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Sinais dos novos tempos

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 24/09/2012

8 MIN DE LEITURA

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Entre 10 e 13 de setembro, realizamos 3 eventos em Uberlândia/MG: o 1º Encontro MilkPoint para a Indústria de Laticínios, o Jantar Top 100 e o 12º Interleite - Simpósio Internacional sobre Produção Intensiva de Leite. Ao todo, apesar do momento ruim de mercado, mais de 900 pessoas compareceram ao evento e, certamente, saíram de Uberlândia com um retrato das mudanças pelas quais o setor passa no Brasil e no mundo.

No Encontro de Laticínios, Tim Hunt, estrategista global de lácteos do Rabobank, e Andrew Novakovic, professor da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, começaram a dar o tom destas mudanças.


Andrew Novakovic (com microfone) e Tim Hunt, durante a sessão de perguntas do 1º Encontro MilkPoint para a Indústria de Laticínios

Hunt mostrou que o custo de produção em países exportadores vem crescendo ao longo dos anos, e assim devem continuar. Em locais que dependem de forte suplementação de grãos, a alta destes insumos após 2007, ainda que seguida de períodos momentâneos de baixa, coloca pressão sobre os custos. Em locais com produção a pasto, a elevação dos custos de fertilizantes, a rápida elevação dos valores da terra e o risco climático colocam desafios adicionais a um tipo de exploração que, antes, era tido como de baixo custo e risco, capaz de suportar períodos de preços mais baixos por mais tempo do que regiões com alta suplementação. Isso não é necessariamente verdade, como mostrou Hunt.

Já no Interleite, Torsten Hemme, do IFCN, da Alemanha, mostrou que, nos últimos anos, percebe-se uma tendência de redução de custos dos países tradicionalmente pouco competitivos, como Estados Unidos e Europa e, ao mesmo tempo, ocorre tendência oposta nas regiões em que Hunt já havia apontado. O resultado disso é que, em um espaço de não mais do que 7 anos, a defasagem de custos, em que Europa e América do Norte apresentaram valores cerca de 2 vezes mais altos do que Nova Zelândia, Austrália, Brasil, Argentina e outros, não mais existe. Há uma convergência em torno dos US$ 0,40/kg de custo médio e o que preocupa é a tendência: enquanto os antes "caros" agora seguem rumo descendente de custos (e mantinham suas exportações mediante fortes subsídios), os antes "baratos" seguem caminho inverso.

Claro que a valorização das moedas emergentes (e a desvalorização das moedas dos países ricos) e a elevação do custo da mão-de-obra nos primeiros exercem papel fundamental nessa inversão de posições. Em palestra recente no Encontro da ABLV, o economista Ricardo Amorim prevê que essa tendência deve continuar: o forte crescimento asiático demanda commodities das quais o Brasil, por exemplo, tem de sobra. Isso eleva a entrada de dólares por aqui, valorizando o real. Com o crescimento do valor das commodities (não só alimentícias, mas minério de ferro, petróleo, madeira, etc) e com a redução do custo de produtos de alta tecnologia, nosso poder de compra aumenta e tendemos a importar mais produtos industrializados.

Não é à toa que, desde que a China entrou na OMC, nosso crescimento anual dobrou de valor; já o dos países desenvolvidos, os que mais sofrem com isso, já que possuem forte base industrial assentada em custos mais elevados, caiu pela metade. Segundo Amorim, a solução para a retomada do crescimento desses países está na desvalorização de suas moedas, voltando a trazer competitividade. Veremos, assim, a volta de produtos Made in USA e Made in Europe. E esse cenário deve perdurar por algumas décadas, já que após a China ainda há a Índia, outro gigante com mais de 1,0 bilhão de habitantes e cuja urbanização, elevando a demanda por insumos, ainda é incipiente. Amorim disse que não seria surpresa se, em um futuro não muito distante, o real valesse mais do que o euro.

As discussões que ocorrem entre Brasil e Estados Unidos nesse momento já são reflexo dessa questão. O aumento de crédito nos países ricos, o chamado "tsunami monetário" apontado pela presidente Dilma, piora ainda mais o câmbio (para os emergentes), gerando reações contrárias como a elevação das tarifas de importação para mais de cem produtos promovida pelo Brasil e criticada pelos EUA.

Segundo estudo realizado por professores da FGV-SP, em junho o dólar estaria desvalorizado em 8% em comparação ao câmbio de equilíbrio, ao passo que o real estaria valorizado em 15%, gerando um distanciamento de 23% entre as moedas. "É como se os Estados Unidos desse um subsídio de 8% para todos os produtos", compara a professora Vera Thorstensen, em matéria publicada no Estado de S. Paulo de 24/09. É o câmbio atuando no protecionismo - e tudo indica que isso continuará.

Independentemente do que ocorrerá com o câmbio, uma coisa é certa: vamos ter que aumentar nossa eficiência em todas as áreas - indústria, agricultura e serviços.

O problema do leite (por aqui) é que essa essa transformação não chegou ainda ao campo. Não melhoramos em termos globais nossa eficiência, a indústria é fragmentada, há um alto custo Brasil que não foi atacado ainda (taxas sobre importação de equipamentos, por exemplo). De certa forma, trabalhamos ainda pensando na época em que nossa moeda era competitiva, o que não faz muito tempo: em 2002, o dólar chegou a valer R$ 4. O que nos sobra nesse cenário? Proteger nosso mercado, barrando ou limitando as importações, e esquecendo o potencial exportador. Aliás, a agenda de nossas lideranças tem sido basicamente esta, desde a política anti-dumping. É hora de virar o disco, ou pelo menos começar a virá-lo, o que, diga-se, não é fácil.

Se pelas lideranças essa virada ainda não vem, o campo e a pesquisa dão suas respostas. O Interleite Brasil 2012, assim como a edição passada, trouxe uma série de casos de sucesso, utilizando com eficiência os recursos produtivos e a terra. Gente como José Renato Chiari, de Morrinhos, Goiás, produzindo ao redor de 50.000 litros/ha/ano sob pivô central e com uma lucratividade que bate muitas commodities agrícolas; gente como Makoto Sekita, de Minas Gerais, que utilizando integração lavoura-pecuária economizará cerca de R$ 3 milhões anuais em fertilizantes para sua cenoura, seu alho e sua beterraba (sem contar o aumento de produtividade dessas culturas com o esterco das vacas), quando o projeto estiver em sua plenitude; gente como Luiz Girão, com 17.000 litros diários no Ceará, sob irrigação e custo total de menos de R$ 0,62/litro, e com muito ainda a fazer. Esses produtores estão encontrando formas de produzir com eficiência, com lucratividade, usando a tecnologia disponível, trabalhando planejamento e gestão, sendo o retrato da constatação de que o leite, cada vez menos, vai comportar amadorismos. Esse Interleite, acima de tudo, mostrou isso.


Palestra do produtor Luiz Parta Girão

É uma revolução silenciosa em curso, que talvez seja mais rápida do que imaginamos. Hemme, do IFCN, mostrou o forte aumento no módulo de produção ocorrido em países como Dinamarca, Polônia e Holanda. Nesses países, em menos de 15 anos o mercado mudou e se profissionalizou. O economista coloca que o mesmo pode ocorrer com o Brasil: "pode ser mais rápido do que imaginam", refletiu ele. Tudo indica que tenha chegado a hora da mudança, ainda que o processo seja lento e que retratos do passado continuem co-existindo por um bom tempo (principalmente se as políticas públicas assim o quiserem).

Antes que se critique que o que está se propondo é um modelo baseado na grande exploração, o próprio Interleite teve em sua palestra de encerramento um exemplo de um produtor familiar que, de 36 litros diários, hoje possui 2 propriedades de leite com produção de alguns milhares de litros por dia. É Nivaldo Michetti, de Paranaíta-MT. O mais interessante é que a filosofia de trabalho de Michetti em nada difere dos produtores acima mencionados: tecnologia adequada ao sistema, controle de custos, presença do proprietário na propriedade (ou gestão profissional), bom relacionamento com seu cliente (o laticínio), visão de longo prazo, busca constante por informação. É um padrão que vem se repetindo nestes produtores e começa a dar o tom do futuro.

Por fim, um outro aspecto importante levantado pelo Interleite e pelo Encontro de Laticínios: a criação de instrumentos para lidar com a volatilidade de preços e insumos. Nesse sentido, o exemplo mais oportuno são as discussões em torno das novas políticas públicas para o leite nos Estados Unidos, que podem entrar em vigor no ano que vem. Como mostrou o professor Novakovic, os instrumentos atuais, como preços mínimos, não são mais efetivos como eram no passado, uma vez que com a flutuação dos custos nem sempre um preço mínimo é garantia de rentabilidade.

O que se estuda hoje é um seguro de margem, em que se a receita menos o custo de alimentação cair abaixo de um determinado valor (cerca de R$ 0,20/kg), o governo paga a diferença até esse limite. O melhor, porém, é o que vem depois. O produtor pode, a seu critério, segurar uma margem maior, claro que com custos crescentes dependendo do valor a ser segurado. Assim, o produtor pode se proteger em relação a flutuação das margens na produção, exigindo um conhecimento que vai bem além da adubação de pastagens ou do controle de mastite, por exemplo. Além desse instrumento, há mercados futuros que podem ser também trabalhados como ferramenta de proteção.

Tudo isso sinaliza novos tempos. É fundamental que tenhamos essa leitura e que possamos discutir de forma mais objetiva para onde queremos ir: ou optamos por manter nosso mercado via proteção, ou criamos uma agenda de mais longo prazo, onde instrumentos como esses possam ser trabalhados e onde posssamos recuperar nossa competitividade através do trabalho. Pesquisa, extensão, instrumentos financeiros, ambiente de investimentos, aumento da produtividade da terra e do trabalho, e relacionamento entre os elos, são aspectos fundamentais nesse caminho.

Finalizando, é bastante oportuno o artigo Harmonização Agroindustrial , escrito pelo professor Décio Zylberstajn, também no dia 24/09 no Estado de S. Paulo. Falando sobre a necessidade de melhor coordenação das cadeias produtivas, tendo como exemplo as dificuldades da citricultura e da pecuária bovina, ele avisa: "os conselhos das corporações atuantes dos sistemas de base agrícola, os governos e as entidades de representação setorial podem observar uma regra simples: se a agenda setorial é tomada exclusivamente pelo debate de preços e custos, algo me diz que perdem grande oportunidade de preparar o futuro".

Concordo com ele.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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WAGNER BESKOW

CRUZ ALTA - RIO GRANDE DO SUL - PESQUISA/ENSINO

EM 30/09/2012

Marcelo:



Gostei muito da matéria. Além de informar, induz ao pensar o futuro. Aquela parte do seguro de margens, não creio que governo algum deva se meter nisso. Aliás, defendo sempre governo o mais fora de tudo possível. Aquilo ali só seria viável com contabilidade fiscal a risca e não existe país do mundo que não faça uma "química" na contabilidade para o lado que lhe convém. Se a contabilidade fosse fiel, o setor privado poderia oferecer esse seguro. Inclusive poderia ser fixado uma margem abaixo da qual o segurado paga, acima ele recebe. Seria justo e um bom negócio para o produtor que nunca mais teria prejuízos, mas tampouco surfaria nas ondas altistas... No fundo, sói algo assim se autofinanciaria. Mas isso não vai ocorrer. Tem o setor é que aprender que não existe "patamar de preços". Riscar do vocabulário essa expressão e tentar entender cada vez mais as curvas de altos e baixos, lá fora e aqui dentro.



É lindo ver casos de sucesso, não é mesmo? Esse país ainda vai dar muito o que falar no leite. Tenho certeza que dominaremos o mercado mundial de lácteos. Não há como fugirmos disso, vem vindo, já consigo até enxergar.



O que não queremos é um real supervalorizado, mas aí o Federal Reserve Bank vai ter que parar com a política de imprimir dinheiro que vem crescendo desde 1970 no EUA. Nsse cenário, as coisas ainda não estão claras.

EKAPPEL

PORTO ALEGRE - RIO GRANDE DO SUL - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 27/09/2012

Acredito que esteja na hora dos formados em Administração de Empresas olharem para estas oportunidades que estão aparecendo, pois as propriedades precisam ser tratadas como empresa e assim ser utilizado ferramentas de gestão empresarial.
ROGERIO RAMES BASILIO

IPAMERI - GOIÁS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 24/09/2012

A grande verdade e uma so temos muito trabalho a ser feito com muito eficiencia.
REINALDO TERRA FREITAS

PIUMHI - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 24/09/2012

    É muito importante para nós produtores, termos acesso a estas matérias para aprender e refletir aonde estamos, onde queremos , devemos  e precisamos chegar. "Lutaremos de mãos dadas produtores."

     Muito obrigado a equipe Milkpoint!

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