Quando vamos às gôndolas dos supermercados ou no preparo de um prato, é comum nos depararmos com manteiga e margarina e algumas dúvidas surgirem: Qual é mais saudável? Qual promove maiores benefícios à saúde? Qual faz mal? Qual devemos comprar? Quais as diferenças entre elas? Por que a manteiga é mais cara? Neste artigo, iremos apresentar as diferenças entre os dois produtos, visando compreender a composição e os aspectos nutricionais de ambos.
A manteiga é um produto lácteo amplamente utilizado na culinária brasileira devido à sua versatilidade e sabor. Ela é comumente usada em receitas doces e salgadas por sua facilidade de derretimento, capacidade de melhorar o sabor e a textura dos alimentos, promover sensação de saciedade devido à gordura láctea e ter um ponto de fumaça adequado para cozinhar em fogo médio. Além disso, desempenha um papel importante na nutrição humana.
Em 2015, nos Estados Unidos, o consumo de manteiga e misturas de manteiga aumentou 4,2%, enquanto o consumo de margarina diminuiu 8,9%, uma mudança atribuída à crescente preocupação dos consumidores com a saúde (MILKPOINT, 2016). No Brasil, em 2017, o consumo médio de manteiga por pessoa ao ano aumentou para 460 gramas (FERREIRA et al., 2019). Esse aumento no consumo de manteiga está relacionado à busca por uma alimentação mais saudável e tem gerado debates sobre os efeitos desse consumo na saúde.
Qual a diferença entre manteiga e margarina?
Apesar de semelhantes no uso culinário, a composição da manteiga e da margarina são diferentes. Segundo a legislação brasileira, a manteiga é um produto composto por gordura láctea (no mínimo 80%), obtido exclusivamente pela bateção e malaxagem, com ou sem modificação biológica do creme pasteurizado (que deve ser derivado unicamente do leite de vaca) (BRASIL, 1996). A margarina, por sua vez, é o produto cujo teor de gordura varia entre 10% a 90% e encontra-se na forma de emulsão estável plástica ou fluida (principalmente do tipo água em óleo). Em sua composição estão presentes água, óleos ou gorduras de origem animal ou vegetal, mas também pode ser adicionada de outros ingredientes, como creme de leite e aromatizantes (BRASIL, 2019).
A Tabela 1 apresenta as principais diferenças entre manteiga e margarina.
Por muitos anos a margarina foi amplamente produzida a partir da hidrogenação de óleos vegetais, mas atualmente é produzida a partir do processo de interesterificação, enquanto a produção de manteiga depende de diversos fatores internos e externos associados à alimentação, saúde e bem estar do animal, bem como da qualidade dos processamentos aplicados nas indústrias de laticínios durante o beneficiamento do creme de leite.
A hidrogenação de óleos vegetais é um processo químico usado para solidificar óleos insaturados, tornando-os semelhantes às gorduras saturadas à temperatura ambiente. Isso envolve a adição de hidrogênio a óleos, como soja ou canola, sob alta pressão e na presença de um catalisador, como níquel. No entanto, esse processo também gera ácidos graxos trans, que são encontrados em pequenas quantidades em alimentos de origem animal (RODRIGUES & CASTEJON, 2021).
A gordura trans pode causar graves problemas de saúde, incluindo aumento do colesterol LDL (associado a doenças cardíacas), diminuição do colesterol HDL (benéfico para a saúde cardíaca), inflamação, questões metabólicas (como resistência à insulina) e complicações na gravidez, afetando a saúde de recém-nascidos. Devido aos riscos à saúde associados ao consumo excessivo de gordura trans, muitos países implementaram regulamentações para restringir seu uso em alimentos processados.
No Brasil, a RDC 332 estabeleceu um limite de 2g de gordura trans por 100g de gordura total em óleos refinados industriais, bem como em alimentos para consumo direto ou serviços de alimentação (BRASIL, 2019). Como resultado, as indústrias alimentícias e lácteas reformularam seus produtos para reduzir ou eliminar a gordura trans. Portanto, ao escolher margarina, é aconselhável verificar o rótulo nutricional e optar por produtos com baixo ou nenhum teor de gordura trans.
A interesterificação é um processo que reorganiza ácidos graxos em triglicerídeos, sem hidrogênio, diferente da hidrogenação. Isso modifica a estrutura das gorduras sem criar ácidos graxos trans. As vantagens incluem ausência de ácidos graxos trans, perfil nutricional melhor com óleos vegetais saudáveis e flexibilidade na formulação de margarina para sabor e textura.
Por outro lado, a interesterificação é um processo tecnologicamente mais complexo do que a hidrogenação, exigindo tecnologia avançada e sendo mais dispendiosa devido à sua complexidade e necessidade de equipamentos específicos. Também pode afetar o perfil sensorial dos consumidores, alterando o sabor e a textura da margarina, dependendo do método de interesterificação e dos óleos utilizados (FALCÃO, 2015).
Nutricionistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro apontam que estudos sobre a gordura interesterificada em humanos são limitados e controversos, devido à falta de informações nos rótulos da margarina e à variedade de ácidos graxos usados. Mais pesquisas são necessárias para entender seu impacto no metabolismo humano. Estudos em animais indicam problemas metabólicos e inflamação, enquanto em humanos, há evidências de aumento do LDL em pessoas com alto colesterol e maior triglicerídeos após refeições em indivíduos obesos. Isso sugere que a gordura interesterificada pode afetar de maneira diferente pessoas saudáveis e aquelas com risco de problemas cardíacos e metabólicos (LANUTRI, 2023).
Por que consumir manteiga?
A manteiga é rica em mais de 400 tipos de ácidos graxos essenciais, muitos exclusivos dela. Triacilgliceróis compõem mais de 96% dos seus lipídios. Devido ao seu alto teor de gordura saturada, a manteiga foi erroneamente vinculada a doenças cardíacas e aumento do colesterol, tornando-se considerada prejudicial à saúde quando consumida em excesso. A manteiga é composta por, pelo menos, 80% de gordura total, com cerca de 50% a 60% sendo gordura saturada. A OMS sugere limitar a ingestão de gordura saturada a 10% das calorias diárias.
Para um adulto com consumo de 2.000 calorias por dia, isso equivale a no máximo 20 gramas de gordura saturada. Uma colher de sopa de manteiga (10 gramas) geralmente não ultrapassa essa quantidade, contendo cerca de 6 gramas de gordura saturada, o que indica que o consumo moderado de manteiga está de acordo com as recomendações da OMS.
A manteiga é uma boa fonte de nutrientes essenciais, como ácidos graxos de cadeia curta, vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K2), minerais (selênio e iodo) e ácidos graxos essenciais (como ômega-6, ômega-3 e ácido linoleico conjugado). Esses nutrientes desempenham funções vitais no corpo. A vitamina K2, presente na manteiga, está associada à saúde cardiovascular, saúde dental, metabolismo adequado do cálcio e possivelmente à proteção dos neurônios e do sistema nervoso. Mais pesquisas são necessárias para entender completamente seus efeitos (KHALIL et al., 2021).
O ácido linoleico conjugado (CLA) é um ácido graxo poliinsaturado associado ao controle de peso, prevenção de câncer, redução da pressão arterial e outros benefícios para a saúde (BADAWY et al., 2023). A gordura láctea contém ácido butírico, ligado à saúde intestinal e imunológica, e estudos sugerem que o consumo de gordura láctea pode reduzir o risco de condições metabólicas como diabetes tipo 2 e síndrome metabólica. Uma dieta equilibrada, com alimentos como frutas, legumes, grãos integrais e atividade física regular, ajuda a equilibrar os efeitos da gordura láctea no organismo (KRAUSE et al., 2007). É importante ressaltar que as respostas do organismo ao consumo de gordura láctea variam de pessoa para pessoa devido aos fatores genéticos, metabólicos e condições de saúde individuais.
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Referências Bibliográficas
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LANUTRI. A Substituição de Gordura Trans por Gordura Interesterificada é Mesmo Benéfica? Laboratório de Avaliação Nutricional. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Disponível em: https://lanutri.injc.ufrj.br/2020/04/06/a-substituicao-de-gordura-trans-por-gordura-interesterificada-e-mesmo-benefica/
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RODRIGUES, T. S., & CASTEJON, L. V. (2021). Pesquisas e publicações sobre o processo de hidrogenação de óleos em margarinas utilizando catalisadores. Research, Society and Development, 10(7). https://doi.org/10.33448/rsd-v10i7.16392