Etanol - mitos, exageros e preconceitos
A visita de George W. Bush gerou um impressionante volume de matérias e opiniões sobre biocombustíveis. O que não faltou foram reducionismos e preconceitos. Alguns merecem destaque. Primeiro mito: muita expectativa, nenhum resultado. Propagou-se a idéia de que a reunião traria grandes resultados em investimentos e comércio. Como isso não ocorreu, o acordo teria fracassado.
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Primeiro mito: muita expectativa, nenhum resultado. Propagou-se a idéia de que a reunião traria grandes resultados em investimentos e comércio. Como isso não ocorreu, o acordo teria fracassado.
Vamos à realidade. Os EUA vão aumentar de duas a três vezes seu programa de etanol de milho em seis anos. Em conseqüência, os preços do milho já aumentaram 80%, afetando a produção de soja e carnes. Uma solução é produzir álcool mais competitivo, utilizando novos produtos e processos, como a hidrólise de biomassa (capins, no caso dos EUA, e bagaço de cana, no nosso). Nasce daí a oportuna cooperação bilateral em pesquisa e tecnologia.
A segunda solução seria reduzir a tarifa de US$ 0,14 por litro e/ou ampliar a atual cota de importação, que hoje beneficia apenas o Caribe. Só que o tema ainda não está sobre a mesa, por se tratar de assunto do Legislativo americano, e nada mudará até 2009. Mas é do interesse de Brasil e EUA discuti-lo nos próximos dois anos. As importações do etanol barato ajudariam os EUA a equilibrar os preços da agricultura e dos combustíveis. O potencial é extraordinário: cada 1% de substituição de gasolina por etanol no mercado americano representa 8 bilhões de litros (US$ 4 bilhões), ou metade da atual produção brasileira.
Segundo mito: monocultura. Na esteira dos exageros, reputados analistas mencionaram que este novo ciclo de monocultura de cana-de-açúcar nos levaria de volta ao tempo das capitanias hereditárias.
Hoje temos 7 milhões de hectares ocupados com cana-de-açúcar, 50% para etanol e 50% para açúcar. A cana para etanol ocupa ínfimo 0,5% da área total e menos de 1% da área agricultável do País, sete vezes menos que a soja e 65 vezes menos que as pastagens. Em janeiro Bush lançou a meta de substituir 15% da gasolina dos EUA por combustíveis renováveis e alternativos, ou 132 bilhões de litros. Sabe-se que essa meta não será cumprida com etanol de milho, que tem rendimento por área 60% inferior ao da cana e custa o dobro.
Imaginemos que os EUA resolvessem importar este enorme volume. Isso consumiria 20 milhões de hectares, o que dá três vezes a área atual de cana, mas apenas 7% da área total agricultável do País. Sem considerar a possibilidade de dobrarmos a produtividade de álcool se viabilizarmos a hidrólise de bagaço e liberarmos as novas variedades de cana que estão travadas na CTNBio.
Ocorre que historicamente o Brasil substituiu as antigas monoculturas trabalho-intensivas por um sistema diversificado de produção capital-intensiva de alimentos, rações, fibras e agroenergia. Em termos nacionais, há cada vez menos monoculturas, e não mais! A revolução nasceu nos anos 70, com a expansão de soja, brachiaria, carnes e leite. A chegada da cana-de-açúcar ao Centro-Oeste marca o início de um novo ciclo de intensificação do uso da terra, de magnitude semelhante à observada nos anos 70.
O valor oferecido para arrendamento de terras para cana vai eliminar os últimos bolsões de ineficiência agropecuária, nas grandes e nas pequenas propriedades. Produtores que tinham um retorno sobre patrimônio de 1% a 2% passarão a receber 6% a 7% ao ano. O tradicional agricultor patrimonialista sempre teve aversão a aceitar o custo de oportunidade do sistema financeiro, que na média oferecia retornos superiores aos obtidos no campo. Surge agora o custo de oportunidade da cana, visível no melhor padrão de vida do vizinho que arrendou suas terras. Soja, milho, algodão e cana disputarão o uso da terra em função de seus preços relativos e condições de logística e de rotação de culturas. A inevitável intensificação da produção de carnes e leite será o corolário do processo.
Terceiro mito: Brasil "fazendão". Economistas e ex-ministros avançaram a estapafúrdia tese de que o País está condenado a se tornar um grande "fazendão". A expansão das commodities (agrícolas, minerais e agora agroenergéticas) produziria a apreciação do câmbio e a desindustrialização, num processo em que o Brasil estaria trocando seu "futuro" industrial e de serviços pelo "passado" da dependência de commodities de baixa tecnologia. É curioso este esporte nacional de malhar tudo o que está dando certo, de empresários a setores econômicos. Nossos ídolos são artistas ou jogadores de futebol, raramente empresários e nunca governantes. Se algo dá certo, ou tem malandragem ou não é tão bom assim.
Primeiro, não é o FMI, a Rodada Doha, a Alca ou o álcool que estão condenando os setores menos eficientes da nossa indústria, mas sim a falta de instituições sólidas e reformas nas políticas públicas. Nossos maiores problemas são internos, e não externos. Segundo, não existe "agricultura contra indústria", "agronegócio contra agricultura familiar", "alta tecnologia na indústria e atraso nas commodities".
É inacreditável como este besteirol endêmico está enraizado no País. 70% do agronegócio é composto por indústrias e serviços correlatas à agricultura. O Brasil é líder mundial em tecnologia e custos agropecuários. Nossos maiores concorrentes nos mercados de commodities são países ricos que utilizam intensivamente seus recursos naturais. EUA, Canadá, Austrália, Suécia, Finlândia, Malásia e Chile são exemplos. Não há nada de errado nisso.
Para resolver esta doença só há uma solução: antes de criticar, é preciso conhecer, visitar. Listem as indústrias mais dinâmicas do interior, que geram mais empregos. Visitem um frigorífico, uma usina sucroalcooleira, o Agrishow de Ribeirão Preto. Aproveitem uma das infinitas idas a Brasília para conhecer o Centro-Oeste verdadeiro, espelhado na alta qualidade de vida das regiões agrícolas de Goiás e Mato Grosso. Viagens e estatísticas curam preconceitos e ignorância!
Material escrito por:
Marcos Sawaya Jank
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AQUIDAUANA - MATO GROSSO DO SUL - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
EM 05/12/2007
Ótimo artigo! Foi muito útil para mim!

PRESIDENTE VENCESLAU - SÃO PAULO
EM 25/06/2007

QUIRINÓPOLIS - GOIÁS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
EM 20/04/2007
Professor li e reli seu artigo foi ótimo, pois aumentei bem minha capacidade de entender o que está acontecendo em minha região. Pois no sudoeste goiano é secular a pecuária e agricultura porém com a chegada da cana estamos vendo essa parceria se desmontar e se tornar sim uma monocultura, e sim estamos preocupados com esse avanço.

SÃO SIMÃO - GOIÁS - PRODUÇÃO DE GADO DE CORTE
EM 20/04/2007
Muito bom, didático e esclaredor este artigo, seria ótimo que muitos pudessem ler.

CATANDUVA - SÃO PAULO - PRODUÇÃO DE GADO DE CORTE
EM 13/04/2007
Excelente seu artigo. Continue sempre a nos brindar com artigos tão cheios de conteúdo, precisão, técnica, e um pouco de ironia. Mais uma vez, meus parabéns.
Neder Abdo

UBERLÂNDIA - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
EM 12/04/2007
Espero que muitas pessoas possam ler seus eclarescimentos. Infelizmente, além do grande público leigo e desinformado, temos também produtores, agrônomos e até pesquisadores ligados a agropecuária que não estão acompanhando a grande evolução que está ocorrendo no setor de agronegócios brasileiro.
Abraço.
Domingos.

AVARÉ - SÃO PAULO - PRODUÇÃO DE GADO DE CORTE
EM 12/04/2007
Abraços

OUTRO - SÃO PAULO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
EM 02/04/2007

CAMPO GRANDE - MATO GROSSO DO SUL - PRODUÇÃO DE GADO DE CORTE
EM 29/03/2007
O grande zootecnista sulafricano, Jan Bonsma, dizia sabiamente, que os 3 males que retardam uma nação são: preconceito, ignorância e superstição.
Infelizmente, estamos cheios de pessoas no país que pensam assim. Acredito muito naquelas poucas pessoas que não pensam desta maneira e que fazem este país andar.
Abraços

ARAÇATUBA - SÃO PAULO
EM 29/03/2007
Quanto aos nossos problemas internos que o Sr. cita, não apenas condenam os setores menos eficientes e fracos de nossa economia, mas atrapalham, e muito, os eficientes e dinâmicos. Sorte nossa o Brasil ser essa potência, e nós termos essa paciência, pois só assim para aguentar tanto desaforo.
Infelizmente os que mais sofrem são os mesmos que não percebem a péssima representatividade que delegam, os padrinhos da ineficiência e malversação de preciosos recursos, estes talvez os mesmos que só criticam e tiram o proveito do preconceito, e não imaginam em fazer algo como contribuir com trabalho e patriotismo para a solução dos problemas.
Abraço

TIBAGI - PARANÁ - PRODUÇÃO DE GADO DE CORTE
EM 28/03/2007
Espero que muitas pessoas tenham a felicidade de poder ler este artigo de tão grande importância em nossa realidade. Pois só assim, com leitura, aumentaremos o nível de conhecimento de tradicionais agricultores patrimonialistas como citou acima, fazendo com que os mesmos, pelo menos, parem de criticar as oportunidades oferecidas ao nosso país através do agronegócio e comecem olhar para o futuro com otimismo e não com egocentrismo!
Muito Obrigado por escrever este artigo
Fabiano Carneiro
Acadêmico de M. Veterinária

FRANCISCO BELTRÃO - PARANÁ - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
EM 27/03/2007
Mas sempre vale a pena insistir.

VITÓRIA - ESPÍRITO SANTO
EM 26/03/2007
José Carlos Gava Ferrão

SALVADOR - BAHIA - PESQUISA/ENSINO
EM 23/03/2007
IPORÁ - GOIÁS - PESQUISA/ENSINO
EM 23/03/2007
O brasileiro em geral tem mesmo este "esporte" de botar defeito em tudo; é o medo do desconhecido, e isto se combate com informação.
Espero que muitos proprietários rurais leiam seu artigo e entendam a mensagem. Precisamos crescer, parar de reclamar e amadurecer como nação.
Obrigado, seu artigo coopera para isso.
SERGIO CUSTODIO
Médico Veterinário

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
EM 22/03/2007
Parabéns, sua crítica serve para cada brasileiro.
Antes de falar mal de qualquer assunto, pense, pense, pense. Como senhor disse no seu último topico, usem o verbo visitar, conhecer, viajar, que realmente a sua
última frase é digna de se repetir: viagens e estatísticas curam preconceitos e ignorância.

UBERLÂNDIA - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
EM 22/03/2007
Temos grandes nomes no país, que sabem dar valor a esse setor, nomes nas Federações, Confederações, e por aí vai. Mas como você mesmo disse, não damos o verdadeiro respaldo às pessoas que estão lutando por essa nobre causa.
Estive visitando eventos, participando de cursos na FAEMG (Federação de Agricultura e Pecuária de Minas Gerais), vi que são inúmeras pessoas com uma visão magnífica do que está por vir. Mas com a imensidão do país, temos que ter forças na massa para mudar algo.
Belas palavras, companheiro. Muito me intusiasmou.