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O leite na mídia: o risco da desinformação do consumidor

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 23/08/2002

7 MIN DE LEITURA

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O médico (e guru de auto-ajuda), Dr. Lair Ribeiro, é co-autor de um novo livro que trata da prevenção e do tratamento de um importante problema de saúde: o câncer de mama. A julgar pela fama do Dr. Lair Ribeiro, pela sua habilidade de comunicação, trânsito na mídia e pelo tema escolhido, sem dúvida de grande importância temporal, o livro não terá riscos de encalhar nas livrarias, contribuindo para engordar a bem sucedida carreira financeira do Dr. Lair Ribeiro.

Não teríamos nada com isso, a não ser pelo fato do Dr. Lair Ribeiro considerar que a ingestão de leite e derivados é maléfica à mulher. Segundo disse em entrevista ao jornalista João Ferreira, no programa "Tarde Legal", da Rádio Globo, no dia 16/08/2002 (realizado entre 13 às 16:00 horas):

"Leite foi feito para bezerro. Leite de vaca serve para criança no processo de crescimento, depois acabou. Não é verdade que tomar leite aumenta a ingestão de cálcio, isso não é verdade, isso é um mito. Ter que tomar leite por causa de osteoporose não é verdade. O cálcio do leite é eliminado, não é absorvido. O leite e seus derivados provocam um fenômeno alérgico no corpo da mulher. Tem muita mulher que tem obesidade por causa de leite, porque provoca a liberação de "estamina" e a pessoa retém líquido. Prejudica a tireóide. O leite faz a tireóide diminuir o funcionamento. Então a pessoa que quer emagrecer tem que cortar o leite. A pessoa que quer fazer prevenção de câncer deve cortar todos os derivados."

Quem quiser acompanhar a entrevista, transcrita por Wiliam Tabchoury, Superintendente da Láctea Brasil, pode clicar aqui.

Alguém sabe o número de ouvintes do programa do João Ferreira, o Tarde Legal ? Pois são entre 160 e 180.000 pessoas, provavelmente a maioria (pelo horário) donas-de-casa, cuja primeira medida na próxima compra de supermercado, dada a contundência das palavras do Dr. Lair Ribeiro, será provavelmente reduzir ou eliminar o leite de suas dietas.

O MilkPoint demorou mais de dois anos para atingir a marca de 11.000 leitores; que me lembre, nenhuma revista do setor tem tiragem superior a 25.000 exemplares; pois o Dr. Lair Ribeiro, em uma única entrevista em uma tarde de sexta-feira, alcançou cerca de 10 vezes o que os veículos do setor alcançam e, pior, atingiu em cheio o tal consumidor, que é em grande parte o responsável pelo preço do leite estar se sustentando nesse momento (dados da Nielsen indicam que o consumo de lácteos subiu significativamente no primeiro semestre desse ano).

Não vamos nesse espaço combater as afirmações da entrevista, pois não somos especialistas na área de nutrição e saúde humana e há quem o possa fazer com propriedade. Aliás, nesse quesito, vale destacar a pronta atuação da ABLV - Associação Brasileira de Leite Longa Vida (www.ablv.org.br), que conseguiu direito de resposta no mesmo programa (em 22/08), mostrando inclusive que o Dr. Lair Ribeiro parece não ter lido o livro no qual é co-autor, visto que nada do que falou encontra respaldo nas próprias páginas da publicação (para ler a argumentação preparada pela ABLV, clique aqui).

O ponto que vale a pena comentar aqui é a nossa suscetibilidade a esse tipo de situação. No Brasil, é preciso admitir, o leite tem sido pouco combatido pela mídia, salvo um ou outro episódio. E, quando realizado, não se trata de um combate ao alimento em si, mas sim ao processamento, ao acondicionamento, a uma eventual contaminação isolada, sem maiores conseqüências além do fato em si. Nessas menções negativas, a culpa raramente recai sobre o alimento e suas características em si. Inclusive, é forte ainda a imagem de pureza associada ao produto informal, direto da vaca, certamente uma distorção, mas que confere ao alimento uma "nobreza" que as empresas de lácteos sabem explorar muito bem.

Em outros países, a vida do setor é bem mais complicada quando o assunto é imagem do produto. Nos EUA, por exemplo, há organizações muito ativas, cujo objetivo é eliminar qualquer forma de produção e exploração animal, incluindo a produção de leite. A mais conhecida é uma tal de PETA (People for the Ethical Treatment of Animals - algo como Pessoas em prol do Tratamento Ético dos Animais), que defende desde o fim dos zoológicos até a não-utilização de animais para experimentação e lazer. O PETA (www.peta.org) faz um barulho significativo no mercado contra o leite, lançando campanhas negativas como o Milksucks (www.milksucks.com), reunindo o poder de fogo de centenas de Lair Ribeiros da vida. É evidente que, de tão grosseiros em suas argumentações, para boa parte da população tudo isso não passa de teatro do exagero (estão quase conseguindo evitar que a NBA, liga de basquete norte-americana, utilize bolas de couro em seus jogos!), mas sem dúvida em alguns milhões de indivíduos a mensagem encontra eco. Não raro, artistas e e personalidades de renome apóiam a causa, o que também sensibiliza o consumidor. A tradicional rede Burger King está anunciando sanduíches vegetarianos nos sites do PETA.

Para fazer frente a esse tipo de iniciativa, o setor lácteo dos EUA conta com várias organizações com poder de fogo suficiente para contra-argumentar e evitar o pior, que seria o declínio do consumo de lácteos a partir de "sensacionalismos fundamentalistas" como o do PETA. A Dairy Management Inc., por exemplo, dispõe de US$ 250 milhões ao ano para, entre outras ações, custear pesquisas que visem descobrir vantagens nutricionais e terapêuticas do leite e seus derivados, fazer propaganda institucional do leite, implementar programas educacionais e proteger (e melhorar) a imagem do setor junto ao consumidor. Convenhamos, com US$ 250 milhões ao ano dá para encarar a briga com quem quer que seja, ainda que dê trabalho. Mesmo com ativa propaganda contra, o consumo de lácteos per capita subiu 11% nos Estados Unidos nos últimos 20 anos, atingindo 265 kg/habitante/ano, o dobro do nosso.

E nós, como estamos ? Se Lair Ribeiros proliferarem, atingindo 180.000 ouvintes ou leitores a cada investida na mídia, concedida por "amigos fraternos" como o jornalista João Ferreira se anuncia (leia a entrevista), como vamos nos defender ? Quem, no setor, é amigo fraterno da grande mídia, a ponto de não apenas defender o produto quando necessário, junto a essa entidade distante de todos nós, o consumidor, mas que possa efetivamente fazer chegar à grande mídia os muitos benefícios à saúde do leite e dos derivados ? Que entidade conta com um corpo científico de peso, que possa não só rebater à altura episódios como esse, mas gozar de credibilidade junto à população ?

(Obs: há algum tempo, outro doutor famoso, o Dráuzio Varela, escreveu um artigo muito favorável à carne bovina, que foi publicado na Gazeta Mercantil e creio que em outros jornais também. O Dr. Varela é comunicativo, inspira confiança e, com isso, tem grande credibilidade junto à população e à mídia em geral, tanto é que tem até quadro no Fantástico. Imagine se tivéssemos ao nosso lado profissionais de renome como ele !)

Sem dúvida alguma a oportuna ação da ABLV é destacável, mas não esconde o fato de não temos ainda um canal único, organizado e capacitado financeiramente para fazer o trabalho que é necessário e possível de ser feito em relação à promoção e defesa do leite e derivados. Temos iniciativas isoladas de algumas empresas privadas, como a Tetra Pak, que mantém ações institucionais voltadas à divulgação do leite, como o site www.bebaleite.com.br. Temos organizações de produtores, como a CNA, que tem mencionado a promoção de lácteos como uma de suas bandeiras.

Temos, enfim, a Láctea Brasil (www.lacteabrasil.org.br), organização que foi fundada com esse objetivo e que, sem dúvida, mais se aproxima da finalidade proposta, uma vez que reúne os diversos elos da cadeia produtiva do leite, constituindo-se em oportunidade única de catalisar os interesses de todos os agentes envolvidos nessa atividade, a partir de um objetivo básico comum, que é o crescimento do mercado de lácteos no país.

A entrevista do Dr. Lair Ribeiro certamente causou espanto e indignação no setor. Porém, deve ser vista também como um alerta de que é preciso que o setor se mobilize, se estruture e aprenda a se defender de situações como essas que, diga-se de passagem, ainda são bem pouco freqüentes entre nós.

PS: A cadeia produtiva da carne bovina, alimento que sem dúvida sofre mais do que o leite na mídia, lançou no ano passado o SIC - Serviço de Informação da Carne, cujo objetivo é informar o consumidor a respeito das vantagens do consumo de carne bovina, bem como combater matérias e informações negativas sobre o alimento. O SIC tem uma coluna quinzenal no site BeefPoint (www.beefpoint.com.br) e reúne, entre outros membros, uma equipe de médicos e nutricionistas capacitados tecnicamente, refletindo-se em um bom exemplo do que pode vir a ser feito por entidades como a Láctea Brasil.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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EDUARDO CARNEIRO DO AMARAL

RIO DE JANEIRO - ESTUDANTE

EM 03/02/2017

Concordo com tudo que o Dr. Lair Ribeiro fala, porque ele passa horas por dia estudando, para que, para que eu vá e fale, sem estudar nada, que ele está errado. Vai ficar sentado 5,6,7,8 horas estudando, para alguém vir e falar que vc não entende do assunto. 
ANGELO CARLUCCIO NETO

SÃO JOÃO DA BOA VISTA - SÃO PAULO - EMPRESÁRIO

EM 04/09/2002

Concordo com todas as suas palavras.

Não pude deixar de também refletir sobre o EFEITO COLATERAL de termos um setor desunido entre seus elos, a saber: produtores, fornecedores de insumos, indústria de laticínios e varejistas.

A estratégia de um elo "engolir" sempre que possível, pode nos surpreender com a derrota para outro setor que se mostra concorrente mais organizado ou simplesmente um "caçador de visibilidade" por criar polêmica.

A verdade é que não há "estratégia".

O que existe é a administração dos problemas com visão de curtíssimo prazo e que está nos colocando em sérias dificuldades mercadológicas, podendo se tornarem até irreversíveis.

Sou produtor de leite que tive a felicidade da oportunidade de me instruir e me informar mais que a maioria esmagadora de meus colegas. Estes sempre muito trabalhadores, mas carente de orientações, como a maioria dos Brasileiros. Por este fato derramo em meus ombros maior responsabilidade que os outros, para organizar e articular as soluções para os nossos problemas.

Seguindo o mesmo raciocínio, também despejo sobre os ombros das indústrias de laticínios e insumos, a responsabilidade de apoiar e auxiliar na organização do setor dos produtores, que é um "Gigante Adormecido" para conferir mais força e consistência ao setor.

No processo de organização do setor produtivo, precisamos desenvolver a mentalidade de que o "Gigante Adormecido" trabalhará para a cadeia e não contra ela, por isso não é necessário ter medo de despertar o "Gigante".

Encarnando a idéia de que os interesses de todos os elos são comuns, e que as relações comerciais têm que ser "ganha-ganha", e que toda a cadeia láctea precisa ter como meta encantar o consumidor, apelo para os muito bem preparados profissionais do setor, atuantes no setor industrial, a APOIAR A FORMAÇÃO DE COOPERATIVAS PROFISSIONAIS E EFICAZES, que poderão garantir o abastecimento de matéria prima, de forma a aumentar a produtividade e qualidade no processo industrial.

Com este apelo não estou me excluindo deste trabalho.

Contem comigo para o que for necessário!

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