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Aditivos na ensilagem de cana-de-açúcar

THIAGO FERNANDES BERNARDES

EM 21/06/2002

10 MIN DE LEITURA

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André de Faria Pedroso1 e Luiz Gustavo Nussio2

A cana-de-açúcar apresenta grande potencial para suplementação de bovinos, com características desejáveis, como grande produção de forragem por unidade de área (80 a 120 t/ha), baixo custo por unidade de matéria seca, manutenção de seu valor nutritivo durante um período de até 6 meses após a maturação, período este coincidente com o período da seca onde ocorre escassez de forragem nas pastagens (9).

Dentre as diversas vantagens da utilização da cana-de-açúcar ressalta-se o fato de ser esta forrageira a de maior potencial de produção de matéria seca (MS) e de energia, por unidade de área, em um único corte, atingindo facilmente produções entre 15 a 20 toneladas de Nutrientes Digestíveis Totais (NDT) por hectare, em comparação com o milho e com o sorgo que produzem menos de 10 toneladas de NDT/ha. (5)

A capacidade da cana-de-açúcar em manter seu valor nutritivo durante um longo período de tempo permite que, em pequenas propriedades, a cana seja colhida diariamente e fornecida fresca aos animais. Esse sistema é, sem dúvida, o mais barato e garante a utilização de forragem de valor nutritivo satisfatório aos animais. No entanto, o corte diário da cana apresenta limitações por dificultar a homogeneidade de rebrota, prejudicando os tratos culturais, como a capina, adubações e o controle com herbicidas, resultando em menor longevidade dessas glebas. Também ocorrem situações menos comuns onde se deseja utilizar a cana como forragem durante o ano todo, resultando em corte diário durante o verão, caracterizado por forragem de baixo valor nutritivo, contendo baixos teores de sacarose (6); e o convívio com a dificuldade operacional de colheita no período chuvoso, que também resulta na morte de plantas e problemas de manutenção do stand dos talhões. Ainda, nos casos de incêndio acidental ou intencional dos canaviais, a ensilagem da cana pode ser a única forma de evitar perda total da forragem, que muitas vezes constitui o único recurso forrageiro de que dispõe o produtor no período da seca.

Por esses motivos, têm sido grande a demanda por informações sobre técnicas de conservação, mais especificamente sobre ensilagem, da cana-de-açúcar. Através da ensilagem grandes talhões podem ser colhidos em um curto espaço de tempo, no período do inverno (seca) quando a cana apresenta seu melhor valor nutritivo, o que coincide com a época mais propícia para a movimentação de máquinas no campo (período da seca). A ensilagem da cana-de-açúcar vem surgindo como solução operacional, sem a devida preocupação com as perdas de valor nutritivo e o custo energético que representa essa decisão. Apesar da escassez de pesquisa nacional nessa área, alguns trabalhos têm sido realizados em outros países de clima tropical desde a década de 70, mostrando que silagens produzidas exclusivamente com cana-de-açúcar são de baixa qualidade, causando redução no consumo voluntário, no ganho de peso e na conversão alimentar dos animais, em comparação à utilização da cana fresca (8). A comunidade científica nacional vem, atualmente, dedicando algum esforço de pesquisa no sentido de gerar informações sobre ensilagem de cana, para imediata aplicação pelo setor de produção.

Os problemas observados na ensilagem da cana-de-açúcar são decorrentes principalmente da intensa atividade de leveduras que naturalmente colonizam a planta (epifíticas), que convertem os açúcares solúveis da forragem a etanol, CO2 e água, levando a grandes perdas de carboidratos solúveis, baixos teores de ácidos lático e acético e aumento no teor de fibra da silagem (3). O etanol produzido representa grande custo energético uma vez que provoca rejeição de consumo pelo animal logo após retirada do silo; aproximadamente 20-30% do etanol produzido pode ser perdido por volatilização e; cerca de 30 a 40 % do etanol ingerido é convertido, no rúmen, a acetato e utilizado pelo animal, e o restante (60-70%) realiza ciclo fútil sem geração de energia líquida no metabolismo.

Em pesquisas pioneiras realizadas no México (8), verificou-se redução de aproximadamente 30% no conteúdo total de açúcares e teor alcoólico de 5,49% da MS da cana, quando ensilada sem nenhum tipo de aditivo. Trabalhos mais recentes mostraram redução no conteúdo de carboidratos solúveis (consumo de aproximadamente 50% da sacarose), aumento no teor de fibra em detergente ácido (29,9 para 43,1% na MS), 17,5% de etanol (MS), perda de 29% da matéria seca, redução no consumo voluntário (5,4 para 4,3% do peso metabólico em ovinos) e na digestibilidade in vivo da matéria seca (66,4 para 55,3%) (1,2,4).

As leveduras dominam o processo fermentativo em silagens de cana e não são inibidas pelo abaixamento do pH da silagem, sendo que algumas cepas são capazes de sobreviver a pH 2 ou menor. Para a maioria das espécies de leveduras encontradas nas silagens o pH ótimo encontra-se entre 3,5 e 6,5. Para que haja inibição do desenvolvimento destes microorganismos pelos ácidos fracos das silagens, em condições anaeróbicas, há necessidade de que haja exaustão das reservas de carbidratos da forragem, pois o mecanismo de neutralização dos ácidos pelas células exige o transporte ativo de prótons para fora da membrana citoplasmática, com gasto de energia (ATP), que na ausência de oxigênio deve ser suprida pela fermentação de açúcares (7). Desta forma, em silagens de cana-de-açúcar ocorre intensa produção de etanol porque a população de leveduras é considerável (na ordem de 106 ufc/g de forragem) (3) e o seu desenvolvimento não é inibido pela presença do ácido lático, pois as bactérias não são capazes de consumir todo o açúcar presente na cana, sendo antes inibidas pela queda do pH.

A constatação de que a ensilagem da cana-de-açúcar normalmente resultava em produtos de baixa qualidade, devido ao intenso desenvolvimento de leveduras e à grande produção de etanol (fermentação alcoólica), levou os pesquisadores a buscarem tratamentos que permitissem melhorar o padrão de fermentação destas silagens, reduzindo as perdas de MS e do seu valor nutritivo. Alguns aditivos químicos e inoculantes bacterianos têm sido utilizados com o intuito de promover o desenvolvimento dos microrganismos desejáveis, como as bactérias produtoras de ácido lático, e inibir os prejudiciais, como leveduras, enterobactérias e clostridium. Estes aditivos podem também contribuir para que haja melhor estabilidade aeróbica das silagens, evitando que microrganismos aeróbicos (e aeróbicos facultativos), como as leveduras tolerantes a pH baixos, se desenvolvam ocasionando a elevação do pH, e a multiplicação de outros microrganismos que causem perdas de matéria seca e no valor nutritivo da silagem, podendo ainda favorecer o aparecimento de agentes patogênicos como Listeria monocytogenes.

Atualmente alguns ensaios vêm sendo conduzidos no Depto de Produção Animal da ESALQ/USP de Piracicaba, com o objetivo de avaliar o efeito de diversos aditivos químicos e microbianos e estabelecer a otimização da dosagem de aplicação, quanto à sua capacidade de inibição do desenvolvimento de leveduras produtoras de etanol, recuperação de MS após a fermentação e estabilidade aeróbica. Neste experimento utilizou-se uma variedade industrial de cana-de-açúcar (RB 835486), colhida madura (13 meses de rebrota, 22,5º Brix e 32% MS) através de uma colhedora acoplada ao trator, regulada para tamanho de partículas entre 5 a 10 mm, e ensilada em unidades experimentais exploratórias ,baldes plásticos, de 20 litros adaptados com válvula para escape de gases e substrato para coleta de efluentes. Foram testados cinco aditivos químicos e dois inoculantes bacterianos, diluídos em água, nas seguintes dosagens (peso fresco): uréia (0,5; 1,0; 1,5%), NaOH (1; 2; 3%), propionato de cálcio (0,05; 0,1; 0,2%), benzoato de sódio (0,05; 0,1; 0,2%), sorbato de potássio (0,015; 0,03; 0,45%), bactérias homoláticas - BAL (1 x 106 ), L. buchnery (1 x 106 ) e a combinação de BAL e uréia (0,5; 1,0%). Na Tabela 1, podem ser observados os resultados preliminares contendo as médias obtidas, após 90 e 180 dias de fermentação, para os diversos parâmetros avaliados.

Tabela 1. Efeito de aditivos químicos e biológicos sobre os parâmetros de fermentação e perdas de MS durante a ensilagem de cana-de-açúcar madura.

 



A análise dos dados mostrou que as perdas gasosas (8,9%) e de efluentes (20,8 kg.t-1) responderam por 62% e 38% (respectivamente) pelas perdas de matéria seca da silagem, que foram de 14,4% em média. A inoculação com BAL levou a menor recuperação de matéria seca (77,7%), como resultado de maiores perdas de efluentes e gases, e a maior produção de etanol. A adição de uréia com BAL também levou a maiores perdas de gases e maior teor de etanol em relação ao controle. Altas concentrações de sais, com exceção do propionato, ajudaram a diminuir as perdas. Melhora significativa na recuperação de matéria seca ocorreu com o uso da uréia e NaOH. A produção de etanol foi diminuída pela adição de NaOH, benzoato e sorbato. A inoculação com L. buchnnery reduziu simultaneamente as perdas gasosas, a produção de etanol e melhorou a recuperação de matéria seca, embora com maior produção de efluentes em relação ao controle. Os tratamentos mais efetivos estão sendo avaliados quanto às alterações no ambiente ruminal e desempenho animal, bem como as perdas de MS em silos de maior porte.

Ao considerar que a combinação apropriada dos aditivos mais eficientes poderia elevar a recuperação de MS em 10 unidades percentuais, em um canavial produzindo 100 t MV/ha ou 30 t MS/ha ao custo de R$70 /t MS, têm-se uma economia estimada de 3 t MS/ha ou R$210,00/ha. Se o consumo diário estimado de uma UA for de 9 kg MS de silagem de cana, durante o período de suplementação (180 dias) deverá totalizar 1620 kg MS/UA. Assim, a maior eficiência dos aditivos poderia permitir a expansão da capacidade de suporte em 1,85 UA/ha, durante o período de suplementação. Diante do possível benefício técnico, cabe ao usuário proceder então a avaliação da relação custo: benefício para a decisão sobre a adoção desses aditivos.

Independentemente da relevância dos resultados experimentais apresentados, deve-se considerar que a cana-de-açúcar picada e manejada como capineira, representa não somente uma forma eficiente de suplementação de ruminantes no inverno, mas a opção comparativa de melhor perspectiva de retorno entre os volumosos suplementares convencionais. Entretanto, a ensilagem da cana sem aditivos, mesmo justificada pelo benefício da logística operacional, se comporta como uma fonte pouco interessante de volumoso suplementar, com valor nutritivo muito inferior a cana original, determinando um potencial limitado de exploração do desempenho de animais, em especial em dietas com grande participação desse volumoso. Ainda que a recomendação tradicional sugira a ensilagem de cana somente sob condições excepcionais ou emergenciais, os resultados históricos apontam para a necessidade da adoção de aditivos que efetivamente controlem a produção de etanol, para que a ensilagem dessa planta possa ser justificada. Do contrário, a silagem de cana poderá se comportar como uma das fontes mais onerosas de MS e de energia para o rebanho, conforme apontam recentes simulações.

Referências

1 ALCÁNTARA, E.; AGUILERA, A.; ELLIOT, R.; SHIMADA, A. Fermentation and utilization by lambs of sugarcane harvested fresh and ensiled with and without NaOH. 4. Ruminal kinetics. Animal Feed Science and Technology, v. 23, p.323-331, 1989.
2 ALLI, I.; BAKER, B. E.; GARCIA, G. Studies on the fermentation of chopped sugarcane., Animal Feed Science and Technology v. 7, p. 411-417, 1982.
3 ALLI, I.; FAIRBAIRN, R.; BAKER, B. E.; GARCIA, G. The effects of ammonia on the fermentation of chopped sugarcane. Animal Feed Science and Technology, v. 9, p. 291-299, 1983.
4 KUNG JR, L.; STANLEY, R. W. effect of stage of maturity on the nutritive value of whole-plant sugarcane preserved as silage. Journal of Animal Science, v. 54, p. 689-696, 1982.
5 LIMA, M. L. M. e MATTOS, W. R. S. Cana-de-açúcar na alimentação de bovinos leiteiros. In : Simpósio sobre nutrição de bovinos. 5. 1993, Piracicaba, Anais... Piracicaba. Peixoto, A M.; Moura, J. C.; Faria, V. P. (ed.) FEALQ. 1993. p.77-105.
6 MATSUOKA, S.; HOFFMANN, H. P. Variedades de cana-de-açúcar para bovinos. In : Simpósio sobre nutrição de bovinos. 5. 1993, Piracicaba, Anais... Piracicaba. Peixoto, //ª M.; Moura, J. C.;Faria, V. P. (ed.) FEALQ. 1993. p. 17-35.
7 McDONALD, P.; HENDERSON, A .R.; HERON, S. J. E. The biochemistry of silage. 2 ed. Marlow, Chalcomb Publications, 1991. 340 p.
8 PRESTON, T. R.; HINOJOSA, C.; MARTINEZ, L. Ensiling of sugar cane with ammonia molasses and mineral acids. Tropical Animal Production, v. 1, p. 120-126, 1976.
9 SILVA, S. C. A cana-de-açúcar como alimento volumoso suplementar. In: Volumosos para bovinos. Peixoto, A M.; Moura, J. C. e Faria, V. P (ed), FEALQ, 1993. P. 59-74
10 STANLEY, R.W. AND SPIELMAN, S. The effect of feeding low and high levels of alfalfa, guinea grass and sugar cane to lactating dairy cows. Journal of Dairy Science, Champaign, 67 (suppl. 1): 144-145 (abstracts), 1984.
11 A.F. PEDROSO, L.G.NUSSIO, S.F PAZIANI , D.R.S.LOURES , M.S.IGARASI , L.J MARI ; R.M COELHO , J.L. RIBEIRO , M. ZOPOLLATTO, J. HORII Bacterial inoculants and chemical additives to improve fermentation in sugar cane (Saccharum officinarum) silage. Proceedings of the International Silage Conference, Auchincruive, Scotland , 2002 (no prelo)

__________________________________
1Aluno de Doutoramento, Ciência Animal e Pastagens, USP/ESALQ, Piracicaba, SP.
2Professor Departamento de Produção Animal, USP/ESALQ, Piracicaba, SP - nussio@esalq.usp.br

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