O período que compreende a transição entre a secagem da vaca em lactação e o início de uma nova lactação é um dos maiores desafios para o controle da mastite.
Porque ocorre a mastite no pós-parto das vacas?
Logo após a secagem do animal, o aumento de pressão intramamária, muitas vezes com extravasamento de leite, associado ao aumento tardio na migração de células de defesa da glândula mamária (1 semana pós-secagem) e à demorada formação do tampão de queratina (1 a 2 semanas pós-secagem), substância que veda o canal do teto impedindo a invasão por patógenos, são fatores que aumentam o risco de aparecimento de mastite. Para temos uma ideia, uma diferença de 12,5 kg de leite para 17,5kg na secagem do animal pode aumentar o risco de infecção intramamária por bactérias ambientais em 77%.
Próximo ao parto, 2 semanas pré-parto até 2-3 semanas de lactação, os riscos de infecção intramamária aumentam ainda mais (Figura 1). Nesta fase, o início da secreção de colostro, com abertura prematura do canal do teto, aumenta muito o risco de infecções intramamárias. Ao mesmo tempo, ocorre uma série de mudanças hormonais, redução no consumo e aumento das exigências nutricionais, além da redução na capacidade de defesa do organismo contra infecções (imunidade do animal).
Figura 1. Distribuição do número de casos clínicos de mastite em relação a data do parto, baseada em dados de 28 rebanhos leiteiros da Nova Zelândia (Adaptado de McDougall et al, 2007).
A defesa da glândula mamária pelo sistema imune é complexa e envolve componentes celulares e solúveis. Entre os principais componentes celulares está o neutrófilo e como componentes solúveis podemos mencionar a lactoferrina, lisozimas, peptídios antimicrobianos e imunoglobulinas. Durante o peri-parto, a capacidade de ação destes componentes fica prejudicada devido às mudanças hormonais e físicas preparatórias para o nascimento do bezerro. Associado a essas mudanças ocorre grande produção de radicais livres essenciais no combate de infecções, mas que em excesso podem reduzir a meia vida das células imunes prejudicando ainda mais seu funcionamento.
A utilização da terapia de vacas secas no momento da secagem pode reduzir a incidência de mastite pós-parto tanto pela eliminação de agentes infecciosos presentes na glândula mamária, impedindo a rápida multiplicação dos microorganismos no momento do parto, quanto pela proteção contra novas infecções no período seco. A antibioticoterapia pré-parto também é uma ferramenta que pode ser utilizada no controle da mastite em novilhas, principalmente em relação ao controle de agentes do grupo dos estafilococos coagulase-negativa.
A etiologia dos agentes bacterianos difere entre os países e entre vacas primíparas e multíparas. De forma geral, os maiores desafios para sanidade da glândula mamária no momento do parto são impostos por bactérias ambientais, especialmente as do grupo dos coliformes. No período seco e início de lactação as bactérias que prevalecem são Streptococcus uberis e, ao contrário do período próximo ao parto, com o avanço da lactação as bactérias que mais prevalecem são de origem contagiosa com predominância do Staphylococcus aureus. Cabe ressaltar que a intensidade da reação inflamatória causada pelos coliformes no peri-parto é muito maior que a reação causada num animal em lactação avançada.
O diagnóstico de mastite clínica pós-parto tem que ser ajustado de acordo com as características físicas do leite neste período, por exemplo, a contagem de células somáticas (CCS) se apresenta elevada logo após o parto e decresce após 3 a 4 dias. O Califórnia Mastitis Teste (CMT) é dotado de sensibilidade e especificidade suficientes para detectar infecções intramamárias 3 dias pós-parto, podendo ser utilizado nesta fase para auxiliar no diagnóstico da mastite subclínica. Nos momentos que antecedem ao parto, o leite pode ser extraído e examinado associado ao monitoramento do úbere formando importante ferramenta para o diagnóstico da mastite clínica pré-parto.
O manejo de vacas secas tem grande influência na incidência de mastite pós-parto. A alimentação de vacas secas e período de transição devem conter teores adequados de minerais (selênio, cobre e zinco) e vitaminas (E e A) que desempenham papéis importantes na defesa da glândula mamária contra infecções. O consumo de alimento pelos animais não pode ser restringido, mas o excesso de alimentação pode ser perigoso; assim, a utilização do monitoramento da condição do escore corporal pode ser uma alternativa valiosa nesse momento.
Outros fatores de manejo considerados de risco, que podem resultar em aumento da CCS no início da lactação é o uso intensivo de alimentação concentrada para novilhas e a transferência dos animais para um sistema de confinamento próximo ao parto. O risco de infecções intramamárias também pode aumentar quando fêmeas primíparas são alojadas com multíparas. O edema de úbere, a mastite subclínica pré-parto, altura do teto em relação ao solo e até a raça do animal constituem fatores de risco para o aparecimento de mastite.
A manutenção do ambiente limpo, seco, ventilado e confortável, a boa desinfecção dos alojamentos e o alojamento de primíparas e multíparas em locais separados, podem auxiliar na prevenção da mastite pós-parto. Vacinas contra mastite quando utilizadas podem não prover adequada proteção contra infecções subsequentes devido grande número de patógenos existentes, mas talvez num futuro próximo o desenvolvimento de novas vacinas pode ser beneficiado por técnicas moleculares.
Considerando os elevados riscos de manifestação da mastite clínica pós-parto, técnicas de manejo, alimentação, prevenção e monitoramento devem ser criteriosamente adotados desde o momento da secagem até o início da lactação. Desta forma os prejuízos causados tanto pela mastite clínica quanto pela subclínica podem ser reduzidos durante a vida produtiva do animal.
Fonte: Pyoala,S. Reprod Dom Anim 43 (Suppl. 2), 252-259 (2008).