As peptidases são enzimas que catalisam o rompimento das ligações peptídicas de uma proteína (Tavano et al., 2018), elas estão presentes em todos os organismos vivos e são responsáveis pela manutenção das atividades biológicas (Rawlings et al., 2018).
Além disso, são utilizadas em vários processos industriais (Errasti et al., 2018), dentre esses se destaca a aplicação na indústria de alimentos para a produção de derivados lácteos voltados aos consumidores alérgicos à proteína do leite de vaca (alergia à proteína do leite de vaca, conhecida pela sigla APLV).
A APLV é mais comum em crianças de até seis meses, provavelmente, porque essa é a primeira proteína estranha ao organismo que o recém-nascido tem contato (Sicherer; Sampson, 2014), e desencadeia um processo alérgico que pode apresentar sintomas cutâneos, gastrointestinais e distúrbios respiratórios.
Como as alergias estão relacionadas à produção de anticorpos, a única forma de evitá-las é eliminar da dieta alimentar os componentes causadores (Rangel et al., 2016). Nos casos de alergias em lactente é imprescindível a substituição do leite e para isso usualmente utilizam-se fórmulas consideradas hipoalergênicas.
Como opções para essa substituição tem-se leite de outros mamíferos (búfalos, caprinos e ovinos) ou de vegetais (soja, coco e castanha) (Souroullas et al., 2018). Além disso, o processamento do leite de vaca, por meio de processos como altas pressões, fermentações, altas temperaturas e hidrólise enzimática, é uma ferramenta para a redução da sua alergenicidade (Abd El-Salam; El-Shibiny, 2019; Bu et al., 2013; Golkar et al., 2019).
Contudo, entre esses processos se destaca a hidrólise enzimática empregando peptidases de diferentes fontes. A origem da peptidase e as condições do processo de hidrólise interferem diretamente no custo e nas características sensoriais da fórmula hipoalergênica.
- Utilização da enzima ß-Galactosidase na hidrólise da lactose do leite
- Utilização de lactase na indústria de laticínios
Peptidases de origem microbiana, vegetal e animal são as mais utilizadas para a redução da alergenicidade do leite de vaca (Oliveira et al., 2019). Além disso, a partir da engenharia genética é possível a produção de peptidases recombinantes mais estáveis e eficientes no processamento do leite de vaca para a redução da sua alergenicidade (Adrio; Demain, 2014).
Considerando a demanda por fórmulas lácteas hipoalergênicas, visto que a APLV atinge um grande número de crianças abaixo de três anos de idade, é fundamental o desenvolvimento de um processo industrial robusto e competitivo.
A biossíntese de novas peptidases recombinantes para a hidrólise das proteínas do leite de vaca é uma alternativa promissora, principalmente em relação à atividade enzimática, além do rendimento, custo e minimização do sabor amargo do produto final (Fiocchi et al., 2018; Rosendal; Barkholt, 2000).
Referências
ABD EL-SALAM, M. H.; EL-SHIBINY, S. Reduction of Milk Protein Antigenicity by Enzymatic Hydrolysis and Fermentation. A Review. Food Reviews International, p. 1-20, 2019.
ADRIO, J. L.; DEMAIN, A. L. Microbial enzymes: tools for biotechnological processes. Biomolecules, v. 4, n. 1, p. 117–139, 2014.
BU, G.; LUO, Y.; CHEN, F.; LIU, K.; ZHU, T. Milk processing as a tool to reduce cow’s milk allergenicity: a mini-review. Dairy Science and Technology, v. 93, n. 3, p. 211-223, 2013.
ERRASTI, M. E.; CAFFINI, N. O.; LÓPEZ, L. M. I. Proteolytic extracts of three Bromeliaceae species as eco-compatible tools for leather industry. Environmental Science and Pollution Research, p. 1-8, 2018.
FIOCCHI, A. et al. The global impact of the DRACMA guidelines cow’s milk allergy clinical practice. World Allergy Organization Journal, 2018.
GOLKAR, A.; MILANI, J. M.; VASILJEVIC, T. Altering allergenicity of cow’s milk by food processing for applications in infant formula. Critical Reviews in Food Science and Nutrition, v. 59, p. 159-172, 2019.
OLIVEIRA, J. P. B.; MARÍA CANDREVA, A.; RIZZO, G.; RAMOS, M. V.; OLIVEIRA, J. S.; OLIVEIRA, H. D.; ARY, M. B.; DOCENA, G.; FREITAS, C. D. T. Allergenicity reduction of cow's milk proteins using latex peptidases. Food Chemistry, v. 284, p. 245-253, 2019.
RANGEL, A. H. N.; SALES, D. C.; URBANO, S. A.; GALVÃO JÚNIOR, J. G. B.; ANDRADE NETO, J. C.; MACÊDO, C. S. Lactose intolerance and cow's milk protein allergy. Food Science and Technology, v. 36, n. 2, p. 179-187, 2016.
RAWLINGS, N. D.; BARRETT, A. J.; THOMAS, P. D.; HUANG, X.; BATEMAN, A.; FINN, R. D. The MEROPS database of proteolytic enzymes, their substrates and inhibitors in 2017 and a comparison with peptidases in the PANTHER database. Nucleic Acids Research, v. 46, n. D1, p. D624-D632, 2018.
ROSENDAL, A.; BARKHOLT, V. Detection of potentially allergenic material in 12 hydrolyzed milk formulas. Journal of Dairy Science, v. 83, n. 10, p. 2200-2210, 2000.
SICHERER, S. H.; SAMPSON, H. A. Food allergy: Epidemiology, pathogenesis, diagnosis, and treatment. Journal of Allergy and Clinical Immunology, v. 133, n. 2, p. 291-307, 2014.
SOUROULLAS, K.; ASPRI, M.; PAPADEMAS, P. Donkey milk as a supplement in infant formula: Benefits and technological challenges. Food Research International, v. 109, p. 416-425, 2018.
TAVANO, O. L.; BERENGUER-MURCIA, A.; SECUNDO, F.; FERNANDEZ LAFUENTE, R. Biotechnological applications of proteases in food technology. Comprehensive Reviews in Food Science and Food Safety, v. 17, n. 2, p. 412-436, 2018.
*Fonte da foto do artigo: Freepik