Na introdução da apresentação, mostrei para a turma o perfil de envelhecimento do produtor rural. A faixa etária do trabalhador rural em 2005, segundo o SEBRAE, era de 52 anos de idade, sendo que 10 anos antes eram 50 anos. Os jovens viam o negócio de seus pais indo de mal a pior e não queriam continuar no fracasso. Acabavam abandonando a fazenda indo morar nas cidades.
No entanto, me vi apresentando isso para uma turma que queria mudar a história de suas famílias. Nesse dia eu idealizei um mundo melhor para mim e para aquela turma. Um mundo onde o produtor rural era valorizado, onde os jovens iriam preferir sair das cidades para vir trabalhar no campo. Onde produtor fosse respeitado como força motora do progresso.
Agora vejo esse mundo na Nova Zelândia. Aqui a permanência do jovem já é evidente e, ao contrário do que ocorria no Brasil, eles saem dos centros urbanos para trabalharem nas fazendas em busca de sucesso profissional, qualidade de vida e equilíbrio financeiro.
É comum ver em propriedades e eventos sobre a cadeia do leite que frequentamos, um grande número de jovens trabalhadores e produtores rurais. O sistema “Sharemilking” é um dos grandes atrativos para os que querem tentar a vida no meio rural e é o grande responsável pela ausência de êxodo rural na NZ.
No sistema “sharemilking”, o produtor (“sharemilker”) opera a fazenda em nome do proprietário em troca de um porcentagem pré-acordada. É um modelo de negócio comprovado e protegido por lei na Nova Zelândia.
O sistema é viável tanto para um proprietário já velho - e/ou desmotivado - quanto para um jovem entusiasta focado na carreira, desenvolvendo uma situação de ganha-ganha.
A vantagem para o proprietário, é poder desfrutar de uma vida longe da fazenda (caso queira) recebendo uma renda, aproveitando qualquer valorização na terra e garantindo uma boa aposentadoria. Além disso, pode fugir dos investimentos considerados de alto risco, tais como gestão do trabalho, animais e depreciação de máquinas. Por fim, pode resolver um eventual problema de sucessão familiar deixando o seu ativo nas mãos de uma pessoa qualificada e motivada.
Uma dura realidade da NZ é que a aposentaria do governo é muito baixa. Os idosos que não se preparam para velhice dependem de caridade para viver. Sabendo disso, perguntei ao Jeremy (proprietário da Back Track Dairies) o que ele planejava para previdência. Com o bom português que possui respondeu: “eu não preciso de aposentadoria, eu tenho uma fazenda. Quando eu não aguentar mais trabalhar, passo o negócio para um “sharemilker”.
Foto: Jeremy Casey (direita)
O Jeremy Casey é um caso de sucesso do sistema “sharemilking”. Há 2 anos, ele era um 50:50 “sharemilker”, exemplo de contrato mais comum do sistema. Ele se formou em agronomia pela Massey University onde conheceu sua companheira e sócia, Kim Solly.
Foram juntos para o Brasil atrás de uma proposta de emprego que receberam, contudo, em virtude de alguns desacordos, voltaram para a Nova Zelândia. Descapitalizados tiveram que começar do zero.
O Jeremy não vem de família com tradição rural. Seus pais eram professores universitários, porém sempre teve consigo o desejo de ser fazendeiro.
Aos 16 anos ele já trabalhava em fazenda de leite e sempre buscou adquirir conhecimento através dos cursos da AGITO que atualmente é a PrimaryITO, uma empresa de capacitação de pessoal agrícola na NZ.
A Kim, apesar do pai ser fazendeiro, não tinha a produção de leite como negócio da família, porém, o casal sempre acreditou na atividade como negócio lucrativo.
Voltando do Brasil o casal começou com “low order sharemilker”, pois esse modelo não se assume tantos custos na propriedade, contudo, possui menor participação da receita.
Nessa propriedade haviam 600 vacas. Depois de 3 anos financiaram um empréstimo junto ao banco, adicionaram a renda que possuíam e foram para a ilha sul, onde passaram 9 anos como “sharemilkers” na Craigleche Farms com 1950 vacas.
Nessa propriedade além de “sharemilker” o casal também era dono de 25% da propriedade.
O “sharemilker” pode ter um modelo de negócio viável, que prevê crescimento patrimonial e, portanto, a criação de riqueza tendo a probabilidade de adquirir a propriedade e ter a chance de construir com visão própria o seu negócio.
Depois de 9 anos como “sharemilkers” Kim e Jeremy venderam o patrimônio que tinham na Craigleche Farms e com a ajuda do banco mais um sócio compraram a Back Track Daires onde operam com 1200 vacas por quase 2 anos.
Foto: Família Casey-Solly .
Casos com esse são muito frequentes na NZ. Em geral ninguém se torna um “sharemilker” da noite para o dia, principalmente se o individuo acabou de chegar da cidade. O que ocorre é que a pessoa começa em um cargo mais baixo e vai sendo promovido. Abaixo segue um esquema para se ter uma idéia de como é a construção da carreira no sistema “sharemilking”.
Como em qualquer setor, é preciso atrair e reter pessoas interessadas e entusiasmadas. Um bom programa de incentivo de longo prazo, irá conduzir ao desejo e ao compromisso com as chamadas "algemas de ouro".
O Sharemilking cria um sistema no qual o empregado tem interesse em continuar no negócio, construir sua carreira e seu capital. Isso o motiva a executar um trabalho árduo, criativo e com maior eficiência.
Exemplos de contratos
Existem diferentes cenários no sistema “share milker”. As seguintes formas são as mais comuns:
• 50:50 “sharemilking” :
Neste cenário, a terra e infra-estrutura (como salas de ordenha, galpões casas e irrigação) são fornecidos pelo proprietário do terreno e o “sharemilker” fornece todo o máquinario, veículos e animais.
Esta opção exige um maior aporte de capital do “sharemilker”, no entanto, recebe uma participação de 50 % da receita bruta do leite. Os custos são geralmente compartilhados e diferem de contrato para contrato.
O sharemilker também recebe toda a descendência do gado, que é um fator-chave para a capacidade de gerar riqueza deste modelo. O sharemilker cresce e constrói patrimônio através da cria, que por sua vez pode ser vendida ou internalizada ao sistema.
• “Contractmilking”
Este cenário sharemilking pode variar, dependendo do que o sharemilker traz para a sociedade na forma de capital. Isso varia de acordo com a capacidade de investimento que pode oferecer:
- animais, máquinas e trabalho (mão de obra pessoal e/ou contratada)
- máquinas e trabalho
- Trabalho: um tipo de contrato onde o gerente passa a ter participação na receita e assume maior responsabilidade na propriedade.
Em cada um desses cenários, a sharemilker receberia uma parte diferente da receita do leite, normalmente de 17% a 30%.
Todas essas formas podem criar trampolins para 50:50 sharemilking, o que pode realmente acontecer dentro de dois a quatro anos.
Os retornos sobre o investimento para a sharemilker podem ser muito atraentes, mas também estão alinhados com o princípio de investimento de "quanto maior o risco, maior o retorno."
Para o proprietário, os retornos são atraentes e sem os riscos de trabalho, máquinas ou animais e, ao mesmo tempo, permite uma significativa renda passiva.
Exemplo para o Brasil
Foto: Vaca F1 girolando em pastejo de tifton 85 fertirrigado na Faz. Santa Isabel Pirapora:MG
O sistema “sharemilking” pode ser muito bom para o proprietário de fazenda leiteira em vários sentidos, como na garantia de um funcionário de grande valor; possibilidade de investimento em outro negócio e/ou propriedade; planejamento de aposentadoria com auxílio em planos de sucessão familiar.
Na NZ a maioria dos casos de sucessão familiar se dá por este sistema.
É uma verdadeira parceria de negócios com base na confiança para ambas as partes. Um proprietário precisa ter fé que seu ativo será cuidado e melhorado, tanto no que diz respeito à geração de lucro quanto no capital adicionado à fazenda.
Além da confiança é importantíssimo se preparar com um contrato claro e detalhado. Procure pessoas que têm boa ética de trabalho e capacidade de organizar, planejar e criar um bom ambiente de trabalho da equipe.
Um potencial parceiro deve ter um bom tino comercial, ter boas noções de mercado bem como o valor de se produzir um litro de leite.
Quando se chega no patamar de sharemilker o parceiro deve ter experiência no ramo de produção leite, mesmo que em posições inferiores. Nesse caso a experiência é crucial para sucesso. Apesar do sistema ser voltado para as novas gerações, é importante lembrar que o processo de construção de capital se inicia como funcionário na fazenda.
Por fim a capacitação é o mais importante. Eu ouvi de um grande sharemilker na nova Zelândia que não existe esse negócio de sorte, a informação está ao alcance de todos.