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O pequeno produtor de leite vai mesmo desaparecer?

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 16/06/2000

6 MIN DE LEITURA

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Marcelo Pereira de Carvalho

Para tentar responder esta questão, é necessário primeiro definir o que é o pequeno produtor. Para efeito de análise neste artigo, o pequeno produtor é aquele sujeito que tem uma pequena propriedade, trabalha nela (muitas vezes com outros membros da família) e dela tira o seu sustento, comercializando a produção e utilizando alimentos produzidos para consumo próprio (horta, leite, carne, frutas). Geralmente, tem uma ligação familiar histórica com a terra: seu avô era produtor, seu pai também era, sua vida girou em tornou da exploração de sua propriedade. Trazendo este estereótipo para a produção de leite no Brasil, pode-se dizer que, gostem ou não, grande parte dos produtores de leite se enquadra nesta categoria, visto o número de produtores e a produção diária média de cada um.

Após definir o pequeno produtor e supondo que a pecuária de leite no Brasil tem um futuro promissor, o eventual desaparecimento desta categoria dará lugar, pela lógica, ao produtor profissional. Mas quem é o produtor profissional ? É outra definição subjetiva, mas poderíamos definí-lo como o produtor-empresário, que não necessariamente tem uma ligação forte com a área rural, mas que fundamentalmente procura encarar a atividade como um negócio. Faz controles de rebanho, tem boa noção do custo de produção, quer remunerar o investimento realizado, está sempre com os olhos abertos para outras opções caso a pecuária leiteira não dê o retorno esperado, está sintonizado com as exigências do mercado, etc. É tido como o tipo de produtor que deve predominar em uma pecuária desenvolvida, como ocorre com outras culturas (algodão, soja, cana) e como ocorreu com a pecuária de outros países (Nova Zelândia, Argentina e EUA, por exemplo).

E porque os pequenos produtores sumiriam ? Diz o consenso que isto ocorreria em função da incapacidade destes em se adaptar à nova realidade, representada por exemplo pela granelização, pelas exigências em qualidade do leite, pelas margens menores, exigindo maior habilidade gerencial e utilização mais racional da técnica, pela ausência de economia de escala, por aspectos de herança (a divisão da propriedade aos herdeiros muitas vezes resulta em módulos inviáveis para todas as famílias), etc. Estes fatores provavelmente resultaram na redução do número de produtores de leite nos países acima mencionados.

No entanto, é também provável que a saída de produtores da atividade leiteira nestes países tenha sido apressada pela existência de outras possibilidades de trabalho mais rentáveis ou menos desgastantes do que a produção de leite. Com a redução das margens, é natural que o produtor avalie cada vez com mais seriedade o uso alternativo de sua área e de seu próprio trabalho. Havendo alternativas disponíveis, fica mais fácil deixar a atividade.

Deste modo, uma primeira análise que deve ser feita é quais as reais oportunidades de trabalho para um pequeno produtor de leite caso deixe a atividade leiteira ? Considerando que a economia do país em geral não está a plenos vapores (isto para ser otimista), e que o grau de instrução deste produtor limita sua colocação nas áreas mais promissoras, é fácil concluir que não há um grande estímulo para o produtor mudar de atividade a não ser que a situação realmente se torne insustentável.

Ligada à observação acima, está o caráter estratégico da pecuária leiteira como geradora de empregos. Na Índia, por exemplo, 70 milhões de pessoas estão envolvidas com a atividade leiteira. No Brasil, são mais de 1 milhão de pessoas, número que impressiona qualquer pessoa alheia ao setor. É um verdadeiro exército de pessoas. Considerando a situação da economia, um êxodo na pecuária de leite é algo que pode ter conseqüências nefastas ao país, ou seja, certamente não interessa aos dirigentes políticos.

Uma outra análise necessária é que a produção de leite é uma atividade facilmente identificada com módulos de subsistência e mesmo de pequena propriedade: a receita é mensal, há geração de leite e carne para consumo próprio, há produção de esterco que alimenta hortas e pomares e não há a necessidade de grandes investimentos em maquinário e instalações (considerando o pequeno produtor e um modelo de produção a pasto, com gado mais rústico). Enfim, é possível viver exclusivamente da atividade, embora de forma muitas vezes precária. A noção de custo de produção para este pequeno produtor perde o sentido, uma vez que remuneração da mão-de-obra familiar, custos de oportunidade, juros e outros cálculos mais geram números que não necessariamente refletem a decisão pela continuidade ou não da atividade leiteira, que certamente se identifica mais com uma opção de vida do que de negócio.

Mesmo em países tidos como de pecuária altamente tecnificada, com grandes fazendas de leite empresariais, há ainda uma certa sobreposição entre o módulo empresarial e o módulo familiar. Nos EUA, por exemplo, a média de vacas por fazenda é inferior a 80 animais e há ainda produtores tipicamente familiares (embora diminuindo). Em uma recente lista de discussão pela internet, um pequeno produtor do estado de Ohio explicava que "sobrava" 50% da receita bruta para seus gastos pessoais e investimento na fazenda, que tinha 30 vacas em lactação; em 40 anos de dedicação, ele raramente ficou sem participar de uma ordenha; as tarefas eram realizadas por ele e pela esposa; ele não havia comprado nenhum maquinário novo, apenas de segunda mão; eles trabalhavam 14 horas por dia, verão e inverno; mas estavam satisfeitos com a vida que levavam, tanto financeiramente quanto em relação à qualidade. Afinal, faziam o que gostavam e não precisavam de muito. Guardando-se as devidas proporções, é um perfil típico do "pequeno produtor" definido acima, típica de países com tradição na atividade (EUA e países da Europa Ocidental são exemplos). Este produtor possivelmente não está muito interessado em cálculos econômicos corretos e não necessariamente seguiria as sinalizações destes cálculos, caso realizados.

Além desta ligação até sentimental com a atividade, o pequeno produtor tem como vantagens o fato de tocar o próprio negócio e de conhecer individualmente as vacas, o que pode em parte compensar claras desvantagens como habilidade gerencial, economia de escala e outros fatores já listados acima.

É evidente que o aumento do módulo de produção tende a ser uma necessidade em função de margens menores e da exigência cada vez maior de profissionalização do setor formal. Isto ocorre em todos os setores da economia, basta ver as fusões e as aquisições realizadas, todas objetivando não só um melhor posicionamento da empresa no mercado, mas uma redução de custos por ganhos de escala.

Porém, no caso específico da pecuária de leite brasileira, o pequeno produtor parece ter seu espaço, dadas as características do país e da própria atividade listadas acima. Mas terá que se mexer, adequando-se à nova realidade. Deve procurar programas de extensão rural à sua disposição, deve-se aliar a outros produtores no intuito de obter maior poder de barganha e deve procurar utilizar as suas (não muitas, é verdade) vantagens a seu favor. De certa forma, dependendo do estágio alcançado, trata-se de uma forma de profissionalização deste produtor.

Em contrapartida, estas colocações não implicam, necessariamente, em desvantagens ao produtor profissional ou produtor empresário. Afinal, este têm a seu favor várias vantagens importantes, entre elas talvez a mais importante seja a capacidade de responder mais rapidamente às exigências do mercado do que o pequeno produtor (adaptação a novas exigências e tecnologias). Ainda, é evidente que há pequenos produtores em condição muito ruim e deixando a atividade, em acelerado processo de empobrecimento. No entanto, parece claro que alguns dos chavões mais falados em economia atual, como economia de escala e competitividade, são realidade em outras atividades agrícolas de forma muito mais contundente do que na pecuária de leite. Neste cenário, é provável que coexistam ainda por longo tempo projetos empresariais de leite e pequenos produtores que fazem da propriedade a extensão da própria vida. E ambos os extremos podem obter "lucro", independentemente do cálculo utilizado por cada um.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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LUIS CARLOS CORRÊA DA SILVA

SAPUCAIA DO SUL - RIO GRANDE DO SUL

EM 05/05/2019

EXCELENTE EXPLANAÇÃO.QUERO AINDA REALIZAR MEU SONHO, COM UMA PROPRIEDADE DEDICADA A ,PRODUÇÃO LEITEIRA.
ALVARO MARTON BARBOSA

LORENA - SÃO PAULO

EM 29/08/2014

Sou pequeno proprietário rural e trabalho a terra por gostar, fui criado no meio rural e atualmente crio animal de corte, assim como, cuido de plantação de árvores no sítio, além ortifrutigrangeiro para o consumo da família, pois sou aposentado e trabalho apenas em  um período do dia (parte da manhã). Gostaria de saber como ficarei enquadrado nessa nova regulamentação da lei. Esta propriedade já esta comigo há mais de 30 anos.

Alvaro Marton

Bairro do Pedroso em Lorena/sp  









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JORGE FELIPE HARDT DOS SANTOS

ALTA FLORESTA D'OESTE - RONDÔNIA

EM 03/01/2013

Concordo em parte, realmente é subjetivo.
ARTURO SIA RATZSCH DE ANDREAZZI

BRAÚNAS - MINAS GERAIS - MÉDICO VETERINÁRIO

EM 14/12/2011

O sujeito que é amador , é o que não vive da atividade , faz puramente por hooby .

O sujeito profissional é o que se susutenta pela atividade , depende dela para viver.

Portanto não acredito que o termo profissional esteja sendo usado da maneira mais correta no presente artigo. Pois sabe-se que muitas vezes os grandes produtores , ditos "profissionais "muitas vezes tem a atividade como mais um de seus investimentos , e geralmente não é a a sua maior fonte de renda.

Portanto no caso de crise da atividade tem maior mobilidade para sair do mercado , e se julgarem necessário , evidentemente o abandonam , pois são capazes de fazer calculos de viabilidade ( Como é claro muitos pequenos também são, e com grande capacidade de gestão e controle direto do negócio além de afinidade inata).

Acredito então que o termo profissional não seja o mais adequado, já que os verdadeiros profissionais na minha concepção são os pequenos que vivem o dia a dia da pecuária.

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