Gestação Gemelar: sonho ou pesadelo?

Ao contrário da pecuária de corte que encara a gestação gemelar como uma característica desejável que impacta positivamente a lucratividade, na produção leiteira, às vezes representa riscos. Isso se deve aos efeitos negativos tanto nas vacas que dão à luz gêmeos quanto nos bezerros gêmeos. 

Vacas prenhes de gêmeos tem sua vida útil reduzida, podendo ter de 3 a 7 vezes mais chances de perda gestacional no primeiro trimestre do que prenhezes usuais.

Diversos fatores estão associados ao risco da ocorrência de gêmeos, como genética, estação do ano, paridade, taxa de ovulação (quadros de hiperovulação podem ser um problema). Esses fatores podem afetar negativamente a saúde e o desempenho das vacas leiteiras, além de demandar um manejo mais complexo e recursos adicionais para garantir o bem-estar e a sobrevivência dos bezerros gêmeos. Apesar do uso de BST muitas vezes ser associado a maior ocorrência de gêmeos, não existe comprovação alguma desse fato.

Gravidez gemelar - O pesadelo

Vacas que parem gêmeos estão mais sujeitas a complicações no parto e pós-parto como retenção de placenta, distocia e metrite, além de distúrbios metabólicos, como deslocamento de abomaso e cetose. Não surpreendentemente, as vacas que parem gêmeos são descartadas em uma taxa maior.

A ocorrência de abortamentos, natimortos, mortalidade neonatal e menor  peso ao nascimento é maior entre gêmeos do que entre bezerros únicos, provavelmente devido à diminuição da duração da gestação e ao aumento das chances de distocia entre vacas que parem gêmeos. Os Estados Unidos perdem anualmente cerca de 55 milhões de dólares por ano, apenas com prejuízos causados por gestações gemelares.

Outro problema comum é a ocorrência de freemartinismo (fêmea maninha, já ouviu falar?), uma condição que se caracteriza pela infertilidade  da bezerra fêmea que teve um irmão gêmeo macho. Esse quadro apenas se desenvolve quando os fetos são do sexo oposto levando as fêmeas a apresentarem características masculinizadas e esterilidade, enquanto os machos têm sua capacidade reprodutiva comprometida. Em vista disso, a maioria dos estudos atuais concorda que a gestação gemelar seja do mesmo sexo ou de sexos opostos, é indesejável. Quaisquer benefícios antecipados do parto gemelar são insuficientes para compensar os riscos para mãe e filhotes. 

Economia da gravidez gemelar 

Embora uma gravidez gemelar possa trazer renda adicional de bezerros extras e encurtar a duração da gestação, essa condição não compensa na rentabilidade final, devido a uma série de efeitos negativos que a geminação traz tanto para as vacas quanto aos bezerros. 

Estudos mostram que  vacas com gestação gemelar têm demandas energéticas de 50% a 70% maiores em comparação com vacas grávidas de um único filhote.

Essas demandas energéticas significativamente maiores impactam negativamente a saúde e o desempenho das vacas, além de aumentar o custo e o risco de complicações durante o parto. Ainda, análises econômicas indicam que cada parto gemelar, quando comparado com um parto simples, resulta em uma perda financeira que varia entre US$ 59 e US$ 161, aproximadamente, R$300,00 a 820,00, por parto. 

FIV e gestação gemelar 

Muitos produtores se perguntam se ao utilizar técnicas como Fertilização In Vitro pode gerar mais bezerros gêmeos, porém estudos apontam o contrário. Um deles recentemente publicado na revista Reproduction in Domestic Animals , mostrou que a transferência de um único embrião congelado e descongelado (produzido in vitro - em laboratório PIV), impediu a gravidez gemelar em vacas, sem afetar a fertilidade da mãe. 

Os resultados mostraram que a gestação ocorreu em 39,4% das vacas, e que 11,9% delas sofreram perda de gestação. A prenhez gemelar ocorreu em 16% das vacas inseminadas artificialmente , enquanto nenhuma vaca com embriões produzidos in vitro teve gêmeos. O uso de embriões congelados e descongelados provou ser eficaz na prevenção de gestações gemelares sem comprometer a fertilidade. Além disso, a transferência de embriões in vitro também melhorou a taxa de prenhez em vacas com dificuldades na reprodução. 

Porém, vale ressaltar que apesar da técnica acelerar o melhoramento genético da fazenda e demonstrar números interessantes na efetividade, é crucial avaliar se é o momento de utilizar a técnica já que a fazenda deve estar devidamente preparada para receber a quantidade de bezerras fêmeas que vem, além de outras implicações.

Reduzindo os efeitos negativos da gravidez gemelar 

Alguns estudos relatam intervenções de manejo, como interrupção da gravidez, redução seletiva e manejo nutricional durante o período de transição para ajudar a reduzir a incidência de gravidez gemelar.

Interrupção da gravidez

Interromper a gestação gemelar assim que é identificada pode ser uma opção, porém deve ser muito bem avaliada pois, em geral estamos falando de vacas altamente produtivas e da geração de um estresse fisiológico importante e que pode causar atrasos na reprodução, gerando mais prejuízos. 

Essa pode não ser uma solução viável à longo prazo, embora as estimativas genéticas (herdabilidade e repetibilidade) para geminação em vacas leiteiras sejam baixas, uma incidência anterior de uma gestação gemelar é um fator de risco para nascimentos de gêmeos subsequentes.

Redução seletiva

A redução seletiva de embriões no início da gestação tem sido uma estratégia usada para minimizar os efeitos adversos maternos associados aos nascimentos múltiplos. Estudos mostram que a redução embrionária, realizada por meio da ruptura manual do âmnio e seguida de tratamento com progesterona, não apresenta riscos adicionais  de perda gestacional em gestações gemelares unilaterais. No entanto, em gestações gemelares bilaterais o risco de perda gestacional é maior. 

Manejo nutricional durante o período de transição

Como citado anteriormente, vacas grávidas de gêmeos apresentam maior demanda energética e uma duração de gestação reduzida em comparação à vacas grávidas de um único feto.

Normalmente, as vacas com gestação gemelar adiantam a data do parto e não recebem durante o período adequado a dieta de transição, portanto o que pode ser feito é trazer vacas que estão gestando 2 bezerros para o pré-parto com maior antecedência e monitorá-las mais de perto.

As informações são do Dairy Global e adaptadas pela equipe MilkPoint.