Os setores defensivos na Europa se apoiam nos riscos da concorrência do Mercosul para seus produtos, como também em declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre meio ambiente, trabalho infantil e outros temas particularmente sensíveis que consideram inquietantes.
“Se você olha o que aconteceu com acordos precedentes com Canadá e Japão, antes da ratificação, a UE fez a implementação provisória dos acordos para ter o acesso aos mercados”, afirmou a diretora-geral do Comitê Europeu de Fabricantes de Açúcar (Cefs), Marie-Christine Ribera. “Mas a implementação provisória do acordo precisa ser rejeitada, já que isso ameaça causar danos graves a nosso setor, que o próprio comissário agrícola, Phil Hogan, reconheceu com seu compromisso de fornecer até um bilhão de euros para a agricultura em caso de perturbações no mercado”, acrescentou.
Para a representante do setor de açúcar, não só será necessário esperar o acordo com o Mercosul ser submetido aos Estados membros e ao Parlamento Europeu, como também, se aprovado, que as concessões feitas pela Europa sejam “reforçadas em linha com os compromissos europeus sobre meio ambiente, mudança climática e direitos trabalhistas, acompanhados de implementação adequada”.
Um porta-voz de comércio da Comissão Europeia, indagado sobre a posição de produtores, respondeu que o acordo Mercosul-UE faz parte de um tratado de associação, incluindo também provisões relacionadas a uma cooperação política mais ampla. Assim, a aplicação dos procedimentos europeus precisa ser decidida caso a caso, baseada no conteúdo específico do acordo. “Dito isso, acordos similares concluídos pela UE no passado requereram a validação por todos os Estados membros, pelo Parlamento Europeu e por voto dos ministros no Conselho (Europeu).”
A representante do setor de açúcar diz que seu foco principal é a competitividade do seu setor, mas, “quando lemos certas declarações de Jair Bolsonaro, não podemos nos impedir de pensar que não vai na boa direção e por isso 340 ONGs se opuseram”.
Na mesma linha, numa questão do jornal “Le Monde” sobre se o acordo é um cheque em branco para o “Bolsonaro desmatador”, o ativista Nicolas Hulot responde que “não podemos entender como, numa questão universal, se assinar um acordo com um país que desrespeita assim a proteção (do meio ambiente)”.
Para certos observadores na Europa, Bolsonaro vem criando ruído adicional com sua retórica. Aumenta a confusão já provocada pelo ruído protecionista europeu e pelo estigma de Amazônia ameaçada que qualquer governo no poder em Brasília enfrentaria.
A avaliação é de que, de um lado, o acordo Mercosul-UE serve para recordar aos europeus a relevância do Brasil como economia e o caráter reformista do atual governo. Mas, de outro lado, chama atenção para aspectos polêmicos, sobretudo no meio ambiente, direitos humanos, proteção de povos indígenas.
Assim, o governo brasileiro precisa pilotar com ainda mais cuidado a imagem do país na Europa, em meio à necessidade de o acordo ser aprovado no Parlamento Europeu e nos Legislativos nacionais.
As informações são do jornal Valor Econômico.