No início da década 60, em uma área de 31,5 ha e por muitos anos, o trabalho era realizado exclusivamente pela família por meio da força de trabalho manual e tração animal. Dessa forma, exploravam atividades como a plantação de feijão, que ocupava 2,5 ha, milho 9,7 ha e soja 2,5 ha, com produtividades de 1.240, 1.550 e 1.490 kg/ha respectivamente nos melhores anos.
O feijão era comercializado, enquanto que o milho e a soja eram utilizados na produção de suínos, sendo comercializado apenas o excedente em anos em que a safra era boa. Na suinocultura era realizado o ciclo completo, com 13 matrizes. Possuíam ainda uma pequena área de pastagem para as vacas e animais de tração. A produção de leite era destinada ao consumo da família e o excedente transformado em queijo, que era comercializado na região. Na época já se efetuava duas ordenhas/dia e os bezerros (as) ficavam presos, porém o desenvolvimento dos mesmos era precário devido à carência de alimentação.
Com o tempo, os filhos foram casando e saindo da propriedade e a área acabou sendo deixada sob a responsabilidade dos filhos (Roberto), juntamente com (Ademir). O Sr. José e a Sra. Adelina se mudaram para Chopinzinho/PR, onde atualmente residem, passando a viver do valor que recebem da aposentadoria.
O Sr. Ademir Pizzolatto é casado com Rosane, sendo os filhos, Vanderson, Vanessa e Vagner com idades respectivas de 23 anos, 16 anos e 11 anos, todos na propriedade. Vanderson já definiu a sua permanência no condomínio e os demais também mostram essa tendência.
O Sr. Eugênio Pizzolatto é casado com Claudete. Eles têm dois filhos: Victor com 17 anos e Sabrina com 12 anos. Victor está iniciando o curso de Biologia, porém, tem perceptivas de permanecer na propriedade, enquanto que a Sabrina sonha em cursar Medicina e provavelmente não permanecerá na propriedade.
O Sr. Roberto Pizzolatto é casado com Maribel. Eles têm três filhos: Débora com 20 anos, Daiane com 19 anos e o Roberto Daniel com 12 anos. Débora, cursa o 4º ano de Medicina Veterinária e pretende voltar para a propriedade e aplicar seus conhecimentos profissionais na busca de melhorias. Daiane está no 2º ano de Biologia e pretende voltar para a propriedade, pois ainda sente uma ligação com a família e a propriedade. Roberto Daniel, que já está na 8ª série, pretende cursar Matemática e ser professor, mas não demonstrou vontade de sair da propriedade, pois acredita ter campo para aplicar seus conhecimentos na contabilidade necessária.
- Escassez de recursos/capital que as famílias enfrentavam;
- Necessidade que sentiam de evoluir principalmente na área tecnológica;
- Incentivo do projeto REDES (Redes de Referência para a Agricultura Familiar patrocinado pela Emater e IAPAR);
- Participação em excursões ao estado de Santa Catarina onde conheceram experiências positivas;
- Palestra de motivação do então membro da coordenação estadual das REDES Antônio Celso, que dentre outras coisas, demonstrava que empresas de grande porte estavam se somando para alcançar melhores resultados, enquanto que os agricultores de forma geral continuavam agindo individualmente e desorganizados, realizando negócios com pouco poder de barganha;
- Após consultoria prestada por meio da Emater Regional de Pato Branco, a qual teve o intuito de esclarecer os diferentes tipos de empresas, cooperativas, associações, dando maior ênfase sobre o sistema de condomínio, os produtores ficaram de analisar qual a melhor forma de sistema seria adotada.
Baseados nessa proposta, as famílias viram a possibilidade de tornar possível os projetos que permitiriam a realização de sonhos dificilmente alcançáveis isoladamente. Com os recursos disponíveis e animais de cada propriedade, somados à economia das instalações, novos investimentos poderiam ser feitos. Juntos, buscaram obter as vantagens da produção em escala, principalmente de leite, como se dá nas médias e grandes propriedades. As famílias vislumbravam a possibilidade de alcançar melhor qualidade, maior capacidade de armazenagem e otimização de mão de obra, permitindo que obtivessem melhores resultados econômicos e sociais.
Mudanças com o tempo
Com o passar do tempo, a organização do trabalho melhorou já que as atividades foram distribuídas entre os sócios por afinidade, o que tornou o trabalho mais prazeroso e consequentemente mais produtivo. Com o tempo, a mão de obra foi se tornando qualificada por meio de cursos, palestras e excursões, trazendo assim benefícios para o grupo como: ter excedente de mão de obra, revezamento de folgas semanais e férias anuais que proporcionaram uma qualidade de vida melhor às famílias. É válido ressaltar ainda que com a constituição do condomínio, as famílias têm mais segurança para realizar investimentos.
A tarefa de gerenciamento da propriedade cabe ao Sr. Eugênio visto a sua liderança, harmonia, transparência, educação e sensatez. Ele administra os conflitos com cuidado, respeita a opinião de todos, procura aperfeiçoamento e oferece oportunidade aos demais. Sabe conversar com todos os componentes, contando sempre com o auxílio de sua esposa Claudete, que faz a contabilidade, controle zootécnico do plantel e elabora a dieta das vacas conforme suas produções.
Hoje a propriedade possui mais de 200 hectares, máquinas e equipamentos novos em boas condições de uso e instalações novas. Todas as negociações de aquisições passam por uma discussão do grupo, que se reúne mensalmente. O objetivo principal dessas reuniões com as famílias é a solução de conflitos quando se trata especificamente de investimentos de forma geral no condomínio. Assim, a transparência nas contas, receitas e despesas são mensalmente apresentadas a todos. Também, é discutido o planejamento mensal das ações para evitar correrias de última hora. Todos têm o direito de expor as ideias, o que fortalece a responsabilidade do que irão executar com qualidade e de que a propriedade pertence a todos.
Na zona rural do município de Saudade do Iguaçu/PR, o Condomínio Pizzolatto tem sido nestes últimos 17 anos, uma propriedade de referência no estado, pela trajetória das quatro famílias que se uniram e iniciaram o negócio em bovinocultura de leite. Com o apoio dos extensionistas da Emater de Pato Branco/PR, os Médicos Veterinários José Antônio Nunes Vieira e Luiz Francisco Lovato, o condomínio recebeu mais de 10.000 pessoas em realização de eventos com a metodologia “Porteira Aberta”, oficinas, dias de campo e muitas excursões vindas até de outros estados. Os trabalhos desenvolvidos e até mesmo nos eventos realizados desde o início da instituição do Condomínio Pizzolatto – com a parceria do Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) e com o Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) – tornaram a propriedade modelo em pesquisas para a tecnologia em sistemas de produção para a agricultura familiar.
Para os produtores do condomínio, o grande desafio na sucessão familiar rural é saber quem vai tocar o negócio. No Condomínio Pizzolatto, não há eleitos para assumirem o posto, mas há uma expectativa de que a maioria dos filhos continue no negócio. A ideia é que parte deles volte para o campo a fim de aplicar os conhecimentos e assim, economizar na contratação de profissionais para a solução de problemas. Para os envolvidos, o assunto sucessão familiar é tratado como uma equação complicada quando pessoas da família se relacionam com o mesmo negócio, mas eles afirmam que na maioria das vezes, os resultados compensam.
Os sucessores adquiriram - com o passar dos anos - uma educação que lhes assegura uma vida com qualidade, tanto no relacionamento familiar como no trabalho. Cabe ainda destacar que a solução de conflitos soma significativamente na permanência dos sucessores, fortalecendo os laços familiares. O resultado disso é positivo e tem tudo a ver com o sucesso da propriedade. Este último, para o Condomínio Pizzolatto, também está atrelado aos cuidados e a forma de tratamento com os animais, desde o pré-parto, bezerras, novilhas, até as vacas em lactação. Tudo é preparado com dedicação e visa a satisfação das famílias.
Outro grande desafio é a transição da primeira para a segunda geração. Os sucessores não vão herdar meramente um patrimônio ou uma empresa. Simplesmente, darão a continuidade a um trabalho, algo que é bem mais complexo, pois esforça o grupo a manter os conflitos familiares bem resolvidos, pois a solução disso tem que começar no âmbito familiar. Na sucessão não pode haver indicação de um novo líder, essa liderança deve ser conquistada, legitimada pelos demais, porque esses vão ser sócios entre si.
A sucessão familiar é um tema delicado. Muitas vezes dentro da própria estrutura familiar ocorre o envolvimento de questões sentimentais e emoções, o que dificulta o entendimento para tratar dos conflitos. Já que as famílias vão aumentando, é necessário muito esforço e criatividade para trazer a nova geração para dentro do negócio, aumentando a mão de obra e a produção.
Há muitos fatores que contribuem para a permanência dos sucessores do Condomínio Pizzolatto. De maneira simples, ficarão no negócio aqueles que mostrarem vocação, interesse e capacidade para gerenciar. A sucessão é um processo que constrói o futuro. No passado, as atividades da propriedade Pizzolatto foram desenvolvidas: cresceram, melhoraram, mas para o futuro, ainda precisam enfrentar alguns percalços. De acordo com a família, a sucessão tem a veia familiar misturada com a gestão: “são anos de esforços e de preparação para que o trabalho tenha continuidade”.
Para os médicos veterinários da Emater responsáveis pelo Condomínio Pizzolatto, ao resgatar a trajetória de vida profissional e pessoal de cada membro do grupo (além da existência de uma extensa rede de parentesco), um resultado positivo foi constatado quanto ao processo sucessório.
“Os resultados evidenciam que, além do preparo para os sucessores, não há resistência por parte do líder em delegar aos jovens a continuação do negócio. Dessa forma, se constata que o planejamento do processo ocorre passiva e naturalmente. No que se refere à escolaridade, observamos que na primeira geração a maioria das pessoas tem o 1º grau completo, enquanto os filhos da segunda geração, o 2º grau. Nesse sentido, a educação pode ser vista como uma forma de equilíbrio, contando com os filhos que estão fora da propriedade em função de estarem cursando o 3º grau. A relação e organização das famílias do Condomínio Pizzolatto com seus sucessores, começou muito cedo, pois os filhos desde pequenos costumavam brincar principalmente perto do local de trabalho de seus pais. O ambiente no qual as crianças foram socializadas sempre privilegiou o trabalho. Foram os exemplos que incentivaram os filhos a seguir ou buscar a identificação com os trabalhos realizados na propriedade rural”.
Os técnicos destacaram que todos da família Pizzolatto prezam pela religiosidade e veem na sucessão a continuidade do trabalho. “Para os que saírem, boa sorte! Aproveitam os estudos para a realização de seus sonhos. Com toda a certeza, não há perdedores e vitoriosos”.
Esta matéria contou com as seguintes colaborações: José Antônio Nunes Vieira (Médico Veterinário, responsável pela gestão no Condomínio Pizzolatto e Coordenador da Emater Regional de Pato Branco/PR), Luiz Francisco Lovato (Médico Veterinário, responsável pelo social no Condomínio Pizzolatto e Gerente Regional da Emater de Pato Branco/PR) e Zelide Izabel Negri (auxiliar administrativa da Emater de Pato Branco/PR).
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