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Leite de transição materno ou formulado: efeitos no crescimento e saúde de bezerros

POR CARLA MARIS MACHADO BITTAR

E ANA PAULA DA SILVA

CARLA BITTAR

EM 03/11/2020

10 MIN DE LEITURA

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Os bezerros são altamente suscetíveis a doenças nas primeiras quatro semanas de vida. As infecções entéricas são comuns na primeira semana de vida, enquanto a ocorrência de doenças respiratórias aumenta da primeira até a quarta semana. Nos EUA, em torno de 25% das bezerras em aleitamento são acometidas por diarreias, das quais 18% necessitam de tratamento com medicamentos. Já a pneumonia afeta 18% das bezerras em fase de aleitamento e 16% dessas recebem tratamento (NAHMS, 2007, 2011). No Brasil, os levantamentos do programa Alta Cria, que compreende produtores bastante focados na criação de bezerras, mostram que 44% e 26% das bezerras têm pelo menos um caso de diarreia e pneumonia, respectivamente (Azevedo et al., 2019). Deste modo, garantir colostragem e nutrição adequada são práticas de manejo fundamentais na prevenção de doenças e para promover o bem-estar e o crescimento dos bezerros, tornando a criação eficiente e o negócio rentável.

O colostro e o leite de transição apresentam propriedades antibacterianas e antivirais devido à presença dos componentes lactoferrina e citocinas pró-inflamatórias, que podem ser uma alternativa para reduzir o uso de antibióticos. É considerado leite de transição aquele obtido a partir da segunda ordenha até aproximadamente a quinta ordenha pós-parto. O leite de transição apresenta concentrações de gordura, proteína, aminoácidos, fatores de crescimento e compostos bioativos superiores aos encontrados no leite integral. Além disso, o fornecimento de colostro e leite de transição adicional auxilia no desenvolvimento do trato gastrointestinal (TGI) de bezerros neonatos.

Várias pesquisas relatam que animais que receberam refeições adicionais de colostro ou leite de transição, apresentaram maior eficiência digestiva, maior capacidade absorção de glicose e menor uso de antibióticos. Embora a administração contínua de colostro para bezerros após 24 horas de vida não resulte em maior absorção IgG, uma vez que o intestino já perdeu sua capacidade de absorver grandes moléculas, a IgG e outras proteínas e minerais podem produzir benefícios localizados no trato digestivo. Portanto, realizar a transição do colostro para a dieta líquida utilizando-se o fornecimento de leite de transição pode ser benéfico para a saúde e consequentemente ao desempenho de bezerros.

Desta forma, o objetivo da pesquisa conduzida por Van Soest et al. (2020) foi avaliar os efeitos do fornecimento do leite de transição materno, sucedâneo suplementado com colostro em pó, ou do sucedâneo sem suplementação sobre o crescimento e a saúde de bezerros.

Para o estudo, foram utilizadas 105 bezerras holandesas recém-nascidas. Para a colostragem, as bezerras foram colostradas com 200 gramas de IgG proveniente de colostro em pó entre duas e seis horas após o nascimento e receberam 100g adicionais de IgG 12 horas após o nascimento. Concluída a segunda refeição com colostro em pó, os animais foram pesados e transferidos paras baias individuais e distribuídos em três tratamentos (Tabela 1), cada um com 35 repetições:

  1. Sucedâneo; 
  2. Leite de transição (LT);
  3. Sucedâneo suplementado com colostro em pó (S+CP)

Os tratamentos foram administrados nas primeiras nove refeições (segundo ao quarto dia de vida). Todas as bezerras receberam o mesmo volume de seus respectivos tratamentos, sendo fornecidos três refeições de 1,89 L por dia às 04:00, 12:00 e 18:00 h (5,67 L no total). O sucedâneo foi diluído para 14% de sólidos/L, fornecendo 1,17 Mcal por alimentação de 1,89 L. O LT foi ordenhado entre a segunda e quarta ordenha após o parto e armazenado a -20°C. Posteriormente, o LT foi descongelado à temperatura ambiente, agrupado e pasteurizado a 71,7°C por 15s. Após a pasteurização o LT foi armazenado em sacos plásticos selado com volume de 1,89L e congelado a −20°C até a alimentação. O descongelamento foi em banho-maria com temperatura da água de 41°C. O LT foi calculado para conter 1,44 Mcal de EM em 1,89L. O S+CP continha 147g (MS) de sucedâneo e 143g (MS) de colostro em pó por alimentação. O tratamento S+CP foi projetado para simular uma dieta de transição semelhante ao leite de transição, fornecendo aos bezerros 15g/L de IgG e 1,28 Mcal de EM em 1,89L.

Tabela 1. Composição química do sucedâneo, leite de transição e da mistura 1:1 de sucedâneo e colostro em pó para bezerros de 2 a 4 dias de idade, ingestão de nutrientes e GMD esperado.

Os animais tiveram acesso livre a água e concentrado inicial desde o segundo dia de vida. Posterior o fornecimento da última refeição dos protocolos de transição, todos os bezerros foram manejados e alimentados de forma semelhante. O sucedâneo foi fornecido de forma programada, em que até 14 dias receberam 0,8 kg/dia (MS) em 3 refeições diárias; 15 a 41 dias de idade, 1,2 kg/dia (MS)  em 3 refeições diárias; 42 a 48 dias de idade, 0,8 kg/ dia (MS) em 2 refeições diárias; e dos  49 aos 56 dias de idade, 0,4 kg/ dia (MS) fornecido em uma alimentação. O desaleitamento ocorreu aos 56 dias.

Os parâmetros de saúde avaliados foram: escore fecal, posicionamento da orelhas e secreção ocular, tais parâmetros recebiam pontuações do intervalo de 0 a 3, onde: 0 representava parâmetros normais e escore 3 sintomas graves. Essas pontuações foram somadas e posteriormente calculado uma média por tratamento. Também foram colhidas amostras de sangue com 14 e 21 dias de vida para avaliar as concentrações de haptoglobina e proteína de ligação ao LPS (LBP), indicadores de estresse agudo. Os dados foram analisados usando o procedimento MIXED no SAS (versão 9.4 SAS Institute Inc., Cary, NC).

Os diferentes programas de transição não afetaram os parâmetros de saúde (Tabela 2). Apenas 17% dos bezerros necessitaram de tratamentos e a taxa de mortalidade foi < 1%, o que provavelmente dificultou a detecção de diferenças nos parâmetros de saúde em função do programa de transição. Fornecer leite de transição materno ou formulado (S+CP) reduziu as concentrações de haptoglobina em relação ao Sucedâneo (Tabela 2).  A concentração de haptoglobina aumenta em resposta a estímulos inflamatórios, dessa forma os tratamentos LT e S+CP diminuíram inflamações gerais no período de sete a 21 dias de idade. Bezerros são considerados saudáveis quando a concentração de haptoglobina é <50 μg/mL (Gelsinger et al., 2016). Isso indica que os bezerros deste estudo eram saudáveis, com concentração média adequada e com valores abaixo de ambos os limiares para todos os programas de transição.  No geral, o tratamento não afetou os parâmetros de saúde, possivelmente devido à boa higiene da fazenda onde foi realizado o estudo ou também devido ao fornecimento adicional de composto bioativos e IgG nas dietas não ter sido adequado para obter um benefício.

Tabela 2. Biomarcadores de inflamação e escores de saúde (pontuação média por bezerro para os primeiros 21 dias de idade)


1Contraste sucedâneo vs. LT e S+CP; 2 Contraste LT vs. S+CP, 3 Média dos escores diárias de saúde durante os primeiros 21 dias; 4 Amostras de haptoglobina aos 14 e 21 dias; 5 Amostras de proteína de ligação ao LPS aos 14 e 21 dias

O leite de transição e o S+CP aumentaram o ganho de peso em 3,0 kg (P=0,02; Tabela 3) durante o período de aleitamento, com ganhos de peso de 34,2 kg e 34,3 kg, quando comparado ao Sucedâneo (31,3 kg) e não houve diferença entre LT e S+CP (P=0,9). O GMD foi de 0,56 kg para os animais que receberam sucedâneo sem suplementação, enquanto os bezerros que receberam LT e S+CP apresentaram GMD de 0,62 kg durante o período de aleitamento.  Com base nas equações do NRC 2001, a energia adicional consumida pelos animais dos tratamentos LT e S+CP quando comparado aos bezerros que receberam somente sucedâneo no período de transição seria responsável pelo maior GMD e também pela diferença de 3,0 kg ao desaleitamento.

Alimentações adicionais com colostro ou LT fornecem não apenas nutrientes adicionais, mas também outros componentes bioativos benéficos, como IgG, insulina, vitaminas A, E e B12, manganês, ferro, cobalto, zinco, riboflavina e colina. Além disso, LT é conhecido por conter microRNAs e proteínas bioativas, e por isso o colostro e LT promovem o desenvolvimento precoce do TGI e estimula a imunidade local no intestino. Os autores especularam que esses compostos presentes no LT ou no S+CP também promoveram o desenvolvimento intestinal mais precoce e proteção local, resultando em maior ganho de peso. Eles também sugeriram que este fator pode apresentar benefícios a longo prazo, pois o aumento da ingestão de nutrientes, acompanhado de taxas de crescimento mais elevadas, pode acelerar a idade a primeira concepção e aumento da produção de leite durante a primeira lactação.

Tabela 3. PV inicial, peso ao desaleitamento e ganho para bezerros alimentados com dietas experimentais

1Contraste sucedâneo vs. LT e S+CP; 2 Contraste LT vs. S+CP

O fornecimento de nutrientes adicionais e compostos bioativos na forma de LT ou colostro em pó durante os primeiros 4 dias de vida melhora o desempenho de bezerros até o momento do desaleitamento e também reduz as concentrações de haptoglobina sérica. Fornecer LT ou S+CP nos primeiros 4 dias de vida pode melhorar a saúde e aumentar a taxa de ganho de peso vivo dos bezerros, pois a mudança abrupta do colostro para a dieta líquida exclui uma importante fase nutricional, na qual as vacas produzem uma secreção rica em nutrientes e energia contendo hormônios e bioativos importantes para o desenvolvimento. Dessa forma, explorar estratégias nutricionais para aumentar o crescimento dos bezerros nos primeiros dias de vida oferece potencial para melhorar o ganho de peso e a saúde durante os períodos pré e pós- desaleitamento.

Comentários

Embora a própria natureza demonstre ser importante a transição do consumo de colostro para o leite, muitos produtores não adotam esta prática devido a problemas com a logística e também com o armazenamento do leite de transição. No entanto, a possibilidade de se mimetizar o leite de transição fazendo-se a diluição de colostro em pó em leite integral ou sucedâneo aparece como uma alternativa viável. O estudo mostrou de forma bastante clara os efeitos em longo prazo do fornecimento de leite de transição no ganho de peso dos animais, com animais mais pesados ao desaleitamento. Embora a discussão do artigo tenha maior foco no consumo adicional de nutrientes em função do fornecimento de leite de transição, levanta ainda a possibilidade de efeitos de compostos bioativos na maturação intestinal. Como o desafio sanitário foi pequeno, não houve possibilidade de se avaliar os efeitos na saúde dos animais. Mas outros trabalhos sugerem menores taxas de morbidade quando o leite de transição é fornecido. Entender mais sobre esta dieta líquida e sua importância na maturação intestinal, seus efeitos na saúde e desempenho em curto e longo prazo pode auxiliar no planejamento de protocolos de alimentação do recém-nascido, assim como já existe para a colostragem. Assim como em outros momentos da vida de bovinos leiteiros, transição é um fator importante que deve ser incorporado no programa alimentar. Fazer a transição do colostro para a dieta de aleitamento (leite ou sucedâneo) pode trazer benefícios em saúde e desempenho de bezerras leiteiras. Por que não experimentar? 

Referências

Azevedo et al., 2019. Alta CRIA 2019, 2019. Rafael Alves de Azevedo, Leoni Ferreira Martins, Paula Marques Tiveron, Alex de Matos Teixeira, Carla Maris Machado Bittar, Lívia Carolina Magalhães Silva Antunes, José Eduardo Portela Santos, Polyana Pizzi Rotta, Rodrigo Melo Meneses e Sandra Gesteira Coelho: Uberaba, Minas Gerais, 2019. 1ª Edição. DOI: https://dx.doi.org/10.26626/978-85-5953-053-7.2019B0001.

Gelsinger, S. L., F. Pino, C. M. Jones, A. M. Gehman, and A. J. Heinrichs. 2016. Effects of a dietary organic mineral program including mannan oligosaccharides for pregnant cattle and their calves on calf health and performance. Prof. Anim. Sci. 32:205–213. https: //doi .org/10.15232/pas .2015-01475.

NAHMS (National Animal Health Monitoring System). 2007. Dairy 2007. Part I: Reference of Dairy Health and Management in the United States, 2007. United States Dept. Agric., Anim. Plant Health Inspec. Serv., Vet. Serv., Fort Collins, CO. https://www.aphis.usda .gov/animal health/ nahms/ dairy/index.shtml.

NAHMS (National Animal Health Monitoring System). 2011. Dairy 2011. Dairy Heifer Raiser, 2011. United States Dept. Agric., Anim. Plant Health Inspection. Serv., Vet. Serv., Fort Collins, CO. https://www.aphis.usda.gov/animalhealth/nahms/dairy/index.shtml.

Van Soest, B., F. Cullens, M. J. VandeHaar, and M. Weber Nielsen. 2020. Short communication: Effects of transition milk and milk replacer supplemented with colostrum replacer on growth and health of dairy calves. J. Dairy Sci. 103. https://doi.org/10.3168/jds.2020-18361.

CARLA MARIS MACHADO BITTAR

Prof. Do Depto. de Zootecnia, ESALQ/USP

ANA PAULA DA SILVA

Mestranda em Ciência Animal e Pastagens, ESALQ/USP

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THIAGO TOIGO CAMARA

AQUIDAUANA - MATO GROSSO DO SUL - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 21/01/2021

Boa Noite Carla,
sobre a silagem de colostro, qual a recomendação mais eficiente?? É bom para a bezerra, Qual idade iniciar o fornecimento, Qual a diluição correta, dilui com agua ou com leite??

Estou pesquisando na literatura, porém não consigo chegar na melhor estratégia.
NIZA HELENA ALVES CANESTRI DE OLIVEIRA

SÃO TOMÉ DAS LETRAS - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 16/11/2020

Olá Carla!
Usar o leite de transição na alimentação das bezerras realmente trás estes resultados, vejo no campo.

Nas fazendas maiores, e principalmente quando ocorre concentração de partos, oi então quando já tratamentos de muitas vacas. Tenho dificuldade com a mão de obra.
Como e vocês fazem a separação deste leite na rotina das fazendas maiores, devido ao sistema de ordenha, a ordem de ordenha dias lotes.

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