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O marketing institucional e a atratividade setorial

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 15/04/2005

9 MIN DE LEITURA

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No início de abril, tive a oportunidade de participar de um treinamento sobre gestão de empresas na Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Em uma das aulas, o professor fez um teste muito simples. Ele passou um vídeo, onde 2 times de 4 jogadores batiam uma bola de basquete. A tarefa, realizada em grupos de 3 pessoas, consistia em contar quantas vezes a bola era passada de um jogador para o outro sem o jogador bater a bola no chão, batendo-a uma vez e batendo-a mais de uma vez. Após terminado o refinado exercício, com os grupos informando seus resultados, o professor perguntou se alguém havia notado alguma coisa de anormal. Qual foi nossa surpresa, ao rever o vídeo, quando um homem fantasiado de gorila havia entrado na pequena quadra, batido no peito, e saído, sem que tivéssemos percebido! Moral da estória: se você estiver muito focado em suas tarefas, pode não ver o gorila à sua frente.

A discussão em torno da necessidade ou não do marketing institucional de lácteos me fez lembrar o insólito episódio do gorila. Ao reconhecer e se curvar ao fato estatístico que a renda é um fator limitante ao consumo de lácteos, cria-se uma perigosa condição em que se ignora a existência de outros aspectos importantes que afetam o crescimento do consumo em nosso mercado. O marketing institucional, ou a sua ausência, é um deles.

É possível avaliar a necessidade do marketing institucional de lácteos a partir da análise da atratividade setorial. Michael Porter, um dos mais influentes estudiosos em estratégia, há algumas décadas propôs que a atratividade de um determinado setor depende da interação de Cinco Forças: a concorrência atual (fragmentação x concentração, nível de ociosidade, crescimento do mercado, barreiras de saída, existência de padrões), a força dos clientes (quanto mais fortes, menor o poder de barganha da indústria, pressionando negativamente a atratividade), a força dos fornecedores (idem), as barreiras de entrada contra novos participantes e a existência de produtos substitutos, que podem vir a ocupar o espaço de mercado antes ocupado pelo seu produto.

Além dessas forças, não se pode negar que há influenciadores poderosos (também chamado de complementos) que participam da rede de valor de um setor. A imprensa e o governo, por exemplo, devem fazer parte da rede de valor de qualquer setor. Outros influenciadores são indiretos; a Intel, por exemplo, que fabrica processadores para computador, não está diretamente presente na rede de valor da Microsoft, que produz software, mas é impossível negar o fato que há uma potencial complementariedade entre elas, visto que o desempenho adequado dos softwares só é possível quando se tem processadores de qualidade, de forma que uma está presente na rede de valor da outra.

A figura 1 traz o resumo das forças que atuam diretamente em determinado setor, bem como alguns influenciadores relativos ao setor de lácteos. As características de cada uma dessas forças, bem como o produto final dessas interações, estabelecerão a atratividade do setor. A figura 2 traz, no período de 1978 a 1986, a rentabilidade sobre o capital investido e o montante de dinheiro investido em diversos setores, nos Estados Unidos. Percebe-se que há, claramente, uma diferença de rentabilidade entre os setores. Tomamos o exemplo do setor farmacêutico; grandes barreiras de entrada (necessidade de pesquisa, patentes), clientes pulverizados, baixo poder de barganha dos fornecedores e pouca disponibilidade de produtos substitutos o torna, naturalmente, um setor de grande atratividade. Já o setor de aço, na extremidade oposta, se vê frente a clientes muito fortes (indústria automobilística, por exemplo), altas barreiras de saída, (grande investimento feito), ociosidade e existência de produtos substitutos (alumínio e carbono), o que afeta negativamente sua rentabilidade.


Figura 1. As Cinco Forças de Porter e complementos
 


Figura 2. Lucros econômicos médios de grupos setoriais dos EUA - 1978-1986 (adaptado de Gemawathi)

 


A essa altura, você já deve estar mentalmente analisando a atratividade do setor de lácteos ou de seus segmentos (queijos, leite UHT, leite em pó, iogurtes, leite pasteurizado, etc), à luz dos conceitos de Porter. O ponto seguinte será discutir se e como uma entidade voltada para o marketing institucional de lácteos pode influenciar positivamente a atratividade do setor, através de ações coordenadas envolvendo propaganda, relações públicas, assessoria de imprensa e informação embasadas cientificamente, ressaltando os benefícios dos lácteos.

Começando pelo mais evidente, por intermédio de ações coordenadas de propaganda, é possível influenciar diretamente os clientes, tanto finais como corporativos. Para isso, propagandas direcionadas ao público-alvo, ressaltando os benefícios dos lácteos para a nutrição e para a saúde já se mostraram muito eficazes em diversos países. A campanha Got Milk?, há mais de 10 anos em cartaz nos Estados Unidos, já foi utilizada até em filmes. Nela, celebridades são fotografadas com bigodes de leite, entre outras ações.

O posicionamento favorável acaba influenciando clientes corporativos que, utilizando a imagem e a qualidade dos lácteos, agregam valor aos seus produtos. A introdução de lácteos nas lojas do McDonald's é um exemplo disso. A rede de fast food tem sofrido ataques constantes em função da relação entre seus produtos e a vida sedentária e a obesidade. Os lácteos, com uma imagem positiva de saúde, ajudam a aliviar a situação.

Nos Estados Unidos, a Nabisco bancou uma campanha nacional ligando sua bolacha Oreo ao leite (figura 3). Para a empresa, a bolacha tinha o sabor realçado ao se combinar com o leite, além de se beneficiar em parte pela boa reputação da bebida. Isso só acontece se houver de fato uma imagem positiva para o leite e lácteos. Como será que está a imagem dos lácteos hoje? Segundo Sérgio Guardado, sócio-diretor da empresa Seragini-Farné, de design de embalagens, "há um descompasso entre o que o leite transmite no imaginário das pessoas com o que ele transmite no ponto de venda" (Tetra Pak News, Janeiro/Março 2005). Em outras palavras, o leite carrega uma imagem positiva, mas essa imagem não tem sido reforçada ou comunicada adequadamente. O marketing institucional é a ferramenta adequada para resgatar esse trunfo e criar condições mais favoráveis para as empresas atuantes no mercado.


Figura 3. Item da campanha da Nabisco unindo sua bolacha ao leite

 


A influência aos clientes pode ocorrer inclusive fora do país. O USDEC, por exemplo, o Conselho de Exportações de Lácteos dos EUA, é mantido pela DMI, entidade que promove o marketing de lácteos nos EUA, com o objetivo de promover os lácteos norte-americanos nos diversos mercados. Trata-se de mais uma maneira de aumentar a base de clientes. Considerando o crescimento e consolidação das exportações brasileiras, trata-se de mais uma área de atuação potencial para uma entidade com a finalidade de fomentar o mercado de lácteos.

Voltando às cinco forças de Porter, produtos substitutos são aqueles que acabam com o seu mercado. Dessa forma, são muito mais nocivos do que os concorrentes na mesma categoria. Pode-se dizer que os computadores representaram produtos substitutos para máquinas de escrever, sendo esse exemplo suficiente para entender a ameaça que representam os substitutos para os mercados existentes.

Nesse aspecto, é necessário mencionar o crescimento dos sucos e das bebidas à base de soja. Segundo o informativo Tetra Pak News (janeiro/março 05), o aumento de domicílios compradores de bebidas de soja entre 2001 e 2004 foi de 147%. A expansão do segmento no Brasil, entre agosto de 2003 e julho de 2004, foi de 19%. Pode-se dizer que a base ainda é pequena, mas tudo leva a crer que há uma mudança de hábito em curso. Esses produtos têm grande apelo em aparência, trabalham o conceito de saúde, variedade e sabor e utilizam normalmente como argumento de vendas a ausência de lactose e colesterol e a adição de cálcio. Fica fácil concluir qual é o alvo...

Uma entidade que atua com marketing institucional poderá reforçar os benefícios dos lácteos, como fonte principal de cálcio e como possuidores de diversos componentes favoráveis à saúde. É possível também divulgar novos usos para ingredientes lácteos, permitindo o desenvolvimento de novos produtos e conceitos. A DMI, nos EUA, mantém dois serviços com essa finalidade: o www.extraordinarydairy.com ("lácteos extraordinários") e o www.doitwithdairy.com ("faça com lácteos"), esse último destinado à indústria de ingredientes. O primeiro, há algum tempo atrás, trazia a matéria "15 maneiras de vender o soro", referindo-se às diversas propriedades interessantes desse ingrediente lácteo e que poderiam ser exploradas comercialmente. Ao identificar novas propriedades e novos usos para lácteos, o poder de influência de produtos substitutos pode diminuir.

O marketing institucional também pode focar os influenciadores. Escolas, médicos e pais são importantes influenciadores, visto que podem recomendar (no caso dos pais, efetivamente comprar) ou não a ingestão de lácteos. A DMI mantém relacionamento muito próximo com a American Academy of Family Physicians ("Academia Americana de Médicos de Família") e com a American Academy of Pediatrics ("Academia Americana de Pediatras"). A Láctea Brasil tem uma boa proximidade com a SBEM - Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Com recursos e uma ação coordenada nesse sentido, é possível influenciar os médicos, seja através da realização de simpósios, seja através de informativos que tragam as últimas pesquisas, seja através de serviços de suporte à informação.

No caso de escolas, é possível desenvolver programas para escolas de renda média e alta, visando a comercialização de lácteos em embalagens e formatos atrativos ao público-alvo. Nos EUA, várias escolas baniram a venda de refrigerantes. O mesmo pode acontecer aqui, desde que haja um trabalho consistente e alternativas atraentes e com custo compatível. Apelo à saúde, com certeza existe.

Uma entidade responsável pelo marketing institucional poderá ter também um importante papel para influenciar o governo em questões de interesse setorial. O setor lácteo tem tido certas dificuldades nessa questão, especialmente em relação aos rótulos desincentivando o consumo de lácteos para crianças menores de 1 ano e, mais recentemente, ao Guia Alimentar, cuja primeira versão era desfavorável às proteínas animais. Os Estados Unidos aprovaram recentemente a versão atual do seu Dietary Guidelines for Americans, o guia alimentar que reúne as recomendações do governo federal para que os habitantes tenham uma dieta saudável e equilibrada. Nesse guia, os lácteos tiveram um bom destaque, compatível com sua importância nutricional. Provavelmente, as ações da DMI, direta ou indiretamente (através da influência positiva de médicos) tiveram sua parte.

Há outras maneiras de atuar através do marketing institucional, bem como é possível discorrer mais profundamente sobre cada aspecto apontado acima. Creio, no entanto, a esta altura, que seja possível concluir que o marketing institucional, se bem feito e com recursos, pode melhorar a atratividade do setor, aumentando o mercado e criando mais oportunidades para seus agentes captarem valor.

A entidade para essa finalidade já existe: a Láctea Brasil, que há 5 anos atua com o objetivo de aumentar o consumo de lácteos nacionais no país. Somente com o apoio de todos os elos e de uma estrutura de contribuição que possa gerar recursos suficientes para impactar os hábitos de consumo da população é que teremos condições de, à luz dos conceitos de estratégia competitiva, melhorar o mercado em que atuamos.

Por fim, uma última mensagem, também retirada dos livros de estratégia: "se você não souber qual papel quer desempenhar no mercado, seu concorrente decidirá por você". Mais do que nunca, a ameaça por trás dessa frase espreita o setor leiteiro, que corre o risco de ser empurrado para os segmentos menos atrativos do mercado, caso não se mobilize para, ativamente, manter e fazer crescer seu mercado.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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