Em apenas 30 dias, 152 pessoas responderam o questionário, representando 123 mil vacas e 3 milhões de litros de leite. Consultores e produtores rurais foram os principais participantes, mas professores e estudantes também apareceram entre os respondentes (categoria outros, figura 1).
Figura 1. Distribuição dos respondentes do questionário de acordo com a ocupação.
Os consultores que responderam à pesquisa representam em média 67 mil vacas e os tamanhos dos rebanhos variaram de 35 a 10.000 animais. No entanto, a mediana do número médio de vacas atendidas por cada consultor respondente foi 600, provavelmente divididas em diversas propriedades. Já dentre os produtores, houve grande participação de propriedades menores, sendo que 49% dos produtores respondentes são de propriedade com menos de 50 vacas. Quando somamos a essa categoria os criadores de até 100 animais esse número sobe para 63%. No entanto, produtores maiores também participaram, 31% com número de animais entre 101 e 500 e 4%, de 1.001 a 3.000 vacas.
A participação diversificada no questionário é bastante interessante e evidencia o poder que uma plataforma digital como o MilkPoint tem de promover o intercâmbio de informações e conhecimento entre realidades bastante diferentes.
Apesar da diversidade de tamanhos de rebanho representados no questionário, a média de produção de leite foi bastante constante entre consultores e técnicos e foi em torno de 23 L/d, variando de 10 a 40 L/d. Além disso, a produção média diária não apresentou correlação com o número de vacas representadas por cada respondente. A figura 2 mostra a distribuição da produção média diária entre os respondentes.
Figura 2. Distribuição da produção média diária entre os respondentes.
Apesar da alta representatividade do questionário, apenas 63% dos respondentes realizam análise de NUL, predominantemente em amostras coletadas no tanque (68% dos respondentes) e uma vez por mês (76% dos respondentes). Os consultores apresentaram maior familiaridade com a ferramenta, com frequência de utilização de 73% contra 49% entre produtores. Como discutido no artigo anterior, a análise de tanque representa baixo potencial de avaliação da dieta. Esses dados revelam um potencial imenso de crescimento na utilização da ferramenta NUL, evidenciando a necessidade de recomendações mais sólidas e baseadas em dados nacionais.
A amostragem de todas as vacas individualmente é feita por 24% dos respondentes. A composição do leite individual é uma informação poderosa para aferir a dieta realmente consumida por cada vaca, já que na maior parte das vezes elas são alimentadas em lotes, tornando impossível obter essa informação pela avaliação de sobras no cocho. O leite é o produto final do metabolismo dos nutrientes de fato ingeridos, de modo que não há nada melhor do que a própria vaca para nos informar se a dieta está ou não adequada e ainda nos indicar qual é o problema. Este assunto já foi abordado em mais detalhes neste radar no artigo “Composição do leite como ferramenta para avaliação de dietas” (partes 1 e 2).
A frequência mensal de análises individuais é, na maioria das situações, adequada para avaliação da dieta, pois permite um tempo de adaptação dos animais após alguma intervenção. Além disso, a maior parte das propriedades ajusta a dieta e o agrupamento dos animais mensalmente. No entanto, para animais consumindo dietas potencialmente variáveis, como em pastejo, em que a composição do capim pode variar de acordo com o piquete, maior frequência de análise permitiria mais ajustes na dieta. Nesse caso, quando todas as vacas pastejam os mesmos piquetes, a análise do tanque pode ser bastante útil (e mais barata do que uma análise bromatológica do capim) para avaliar mudanças na composição nutricional do pasto e deve ser realizada mais frequentemente.
Um potencial problema com a utilização dos valores de NUL é a real adequação de recomendações estrangeiras em condições brasileiras. De fato, a faixa considerada adequada pela grande maioria dos usuários da ferramenta é de 10 a 14 mg/dL, exatamente os valores de referência encontrados na literatura atual, baseada exclusivamente em rebanhos americanos. Esta é uma recomendação bastante genérica e que ainda não foi sistematicamente validada na realidade brasileira. Como comentado no artigo anterior, experimentos brasileiros já demonstraram que vacas em pastagens bem manejadas apresentaram valores médios de NUL de 8 mg/dL sem nenhum prejuízo no consumo de alimento, no metabolismo proteico e na produção de proteína do leite.
Um quarto dos participantes que realizam a análise de NUL nas propriedades não utiliza critérios adicionais para as recomendações consideradas adequadas. Entre os que utilizam, os critérios adicionais mais citados foram o teor de proteína do leite, dias em lactação (DEL), e teor de gordura do leite. Poucos respondentes citaram paridade e composição racial como critérios. A utilização conjunta de NUL e teor de proteína do leite permite especular de forma muito mais completa sobre o metabolismo do N no animal. Por exemplo, alto NUL e baixa proteína no leite muito provavelmente indicam falta de energia no rúmen. Por outro lado baixo, NUL e baixa proteína são indicativos de falta de proteína degradada no rúmen (PDR) e a situação provavelmente virá acompanhada de queda de consumo de alimento e desempenho.
Também faz bastante sentido que DEL e composição racial afetem a secreção de NUL. No início da lactação, devido ao baixo consumo de MS e alta produção de leite, as vacas encontram-se em balanço energético e proteico negativos, resultando na mobilização de tecidos do corpo. Quando a proteína muscular é mobilizada e seus aminoácidos utilizados para produção de energia, o NUL aumenta. Em situações como essa, o escore de condição corporal pode ser um importante critério adicional para determinação de valores de referência. A composição racial afeta o teor de proteína e gordura do leite, potencialmente por causa de diferenças no metabolismo de nutrientes que também podem afetar NUL.
Os resultados deste questionário deixam claro que diferentes protocolos de amostragem (frequência e unidade de coleta) devem ser avaliados e comparados entre si, levando em conta também o custo das análises. Além disso, os valores de referência devem ser determinados em situações em que a composição da dieta e o consumo de alimento sejam conhecidos para que os balanços de PDR e proteína metabolizável possam ser estimados por um modelo nutricional. Por fim, as correlações entre NUL e outras variáveis potencialmente importantes para o metabolismo proteico devem ser cuidadosamente estudadas para que recomendações mais específicas possam ser desenvolvidas. Essas conclusões irão orientar uma linha de pesquisa que está se iniciando no Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Lavras. Gostaríamos de agradecer enormemente os que participaram do questionário! Vamos continuar trazendo informações novas sobre esse assunto para fomentar a discussão e troca de conhecimento!
"Se você aproveitou o conteúdo do MilkPoint durante o ano de 2016, saiba que nossa equipe o preparou com toda a dedicação para você! Vote em nós para o Troféu Agroleite: nos dê esse presente! Clique aqui para votar no MilkPoint como melhor mídia digital"