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Adoção do sistema APPCC na produção de silagens. II - Controle de pontos críticos e parâmetros de qualidade

THIAGO FERNANDES BERNARDES

EM 05/03/2004

11 MIN DE LEITURA

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Por Lucas José Mari1 e Luiz Gustavo Nussio2

Introdução

Como já havia sido apresentado no artigo anterior, a introdução do sistema APPCC visa controlar a qualidade da silagem tanto para benefício da saúde dos animais alimentados com a mesma, quanto à saúde dos seres humanos, cuja principal fonte de proteína alimentar é aquela oriunda de produtos de origem animal.

Pontos críticos no processo de ensilagem

Segundo McDonald et al. (1991) o controle mais efetivo dos microrganismos indesejáveis na ensilagem ocorre através do rápido abaixamento do pH concomitante ao estabelecimento do ambiente anaeróbio e, de acordo com Seale (1986), a redução da atividade de água (Aw) apresentaria um efeito sinérgico aos demais.

Os produtos finais da fermentação são oriundos, principalmente, de bactérias ácido-láticas (BAL) com acúmulo de ácido lático e, em menor parte, de ácido acético. Entretanto, podem estar envolvidos outros produtos finais como dióxido de carbono, peróxido de hidrogênio, diacetil, etc, decorrentes de atividade microbiana secundária. O pré-requisito básico para a ocorrência dessa segunda fase da fermentação depende da disponibilidade de ácido lático presente no meio, da quantidade residual de açúcares potencialmente fermentáveis e de outros nutrientes, além da temperatura que deverá ser adequada ao crescimento desses microrganismos secundários.

A fermentação mais lenta e incompleta favorece o desenvolvimento de enterobactérias e clostrídios. As enterobactérias competem com as BAL por carboidratos, causando assim, queda na produção de ácido lático. Quando ocorre depleção no conteúdo de carboidratos, os clostrídios e as enterobactérias iniciam a produção de amônia, que compromete a qualidade da silagem (Woolford, 1990) acarretando em sérias limitações no consumo dos animais.

Segundo Lindgren (1999), o pH continua sendo usado como um dos melhores critérios para indicar a preservação da silagem. Entretanto, um indicador mais preciso seria a concentração total de ácidos orgânicos não-dissociados. Muitos ácidos fracos na sua forma não-dissociada podem penetrar na membrana celular e se acumular no citoplasma, e em seguida, dissociam-se liberando prótons o que leva à queda do pH, havendo ainda alterações na bomba de prótons que regula o pH interno da célula microbiana.

A concentração de ácidos na silagem é expressa em gramas por quilogramas de matéria seca (g kg-1 MS) e, talvez, isso não demonstre a importância do potencial de preservação causado pelo ácido. Esse raciocínio é mais facilmente entendido ao se comparar uma silagem bem preservada com a mesma silagem acrescida de 20% de água. A adição de água não altera a relação de ácido por kg MS, mas a concentração de ácido na silagem úmida é reduzida, conseqüentemente, a atividade antimicrobiana e a estabilidade, mesmo na ausência de oxigênio, tornam-se reduzidas, em função do aumento da Aw.

Na inoculação de L. plantarum produz-se concentrações de 100 mmol L-1 de ácido lático não-dissociado e isso amplifica a concentração final desse (ácido por litro de água) na silagem, atingindo valores entre 15 e 124 mmol (Figura 1) (Eurobac, 1990).

 


Figura 1 - Concentração de ácido lático total (g kg-1 MS) e de ácido lático não-dissociado (mmol L-1 de água na silagem). Fonte: Eurobac, 1990.

Legenda: 1A: MS < 18%, CS (carboidratos solúveis) < 15 g kg-1; 1B: MS < 18%, CS > 15 g kg-1; 2: MS = 18-25%; 3: MS = 25-35% e 4: MS > 35%.

Ao se analisar os resultados apresentados na Figura 1 observa-se que os menores níveis de ácido não-dissociado foram encontrados em silagens mais úmidas. A adição de ácido fórmico reduziu a concentração do ácido lático não-dissociado em todos os teores de MS. A concentração de ácido lático na MS não reflete a realidade do padrão fermentativo das silagens, tendo variado entre 55 e 120 g kg-1 MS. O resultado também mostra a importância do teor de CS no processo fermentativo, sobretudo, nas silagens mais úmidas.

Ao se analisar a Figura 2 pode-se inferir que o teor de ácido lático na MS indica diferenças limítrofes na quantidade de ácido lático entre os diferentes teores de MS, enquanto que na fase aquosa a concentração de ácido lático aparece com um consistente aumento conforme se eleva o teor de MS da silagem.

 


Figura 2 - Teor de ácido lático relacionado com o teor de MS (g kg-1) e na respectiva fase aquosa (g L-1). Fonte: Eurobac, 1990.

Legenda: 1A: MS < 18%, CS (carboidratos solúveis) < 15 g kg-1; 1B: MS < 18%, CS > 15 g kg-1; 2: MS = 18-25%; 3: MS = 25-35% e 4: MS > 35%.

De acordo com Baird-Parker (1980), a sensibilidade à condição de acidificação da silagem varia entre os diferentes microrganismos. A atividade inibitória é normalmente constante para os ácidos não-dissociados dentro de uma amplitude de pH entre 4,0 e 5,5. Leveduras e fungos não são sensíveis às condições ácidas existentes nas silagens, entretanto, a manutenção das condições anaeróbias é o fator mais importante para se evitar o crescimento desses microrganismos, uma vez que esses são capazes de metabolizar o lactato da silagem reduzindo a propriedade de estocagem do material (Lindgren et al., 1985). Existem evidências de que o ácido acético na silagem tem maior poder inibitório sobre fungos e leveduras, se comparado ao ácido lático.

O procedimento do emurchecimento da forragem para ensilagem reduz o transporte de água para o silo, diminuindo a possibilidade de perdas por meio de efluente, aumentando a concentração de carboidratos solúveis (CS) na fase líquida da silagem, além de promover a redução da Aw, ou seja, na quantidade percentual de água que estará disponível para o crescimento de microrganismos.

A instabilidade aeróbia é um dos principais problemas na estocagem da silagem e na alimentação do rebanho com esse volumoso. A adição de ácido benzóico e propiônico tem sido reportado como efetivo no que se refere à estabilidade aeróbia. De acordo com Weinberg & Muck (1996), as silagens que apresentaram um melhor perfil de fermentação, com altos níveis de ácido lático e açúcares residuais, têm probabilidade de deterioração aeróbia aumentada.

Aditivos

Os aditivos são utilizados para aumentar a segurança da silagem produzida. Esses aditivos incluem inibidores específicos como ácidos e sais, estimulantes da fermentação, substratos fermentáveis e enzimas, além de possíveis combinações de dois desses aditivos.

Diversas revisões técnicas sobre os aditivos foram publicadas nas décadas de 80 e 90, assim como alguns trabalhos específicos, e os mais variados resultados têm sido encontrados, havendo efeitos controversos na literatura para a aplicação de inoculantes. Com respeito a inoculantes biológicos, Pahlow & Honig (1993) sugeriram que os melhores resultados ocorreram quando o teor de MS da forragem esteve entre 20 e 35%. Em teores reduzidos de MS a concentração de CS é baixa e a adição de enzimas e açúcares pode elevar esses teores (Lindgren, 1999), melhorando o perfil fementativo em silagens de gramíneas de clima temperado.

Atualmente o ácido fórmico tem sido utilizado para inibir ou retardar a competição entre microrganismos externos com bactérias epifíticas capazes de produzir ácido lático. Na comparação entre os tratamentos controle, inoculado com BAL e adicionado de ácido fórmico, resumidos na Figura 3, os resultados indicam aumento na qualidade da silagem, expressa na menor concentração de amônia, quando foi adicionado o ácido fórmico. Os dados também demonstram que ocorre maior benefício em silagens com teores mais elevados de MS. Em teores baixos (18% - 1A e 1B) a concentração de CS foi importante para a melhor qualidade (1B), especialmente nas silagens controle e inoculada com BAL.

 


Figura 3 - Variação do teor de amônia (N-NH3) em relação ao teor de MS nos tratamentos experimentais. Fonte: Eurobac, 1990.

Legenda: 1A: MS < 18%, CS (carboidratos solúveis) < 15 g kg-1; 1B: MS < 18%, CS > 15 g kg-1; 2: MS = 18-25%; 3: MS = 25-35% e 4: MS > 35%.

Parâmetros de qualidade

Alguns parâmetros têm sido estabelecidos como critério para a avaliação qualitativa de silagens como: pH, teor de amônia (N-NH3), teor de MS, CS, concentração de ácidos orgânicos (acético, lático e butírico), teor de etanol (Tabela 1) e testes microbiológicos de enterobactérias, esporos, BAL, leveduras e fungos (Tabela 2). Esses parâmetros indicam diferentes aspectos da deterioração da silagem e sua importância consiste em oferecer valores indicativos de estocagem segura, níveis aceitáveis de deterioração e/ou microrganismos potencialmente patogênicos. Se o sistema APPCC pretende ser estabelecido, os parâmetros de qualidade são informações importantes para condições de segurança à que se procura estabelecer. Porém, como há diferentes tipos de culturas a serem ensiladas, diferentes condições de produção, aditivos, dentre outros, há certa dificuldade em se estabelecer limites críticos gerais que caracterizem a variabilidade existente.

 

 


Alguns critérios de relevância (Tabela 3) são usualmente utilizados na literatura como: o pH - indicador da condição de preservação; a concentração de ácido lático na MS - indicador da atividade fermentativa; o teor de CS - passível de ser utilizado para a análise de intensidade de fermentação. Como alguns parâmetros indesejáveis pode-se citar a concentração de ácido butírico e a colonização de esporos clostrídicos.

 


Segura: Silagem potencialmente segura.
Perigo: Risco de crescimento de Clostridium sp. e Listeria sp.
Fonte: Lallemand, 2003.

APPCC na silagem

Após análise dos dados apresentados, fica evidente que o processo de produção de silagem está sujeito a falhas que podem afetar a saúde animal, o valor nutritivo e energético da silagem e os produtos oriundos de animais alimentados com esse tipo de volumoso. As conseqüências econômicas e sanitárias desses efeitos são difíceis de serem estimadas.

A orientação para a produção de silagens seguras do ponto de vista sanitário depende da aplicação de conceitos de Boas Práticas de Agricultura (BPA). Essas práticas, por sua vez, dependem dos cuidados dispensados durante a fertilização das culturas, prevenindo a contaminação por solo durante o corte ou emurchecimento e o rápido carregamento no silo para evitar-se a contaminação e a entrada de oxigênio na massa.

Mesmo com a aplicação de BPA a complexidade do sistema de produção de silagem é afetada por outros aspectos como clima, baixos níveis de CS, baixa capacidade de colonização da flora epifítica, entre outros que estão além do controle do produtor.

A segurança alimentar inicia-se na fazenda, existindo íntima conexão entre o histórico e a qualidade final à mesa do consumidor ("from stable to table"). A aplicação dos princípios de APPCC, juntamente com BPA pode ser um caminho para melhorar a segurança na produção de silagem, auxiliando a segurança da alimentação humana.

O pré-requisito para a introdução do APPCC é a identificação dos perigos que normalmente ocorrem e os seus pontos críticos. Uma maneira de se iniciar esse procedimento seria, por exemplo, baseado na adoção de aditivos. Entretanto, os efeitos desse uso são segmentados e não sistematicamente evidenciados, ou seja, são efetivos apenas em algumas fases do processo de ensilagem, sendo ineficientes ou mesmo prejudiciais em outras. Um segundo passo seria a predição de modelos para estabelecer ou considerar a diversidade de fatores que afetam o produto final. Esses modelos devem resumir o conhecimento existente e indicar a provável qualidade do produto final em relação aos procedimentos adotados.

Conclusões e comentários

Na Tabela 4 estão resumidos alguns parâmetros que devem ser considerados em silagens estáveis. As BPA devem ser aplicadas como a base na produção de silagem com vista à segurança sanitária. A aplicação do sistema APPCC é uma ferramenta adicional para esse aspecto de seguridade na produção de silagem. Para a adoção do APPCC o processo deve ser predito em modelos que poderão indicar a qualidade final do produto com vistas aos procedimentos tomados. Há necessidade de se reavaliar alguns critérios usados como indicativos da qualidade da silagem, como por exemplo, o pH.

 


Fonte: Mahanna, 1997.

Literatura consultada

BAIRD-PAKER, A.C. Organic acids. In: Microbial Ecology of Foods. New York: Academic Press, 1980. p.126-135.
EUROBAC CONFERENCE. Grass and forage report. In: EUROBAC CONFERENCE, 3. Uppsala, 1990. Proceedings. Uppsala: Swedish University of Agricultural Science.
LINDGREN, S. Can HACCP principles be applied for silage safety? In: INTERNATIONAL SILAGE CONFERENCE, 12. Uppsala, 1999. Proceedings. Uppsala: Swedish University of Agricultural Sciences, 1999. p.51-66.
LALLEMAND. Program QSP - Quality Safety Profitability for grass silages. 2003.
LINDGREN, S.; JONSSON, A.; PETTERSSON, K; KASPERSSON, A. Microbial dynamics during aerobic deterioration of silage. Journal of the Science of Food and Agriculture, v.36, p.765-774, 1985.
McDONALD, P.J.; HENDERSON, A.R.; HERON, S.J.E. The biochemistry of silage. 2.ed. Mallow: Chalcombe Publications, 1991. 340p.
OLDENBURG, E. Mycotoxins in conserved forage. In: FORAGE CONSERVATION 2000, Völkenrode, 1991. Proceedings. Völkenrode: LANDBAUFORSCHUNG, 1991. p.177-199.
PAHLOW, G.; HONIG, H. Dry matter losses during storage and unloading as influenced by different types of silage additives. In: INTERNATIONAL SILAGE CONFERENCE, 10. Aberystwyth, 1993. Proceedings. Aberystwyth: Publication Section Stapledon Library & Information Service, 1993. p.118-119.
SEALE, D.R. Bacterial inoculants as silage aditive. Journal of Applied Bacteriology, Supplement, p.9S-26S, 1986.
WEINBERG, Z.G.; MUCK, R.E. New trends and opportunities in the development and use of inoculants for silage. FEMS Microbiology Reviews, v.19, p.53-68, 1996.
WOOLFORD, M.K. The detrimental effects of air in the silage. Journal of Applied Bacteriology, v.68, p.101-116, 1990.
________________________________________________
1Médico Veterinário, Mestre em "Ciência Animal e Pastagens" - USP/ESALQ
2Professor do Departamento de Zootecnia - USP/ESALQ - Piracicaba, SP

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