De acordo com o site italiano CLAL.IT, em 2021 o setor lácteo italiano representou quase 10% da produção total de leite e 6% das exportações de leite da União Europeia (UE). A Itália exporta cerca de 35% de sua produção de leite, principalmente queijo, com alto valor agregado.
O rebanho leiteiro italiano é formado por 1,6 milhão de vacas leiteiras, a maioria delas em fazendas localizadas na região do vale do Pó, no norte do país. A produção de leite em 2021 atingiu 13,2 bilhões de litros, quando a produção anual de leite por vaca é de 8.300 litros, com 3,76% de gordura e 3,44% de proteína. A produção anual de leite em 2021 foi quase 4% acima do ano anterior, mais que o dobro do aumento em 2020 (1,7%) e em 2019 (1,3%).
Uma das últimas publicações do site CLAL.IT informou que o aumento da produção anual é exclusivo da Itália, e que a mesma magnitude não aparece em outros importantes produtores de leite da UE, como Alemanha, França e Holanda, como pode ser visto nos gráficos abaixo.
Gráfico 1. Aumento da produção anual de leite.
Como pode ser visto nas figuras acima, a produção de leite em 2021 nesses países foi menor do que nos dois anos anteriores, principalmente nos meses de verão-outono, enquanto a produção de leite na Itália foi maior do que nos anos anteriores, durante todo o ano.
Não há uma explicação clara para esse fenômeno. De qualquer forma, vamos especular um pouco neste artigo e relacionar, pelo menos parte desse aumento incomum no desempenho da vaca na Itália, à adoção e implementação adequada de meios de resfriamento de vacas em cada vez mais fazendas leiteiras na Itália nos últimos anos, onde honestamente sentimos que participamos.
A primeira visita profissional do Dr. Flamenbaum à Itália foi em março de 2016, ministrando palestras sobre resfriamento de vacas em diversas partes do país. A colaboração com a empresa começou no final de 2016, após o qual foi estabelecido um programa de consultoria e suporte profissional, denominado programa “Element”, onde foram instalados equipamentos de resfriamento e avaliados os resultados da fazenda, pelo pessoal técnico da empresa.
O acompanhamento incluiu o uso de registradores de dados intravaginais e o cálculo do “índice de relação verão/inverno” (isso em colaboração com a AIA, a Associação Italiana de Produtores de Leite). Durante esses anos, o Dr. Flamenbaum participou como palestrante em dois encontros nacionais consecutivos de produtores de leite “Cirio” (2017 e 2018), em um workshop especial sobre o tema resfriamento de vacas e quatro visitas de “uma semana” todos os anos a fazendas e instituições, reunindo-se com o pessoal de Arienti, passando a “mensagem de resfriamento da vaca” de forma direta aos produtores de leite em toda a Itália.
Para sustentar as “especulações” sobre a contribuição da “campanha de resfriamento de vacas” para a melhoria da produção nacional de leite (conforme apresentado no início deste artigo), foram investigados em profundidade dados de 23 fazendas leiteiras que participaram do programa Element, onde alguns resultados importantes foram alcançados. Essas fazendas (a maioria delas na Lombardia) começaram a implementar o resfriamento intensivo no verão de 2019 e continuam fazendo isso até hoje. As fazendas foram visitadas por técnicos da empresa durante o verão, e foram confirmadas como fazendas “adequadamente resfriadas”.
Para entender a melhoria do ano passado na produção de leite italiana, decidimos comparar os resultados das fazendas Element com os de quase 2.000 fazendas leiteiras de vacas Holandesas na região do vale do Pó da Lombardia.
Usando os dados de registro de desempenho da AIA, a comparação das curvas anuais de lactação e as médias mensais de produção de leite corrigido para gordura e proteína (FPCM, da sigla em inglês) por vaca foram calculadas.
Para avaliação e comparação, o desempenho anual da vaca foi calculado em três períodos:
(a) dois anos antes do início do programa de resfriamento (2017-2018),
(b) o ano em que o resfriamento foi implementado pela primeira vez (2019)
(c) o dois anos depois (2020-2021).
São apresentadas curvas de lactação e produção total de leite nos diferentes períodos na fig. 1, para as fazendas Element e na fig. 2, para todas as fazendas da Lombardia.
Figura 1. Curvas de lactação e produção total de leite nos diferentes períodos.
A melhoria de 2017 para 2018 foi de 170 kg (+1,62%) e pode ser considerada como “tendência regular anual de melhoria” que inclui melhorias genéticas e de manejo.
Se calcularmos a diferença entre 2019 (primeiro verão de resfriamento) e 2018, a diferença é de 210 kg, apenas 40 kg acima da melhoria “regular”. De qualquer forma, quando comparamos 2020 e 2021, cada um com o ano anterior tivemos um aumento de 435 e 420 kg de leite, respectivamente, muito acima do aumento dos anos anteriores.
Conforme publicado em artigo anterior, fica bastante claro que a melhora no desempenho da vaca não se completa no ano de implantação, mas “continua crescendo” por pelo menos mais dois verões.
O melhoramento anual “genético” (definido pelo Milk Index) e “não genético” por vaca nessas fazendas foi calculado e comparado entre os períodos antes e depois da implementação do resfriamento. Entre 2019 e 2021, houve um aumento anual total de 1.176 kg FCPM por vaca, dos quais, 346 kg foram considerados como aumento genético esperado e 830 kg (quase o dobro), foram considerados como aumento “não genético” (sendo a implementação do resfriamento intensivo foi uma das únicas alterações efetuadas nestas fazendas neste período). Estamos curiosos para saber se esta tendência continua e, caso persista, até quando e a que ritmo.
Agora, vejamos o que aconteceu no mesmo período, no restante da Lombardia (região do Vale do Pó, aproximadamente 2.000 fazendas). A evolução da produção nos mesmos anos pode ser vista na figura 2.
Figura 2. Evolução da produção no mesmo período, no restante da Lombardia.
Como pode ser visto, também as fazendas da Lombardia experimentaram um aumento notável na produção anual de leite por vaca em 2020 e 2021, muito acima do observado nos anos anteriores.
Podemos supor que, como nas fazendas Element, o aumento da produção nestes anos nas fazendas da Lombardia está acima do melhoramento genético esperado. Na figura 3a e 3b, comparamos a taxa de aumento obtida entre 2017 e 2021, nas 23 fazendas da Element, com a obtida em toda a Lombardia.
Figura 3. Comparação da taxa de aumento obtida entre 2017 e 2021, nas 23 fazendas da Element, com a obtida em toda a Lombardia.
Fazendas Arenti em azul e Fazendas Lombardia em vermelho.
Do apresentado na figura 3a, verifica-se um aumento da produção anual das vacas nos últimos três anos, tanto na Element como em todas as fazendas da Lombardia. A taxa de aumento em todo o período (2017-2021) foi quase 50% maior nas fazendas Element, em comparação com todas as fazendas da Lombardia (1.250 e 766 kg FPCM kg), respectivamente.
Desde 2019 (o primeiro ano de implementação do resfriamento nas fazendas Element), a produção de leite aumentou 1.109 kg nas fazendas Element (10,4%), em comparação com 690 kg (6,9%), em todas as fazendas da Lombardia, mais que o dobro. A mudança na magnitude do aumento da produção anual de leite nas fazendas “Element” e em todas as fazendas da Lombardia, a partir de 2019, pode ser vista na figura 3b.
O aumento observado na produção nas fazendas da Element pode ser bem compreendido, pois a instalação e operação adequada dos meios de resfriamento desde o verão de 2019 pode ser confirmada pela equipe da Arienti (isso inclui também o monitoramento da temperatura corporal da vaca).
O aumento em todas as fazendas da Lombardia, embora menor do que o observado nas fazendas Element, também está acima do melhoramento genético esperado, e a questão pode ser se isso representa também uma melhoria relacionada à implementação de meios de resfriamento de vacas em grande parte dessas fazendas.
Para avaliar o possível efeito da adoção de estratégias de resfriamento das vacas nos resultados apresentados acima, utilizamos o índice de razão verão-inverno (V:I), que a AIA recentemente começou a calcular e fornecer a todos os produtores associados. Este índice compara os parâmetros de desempenho da vaca entre o verão (julho-setembro) e o inverno (janeiro-março).
Esperamos que quanto mais os resultados do verão se aproximem dos resultados do inverno, melhor a fazenda lida com o estresse térmico do verão. Na figura 4, é apresentada a proporção verão/inverno do FCPM nos anos de 2017 a 2021, em 23 fazendas da Element e todas as fazendas da Lombardia.
Figura 4. Comparação da relação verão-inverno entre as fazendas Ariente e Lombardia.
Fazendas Arenti em azul e Fazendas Lombardia em vermelho.
Como pode ser visto na figura 4, a relação verão/inverno melhorou nos últimos dois anos, tanto na Element quanto em todas as fazendas da Lombardia, e como esperado, com melhores resultados nas fazendas Element. A relação S:W aumentou de 0,92 em 2018 para 0,97, em 2021, nas fazendas Element, e de 0,91 para 0,94, no mesmo período, em todas as fazendas da Lombardia.
Esta melhoria na relação S:W em ambos os grupos de fazendas apoia nossa crença de que pelo menos parte da melhoria na produção anual de vacas obtida pode ser atribuída à implementação de meios de resfriamento de vacas em cada vez mais fazendas na Itália nos últimos anos.
Agora, é hora de fechar o círculo e voltar aos números apresentados no início deste artigo. Provavelmente podemos relacionar a melhoria especial e única da produção italiana nos últimos anos à intensa campanha de implementação de meios de mitigação de calor que incluem o fornecimento de equipamentos e know-how para instalar e operar adequadamente o sistema de resfriamento.
A Cowcooling Flamenbaum & Seddon, foi criada há quase 4 anos no Brasil, exatamente com o mesmo objetivo, e planeja usar a mesma metodologia implementada com sucesso pela empresa Arienti na Itália. As fazendas italianas estão “colhendo” hoje, os frutos dos esforços acima mencionados e esperamos que muitos produtores brasileiros aproveitem esta experiência e alcancem os mesmos resultados nos próximos anos.
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