Quando avaliamos um free-stall, devemos ter em mente que, mais importante que a checagem de inúmeros detalhes, seria a avaliação do comportamento da vaca neste tipo de instalação. É justamente ela quem nos dirá se algo vai bem ou mal.
CAMA
Podemos dizer que o conforto da cama é o principal item a ser avaliado e que o sucesso do free-stall está associado, principalmente, ao nível de conforto proporcionado pela mesma. Camas confortáveis são fundamentais, logo, a escolha do material que irá compô-la é de extrema importância. Diversos materiais podem ser utilizados, como palhas, maravalhas (pó de serra), fenos de baixa qualidade, terra, areia e colchões de borracha. Apesar de materiais orgânicos, como maravalha, por exemplo, proporcionarem um bom conforto, são indesejados do ponto de vista sanitário pois servem como substrato para crescimento de bactérias prejudiciais a saúde da glândula mamária. Desta forma, é necessária a constante remoção e reposição de material nas camas. No caso de materiais inertes como colchões de borracha este problema quase inexiste, porém esbarramos no custo/cama deste material. Por este motivo, a cama de areia apresenta-se como uma boa opção, sendo amplamente utilizada no mundo, uma vez que oferece grande conforto, além de não ser um meio propício ao crescimento de patógenos (material inorgânico e inerte) desde que conservadas limpas e secas.
Segundo pesquisa, avaliando o conforto entre camas de concreto (sem forro) e cama de palha, foi possível notar diferenças gritantes. Os animais que tiveram acesso à cama de palha permaneceram deitados o dobro do tempo em relação aos animais com acesso a cama concretada. No primeiro caso (palha) os animais permaneceram deitados em média 14 horas/dia x 7 horas/dia (concreto). O resultado acima induz ao raciocínio de que, antes dos detalhes envolvendo dimensões, o fator conforto-cama, em si, pode compensar possíveis erros da instalação.
Camas de free-stall, qualquer que seja o material utilizado nas mesmas devem sempre estar limpas e secas. Para camas de areia, existe um teste prático para avaliação do seu conforto. Devemos nos ajoelhar na cama, levantando em seguida. Nossos joelhos devem ficar marcados (moldados) na superfície e, quando ficamos novamente de pé devem estar limpos e nossas calças, secas. Free-stalls impraticáveis, quando realizamos este teste, geralmente não moldam nossos joelhos, umedecem os mesmos e sujam nossa roupa.
AVALIAÇÃO SEQUENCIAL
Para avaliarmos o nível de conforto proporcionado por instalações do tipo free-stall, devemos seguir a seqüência de itens descritos a abaixo, como orientação:
a - Tamanho da cama:
Devemos observar se as camas oferecem espaço suficiente para abrigar um animal deitado, confortavelmente. No caso de camas muito pequenas, o problema torna-se bastante complicado, pois a correção implica, na maioria dos casos, reformas estruturais (serviços de pedreiro). Quando a situação é contrária, ou seja, camas muito grandes, podemos resolver o problema com a colocação de uma prancha que atua como um "para-peito" para as vacas, chamado "brisket-board". O "brisket-board" geralmente é de madeira, quando móvel. Em algumas instalações, esta estrutura é fixa (concreto), impedindo possíveis ajustes.
Atualmente, a recomendação técnica padrão, quanto às dimensões da cama, para um animal adulto de 630 kg (média) é a seguinte:
- largura: 1,20 m
- comprimento: 1,70 m
Entretanto, existem variações e adiante detalharemos cálculos de dimensionamento de camas.
b - "Lunge- Space":
"Lunge-space" é a nomenclatura em inglês do: "espaço livre para a movimentação" da cabeça do animal, quando o mesmo se levanta, deita ou permanece em repouso. Este espaço é determinado entre o "para-peito" ("brisket-board") e o eixo central que suporta as estruturas de contenção (divisórias entre as camas). A ausência deste espaço livre, pode causar extremo desconforto quando os animais estão deitados, além de dificultar seus movimentos. Desta forma, este item é um detalhe importante de ser avaliado quando temos casos de free-stalls com poucas vacas aproveitando as camas.
c - "Neckrail":
Traduzindo o termo acima, tal estrutura seria o "trilho do pescoço", ou seja, trata-se de uma barra localizada ao longo das contenções, paralela a linha do corredor, que deve ser posicionada próxima ao alinhamento do "brisket-board". Pode ser considerada como uma estrutura de grande importância numa cama, uma vez que seu posicionamento afeta diretamente o comportamento animal.
A sua função é fazer com que as vacas, ao se levantarem para urinar ou defecar, dêem um passo para trás, evitando a contaminação do local de repouso. Quando temos um "neckrail" muito "adiantado" (além da linha do "brisket-board"), oferecemos muita liberdade de movimento para as vacas que podem efetuar suas necessidades inadequadamente (dentro das camas). Quando posicionamos tal estrutura demasiadamente para trás, dificultamos o repouso dos animais, que passam a encontrar dificuldades para se deitar/levantar, aumentando consideravelmente o número de animais deitados nos corredores ou vacas de pé dentro das camas, somente com os membros anteriores.
O posicionamento do "neckrail" vem sendo objeto de pesquisas recentes envolvendo o conforto/comportamento de animais em free-stalls. De acordo com avaliações experimentais da University of British Columbia (Canadá), o tempo de permanência de animais de pé sobre as camas diminui consideravelmente quando o "neckrail" foi aproximado (1,5 m) do eixo central das camas em relação a um posicionamento mais afastado (1,7 m). Segundo os dados desta pesquisa, no caso do "neckrail" mais afastado houve um acréscimo de 15 minutos no tempo de permanência (médio) dos animais que tiveram acesso ao "neckrail" mais afastado em relação ao alojado mais próximo do eixo central. Em outro experimento, realizado pela mesma instituição, foi avaliado o efeito da presença x ausência de "neckrail" quanto à higiene das camas. A deposição de esterco nas camas do grupo de animais sem o "trilho do pescoço" foi duas vezes superior em relação ao grupo submetido à estrutura tradicional, que permaneceram mais tempo em pé nos corredores concretados.
ROTEIRO PARA AVALIAÇÃO DO CONFORTO:
O quadro abaixo apresenta uma série de itens que mensuram o conforto/comportamento dos animais num free-stall. O objetivo seria responder às questões abaixo e direcionar possíveis soluções para os problemas mais comuns envolvendo este tipo de instalação*:
1 - As camas passaram no "teste dos joelhos"?
a-) sim (2)
b-) não: remova/substitua o material da cama, avalie a profundidade da mesma (caixa)
2 - Há espaço suficiente para as vacas deitarem confortavelmente?
a-) sim (3)
b-) não: reposicione o "brisket-board" ou reconstrua a instalação para proporcionar espaço suficiente
3 - As vacas estão com liberdade para movimentar a cabeça?
a-) sim (4)
b-) não: verifique a altura do "brisket-board" (não deve ser superior a 15 cm) e a diferença de nível entre a superfície da cama e o nível superior do "lunge space" (não deve ser superior a 25 cm, o seja, a vaca não pode estar "enterrada" numa cama).
4 - As vacas alcançam ou encostam seus focinhos em alguma estrutura no final do "lunge space"?
a-) não (5)
b-) sim: remova as possíveis estruturas e/ou divisórias que possam incomodá-las
5 - As vacas ao se levantar, encostam no "neckrail"?
a-) sim (6)
b-) não: reposicione tal estrutura adequadamente de acordo com o tamanho dos animais
6 - Chegando a este item, consideramos um free-stall dentro de padrões adequados de conforto.
* adaptado do gráfico ilustrativo do Profº Nigel Cook da University of Wisconsin-Madison
A tabela abaixo apresenta as dimensões adequadas de uma cama, de acordo com o tamanho dos animais (peso):
A tabela acima pode ser utilizada como referência no momento da construção de camas para vacas de leite. Podemos notar que o peso (kg) foi utilizado para "balizar" o tamanho do rebanho/categoria animal.
Para obtenção de um dimensionamento exato, em metros, de acordo com o peso médio de uma determinada categoria animal, recomendamos as fórmulas abaixo**:
Cálculo da largura da cama (LC):
LC = [0.018 x (PV/0.453) + 21.9] x 0.0254
Cálculo do comprimento ocupado pelo animal deitado (CAD):
CAD = [0.0224 x (PV/0.453) + 34.2] x 0.0254
Cálculo do comprimento total da cama (CT):
CT = [0.0405 x (PV/0.453) + 41] x 0.0254
Cálculo da altura do "neckrail" (AN):
AN = [0.0136 x (PV/0.453) + 26.4] x 0.0254
** onde: PV = peso vivo (kg)
Fonte: Hoard's Dairyman, 25/02/2002
Comentário do autor: com as informações descritas no texto, encontramos "ferramentas" para um diagnóstico prático do conforto de um free-stall. Existem pontos cruciais na construção deste tipo de instalação e outros menos importantes, possíveis de serem corrigidos sem grandes problemas. Dentre diversos itens importantes, o centro das atenções neste tipo de instalação será sempre as camas, cujos pequenos detalhes no dimensionamento, modificam o comportamento animal, prejudicando o rendimento da atividade.