Numa era em que é tão fácil ter acesso a informação, vivemos um inesperado reducionismo, em que São Paulo é o centro das atenções e não importa o que acontece na periferia, que é o resto do Brasil. A imprensa “nacional”, por exemplo, me informa diariamente tudo sobre os feitos e desfeitos do Kassab, sobre as subprefeituras, a movimentação política dos pré-candidatos a prefeito de São Paulo. Aos poucos, vamos esquecendo que há um imenso Brasil pulsando firme.
Assim, para ser notícia, o fato ou feito tem de acontecer em São Paulo. Do contrário, não existiu. Minas Gerais não tem um jornal impresso que circule em São Paulo. Então, o que acontece em Minas e nos outros estados não interessa a São Paulo e não chega ao Brasil. Aos poucos, o reducionismo transformou em verdade o dito popular. Minas e o Brasil realmente trabalham em silêncio. Não por opção, mas por falta de. Pois eu, na contramão do fluxo, remando contra a maré e sem bairrismos, vou me valer do nosso MilkPoint, que é a nossa janela piracicabana com vistas para o mundo. Vou falar desse Fórum do Leite!
Em 2004, quando assumi a direção da Embrapa Gado de Leite, reivindiquei que tivéssemos acento na Câmara Setorial do Leite e Derivados do Ministério da Agricultura – MAPA. Fui o primeiro dirigente de uma Unidade de Pesquisa da Embrapa a ser membro efetivo de uma das várias câmaras setoriais do MAPA. Nesta condição, fui eleito e reeleito seu Secretário Executivo até 2008, ano que deixei o cargo de dirigente da Unidade.
O meu empenho tinha um motivo. Via na indústria láctea brasileira uma incapacidade de atuar como coordenadora do setor. A indústria láctea, que é o somatório de todas as empresas industriais, tinha e ainda tem comportamento imaturo. A indústria não consegue emitir sinais claros para os produtores e para os governos, estaduais e federal, sobre que caminhos ela deseja seguir. O setor industrial atua de modo errático, com visão de curtíssimo prazo e com análises frágeis e parciais. Três meses é horizonte de longuíssimo prazo e, portanto, de difícil previsão.
Neste cenário de mutação contínua, o produtor, o consumidor e o próprio empresário de laticínios vivem num ambiente de instabilidade tamanha, que é necessário criar ambientes de concertação com “c”, de entendimentos, para que o setor revele e supere suas contradições e, num segundo momento, encontre seu caminho. Em 2004, imaginava que este lugar seria a Câmara Setorial do MAPA e os avanços obtidos demonstraram que sim, pois tiveram a inequívoca participação da Câmara Setorial.
Agora, surge o Fórum do Leite em Minas, que traz três importantes inovações. A primeira é que o Fórum está vinculado diretamente ao Governador. Num regime presidencialista, isso faz toda a diferença, pois dá peso ao Fórum e permite que assuntos transversais, que dizem respeito a várias esferas de Governo sejam tratados sob o olhar e ouvido do seu principal mandatário. Sempre é bom lembrar que, num Governo, os únicos com mandato são o Governador e seu Vice.
A segunda importante inovação é sua composição. Fazem parte duas secretarias (Agricultura e Desenvolvimento Econômico) e dois órgãos estaduais de fomento (Banco de Desenvolvimento – BDMG e Fundação de amparo à pesquisa – Fapemig). Pelo setor privado, têm acento um representante dos produtores (FAEMG), dos trabalhadores (FETAEMG), da indústria (FIEMG e Silemg), cooperativas (OCEMG) e do Comércio (FECOMÉRCIO). Um Fórum enxuto, você concorda? Isso facilita muito. Nos meus tempos de Câmara Setorial chegamos a ter 48 entidades!
A terceira inovação é a participação do Escritório de Prioridades Estratégicas do Governo de Minas. Eu sei que você nunca ouviu falar desse órgão e isso faz parte da estratégia. Para entender o motivo, acesse https://www.escritorio.mg.gov.br. Com status de secretaria de Estado e diretamente vinculado ao Governador, este órgão é fruto da belíssima e inovadora experiência que foi o “Choque de Gestão”, implantado na gestão pública mineira. Congrega um conjunto restrito de técnicos muitíssimo bem formados e experientes, que tem a missão de interagir com todas as secretarias e empresas do Governo de Minas, para que as metas sejam atingidas.
Como pesquisador interessado em arranjos eficientes de gestão, tenho acompanhado os resultados desta equipe, por meio de trabalhos publicados em revistas e congressos científicos. Por outro lado, como professor da disciplina Administração Pública, na Universidade Federal de Juiz de Fora, adoto dois livros que organizam esta experiência e que foram editados pela UFMG (“Estado para Resultados – avanços no monitoramento e avaliação da gestão pública em MG” e “Empreendedores públicos no Governo de Minas Gerais”).
Leite e Derivados tem a cadeia produtiva mais longa do agronegócio brasileiro. Isso cria uma dificuldade adicional para a resolução de problemas dentro de governos, pois as soluções, em geral, não são geradas somente por uma secretaria ou ministério, pois resultam da interação de diferentes secretarias e ministérios. Por exemplo, o MAPA não pode efetivamente resolver uma questão de tributos ou a manutenção de cotas de importação de leite para a Argentina. No Governo Federal, quem faz a harmonização de ministérios é a casa Civil, que tem um perfil político – não técnico. Portanto, resolver um problema setorial no âmbito federal exige muita energia, muita dedicação, muita ida a vários ministérios por parte das lideranças do setor.
Pois a presença do Escritório de Prioridades Estratégicas do Governo de Minas no Fórum do Leite evidencia a prioridade que está sendo dada a esta iniciativa. Mais que isso, assegura que as posições tomadas no seu âmbito têm muito melhores chances de se transformarem em efetivas decisões de Governo e de serem implementadas, pois esse órgão tem a marca da eficiência técnico-administrativa. Portanto, por este e pelos outros dois motivos, compensa acompanhar esta experiência inovadora, que está apenas no seu início. Afinal, coisas acontecem além de São Paulo!