“O leite A2 é um produto de nicho. Se observarmos a Ásia e a Oceania, notaremos que essa categoria cresceu muito nos últimos anos. Atualmente, o produto também vem ganhando os mercados da Europa e dos Estados Unidos. Neste último, a previsão é bastante otimista e há um forte marketing no lançamento de produtos com A2, o que significa uma oportunidade. O grande crescimento do leite A2 foi, em grande parte, no mercado de fórmulas infantis, principalmente na China”, disse Antônio Fernandes Carvalho, que é professor do Departamento de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Viçosa (UFV) – Laboratório INOVALEITE, em entrevista exclusiva ao MilkPoint.
Segundo Antônio, existe uma parte da população mundial que é alérgica ao leite. “Para exemplificar, nos EUA, 3,9% das pessoas do país até 18 anos têm alergia ao leite. Aconteceu uma modificação genética na biossíntese do leite que, durante o processo digestivo, passou a gerar peptídeos diferentes, o que pode aumentar o número de pessoas alérgicas ao leite. Devemos lembrar que, durante a digestão, muitos outros peptídeos são também formados no processo digestivo das proteínas do leite e podem também levar à alergia. A comunicação das empresas que querem investir nessa oportunidade de negócio tem que ser cautelosa, já que o A2 definitivamente não resolve todos os problemas nesse âmbito”, explicou o professor, que é técnico pelo Instituto de Laticínios Cândido Tostes, graduado em Farmácia e Bioquímica pela UFJF e trabalhou como professor no ILCT/EPAMIG.
Antônio, que será um dos palestrantes do Dairy Vision 2018, desenvolve trabalhos de transferência de tecnologia, inovação tecnológica e implementação de ferramentas de qualidade. Ele também mantém parceria com empresas na área de aditivos para a indústria láctea. O Dairy Vision ocorrerá nos dias 28 e 29 de novembro na Expo Dom Pedro, em Campinas/SP e a sua palestra tem o seguinte tema: “Leite A2: status atual e oportunidades de mercado”.
Entendendo as diferenças entre A1 e A2
Aproximadamente 80% de todo o conteúdo proteico no leite são caseínas. As caseínas são um grupo de fosfoproteínas específicas do leite as quais se precipitam com acidificação a pH 4,6, presente na forma de micelas. Nesta categoria são inclusos quatro tipos de cadeias polipeptídicas: alfa S1, alfa S2, beta e kappa. A beta caseína é formada de 209 resíduos de aminoácidos e são divididas em 12 variantes conhecidas: A1, A2, A3, B, C, D, E, F, H1, H2, I e G. Essas variantes são caracterizadas por diferenças mínimas de composição dos aminoácidos na cadeia proteica. As formas mais comuns no leite dos bovinos são as beta-caseínas A1 e A2.
A diferença entre as cadeias da A1 e da A2 concentra-se na posição 67 da ordem de aminoácidos. Nessa posição, a A1 possui o aminoácido histidina e a A2 possui a prolina. Os pesquisadores sugerem que entre 5 mil e 10 mil anos atrás, todos os bovinos produziam um leite com apenas A2 entre as beta-caseínas, mas uma mutação genética fez com que grande parte da população de algumas raças passasse a produzir a variante A1, lembrando que mutações genéticas são comuns. Estudos realizados a partir de 1980 começaram a relacionar a beta-caseína A1 com problemas crônicos em pessoas predispostas, que incluem diabetes tipo 1, danos cardíacos e alergia ao leite, entre outros.
O mecanismo por trás desses supostos problemas reside na digestão diferenciada entre a A1 e a A2 no intestino. A beta-caseína A2 não passa por uma hidrólise enzimática (ou ela ocorre muito lentamente), produzindo o peptídeo beta-casomorfina-9 (BCM-9). Já a A1 passa pelo processo de hidrólise, produzindo o peptídeo opioide chamado de beta-casomorfina-7 (BCM-7). Esse opioide seria o responsável por alguns problemas de saúde, inclusive a alergia.
“É por essa variedade de estruturas que eu acredito que o leite A2 não é a solução para todas as alergias visto que o leite tem muitos peptídeos, não só beta-caseínas A1 e A2, mas sim, outras frações, como alfas, kappa, e as proteínas globulares do soro como a β-lactoglobulina. Então, o interessante é que a pessoa que suspeite de alergia, faça algum teste médico ou acompanhamento de algum profissional para verificar se o problema realmente é com a beta-caseína A1”, explanou Fernandes sobre o tema.
E por que algumas pessoas têm alergia ao leite?
Antônio explica que o sistema imune das crianças – categoria bastante afetada – ainda não está totalmente desenvolvido antes dos dois anos de vida. Também, com a maior popularidade do tema, ele observa que mais casos de alergia estão sendo detectados, não só com leite, mas também, ovos, soja e crustáceos. “A lei dos alergênicos veio inclusive para contribuir com estas pessoas, já que ela obriga os produtos no varejo a informar sobre a presença desses ingredientes em sua composição”.
E quando questionado se investiria no leite A2, o pesquisador destaca que se ele tivesse uma fazenda onde os animais já estivessem biotipados para a produção de leite A2, o que permitiria o consumo de leite a uma parte da população, sim, ele apostaria no negócio. “Tenho certeza que faria sucesso no Brasil, mas, ressalto novamente que esse leite não é a solução para todos os problemas. Também, como o valor de mercado do produto é alto, ele não atingiria toda a população”, finalizou.
Chegando em sua 4ª edição, o Dairy Vision contribuirá (e muito!) com o setor por meio de vários insights apresentados sobre as tendências na área de alimentos e bebidas no Brasil e no mundo. Assim, é fundamental que o Dairy Vision 2018 esteja na sua agenda! O evento mostrará oportunidades e clareará ao público os principais desafios de todas essas mudanças para o setor lácteo. Mas atenção: últimas vagas disponíveis – já são mais de 330 inscritos, recorde nos 4 anos de evento. Dias 28 e 29 de novembro na Expo Dom Pedro, em Campinas/SP.
Fontes consultadas:
- Portal Saber Atualizado