Foi nessa empresa que eu tive a grande oportunidade de desenvolver um estágio (entre 2015 e 2016) durante seis meses na área de Controle e Garantia da Qualidade. Agora, tenho um grande prazer em compartilhar, com os leitores do blog Leite no Mundo, do MilkPoint, um pouco da minha experiência e do processo produtivo de um laticínio americano com influências francesas.
Antes desse estágio, a minha experiência com laticínios se baseava em informações de aulas da disciplina de “Laticínios”, que proporcionou uma visita técnica em uma cooperativa processadora de leite e produtora de queijo tipo muçarela.
Após dois anos, a maioria dos dados sobre o tema tinham ficado apenas no caderno e com o estágio nos Estados Unidos, passei a me deparar com todo o processo na prática, termos técnicos e uma chuva de informações expostas em inglês com sotaque francês e algumas vezes, até em espanhol! Mas o medo de não entender durou apenas alguns dias e com o passar do tempo, relembrando todo o aprendizado e com a ajuda do “google translate”, fui entendendo e me apaixonando por cada detalhe da produção.
A empresa fornece diretrizes para garantir uma boa nutrição e bem-estar dos animais nas fazendas. Um consultor especializado viaja da França para os Estados Unidos duas vezes ao ano para oferecer novas informações e tecnologias e garantir que os parâmetros acordados estão sendo cumpridos. Além disso, todos os produtores têm uma linha de comunicação direta com a empresa para tirar qualquer dúvida ou informar qualquer contratempo e grande parte deles já tem contrato firmado com a empresa desde o início, mantendo assim uma relação de proximidade e confiança. No caso de novos produtores, os mesmos passam por auditoria para preencher requisitos que garantam a qualidade na criação dos animais e da matéria-prima ofertada.
As fazendas possuem amplos espaços de pasto onde as cabras vivem livres para procurar pontas de arbustos e árvores ocasionais de folhas largas. Possuem abrigos disponíveis para se protegerem do sol, vento ou chuva. A alimentação dos animais consiste principalmente de alfafa, um tipo de feno altamente proteico. São alimentados de 2 a 3 vezes por dia e para complementar a dieta durante o processo de ordenha, são introduzidos grãos na alimentação para garantir que as cabras tenham todos os nutrientes para produzir um leite equilibrado em proteínas e gorduras que irá resultar em um queijo fresco, de sabor ameno e textura adequada.
Após a descarga do leite, o caminhão passa por higienização do tanque e é lacrado por funcionários da Laura Chenel’s. Esse lacre só é rompido quando for realizada nova coleta de leite na fazenda e um novo lacre é colocado após o tanque estar completo. Essa é uma forma da empresa garantir e evitar que durante o trajeto não ocorra contaminação proposital do produto por terceiros, que a limpeza do tanque foi realizada de forma correta e que a próxima carga será colocada em tanque que foi inspecionado.
Se o leite for aprovado, é descarregado e segue para o tanque de pasteurização que é um processo térmico que visa destruir os patógenos e diminuir o número de micro-organismos em geral da matéria-prima. Esse é um ponto de controle importante pois vale ressaltar que a pasteurização não melhora a qualidade do leite. Se o mesmo tiver uma quantidade elevada de micro-organismos, a atividade deles provoca a acidificação do leite e gera uma matéria-prima de baixa qualidade que interfere no produto final. A pasteurização consiste no aquecimento do leite até atingir 72°C por 15 segundos e imediatamente ele é resfriado até 3°C. Pelas leis americanas, todo leite utilizado na produção de queijo fresco com menos de 60 dias de maturação deve ser pasteurizado.
Após a pasteurização, o leite segue para os tanques de cultura com controle de temperatura e pá agitadora para completar o processo. É adicionado o fermento cuja ação é consumir a lactose (açúcar do leite) e converter em ácido lático. Após algumas horas é adicionado o coalho diluído em água destilada com a função de coagular a caseína (proteína do leite) que completa a fermentação solidificando as proteínas do leite e originando a coalhada. A Laura Chenel’s opta por utilizar o coalho de origem microbiana para atingir o público vegetariano e muçulmano.
A coalhada segue para filtros onde, por meio de uma prensa automática, ocorre a separação do soro que é destinado para empresa produtora de ração. O soro é retirado de maneira rápida e eficiente para controle de acidez da massa. Além da acidez, é controlada a umidade, que interfere no tipo de queijo a ser produzido, sendo alguns com maior teor de umidade e outros menos. Atingida a umidade necessária, a massa é salgada, algumas são temperadas de acordo com o portfólio da marca e são acondicionadas. Os queijos são formatados através de uma máquina extrusora, embalados a vácuo ou colocados em pequenos potes plásticos e seguem para comercialização.
Os queijos são livres de adição de conservantes e aditivos químicos. A cultura de produção da empresa segue os modelos europeus, principalmente os da França. O processo de produção é totalmente automatizado e com o mínimo contato possível dos manipuladores. Os Estados Unidos através da FDA (Food and Drug Administration) órgão regulador de alimentos no país exige que os laticínios possuam um controle rígido em relação a Listeria monocytogenes depois do surto que afetou o país em 1998.
A contaminação é em decorrência de falhas de caráter higiênico-sanitárias sendo os principais alimentos implicados os lácteos. Dessa forma as empresas devem ter um plano de ação detalhado de coletas e análises diárias dessas bactérias. A Laura Chenel’s utiliza de kits de análise de resposta imediata diariamente para o controle na linha de produção.
Esse é um resumo do processo que eu pude presenciar e participar. Ao final, foram 6 meses de inserção nesse mundo maravilhoso da produção de queijos, descobrindo novos processos, sabores, conhecendo novas pessoas, culturas e lugares. Serei sempre agradecida por essa oportunidade que me foi dada pela empresa de me aceitar e compartilhar comigo essa paixão pela forma de produzir, e claro, consumir queijos.