais bem como atestar a transferência de imunidade passiva em bezerros recém nascidos.
O colostro pode ser avaliado por diferentes métodos, cada um possui sua vantagem e desvantagem. Os mais utilizados na rotina em fazendas são o colostrômetro que avalia a concentração de imunoglobulinas no leite, esse método pode ser afetado por temperatura, e requer maior treinamento de equipe e o uso do refratômetro de Brix, em que se avalia de forma indireta a concentração de IgG do colostro materno, este de mais fácil manuseio na fazenda, e com as opções de refratômetro digital e óptico.
Já em relação a mensurar se a transferência de imunidade passiva foi bem sucedida, podemos avaliar a concentração de proteína no soro do sangue dos bezerros no período do pós-parto.
O uso do refratômetro de brix se apresenta como uma ferramenta de fácil manuseio, contudo alguns cuidados devem ser tomados, como coletar o sangue da veia jugular e a coleta sendo realizada de 24 a 48 horas após a ingestão do colostro. O sangue deve ter armazenado em tubos específicos para coleta de sangue, para essa avaliação é conveniente que se use tubos sem anticoagulante, podendo ser o com gel separador (tubo da tampa amarela) ou sem gel separador (tubo da tampa vermelha). Os tubos com a tampa amarela requerem menos tempo para separação de soro do sangue e facilitam a coleta, em média levam de 5-30 minutos para conclusão do processo. Para acelerar o processo de separar o soro do sangue, caso a fazenda tenha, pode ser fazer o uso de centrífugas.
Conclusão
A colostragem é uma etapa essencial para a produção das fazendas que realizam a cria de bezerras em sua propriedade e por conta disso deve-se reforçar o monitoramento da oferta de colostro observando se haverá falha na transferência de imunidade passiva.
Se o processo apresentar falhas, os animais devem receber mais atenção, pois estarão mais suscetíveis à doenças comuns à essa fase como diarreias neonatais e doenças respiratórias. Salienta-se também a importância de reconhecer a colostragem como etapa fundamental da criação de animais, que pode ser a chave em muitas propriedades para redução do uso de medicamentos e perdas por doenças, bem como se reflete em animais mais produtivos no futuro.
Autores
Anna Carla Silva Cunha - Graduanda em Medicina Veterinária, Membro LiBovis-UFRRJ
Júlia Roberta Carioca Bezerra - Graduanda em Medicina Veterinária, Universidade Federal de São João Del-Rei, Membro LiBovis-UFRRJ
Ana Paula Lopes Marques - Orientadora - LiBovis-UFRRJ
Referências
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DUNN, A. et al. Effect of concentrate supplementation during the dry period on colostrum quality and effect of colostrum feeding regimen on passive transfer of immunity, calf health, and performance. Journal of Dairy Science, v. 100, n. 1, p. 357–370, jan. 2017.
GODDEN, S. M.; LOMBARD, J. E.; WOOLUMS, A. R. Colostrum Management for Dairy Calves. Veterinary Clinics of North America: Food Animal Practice, v. 35, n. 3, p. 535–556, nov. 2019.
NASCIMENTO, K.S. Avaliação da eficácia do uso da técnica de liofilização no processo de conservação do leite. 68 p. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal Amazonas. 2014.