A questão foi levada à 1ª Seção por meio de embargos de divergência contra decisão favorável à concessionária Bigger Caminhões, do Paraná. O ministro decidirá se aceita ou não o recurso — usado quando há discordância entre a 1ª e a 2ª Turma.
Além do segmento automotivo, estão no regime monofásico companhias dos setores de combustíveis, pneus, cosméticos, bebidas, tratores e medicamentos. Nesse regime especial, a cobrança do PIS e da Cofins é concentrada no primeiro elo da cadeia produtiva — o fabricante ou importador.
O assunto discutido no recurso apresentado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) é complexo por envolver duas teses. Uma delas refere-se ao direito a créditos de PIS e Cofins sobre o transporte de mercadorias do fabricante ao revendedor. A outra trata da possibilidade de estender esse direito às empresas tributadas pelo regime monofásico.
A 1ª Seção do STJ já decidiu que concessionárias de automóveis podem descontar créditos relativos a frete do cálculo do PIS e da Cofins (REsp 1215773). O entendimento, inclusive, foi aplicado pela 1ª Turma no caso da Bigger Caminhões (REsp 1477320).
Contudo, nos embargos de divergência, a PGFN argumenta que a decisão da 1ª Seção não foi unânime. Alega que, de acordo com o voto do ministro Gurgel de Faria, como concessionária é tributada pelo regime monofásico, não teria direito ao aproveitamento de créditos de PIS e Cofins. Isso seria válido apenas para o regime da não cumulatividade.
No recurso, a procuradoria alega ainda que a 2ª Turma entende de forma diferente. Ao analisar o caso da concessionária gaúcha San Marino Veículos, em 2014, os ministros decidiram que contribuinte no regime monofásico não pode usar créditos sobre frete (REsp 1215773).
A Lei nº 10.833, de 2003, permite expressamente o uso de créditos de PIS e Cofins sobre frete em operação de venda para cliente final. Mas não fala do chamado frete interno ou de logística, para locomoção de produtos a um centro de distribuição, por exemplo. “A Receita diz que não há direito a créditos nesses casos”, diz o advogado Luis Augusto Gomes, do Viseu Advogados.
Porém, Gomes afirma que a PGFN apresentou decisões muito antigas do STJ contra o aproveitamento de créditos por empresas tributadas no regime monofásico, nos embargos de divergência. “A tendência é o STJ manifestar que as decisões divergentes apresentadas pela procuradoria não tratam da mesma matéria”, diz.
Para o advogado, a decisão “será importante tanto para as empresas no regime monofásico como para as que têm gastos com frete na logística interna”.
O advogado Geraldo Valentim, do MVA Advogados, acompanha pelo escritório alguns casos parecidos com o da Bigger Caminhões. Em seu entendimento, como o recurso analisado pela 1ª Seção do STJ não foi tratado como repetitivo, o tema pode ser novamente analisado. Mas diz haver vários fundamentos para ser mantido o entendimento favorável às empresas. “O regime monofásico não é incompatível com a não cumulatividade.”
Valentim ainda destaca que o ministro Sergio Kukina, em seu voto, posicionou-se a favor da Bigger. Levou em consideração decisão da própria Corte, no recurso repetitivo que definiu as características de insumo (REsp 1221170) . Segundo a decisão, o que é “essencial” ou “relevante” para a atividade de uma empresa é insumo e gera créditos.
A advogada Glaucia Lauletta, do Mattos Filho Advogados, também relaciona a discussão da Bigger à decisão do STJ sobre o conceito de insumo. Ela diz que toda grande varejista tem que arcar com o frete do transporte da mercadoria do centro de distribuição para as lojas, o que é essencial para o negócio. “Por isso, independentemente de estar na tributação geral ou no regime monofásico, a lei autoriza o aproveitamento desses créditos”, afirma.
Representante da Bigger no processo, Isabele Françóia, do escritório Harry Françóia & Advogados Associados, lembra que obteve decisão favorável à concessionária Ponto K no STJ (REsp 1679897), que não foi contestada e contra a qual não cabe mais recurso. Por isso, achou que a PGFN não recorreria da decisão no caso da concessionária de caminhões.
“Manteremos a tese de que a Lei nº 10.833 permite o uso dos créditos de PIS e Cofins. Assim como quatro decisões do STJ já permitiram o uso do incentivo da Lei do Reporto (nº 11.033, de 2004) por empresas no regime monofásico. Um desses processos poderá também ser analisado pela 1ª Seção [REsp nº 1051634]”, diz a advogada.
Por nota, a PGFN afirma que o tema está na 1ª Seção também por afetação dos ministros da 2ª Turma. Diz ainda que em qualquer setor cuja tributação seja monofásica é inviável o “creditamento do frete”. E conclui que reconhecer esse crédito equivaleria a instituir benefício fiscal sem lei específica, “o que contraria o Código Tributário Nacional e a Constituição Federal.
As informações são do jornal Valor Econômico.