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O Brasil vai ser mesmo exportador de lácteos?

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 09/09/2015

6 MIN DE LEITURA

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O principal fator determinante da nossa competitividade internacional nos últimos 15 anos foi a taxa de câmbio. Graças a ela, nosso leite atingiu, em outubro de 2001, o preço de US$ 0,098/litro, o valor mais baixo do mundo à época (entre os principais países). Graças principalmente a ela, também, alcançamos US$ 0,55/litro em julho de 2011, dez anos depois, um valor superior ao que produtores da Europa e Estados Unidos receberam naquele momento (gráfico 1).

Claro que há outros fatores que determinam a competitividade. A própria elevação de custos por volta de 2011 foi ocasionada não só pela valorização da nossa moeda, mas também pela elevação de custos de mão-de-obra, insumos e valor da terra, que contribuíram para que nosso leite tenha se tornado, durante um período razoável, um dos mais altos do mundo.

Gráfico 1. Preços do leite ao produtor, em dólar por litro, nos principais países produtores (Fonte: vários, elaborado por MilkPoint Inteligência). 



Mas é inegável que o câmbio tem sido o fator principal. É o câmbio que explica, nesse momento, estarmos novamente com um dos leites mais baratos do mundo, abaixo de US$ 0,30/litro, menor até do que o da Argentina, que hoje possui, oficialmente, um leite caro para os padrões do país. Nota: ao falar que estamos competitivos, quero dizer em comparação a outros países, não se considerando os atuais valores de US$ 2.000/tonelada do leite em pó, a partir do qual nenhum país consegue produzir sem perder bastante dinheiro.

Voltemos ao câmbio. O real se desvalorizou assombrosos 71,57% nos últimos 12 meses, segundo matéria do jornal O Estado de São Paulo (06/09/2015), só perdendo para o rublo russo, que perdeu 85,35% do seu valor em dólar. Em que pese o fato de a maior parte das moedas terem se desvalorizado frente ao dólar, os valores verificados pelo real são muito significativos. A tabela 1 mostra a desvalorização das moedas de diversos países.

Tabela 1. Desvalorização de diversas moedas frente ao dólar norte-americano. 



É sempre bom notar que essa queda no valor do nosso leite, em dólar, não foi seguida evidentemente por uma queda da mesma magnitude em moeda local. Em valor real, corrigido pela inflação, o preço ao produtor está 10,8% abaixo do valor de 2014, se considerarmos o período de janeiro a agosto. É uma situação menos confortável que no ano, passado, mas em nada se assemelha a queda em moedas locais verificadas no período de janeiro a julho: na Nova Zelândia, houve queda de cerca de 37% em dólar neozelandês, na Europa, o valor do leite em euro teve queda de 20,6%e nos Estados Unidos, 28% de queda em dólar. Em outras palavras, foi o câmbio mesmo que tornou nosso leite “barato”.

Sem dúvida, parte desse ganho de competitividade será corroído pela inflação nos insumos importados, de forma que, a não ser que o real continue se desvalorizando, em algum momento teremos um equilíbrio em um valor um pouco maior do que o atual.  Porém, não há como ignorar o fato que, independentemente do que façamos ou deixemos de fazer, nos últimos anos quem determinou nossa competitividade foi simplesmente a taxa cambial.

Para ficarmos em mais um exemplo: em julho de 2011, nosso preço ao produtor estava em R$ 0,865/litro; o câmbio médio foi de R$ 1,56 e o leite em pó integral no mercado internacional, de acordo com o leilão gDT, era de US$ 3557. Nesse contexto, o preço de equivalência de exportação, considerando ganho zero para a indústria processadora (o que, há de se convir, não é viável), era de R$ 0,53/litro. Isso quer dizer que, a preços acima de R$ 0,53, não se podia exportar de acordo com os preços e relação cambial vigentes.

Já com câmbio de R$ 3,80, o preço de equivalência para a exportação seria de R$ 1,09/litro, considerando uma tonelada de US$ 3.000. Ou seja, se o leite atingir lá fora um valor 15% mais baixo do que estava em julho de 2011 (obs: hoje está bem mais baixo do que isso, a US$ 2078/tonelada, segundo o gDT), nosso preço de break even seria de R$ 1,09/litro, isto é, se o preço médio for menor do que esse, a exportação começa a ficar interessante. Em outras palavras, enquanto em julho de 2011 preços de US$ 3.500 nos colocavam muito distantes do mercado internacional, no contexto de 2015, valores de US$ 3.000 já nos fazem aspirar alguma coisa no mercado externo (sem contar aqui os negócios a preços bem mais interessantes com mercados como a Venezuela).

É de se perguntar como é possível estruturar uma estratégia de atuação de longo prazo visando uma inserção mais permanente no mercado internacional, em um país que passa por turbulências relativamente frequentes, afetando a percepção dos investidores e o valor da moeda, aliado ao câmbio flutuante, que permite que esses movimentos, em grande parte especulativos, possam se manifestar de forma plena. O gráfico 2 abaixo mostra a extrema volatilidade cambial do real em comparação a outras moedas.

Gráfico 2. Taxas de câmbio de algumas moedas frente ao dólar – Jan 2009 = 100.



Em uma cesta comparando a evolução do valor de moedas frente ao dólar (Real, Euro, Dólar Neozelandês e Peso Uruguaio), de janeiro de 2009 a agosto de 2015, o real conseguiu ser a segunda moeda que mais se valorizou (e, por muito pouco, não foi a primeira, como pode ser visto no gráfico em julho de 2011). Depois do período de valorização, foi a moeda que mais se desvalorizou.

Para efeito de comparação, a diferença entre o valor máximo (R$3,51/US$) e mínimo (R$1,56/US$) apresenta uma diferença de 125%. Nas outras moedas analisadas, essa amplitude entre os valores máximo e mínimo foi bem menor: 38% no Euro; 69% no Dólar Neozelândes e 54% no Peso Uruguaio. Um caso de volatilidade semelhante ao brasileiro é o da Argentina: a diferença entre o valor máximo e mínimo do Peso Argentino nesse mesmo período foi de 167%, mas a situação macroeconômica da Argentina não é algo para se invejar.

Isso não só no leite, mas em qualquer atividade econômica, denota falta de planejamento de longo prazo do estado brasileiro. Nesse momento, as notícias tratam do processo de substituição de componentes importados por nacionais, que passaram a ganhar competitividade; se as coisas melhorarem de novo e a confiança voltar, é possível que o câmbio volte (não aos níveis prévios à crise, provavelmente, mas a níveis que possam dificultar novamente a inserção internacional de alguns setores).

O resultado disso é que, no que se refere à inserção internacional, fiquemos sempre à deriva, dependendo das marés econômicas, exceto naqueles segmentos que são altamente competitivos ou dependentes dos mercados internacionais, ainda que percam dinheiro por um período.

O fato de depender basicamente de uma variável fora de controle do setor e dos agentes individuais atuantes no mercado não estimula que se crie uma agenda efetiva de longo prazo, baseada no aumento da produtividade (das propriedades, da captação de leite), da qualidade do leite, da redução do custo Brasil e da busca de acordos comerciais. Afinal, é mais fácil aguardar a próxima desvalorização cambial – e, de qualquer forma, provavelmente não haverá medidas suficientes para sermos competitivos caso a moeda esteja sobrevalorizada como esteve em 2011.

Porém, é aqui que mora o perigo: sob o efeito da cangorra cambial, a meta de sermos competitivos no longo prazo fica em segundo plano. Por mais paradoxal que seja, o caminho deveria ser o oposto: caso queiramos continuar desenvolvendo a atividade a taxas superiores ao consumo, temos de olhar para o horizonte mais adiante, mesmo em momentos de baixa competitividade. Sem isso, não acredito que seremos exportadores a não ser em momentos específicos e sempre de forma secundária. Ainda, as empresas que desejem atuar nesse mercado devem estar preparadas para a alternância de momentos muito bons e muito ruins, ou procurar mercados mais estáveis.

Finalmente, nesse ambiente altamente volátil que caracterizou a economia brasileira nas últimas várias décadas, torna-se difícil ter um horizonte suficientemente longo, que permita que se invista na estruturação do país como exportador de lácteos e de outros produtos. Talvez por isso, além das estratégias equivocadas em relação aos acordos comerciais, o Brasil tenha uma participação pífia no comércio externo, ficando basicamente restrito a commodities agrícolas e matérias-primas.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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RONALDO MARCIANO GONTIJO

BOM DESPACHO - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 14/09/2015

Quem paga mais, o mercado interno ou externo? Com certeza a industria prioriza quem paga mais.
HERMENEGILDO DE ASSIS VILLAÇA

JUIZ DE FORA - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 14/09/2015







   Ao pensarmos em exportar devemos priorizar,sanidade,qualidade e fiscalização.
JOSE RONALDO BORGES

CUIABÁ - MATO GROSSO - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 11/09/2015

Marcelo,

Excelente artigo, porem gostaria de acrescentar um detalhe. Nos países importadores também ocorreu desvalorização das moedas, como por exemplo a Russia que teve uma depreciação do Rublo equivalente ao Real. Isso também dificultará as nossa exportações.
MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

PIRACICABA - SÃO PAULO

EM 10/09/2015

Obrigado a todos pelos comentários. A grande questão é: sendo o câmbio o grande diferencial, corremos o risco de continuarmos não fazendo a lição de casa porque o principal fator não depende do setor. Nesse caso, se as coisas um dia se estabilizarem, tendo um horizonte mais estável e previsível (acreditemos...), ainda assim não teremos como aproveitar plenamente Ficaremos na dependência de momentos e casos específicos: preços de lácteos muito altos, negociações para mercados periféricos ou acordos entre países/empresas que fogem aos preços de mercado.
RONEY JOSE DA VEIGA

HONÓRIO SERPA - PARANÁ - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 10/09/2015

Graças a Deus que o Real depreciou!! Eu posso estar  escrevendo bobagens, mas uma das causas dessa crise que está aí foi justamente o câmbio supervalorizado do real frente ao dólar, o que causou uma falsa  idéia de riqueza em nós Brasileiros.

O Banco Central Brasileiro TORROU mais de 80 Bilhões de Reais em operações de Swap cambial para segurar o dólar e garantir a re-eleição desse Desgoverno que aí está (entre outras medidas desastrosas) !

Imaginem um cenário onde os preços internacionais das comodities em geral estão baixos, e o nosso real continuar supervalorizado...estaríamos vendendo soja a R$ 45,00?

O que isso significaria para o Agro Brasil?

Quanto ao leite, imagino que o setor passa sim por arranjos de produtividade e qualidade, só que as coisas andam devagar , pois não há margem para ajustes mais instanâneos; passamos por uma crise muito severa nesse verão , onde os preços voltaram a patamares de 2011, com custos de 2015!  Vi muita gente desistir!

Tenho fé e esperança (o que me move e o que me resta ) que 2016, com a queda já anunciada dos juros, o dólar um pouco mais equalizado e a China comçando a consumir mais alimentos  ( inevitável devido ao direcionamento da economia deles, saindo do investimento em infra-estrutura e voltado ao consumo) teremos um ano melhor que 2015, voltando até ao nível de margem de 2013.

Por um Brasil mais Justo e Perfeito.:
ROBERTO JANK JR.

DESCALVADO - SÃO PAULO - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 09/09/2015

Marcelo, você pergunta mas também já responde no mesmo texto. O cambio é tão relevante e volátil que sequer conseguimos concluir se somos mais ou menos competentes que nossas vantagens comparativas em relação os outros países.

Sabemos sim que temos baixa qualidade comparativa de leite e que por isso não temos acesso a mercados mais sofisticados. Sabemos também que nossa segmentação de produtos ao consumidor é medíocre e que pouco se faz para isso mudar. Uns dizem que é por conta da baixa qualidade de matéria prima outros dizem que é porque a industria não se mexe. A verdade é que andamos muito devagar para mudar esse quadro.

Mas sua pergunta já esta respondida; de fato o diferencial é o cambio.

Basta dizer que o preço saiu de U$ 5 mil em 2014 para U$ 2 mil em 2015 e nós exportamos 25% a mais de equivalente leite em julho e agosto de 2015 sobre o mesmo período de 2014.

Como realizar tal proeza com uma queda de 60% no preço? Só com nossa moeda depreciada como está.

abraços,



CELESTINO DOS SANTOS PANTALEÃO

CASA BRANCA - SÃO PAULO - INDÚSTRIA DE LATICÍNIOS

EM 09/09/2015

Parabéns , pelo histórico, conhecer a verdade sobre os lácteos é única forma de caminharmos para uma politica de produção seria e permanente, e esta verdade só faz com que entendamos que nosso setor só vai caminhar , tendo o envolvimento do produtor , laticínios, insumos , governo, e comercialização , e que todos estão juntos neste mesmo problema ou solução?
MARCELLO DE MOURA CAMPOS FILHO

CAMPINAS - SÃO PAULO - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 09/09/2015

Prezado Marcelo



Parabéns pelo editorial, onde você apresenta informações que permitem ver com clareza que a resposta à pergunta "O Brasil vai mesmo ser exportador de lácteos/", se depender da desvalorização do real ( com previsões, dentro do cenário político e econômico caótico atual,  de chegar a encostar ou ultrapassar um câmbio de R$ 5,00/US$ em 2018 ) é não.



Aliás, em vários artigos. ante colocações feitas pela indústria em várias ocasiões, que o Brasil não exportava leite por ter o preço do leite ao produtor em US$ entre os mais caros do mundo, eu argumentava que essa colocação feita  com base numa comparação simplista da conversão do preço recebido pelo produtor nacional considerando a taxa de câmbio para US$ vigente no País não fazia sentido, pois em outras ocasiões, como você mostra no editorial, esse preço ficou entre os mais baixos do mundo. O produtor nacional produz em reais e não é a taxa de câmbio vigente no País que mudará o seu dia a dia!



Ser exportador de leite e lácteos depende do tripé: produtividade, competitividade e qualidade, e infelizmente as mudanças nesse tripé no setor leiteiro vem se processando a passos muito lentos e nessa toada concordo com você que é difícil, mesmo no longo prazo, ver o Brasil como exportador de leite e lácteos.



Einstein disse uma vez, com muita propriedade, que é loucura esperar mudanças fazendo as mesmas coisas do mesmo jeito.



E por ver isso acontecer no setor leiteiro nacional é que escrevi muitos artigos e tomei posições alertando para a necessidade de melhorar a produtividade, competitividade e qualidade do leite ( incluindo medidas para coibir a fraude, como coloca-la como crime hediondo), o que não entendido e  não foi bem recebido pela indústria.



Espero que ao ler e refletir sobre esse editorial a indústria comecem tomar medidas efetivas relativas  à produtividade, competitividade e qualidade do leite, uma vez que não acredito que essa iniciativa parta dos produtores e do governo, e assim acontecerem mudanças que num próximo editorial possamos ter esperança do Brasil se tornar um exportador de lácteos.



Abraço



Marcello de Moura Campos Filho

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