A União Européia (UE-27)1 é o mercado mais importante quando nos referimos ao comércio internacional de carne ovina, sendo um grande centro produtor, importador e consumidor, e por esse motivo, é um mercado que apresenta uma crucial participação no balizamento de preços e nas estratégias produtivas e comerciais dos maiores players internacionais.
Quaisquer mudanças na esfera política, econômica e/ou sanitário, a exemplo da recente reforma da Política Agrícola Comum (PAC) e dos surtos de Língua Azul e Febre Aftosa, possuem um efeito marcante que rege o ritmo e as tendências no mercado internacional da carne ovina.
2. Rebanho
O efetivo ovino na União Européia, contando com seus atuais 27 estados membros, apresentou uma queda continua nos últimos 10 anos, de acordo com o Gráfico 1.
Gráfico 1. Evolução do efetivo ovino da UE-27, em milhões de cabeças.
Os maiores efetivos se encontram no Reino Unido e Espanha, que juntos detêm cerca de 52% da população ovina. Apesar da França, Grécia e Itália apresentarem números bem inferiores, estes ainda são significantes. No entanto, nos últimos dois países o rebanho é particularmente orientado para a produção de leite e derivados, com a produção de carne vinculada ao comércio de cordeiros leves (peso de carcaça < 13 kg).
Os rebanhos dos principais produtores, a exemplo do Reino Unido, Espanha, França e Irlanda, decresceram no decorrer dos anos, porém em ritmos diferentes, e não há perspectivas de recuperação, uma vez que, atualmente, a tendência de queda persiste.
O surto de febre aftosa que atingiu o Reino Unido, o maior produtor e exportador da UE-27 e alguns outros países europeus em 2000 afetou drasticamente o setor ovino, devido às medidas sanitárias e às limitações comerciais, ocasionando uma redução de quase 10% no efetivo entre 2000 e 2002. Além disso, a ocorrência de surtos de Língua Azul na região da Península Ibérica a partir de 2004, e mais recentemente no norte da Europa, juntamente com novos surtos de Febre Aftosa em 2007, acentuaram ainda mais os efeitos negativos sobre a produção, comércio e consumo europeus.
Dentre os novos 12 membros da União Européia, apenas alguns países, a exemplo da Hungria, Bulgária e Romênia, possuem efetivos significantes, e apenas os dois primeiros, apresentam alguma capacidade produtiva para exportação. Porém, apenas a Hungria, República Checa, Estônia e Letônia, apresentam uma situação estável não-decrescente com relação a seus rebanhos. Dessa forma, a UE-27 é a única região do mundo onde o rebanho decresce regularmente, mesmo com o reforço dos novos Estados Membros.
3. Produção
No mercado europeu, a produção (Gráfico 2), após um período de queda mais acentuada, vem se mantendo relativamente estável nos últimos anos.
Gráfico 2. Produção de carne ovina da UE-27, em milhões de toneladas.
Os maiores produtores da UE-27 são Reino Unido e Espanha, responsáveis, por mais de 52% da produção regional. Por sua vez, a Espanha é um dos poucos países da região onde o efetivo ovino tem se mantido relativamente estável, apesar de apresentar uma tendência de retração nos últimos anos, especialmente com o agravamento da crise causada pela Língua Azul. Entre os produtores secundários, a França é aquele em que se têm registrado decréscimos constantes da produção, juntamente com a Irlanda, nas últimas duas décadas.
De qualquer forma, a produção de carne ovina na UE-27 permanece com uma tendência decrescente para os próximos anos, esperando-se uma queda de 5% para 2007, com uma dependência cada vez maior das importações para atender seu mercado interno, principalmente, devido às reformas realizadas em 2003 na PAC, que determinaram a completa ou parcial desvinculação do pagamento anual dos subsídios ao volume de produção e/ou ao número de ovelhas, resultando em uma maior retração do rebanho e da produção, uma vez que, os produtores receberão um pagamento único sem a necessidade de produzir qualquer volume a mais ou de ter um determinado número de ovelhas, a depender do tipo de desvinculação (completa ou parcial).
De acordo com as informações disponíveis, muitos países, a exemplo do Reino Unido, Itália, Alemanha e Irlanda, estão optando pela completa desvinculação, enquanto outros como Espanha, Grécia, França, Portugal, Dinamarca e Finlândia decidiram por desvincular apenas 50% dos subsídios.
Mudanças já são evidentes no Reino Unido e Irlanda, onde houve um aumento de 8,7% e 10,4%, respectivamente, na quantidade de animais abatidos no período 2003-2006, em decorrência dos ajustes realizados nos rebanhos após a remoção do prêmio ovino, com grande impacto sobre o rebanho de cria. No entanto, em 2007, o volume de abates deve cair 4%, devido aos problemas sanitários e à redução da população ovina.
4. Comércio
Os países da UE-27 apresentam um volume considerável de exportações, no entanto, geralmente estão limitados ao comércio intracomunitário, sendo que os maiores vendedores são o Reino Unido, Irlanda, Bélgica, Espanha e Holanda. Somado a isso, estima-se que o volume de carne ovina exportada para fora da Comunidade se estabilize na ínfima quantidade de 4 mil toneladas pelos próximos 5 anos.
As importações européias (Gráfico 3) têm oscilado em decorrência da produção doméstica e dos eventos sanitários na Comunidade. Embora quase 32% da carne ovina que entra nos Estados Membros seja fruto do comércio intracomunitário, o mercado europeu importa de países terceiros uma quantidade equivalente a 20% do seu consumo, sendo que cerca de 84% desta é fornecida pela Nova Zelândia, enquanto que o restante é dividido entre Argentina, Austrália, Uruguai e Chile.
Gráfico 3. Volume importado de carne ovina pelos Estados Membros (UE-27), em mil toneladas.
Em 2006, as importações de países terceiros aumentaram 2%, no entanto, foram insuficientes para compensar a queda na produção doméstica, o que reduziu levemente o consumo. Porém, a fim de atender a demanda dos novos países membros, a cota neozelandesa aumentou em cerca de 1,1 mil toneladas, totalizando 228,7 mil toneladas, quase 82% da cota total.
Projeções recentes da Comissão Européia, para 2012, indicam que a UE-27 terá uma queda na produção de 1,1% e aumento de 1,2% nas importações de carne ovina. No entanto, tais projeções, não parecem considerar apropriadamente os efeitos negativos da reforma da PAC sobre a indústria ovina européia, o que se tornaria mais evidente a partir de 2006. De qualquer forma, o volume importado tende a se estabilizar ao nível das cotas existentes ou aumentar levemente em resposta a algum acordo de acesso ao mercado concedido a alguns fornecedores externos.
5. Consumo
Em termos de consumo (Gráfico 4), a UE-27, com 1,33 milhões de toneladas em 2005, é o segundo maior consumidor mundial de carne ovina, logo depois da China. Porém, em decorrência da redução na produção e da limitação dos países terceiros para contrabalancear a demanda européia, o consumo de carne ovina tende a cair 0,7%, ocorrendo a estabilização do consumo per capita em torno de 2,8 kg/hab/ano, pelos próximos 5 anos. Ao mesmo tempo, a demanda por carne ovina nos novos Estados Membros é extremamente baixa e não tende a se desenvolver a médio prazo, uma vez que, o consumo per capita nesses países é de aproximadamente 0,4 kg/hab/ano.
Gráfico 4. Consumo de carne ovina na UE-27, em milhões de toneladas*.
*Os números se referem à carne ovina e caprina.
6. Perspectivas e considerações finais
A União Européia tende a retrair ainda mais o seu efetivo ovino, limitando sua capacidade produtiva, como conseqüência da desvinculação total dos subsídios em alguns importantes países produtores, como Reino Unido e Irlanda, assim como, devido à ocorrência recente de problemas sanitários. Além disso, os novos Estados Membros possuem baixa capacidade para suprir a demanda da Comunidade, tornando a UE-27 mais dependente do fornecimento de países terceiros, especialmente da Nova Zelândia.
Dessa forma, a combinação da demanda forte e contínua com a queda na produção deve levar a um aumento nas importações, o que manterá os preços da carne ovina no mercado europeu firmes ou com tendência de alta, tornando-o atrativo aos países exportadores.
Devido à limitação de oferta para exportação existente na Nova Zelândia em decorrência da redução do efetivo de cria e baixa oferta de cordeiros para 2008, como conseqüência também da maior competitividade da pecuária leiteira neste país, o mesmo, direcionará seus embarques especialmente para os mercados europeu e norte-americano, de maior valor, deixando espaço na Ásia, Oriente Médio e África, onde a demanda é crescente.
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1 A União Européia era composta por 15 países até 2004, quando foram admitidos a República Checa, Chipre, Eslovênia, Eslováquia, Estônia, Hungria, Letônia, Lituânia, Malta e Polônia. Em janeiro de 2007 foram admitidos Bulgária e Romênia, constituindo, assim, 27 Estados Membros.
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