Todo esse histórico contribuiu para que a cidade de Cruzília se tornasse um dos principais polos de queijos nobres no estado.
“O meu pai, o Sr. José Moreira, era de Lima Duarte/MG e a sua família era de origem pobre. Ele era empregado de uma propriedade leiteira que fazia queijos. Juntando dinheiro e com um sonho de tentar a vida em São Paulo, em 1948 ele deu a primeira cartada para o desenrolar da nossa história: adquiriu uma banca no Mercadão de São Paulo para vender queijos. Agraciado com um forte tino comercial e muita carisma, ele foi crescendo e, com a suas economias, conseguiu uma casa para trazer os seus pais e irmãos que viviam na roça. Na época, também conheceu a minha mãe, foi desenvolvendo o seu negócio e comprando novas bancas”, explicou Luiz Sérgio Medeiros de Almeida, Diretor Industrial do Laticínio Cruzília, em entrevista exclusiva ao MilkPoint.
Segundo Luiz, com a situação mais estabilizada, o Sr. José adquiriu uma fazenda na década de 80 em Cruzília e em 1989 montou uma fabriqueta de queijos. Ele usava como matéria-prima o leite da propriedade, na época, 400 litros/dia. Os queijos fabricados passaram a ser levados então ao Mercadão para serem comercializados (antes, os queijos vendidos eram de terceiros).
“Mesmo com formação em música pelo conservatório de Tatuí/SP, eu sempre participei da rotina de negócios do meu pai nas férias ou tempo livre. Em 1996, comecei a tocar o negócio com o meu pai em Cruzília e passamos a nos dedicar exclusivamente à produção queijeira, focando no mercado de produtos finos”, destacou Luiz.
Na década de 90, várias multinacionais compraram as queijarias da região e como resultado disso, vários queijeiros experientes e capacitados ficaram desempregados, o que favoreceu a absorção destes pelo Laticínio Cruzília, impulsionando a linha de queijos finos (tipo Gruyère, Emmental, queijos de mofo azul, mofo branco, entre outros). “Nós sempre tivemos a cultura de também inventar nossos próprios queijos. Acredito que isso seja uma particularidade nossa. O meu lado artístico contribui para isso”, complementa. O laticínio também fabrica uma pequena quantidade de queijo prato, mas não é o foco do negócio.
Queijos Cruzília
Hoje passam pela indústria de 40 a 50 mil litros de leite/dia, que resultam em cinco toneladas de queijos diariamente.
Tradição & Novas tecnologias
Luiz não nega que tinha muito preconceito com novos equipamentos para a sua indústria láctea. Ele acreditava que o queijo deveria ser feito apenas por meio das mãos dos queijeiros e não necessitava passar por máquinas. Mas, quando foi para a Europa em 2010, conheceu queijos premiados feitos na própria fazenda e que contavam com as facilidades do maquinário e outras tecnologias. “Nesse momento percebi que é uma bobagem ficarmos agarrados com as tradições. Temos medo do novo. Depois dessa viagem mudei os meus conceitos e hoje estamos com várias máquinas novas, inclusive, focadas nas embalagens para queijos com olhaduras, entre outras”.
Queijos produzidos
Luiz diz que sempre ‘bate na tecla’ para que nós brasileiros evitemos a ‘síndrome do cachorro vira-lata’, pois produzimos queijos muito bons e precisamos aprender a valorizar isso. “Na minha opinião, deveríamos dar novos nomes para os queijos produzidos no país. Por que ainda ficamos dando nomes europeus para os nossos queijos com um ‘tipo’ na frente? Um queijo não leva um nome pela sua tecnologia de fabricação, mas também, por seu terroir agregado. O verdadeiro gorgonzola só existe na região de Gorgonzola da Itália. Precisamos parar de querer fazer esses queijos e lutar para lançar nossos próprios nomes. O maior problema é que, ao fazer isso, acabamos esbarrando no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e as burocracias que o rodeiam. É mais fácil os queijos estarem vinculados a nomes já conhecidos”, acrescenta.
A linha Cruzília Reserva trabalha hoje com os seguintes queijos: Gouda, Brie, Fondue, Prato Esférico, Estepe, Gruyère, Gorgonzola, Emmental e Camembert. Já a linha de queijos próprios conta com os queijos A Lenda, Santo Casamenteiro e Azul de Minas. “Conseguimos registrar com muito esforço o Azul de Minas em 2010. Ele é o primeiro queijo de mofo azul criado e fabricado em terroir brasileiro. O leite é selecionado e as cepas especiais de fermento são maturadas por 45 dias”.
Queijo Cruzília Santo Casamenteiro (a)
Queijo Cruzília Santo Casamenteiro (b)
A equipe Cruzília conseguiu atingir um queijo com acidez adequada, sabor adocicado e um cheiro inigualável. “Passamos a maturar esse queijo e para que ele alcançasse o ponto ideal, nos tornamos adeptos de alguns procedimentos para evitar bolor e outras características indesejáveis. Um dia, um dos funcionários relatou que os queijos estavam mudando de lugar durante a noite e, além disso, pelas manhãs, já estavam limpos. Também, ele dizia sentir a presença de ‘fantasmas’ no dia a dia dentro da câmara. Desde então, passamos a acreditar que o queijo ‘A Lenda’ conta com a ajuda de uma ‘mãozinha’ extra do outro mundo. Dizemos hoje que o produto é ‘feito a quatro mãos’”, explicou.
Os queijos da Cruzília já ganharam vários prêmios e o mais recente foi a conquista de uma medalha de prata no 3º Concurso Mundial de Queijos, realizado em Tours, na França, neste mês de junho.
Distribuição dos queijos
Atualmente, o Laticínio Cruzília vende os seus produtos para as principais redes varejistas do Brasil (rede Pão de Açúcar, Casa Santa Luzia, St. Marche, WalMart, Eataly, Carrefour, Bom Preço, entre outros) e também tem uma loja própria no Mercadão Municipal de São Paulo. No ano passado, a empresa não sofreu os impactos da crise. “Já no primeiro trimestre deste ano, sentimos uma queda nas vendas, mas, agora recuperamos. O frio também contribui com o aumento no consumo”, finalizou Luiz.