O café da manhã do brasileiro tem sido alvo de uma intensa disputa pelas preferências dos consumidores. A nova classe média por exemplo é responsável por grande aumento no consumo de um derivado do leite, o iogurte. Outras categorias que ganham importância são os sucos prontos (com uma gôndola cada vez mais diversificada e “saudável) e as bebidas à base de soja. A disputa por espaço traz apelos dos mais diversos, desde o sabor a questões ligadas à saúde ou sustentabilidade. Com certeza, escândalos que colocam em risco à imagem de segurança alimentar que o leite possui podem abrir espaço para que bebidas concorrentes roubem a cena.
O tema da segurança alimentar ganha importância cada vez maior com a globalização. O intercâmbio entre países - não importando a distância - cresce e com ele a preocupação sobre a origem e sanidade dos alimentos. Temas como rastreabilidade e certificações já estão presentes não apenas em congressos de especialistas e em ONGs, mas dentro das grandes corporações mundiais. Tenha certeza que elas irão adotar e implementar sistemas de controle cada vez mais completos, buscando rastrear a origem do alimento e a forma como foi produzido. É um caminho sem volta. Estas grandes empresas sabem que um arranhão na imagem de seus produtos pode virar uma bola de neve e acabar com a credibilidade de toda a organização.
É importante salientar que o consumidor possui conceitos sobre segurança alimentar muito diferentes de acordo com seu nível de conhecimento. Muitas vezes estes conceitos se confundem. Existe por exemplo a errônea associação de que o simples fato de um produto ser orgânico, ele automaticamente é mais seguro. O caso da contaminação dos brotos de feijão orgânicos é um triste exemplo sobre como conceitos diferentes podem levar à percepções confusas (2). Veja bem, seguro é diferente de saudável, ou “livre de agrotóxicos”. A adição de qualquer produto estranho em algo que é de sua inteira confiança gera a percepção de risco e de enganação. Com certeza, álcool etílico no leite, buscando mascarar uma fraude com água, não pode causar boa impressão nas mães que buscam no leite uma fonte de alimento saudável para seus filhos.
As decisões de compra são afetadas significativamente com a perda da confiança. Talvez as fraudes impactem diretamente apenas no consumo de leite in natura ou em caixinha, não em seus derivados. Mas o dano na imagem do produto, este tende a perdurar por um bom tempo.
Em grandes empresas, com departamentos de marketing bem estruturados, as relações públicas estão preparadas para conter de forma sistemática os danos à imagem da organização. A equipe de relações públicas rapidamente emite notas de esclarecimento e fornece informações à imprensa de forma a não deixar que o estrago se torne incontrolável. A demora na resposta pode significar que uma informação ou boato se torne verdade em pouco tempo e cause enormes prejuízos financeiros.
Agora, como uma cadeia que envolve milhares de produtores e empresas pode se articular de forma coesa para rebater com rapidez estas crises? Este é o desafio, integrar a comunicação de todos os representantes da cadeia, afinal, todos tem a perder com os escândalos. Para a mídia como um todo, chama mais a atenção do público o desastre, a crise, não a resposta oficial que às vezes é mencionada no final de uma reportagem em forma de nota.
Esta crise demanda uma resposta à sua altura. A disputa por espaços na cesta de compras da população ficará mais intensa, e os que perderem espaço, terão que investir muito para recuperar sua credibilidade. Os consumidores não podem ficar com a única versão da fraude de alguns poucos desonestos que prejudicam o trabalho de milhares de produtores no Brasil. O leite brasileiro e seus consumidores merecem respeito.
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1 – Ver a reportagem “Ministério Público do RS convoca duas cooperativas por álcool no leite” (https://www.milkpoint.com.br/cadeia-do-leite/giro-lacteo/ministerio-publico-do-rs-convoca-duas-cooperativas-por-alcool-no-leite-90437n.aspx) e a reportagem “Entenda como o álcool etílico foi parar no leite das cooperativas” (https://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2014/08/entenda-como-o-alcool-etilico-foi-parar-no-leite-das-cooperativas-4568104.html).
2 - Bactéria letal mata pelo menos 10 pessoas e afeta outras 300 na Alemanha (https://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/05/110529_alemanha_bacteria_rp.shtml).