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Efeito de horários irregulares de alimentação sobre o comportamento e crescimento de bezerros leiteiros

POR CARLA MARIS MACHADO BITTAR

E LUCAS SILVEIRA FERREIRA

CARLA BITTAR

EM 18/06/2008

11 MIN DE LEITURA

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1. Introdução

No Radar técnico anterior citamos a consistência no manejo dos animais, ou a rotina, como um aspecto importante na criação de bezerros de rebanhos leiteiros. A previsibilidade de rotinas de manejo, tais como ordenha, alimentação ou inspeção dos animais não tem recebido muita atenção em estudos do impacto destes fatores no comportamento e bem-estar animal.

O presente experimento foi realizado para avaliar o impacto da previsibilidade da alimentação no bem-estar animal. Trabalhos mostram que muitos processos fisiológicos e comportamentais seguem ritmos circadianos, controlados principalmente pelo comprimento do dia (Mrosovsky et al., 1989; Mistlberger, 1994). No entanto, alguns processos e atividades preventivas podem ser modificados através da manipulação da rotina de alimentação dos animais. Isso indica que há pelo menos dois sistemas capazes de controlar o ritmo dos processos biológicos. Um deles é conduzido por um ritmo, ajustado pelo comprimento do dia, mas não afetado por estímulos externos tais como alimentação, mas dependente de outros estímulos externos.

Vários experimentos têm relacionado a perda de previsibilidade ou o controle no desenvolvimento de neurose experimental em animais (Mineka e Kihlstrom, 1978). Outros estudos demonstraram que eventos previsíveis podem causar mais estresse para os animais do que acontecimentos imprevisíveis.

Ainda não está claro como rotinas variáveis de manejo nas propriedades agrícolas podem afetar o bem-estar dos animais, e se o efeito sobre o bem-estar é positivo ou negativo. O estudo de Johannesson et al. (2000) aborda duas questões: 1) Uma rotina de alimentação imprevisível afeta o comportamento, a produção leiteira ou a saúde dos animais; 2) Fazer com que os animais que utilizam uma rotina de alimentação previsível reajam positivamente a desvios ocasionais, em relação aos animais que são alimentados de acordo com uma rotina imprevisível.

2. Material e métodos

2.1. Alojamento
Os animais foram mantidos em duas unidades idênticas, na mesma instalação, mantida a temperatura de 20ºC, sendo as luzes desligadas a partir das 15:00 h até as 07:00 h, exceto por um período de 30 min para inspeção diariamente as 22:00 horas. Quando o comportamento foi gravado durante as noites, as luzes permaneceram acesas. Os animais foram mantidos em baias individuais (0,85 x 1,85 m) com piso de concreto coberto com 5-15 cm de palha, trocada diariamente.

2.2. Animais
Trinta e seis bezerros da raça Holandesa, de ambos os sexos, foram utilizados no experimento, porém apenas 24 bezerros foram submetidos às gravações comportamentais. Estes animais foram selecionados aleatoriamente
dentro de cada tratamento. Os bezerros foram separados de suas mães imediatamente após parto, receberam colostro e foram alimentados com 2 litros de leite, com balde, duas vezes por dia. A quantidade foi gradualmente aumentada até um máximo de 2 x 4,5 L de leite/dia. Todos os animais tinham livre acesso a feno, concentrado e água. Para minimizar a variação da idade dentro dos grupos, as observações comportamentais foram conduzidas em paralelo com dois ensaios, com 12 bezerros - quatro de cada tratamento - em cada ensaio. O primeiro julgamento ocorreu duas semanas mais cedo do que o segundo. Os dados provenientes dos dois ensaios foram agrupados para a análise estatística.

2.3. Tratamentos
No quinto dia, os bezerros foram designados para um dos três tratamentos:
1. Controle (C): leite fornecido no mesmo horário todos os dias: 07:10 h e 14:30 h.
2. Desvios ocasionais (OD): tratado da mesma forma, exceto em 2 dias (nos dias de observação), quando estes apresentavam 5 e 8 semanas de idade, alimentados 3 h mais tarde do que o habitual.
3. Alimentação irregular (IR): recebia leite de acordo com um calendário com alimentação aleatória (primeira vez às 06:00, 07:00, 08:00, 10:00, 11:00 ou 13:00 e segunda vez às 13:00, 14:00, 15:00, 17:30, 18:00 ou 21:00 h).

Os bezerros foram distribuídos nos grupos de acordo com a idade (C: 34±4 dias; OD: 33±5 dias; IR: 35±5 dias), peso ao nascer (C: 43±9 kg; OD: 44±7 kg; IR: 43±6 kg), e sexo. O intervalo mínimo entre a primeira e a segunda alimentação foi fixada para 4 horas e os animais tiveram acesso aos baldes de leite pelo período de 15 minutos.

2.4. Avaliações

2.4.1 Comportamento
Em cada ensaio, o comportamento de quatro bezerros de cada tratamento foi gravado simultaneamente, perfazendo um total de 24 animais. As gravações foram realizadas quando os animais apresentavam em média 5 e 8 semanas de idade por um período de 48 h de cada vez. Na análise dos dados, as primeiras 24 h foram identificadas como "dia controle" e o segundo dia como "dia de tratamento´´, e o período todo de 48 h é identificado como "dia de observação".

Do período de observação de 2 x 24 h foi encontrada uma amostra suficiente para representar o verdadeiro comportamento dos animais. Por razões práticas, as gravações se iniciaram às 22:00 h, um dia antes do "dia controle" e terminaram às 22:00 h do "dia de tratamento". Assim, foram analisados oito animais para cada tratamento, com 48 h de gravações na quinta semana de idade e 48 h na oitava semana de idade. Os seguintes comportamentos foram registrados:

• Períodos em pé e em repouso;
• Freqüência que lambia ou mamava o interior da baia;
• Freqüência que lambia ou mamava outros bezerros;
• Freqüência que brincava com a língua;
• Comportamento de conforto, definido como lamber ou coçar o próprio corpo;
• Freqüência que comia concentrado ou feno;
• Freqüência que bebia água;
• Freqüência que esticava a cabeça através da barreira do cocho de alimentação (Comportamento HTB). Comportamento HTB, em contraste com os outros comportamentos, não é comumente utilizado em investigações comportamentais, porém observações anteriores mostraram que este comportamento é muito comum no período que antecede a alimentação no sistema de alojamento em que se encontravam os animais. Sugerimos que possa ser utilizado para indicar "expectativas de alimentação" pelos bezerros.

2.4.2 Produção e saúde
Todos os bezerros foram pesados ao nascimento e semanalmente. O consumo de leite foi medido a cada alimentação e o consumo de concentrado e feno foi medido semanalmente. Com base nestes dados foi calculado o consumo médio diário de concentrado (kg/dia), a taxa de crescimento (g/ dia), e a taxa de conversão alimentar calculada para cada bezerro. Todas as incidências de doenças foram registradas e, se necessário, tratadas por um veterinário.

Resultados

Comportamento

A Tabela 1 mostra os resultados das observações comportamentais. Todos os parâmetros comportamentais apresentaram distribuição normal, e como não houve diferença entre os dois ensaios, os dados foram agregados.

Tabela 1. Resultados das observações comportamentais.


* Diferenças significativas (P<0,05) entre os tratamentos são indicados por letras "a" ou "b", mas diferenças entre os dias são mostradas pelas chaves "}"
Dias - C: dia controle; T: dia de tratamento
Rotina de alimentação - C: controle; OD: desvios ocasionais; IR: irregular

Efeito de tratamentos
Com 5 semanas de idade, os bezerros do grupo com rotina de alimentação irregular (IR) apresentaram significativo aumento no tempo gasto com consumo de alimento (comendo) do que os outros dois grupos em ambos os dias observação (P=0,02). Quando os bezerros estavam com 8 semanas de idade, não foram encontradas diferenças entre os grupos. Contudo, no "dia de tratamento" o grupo OD diferiu dos grupos C (P<0,05) e IR (P<0,01) no comportamento de conforto, do grupo C no comportamento alimentar (P=0,02) e do grupo IR no comportamento HTB (P=0,01). Não foram encontradas diferenças no comportamento de repouso.

Efeitos do dia
Com 5 semanas de idade, o grupo OD apresentou maior comportamento de beber (P<0.05) no "dia de tratamento" do que no "dia controle". Os grupos C e IR não mostraram diferenças nestes dois dias. Com 8 semanas de idade, o grupo OD mostrou significativamente maior comportamento de conforto (P<0,05), comportamento de ingestão (P<0,05) e comportamento HTB (P<0,001) no "dia de tratamento" do que no "dia controle".

Além disso, os bezerros do grupo OD apresentavam menores períodos de repouso durante o dia, embora a diferença não tenha sido significativa (P=0,08). Os bezerros do grupo IR apresentaram maior comportamento de beber no "dia do tratamento" do que no "dia controle" (P<0,05). Como esperado, o grupo C não apresentou diferenças nesta observação entre os dois dias.

Desempenho e saúde
A média diária de consumo de concentrado foi de 1,92 kg e a média diária de taxa de crescimento foi 750 g. Diarréia e pneumonia foram observadas com total de incidências de 57 e 9, respectivamente. Nenhuma das variáveis de desempenho e de saúde diferiu entre os tratamentos, peso ao nascimento ou ensaios.

Discussão
Os bezerros alimentados com uma rotina previsível mostraram várias respostas comportamentais a desvios ocasionais. As respostas foram observadas principalmente na avaliação na oitava semana de idade. Quando os bezerros tinham 5 semanas de idade, a única diferença significativa entre os dias "controle" e "de tratamento" foi para a atividade de beber (P<0,05). Uma tendência semelhante (P=0,06) foi encontrada para os bezerros no grupo controle. Por conseguinte, o aumento no comportamento de beber no grupo OD (desvios ocasionais), provavelmente, foi causado por outros fatores não associados ao atraso de três horas no horário de alimentação.

A razão para esta aparente falta de resposta às mudanças de alimentação nos animais com 5 semanas de vida é pouco clara. Este efeito poderia ser explicado em termos da atividade geral de alimentação dos bezerros, que aumenta entre 5 e 8 semanas de vida. Também tem sido demonstrado que, quando testado em campo aberto, bezerros com 3 semanas de idade caminharam menos e vocalizaram menos do que de bezerros com 12 semanas de idade (van Reenen et al., 1995). Estes resultados, no entanto, não explicam totalmente as presentes conclusões.

As respostas ao atraso na alimentação observadas nos bezerros do tratamento OD na oitava semana de idade, indicam que eles aprenderam a antecipar o leite em horários regulares. De acordo com resultados de outros estudos, a maioria dos animais estabelece facilmente ritmos de alimentação por ritmos circadianos ou por consumo periódico de alimentos. O atraso no fornecimento do leite afetou o comportamento dos animais de várias maneiras. Eles apresentaram maior comportamento de conforto e gastaram mais tempo comendo, o que provavelmente deve ser visto como antecipação de alimentação.

Uma falha na antecipação, na maioria dos casos, levaria à frustração alguns animais. O aumento do comportamento de se alimentar também pode ter sido causado por um aumento da motivação à alimentação, mas como o próprio alimento não foi medido numa base diária, não é possível avaliar se os animais consumiram mais concentrado. O aumento no comportamento HTB e a redução do número de períodos de repouso sugerem que elevada prontidão e expectativas sobre a alimentação não foram cumpridas.

Em contraste com os bezerros do tratamento OD, os bezerros do tratamento IR, que sempre mantiveram um horário de alimentação variável, quase não mostraram diferenças de comportamento nos dois dias de observação. Com 8 semanas de idade, eles não foram diferentes do grupo de controle para os comportamentos medidos. Assim, a imprevisibilidade da alimentação parece não afetar os bezerros consideravelmente. De acordo com Mistlberger (1994), animais sem horário fixo de alimentação não mostraram antecipação específica no comportamento. Com 5 semanas de idade, os bezerros do tratamento IR apresentaram significativamente maior comportamento de comer do que os outros dois grupos, tanto no "dia controle" como no "dia de tratamento". Uma análise adicional revelou que os bezerros do tratamento IR comiam duas vezes mais concentrado do que grupos C e OD (P<0,05).

Não se pode excluir que a razão para isso poderia ser diferentes níveis de doenças subclínicas ou de um simples mecanismo de resposta a um horário irregular de alimentação. Este também poderia ser visto como um sinal de menor inatividade entre estes bezerros. Pode ser que, em um ambiente bastante previsível, os animais podem antecipar os próximos eventos regularmente, enquanto que os indivíduos em ambientes mais imprevisíveis têm uma maior motivação para exploração.

Conclusões
Calendários imprevisíveis de aleitamento não afetam negativamente o comportamento, crescimento ou a saúde de bezerros alojados individualmente. No entanto, bezerros com um horário regular de alimentação, mostraram vários desvios comportamentais quando expostas a um atraso de 3 h na alimentação. Os resultados indicam que, sob condições de exploração ou de laboratório, os animais podem facilmente adaptar-se a manejos imprevisíveis, enquanto os desvios em rotinas estabelecidas podem levar a diversas alterações comportamentais.

Literatura citada

Johannesson, T.; Ladewig, J. The effect of irregular feeding times on the behaviour and growth of dairy calves. Applied Animal Behaviour Science, v.69, p. 103-111, 2000.

Mineka, S., Kihlstrom, J.F. Unpredictable and uncontrollable events: a new perspective on experimental neurosis. J. Abnorm. Psychol. 87, 256-27,1978.

Mistlberger, R.E. Circadian food-anticipatory activity: formal models and physiological mechanisms. Neurosci. Biobehav. Rev. 18, 171-195, 1994.

Mrosovsky, N., Reebs, S.G., Honrado, G.I., Salmon, P.A. Behavioural entrainment of circadian rhythms. Experientia 45, 696-702, 1989.


Comentários

O trabalho mostra grandes alterações no comportamento de bezerros em resposta a alteração no manejo alimentar, demonstrando, no entanto que os animais têm poder de se adaptar. De acordo com o trabalho, os animais submetidos a diferentes tipos de manejo alimentar não apresentaram diferenças quanto ao desempenho ou a saúde dos animais, o que compromete um pouco suas conclusões.

Ao que tudo indica, bezerros leiteiros gostam de rotina, ou seja, consistência no que diz respeito ao manejo alimentar e até ao tratador. Inclusive já escrevemos em outro radar técnico sobre trabalhos demonstrando que os bezerros reconhecem tratadores diferentes e mudam seu comportamento de acordo com a conduta do mesmo. Podemos observar em campo que bezerreiros manejados com este tipo de preocupação apresentam menores taxas de mortalidade e morbidade, com bezerros de aspecto mais saudável e bastante ativos. Invariavelmente, estes animais também apresentam adequadas taxas de crescimento e consumo de concentrado, permitindo desaleitamento precoce sem grandes problemas.

O presente trabalho demonstra um aumento na freqüência de alimentação dos bezerros submetidos a fornecimento de leite em horário variável, o que pode atrasar o desenvolvimento ruminal devido ao comportamento errático no consumo de concentrado. Segundo a conclusão dos autores, o maior problema é o desvio da rotina, quando está bem estabelecida, ou seja, as maiores alterações de comportamento de bezerros devido ao atraso no fornecimento de leite ocorrem em bezerreiros onde existe grande consistência no manejo, com rotinas estabelecidas.

CARLA MARIS MACHADO BITTAR

Prof. Do Depto. de Zootecnia, ESALQ/USP

LUCAS SILVEIRA FERREIRA

Engenheiro agronômo formado pela UFSCar e Doutor em Ciência Animal e Pastagens pela ESALQ - USP na área de nutrição e avaliação de alimentos para bovinos. Atualmente exerce a função de Nutricionista de Ruminantes na Agroceres MMX Nutrição Animal

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LUIZ GOUVÊA LOPES JARDIM

SÃO PAULO - SÃO PAULO

EM 24/06/2008

É bastante interessante o trabalho realizado pelos ilustres doutores, o que nos propícia conhecer um pouco mais os bezerros. Parabéns. Luiz Jardim

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