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Leite exige planejamento de longo prazo

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 11/08/2000

4 MIN DE LEITURA

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Marcelo Pereira de Carvalho

Se fossemos camelôs, poderíamos ter inúmeras desvantagens e obstáculos, mas também teríamos lá nossos pontos fortes: se as vendas estivessem fracas (ou se a polícia baixasse ...), provavelmente não seria difícil mudar o local ou a variedade de produtos, dando um guinada no negócio da noite para o dia. Esta flexibilidade permite que se trabalhe com algum grau de aventura, tornando-se menos necessária a avaliação meticulosa dos riscos inerentes ao negócio e até dispensando o planejamento de longo prazo.

Ao contrário, há atividades nas quais não se altera o rumo do negócio da noite para o dia. A produção de leite é uma delas e é fácil entender porquê. O próprio tempo decorrente entre uma geração de animais e a seguinte é longo, pelo menos 2 anos, de forma que grandes mudanças por exemplo em genética só se farão sentir ao cabo de alguns anos, diferentemente do que ocorre por exemplo com aves ou mesmo suínos, atividades que possuem uma taxa de reposição significativamente mais rápida. A demora entre uma geração e outra traz, em contrapartida, maior valor àqueles que têm rebanhos selecionados ao longo de décadas.

Além disto, não se pode definir um sistema de produção de leite sem estabelecer quais recursos forrageiros serão empregados. A definição por estes recursos, por sua vez, representa um caminho sem volta no curto prazo, a não ser sob provável prejuízo. Algumas culturas têm custo de implantação que precisa ser amortizado em determinado número de anos, sendo exemplos as pastagens e a cana-de-açúcar. Caso o produtor decida pelo uso de milho, por outro lado, é necessário investimento em maquinário agrícola próprio, cujo abandono precoce também representará prejuízo.

É verdade que uma eventual tercerização total da produção de alimento tende a minimizar esta característica mas, convenhamos, trata-se de uma possibilidade ainda longe de ser realidade e, mesmo que venha a ocorrer, o tipo de alimento empregado de está, em maior ou menor grau, relacionado ao tipo de gado explorado e instalações disponíveis (ex: não há sentido em utilizar alfafa para animais mestiços, ou confinar vacas de alto potencial, em free stall, recebendo cana-de-açúcar). O investimento em instalações, finalmente, é um aspecto que ancora a fazenda, reduzindo em muito a capacidade de se inovar.

Falando em âncora, a pecuária de leite teria, desta forma, a flexibilidade de manobra de um transatlântico, caracterizada pela interação animal explorado-instalações-alimento volumoso. Um parêntesis: é claro que esta amarração não é definitiva; há propriedades que alteraram sistema de produção, instalações e mesmo animal explorado com relativa agilidade e com sucesso. Diria mais: a aceitação pura e simples desta inflexibilidade leva, em última instância, ao fracasso (o transatlântico segue em linha reta, até a colisão). É preciso entender, contudo, que em pecuária de leite não se muda da noite para o dia, dada a configuração básica exigida para que a fazenda rode. Quando isto é feito, a chance se erro é elevada e hoje não se pode errar muito mais. Há, ainda, outro fator: a inflexibilidade na definição do preço e do tipo de produto comercializado (compare com o camelô, que pode alterar rapidamente seu portfólio). Esta soma de inflexibilidades explica, em parte, a relutância de alguns produtores em deixar a atividade mesmo tendo resultados pífios por anos e anos. Sempre há um investimento a ser recuperado, seja em instalações, animais ou maquinário.

A implicação desta realidade é que, quando decididas, as manobras devem ser certeiras, pois pode não haver espaço para meia-volta. Para ser certeiras, é preciso que sejam bem planejadas e bem executadas. O que se vê, em muitos casos, são produtores pouco preocupados com o planejamento de suas ações, tão absortos que estão com a condução do a dia-a-dia da propriedade. Embora pareça chavão de consultor, análises do tipo "como estará sua propriedade daqui a 5, 10 anos ?" fazem todo o sentido. Por mais que tais avaliações sejam carregadas de doses variadas de "achismo", acabam por estimular a reflexão, o levantamento de números, a análise de cenários. E, com isto, abre-se a possibilidade de evolução.

O pouco tempo dedicado ao planejamento aparece de outras formas. Quantas são as fazendas que controlam índices técnicos? Que projetam o crescimento do rebanho? Que avaliam a variação dos custos? Poucas, muito poucas ainda. É exatamente por isto que, às portas do século XXI, custo de produção de leite no Brasil é um assunto quase tão obscuro quanto a existência de vida fora da Terra. Será que na área industrial ou comercial também é assim? Será que uma Ford ou uma Microsoft não sabem o custo de seus produtos? Difícil.

O entendimento desta característica intrínseca da pecuária de leite é fundamental para todos aqueles que desejam evoluir como produtores de leite. O entendimento do imobilismo e do risco de mudanças drásticas é a maior garantia de mudar com sucesso. É preciso avaliar e planejar, antes de executar. Afinal, produtor de leite não é camelô.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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