Realmente, responder as perguntas acima não é tarefa fácil, principalmente, em função da escassez de pesquisas comparando os diferentes sistemas de produção. Com objetivo de ilustrar o assunto estaremos apresentando dados do Dairy Herd Improvement Association (DHIA), agrupados por Hubert J. Karreman, veterinário extensionista em Lancaster (Pennsylvania-EUA), responsável pelo monitoramento de 75 fazendas naquele estado, das quais 35 certificadas como orgânicas pelo United States Department of Agriculture (USDA).
Assim como no Brasil, a pecuária orgânica de leite nos EUA é vista como um desafio bastante difícil, classificada por muitos como detentora de índices zootécnicos inferiores a pecuária tradicional (não-orgânica). De acordo com o National Organic Standards Board (NOSB), entidade que regulamenta orgânicos nos EUA, a produção de leite orgânico está baseada em sistema de produção sem uso de antibióticos e hormônios. Dentre os componentes proibidos pelo NOSB, destacam-se: penicilina, ampicilina, sulfas, prostaglandinas, gonadotropinas, somatrotropinas, entre outras.
O quadro a seguir resume números envolvendo levantamento de 16 propriedades orgânicas em Lancaster comparados com rebanhos convencionais de pelo menos 100 animais, totalizando um universo de 1059 vacas.
Os sistemas de leite orgânico nos EUA têm o pasto como importante componente da dieta, uma vez que não é permitido o uso de grãos não orgânicos (o que justifica uma produção mais elevada do sistema convencional-quadro acima).
A mastite e a saúde da glândula mamária, dentre as enfermidades que afetam o rebanho, talvez sejam a polêmica de maior impacto quando discutimos produção de leite sem uso de medicamentos tradicionais (antibioticocoterapia). No quadro acima percebemos que as perdas de leite, pelo método indireto de avaliação da contagem de células somáticas (escore linear), de fato, revelam um pior desempenho em animais orgânicos. Sendo a mastite uma das principais doenças que afetam rebanhos, gerando elevado descarte de animais, era de se esperar uma taxa de descarte superior para os animais que apresentaram um EL mais elevado (sistema orgânico), o que não ocorreu. Segundo Karreman, tal comportamento está associado ao fato de que sistemas convencionais trabalham e visam a exploração do máximo potencial individual de cada animal o que gera maior número de problemas e necessidade maior de descarte.
O desempenho reprodutivo dos animais é encarado como um "tabu" em sistemas de produção de leite orgânico. Devido ao balanço energético negativo e possíveis problemas pós-parto (distúrbios metabólicos), muitos consideram impossível vencer esta etapa do ciclo produtivo dos animais apenas com produtos homeopáticos, ervas medicinais e outros derivados, permitidos nos EUA e classificados como: Medicina Veterinária Complementar e Alternativa (Complementary Alternative Veterinary Medicine-CAVM). De acordo com os dados da tabela acima, percebemos um desempenho bastante semelhante entre os sistemas e, em alguns casos, até mesmo superior para a produção orgânica, como menor PVE e consequente redução nos dias em aberto e IEP.
Comentários do autor: quando avaliamos dados experimentais, devemos sempre atentar para o período de avaliação e número de animais envolvidos na pesquisa. Desta forma, para obtermos conclusões definitivas a respeito do tema abordado no texto, devemos aguardar e incentivar a elaboração de futuros trabalhos. É fundamental termos dados de pesquisa no Brasil, dadas as diferenças ambientais, que colocam desafios muito distintos aos animais e às plantas. Nesse ponto, países como os EUA, Nova Zelândia e Comunidade Européia estão à frente, já reunindo pesquisas que permitem analisar economicamente a viabilidade de sistemas alternativos. Esse, talvez, seja o que de melhor podemos aprender ao reportar trabalhos feitos nestes países.
Fonte: Hoard's Dairyman, vol. 148 (junho 2003)