O que são bebidas lácteas não fermentadas?
No Brasil, a Instrução Normativa nº 16, de 23 de agosto de 2005, que aprova o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de Bebida Láctea, a define como o produto lácteo resultante da mistura do leite (in natura, pasteurizado, esterilizado, UHT, reconstituído, concentrado, em pó, integral, semidesnatado ou parcialmente desnatado e desnatado) e soro de leite (líquido, concentrado e em pó), adicionado ou não de produtos ou substâncias alimentícias. A base láctea deve representar pelo menos 51% do total de ingredientes do produto (BRASIL, 2005).
No caso das bebidas lácteas não fermentadas não deve haver adição de cultivos de microrganismos ou de produtos lácteos fermentados. No entanto, é opcional a adição de outros produtos ou substâncias alimentícias, como gordura vegetal, açúcares, aromatizantes e compostos lácteos. Além disso, é obrigatório que o produto seja submetido a tratamento térmico adequado (BRASIL, 2005).
Normalmente, para conferir aroma e sabor visando melhorar aceitação do produto, adiciona-se concentrados de frutas, chocolate em pó, mel, açúcares e outros ingredientes, que são distribuídos homogeneamente pelo leite e determinam o sabor final do produto.
Processamento de bebidas lácteas não fermentadas
Em geral, as bebidas lácteas são fabricadas a partir do soro do leite, que é um coproduto obtido durante a fabricação de queijos. O soro representa de 85-90% do volume de leite utilizado na fabricação de queijos, contendo aproximadamente 55% dos nutrientes (PIRES et al., 2021). Por isso, atualmente é muito utilizado como ingrediente, como por exemplo na fabricação de bebidas lácteas, sendo fonte de proteínas de elevado valor nutricional, lactose, minerais e vitaminas hidrossolúveis. A Tabela 1 mostra uma comparação da composição nutricional do leite integral, soro de leite e uma bebida láctea comercial, contendo 60% de soro.
Tabela 1. Principais diferenças na composição do leite, soro de leite e bebida láctea
Para a fabricação de bebidas lácteas não fermentadas, o soro deve ser de boa qualidade microbiológica, e, de preferência, processado logo após a fabricação dos queijos (PACHECO et al., 2022). O leite fresco adicionado também deve ser de boa qualidade microbiológica e geralmente apresenta um teor de gordura padronizado para 3%. O volume de leite a ser adicionado ao soro deve ser calculado em função do teor de proteína final, para que a bebida possa ser enquadrada no Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de Bebida Láctea (BRASIL, 2005).
Do ponto de vista industrial, a tecnologia de processamento de bebidas lácteas não fermentadas (Figura 1) é simples e apresenta baixo custo (PACHECO et al., 2022). Basicamente, realiza-se a mistura do soro com o leite, e posteriormente tem-se a adição dos ingredientes opcionais, como sacarose (em concentrações de 5-8%) ou edulcorantes, aromatizantes, corantes (que podem ser pigmentos naturais e bioativos, como β-caroteno e luteína), ingredientes para conferir sabor, como cacau ou preparados à base de frutas (em concentrações de 3-5%) e espessantes e/ou estabilizantes, visando manter a viscosidade e a estabilidade da bebida durante a vida de prateleira (BRASIL, 2005).
Figura 1. Fluxograma de processamento das bebidas lácteas não fermentadas
Fonte: Autoria própria
Após a mistura dos ingredientes, é realizada a homogeneização, que tem como principal objetivo promover a redução dos glóbulos de gordura, a fim de não haver separação de fases durante o armazenamento do produto. Normalmente, essa etapa está associada à produção em larga escala, devido aos custos elevados para aquisição e manutenção do homogeneizador.
Em seguida, ocorre o tratamento térmico, que pode ser a pasteurização (lenta à 65 °C por 30 minutos ou rápida à 72 °C por 12-15 segundos) ou a esterilização à 130- 150°C por 2-4 segundos. Por fim, a bebida láctea é resfriada para 5 °C e o envase e armazenamento são feitos sob refrigeração (5 °C), exceto para as bebidas esterilizadas pelo método UHT, no qual realiza-se o resfriamento, envase asséptico e estocagem do produto em temperatura ambiente (PACHECO et al., 2022).
Além da simples tecnologia de processamento, a fabricação de bebidas lácteas é viável do ponto de vista econômico devido ao aproveitamento do soro da indústria de laticínios. Para os consumidores é uma opção atrativa do ponto de vista sensorial e nutricional, uma vez que, o produto abrange conceitos de saudabilidade, inovação e sustentabilidade.
Comercialmente é possível encontrar diversas opções de bebidas lácteas que buscam atender a demanda dos consumidores, dentre os quais se destacam as bebidas isentas de lactose, com baixo teor de açúcares, além das opções suplementadas com proteínas, vitaminas, minerais e fibras (CARVALHO et al., 2007; PACHECO et al., 2022).
Considerações finais
A fabricação de bebida láctea não fermentada constitui uma alternativa viável tecnologicamente para a indústria de laticínios, visto que pode ser facilmente produzida e comercializada desde larga escala até por pequenos produtores, sem a necessidade de grandes investimentos, incluindo o aproveitamento do soro obtido após a fabricação de queijos.
Portanto, a utilização do soro para o desenvolvimento de novos produtos é uma estratégia interessante para reduzir o impacto ambiental e financeiro do seu descarte. Além disso, essas bebidas são nutritivas, sensorialmente aceitas e de baixo custo ao mercado consumidor.
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Autores:
Isabela Soares Magalhães - Nutricionista, Mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos e membro do Laboratório de Inovação no Processamento de Alimentos- LIPA/DTA/UFV.
Viviane Lopes Pereira - Engenheira de Alimentos, Mestre em Ciência de Alimentos e membro do Laboratório de Inovação no Processamento de Alimentos- LIPA/DTA/UFV.
Jeferson Silva Cunha - Bacharel em Ciência e Tecnologia de Laticínios e membro do Laboratório de Inovação no Processamento de Alimentos- LIPA/DTA/UFV.
Danielly Aparecida de Souza - Bacharel em Ciência e Tecnologia de Laticínios e membro do Laboratório de Inovação no Processamento de Alimentos- LIPA/DTA/UFV.
Profa. Dra. Érica Nascif Rufino Vieira - Professora do Departamento de Tecnologia de Alimentos da UFV e coordenadora do Laboratório de Inovação no Processamento de Alimentos- LIPA/DTA/UFV.
Prof. Dr. Bruno Ricardo de Castro Leite Júnior - Professor do Departamento de Tecnologia de Alimentos da UFV e coordenador do Laboratório de Inovação no Processamento de Alimentos- LIPA/DTA/UFV.
Agradecimentos: Os autores agradecem a CAPES - Código Financiamento 001; à Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (FAPEMIG) pelo financiamento do projeto APQ-00388-21; ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo financiamento do projeto (429033/2018-4) e pela bolsa de produtividade à B.R.C. Leite Júnior (n°306514/2020-6).
Referências bibliográficas
BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de Bebida Láctea. Instrução Normativa n.16, de 23 de agosto de 2005. Diário Oficial da União, Brasília, 2005.
CARVALHO, R. F. Ricota e Bebida Láctea. Rede de Tecnologia da Bahia – RETEC. Serviço Brasileiro de Respostas Técnicas – SBRT. Bahia, 2007. Disponível em: https://www.sbrt.ibict.br/dossie-tecnico/downloadsDT/MTQw Acesso em 15 de set. 2023.
PIRES, A. F.; MARNOTES, N. G.; RUBIO, O. D.; GARCIA, A. C.; PEREIRA, C. D. Dairy By-Products: A Review on the Valorization of Whey and Second Cheese Whey. Foods, v. 10, n. 5, p. 1067, 2021. Doi:10.3390/foods10051067
SALATI, P. Leite, soro de leite e bebida láctea: entenda o que são e diferenças nutricionais. 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2022/07/07/soro-de-leite-e-bebida-lactea-o-que-sao-e-quais-as-diferencas-nutricionais-em-relacao-ao-leite-integral.ghtml Acesso em: 13 de set. 2023.
PACHECO, A. F. C., SOUZA, L. B., PAULA, J. C. J., PAIVA, P. H. C., LEITE JÚNIOR, B. R. C. Bebidas lácteas: produção, tendências e desafios. Boletim de Extensão. Universidade Federal de Viçosa, Viçosa - MG. Divisão de Extensão, 2022. 36 p.