A polêmica sobre qual a melhor raça para a produção de leite no Brasil sempre foi um tema bastante discutido nas mais diferentes "rodas" de produtores em todo o país. Obviamente que existe um limite entre "a paixão" (tradição, nível cultural do produtor) e a razão. A escolha da raça e do sistema de produção a serem implantados numa fazenda não raro são feitos sem critérios, acarretando em decisões precipitadas, levando em muitos casos a desistência do produtor. É importante que o produtor conheça muito bem as suas limitações financeiras, bem como os recursos naturais e físicos (instalações) da sua propriedade, antes de realizar qualquer mudança. A qualidade e oferta de mão de obra são outros importantes fatores que não podem ser esquecidos, assim como a possibilidade de orientação técnica deve ser também discutida e levada em consideração.
Os sistemas de produção predominantes na região Sudeste, com exceção dos que envolvem a produção de leite B, estão baseados em rebanhos mestiços de B.taurus e B.indicus, sendo que no estado de Minas, cerca de 46% dos produtores pretendem mantê-lo assim. De acordo com trabalho publicado em 1998, num levantamento realizado em 291 fazendas em Minas Gerais, 78% delas ordenham apenas uma vez por dia, sendo 98% manual e 95% com estímulo do bezerro. O tamanho médio dos rebanhos neste levantamento foi de 25 vacas, das quais 89% eram híbridas de B.taurus e B.indicus. Grande parte das fazendas utilizava a monta natural não controlada (79%) e, em 72% destas, havia apenas um único reprodutor. Segundo MADALENA et al. (1997), durante a pesquisa, foi perguntado qual tipo de rebanho (quanto ao padrão racial) o produtor esperava ter nos próximos 5 anos. As respostas obtidas foram:
* 46% intermediário sangue zebu x sangue europeu
* 12% raça européia pura
* 1% zebu puro
* 40% não tinham meta definida
De acordo com os pesquisadores, os resultados obtidos foram semelhantes a outros levantamentos realizados na região Sudeste, exceto produtores de leite B em São Paulo. No Quadro 1., a seguir, são demonstrados os resultados experimentais:
Quadro 1. Produção de Leite por dia de intervalo entre partos de diferentes cruzamentos de Bos taurus x Bos indicus em vários níveis de produção
De acordo com o quadro acima podemos perceber a superioridade dos animais mestiços, geração F1, em diferentes condições. O desempenho de B.taurus puras (˜ 1) alcançou o das F1 apenas nos níveis de aproximadamente 10 kg de leite/dia de intervalo entre partos. O quadro 2. ilustra o raciocínio:
Quadro 2. Desempenho de diferentes cruzamentos na fazenda demonstrativa da EMBRAPA - Gado de Leite em Coronel Pacheco, MG
Uma pesquisa realizada por LEMOS et al. (1996) avaliando a vida útil de vacas HVB (holandês vermelho e branco) x Guzerá acompanhadas até os 12 anos de idade, em 67 fazendas na região Sudeste, demonstrou que vacas F1 permaneceram mais tempo nos rebanhos que as de outros cruzamentos. O quadro 3. ilustra os resultados:
Quadro 3. Percentuais de vacas retidas no rebanho e número de lactações produzidas em cruzamentos de Holandês x Guzerá acompanhados até os 12 anos de idade
Comentário MilkPoint: de acordo com os dados experimentais, podemos concluir que os cruzamentos comparativos demonstram que as fêmeas de B.taurus x B.indicus apresentaram, em regiões tropicais, melhores desempenhos produtivos e reprodutivos, além de maior vida útil que outros cruzamentos, exceto no caso de produções de 10 kg leite/dia de intervalo entre parto, em que fêmeas puras de B.taurus alcançaram o desempenho das F1. De acordo com a pesquisa em Minas, 46% dos produtores pretendem manter o rebanho mestiço e nas 291 fazendas levantadas, 72% possuíam apenas um reprodutor. Detalhes como este último são bastante importantes, pois para a manutenção de um rebanho intermediário é necessária a utilização de um reprodutor híbrido, o que acarreta em perdas por recombinação (MADALENA et al. 1990). Outras maneiras para resolução do problema podem ser implantadas, como a troca periódica do reprodutor, o que não é recomendado, uma vez que pode resultar em alta proporção de genótipos extremos (menos desejáveis). A recomendação seria, então, a reposição de animais com fêmeas F1. Podemos dizer, mais uma vez, que não existe "a Raça" ideal. Tal conceito (de melhor raça) está intimamente ligado ao manejo e condições de cada propriedade. Logo, a melhor genética ou o melhor animal é aquele que melhor se adapta diante das condições impostas dentro de um sistema de produção, sejam estas econômicas, ambientais, físicas, técnica ou culturais.
fonte: Anais da XXXV Reunião da SBZ, Bases Zootécnicas do Sistema de Reposição Contínua com fêmeas F1 de Bos indicus x Bos taurus para Produção de Leite (MADALENA, F.E.); 1998