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O paradoxo do PNMQL

POR LUIS FERNANDO LARANJA DA FONSECA

PANORAMA DE MERCADO

EM 02/02/2001

6 MIN DE LEITURA

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Luis Fernando Laranja da Fonseca

Se o chamado PNMQL fosse uma novela da Globo não daria tanto Ibope. Pelo menos a novela seria mais curta...

Tenho me debruçado ultimamente a estudar esse novo programa que promete revolucionar a pecuária leiteira nacional. Confesso que em algumas ocasiões tenho um sentimento de perplexidade ou de ingenuidade, e gostaria de compartilhar aqui algumas de minhas angústias.

Tenho lido e escutado das mais diversas lideranças dos produtores, que este programa será a salvação e a redenção da pecuária leiteira nacional. No entanto, analisando criticamente a questão, me pergunto: quais os verdadeiros benefícios reais que serão apropriados pelos produtores? Lógico que poderíamos enumerar alguns superficiais e teóricos, do tipo "maior comodidade para o produtor", "menor ocorrência de leite ácido", etc... Mas indo ao cerne da questão, que em última análise recai sobre a questão do preço pago ao produtor e a sua ingrata e eterna luta com a indústria de laticínios, haverá algum benefício para o produtor? Só consigo vislumbrar que a granelização gera uma redução no custo do frete, mas até aí não precisaria de um PNMQL para que isso se tornasse realidade.

Poderíamos discutir mais essa questão do benefício aos produtores, mas o objetivo desta breve colocação é apenas compartilhar a minha incapacidade de compreender que o PNMQL vai ser a tábua de salvação do setor lácteo brasileiro. Aliás, é interessante perceber como as pessoas precisam acreditar em alguma tábua de salvação. Lembro que há quase 10 anos, propagava-se aos quatro cantos, que a desregulamentação do setor ajudaria a resolver todos os males da pecuária leiteira brasileira. A desregulamentação veio em 1992, e o resto da história não precisa contar...

Mas voltando ao PNMQL, e apenas para citar alguns pontos já discutidos nesta coluna, não canso de perguntar como ficarão os produtores que não dispõem de energia elétrica. Tomemos como exemplo o estado do Tocantins, que hoje conta com um índice de eletrificação rural de apenas 13%, e que se prevê, após o programa federal "Luz no Campo", passará para 41%. Considerando que a meta de início da vigência do PNMQL é para o ano 2001 na região Centro-Oeste, como ficam os produtores que fazem parte do grupo dos 59% "sem luz" (aliás, o nome foi até sugestivo, poder-se-ia criar o MSL).

Outra questão que me intriga, é de onde foram tirados os valores que compõem o regulamento técnico de identidade do leite cru resfriado. Eu suponho que a definição de valores para um programa dessa magnitude deva se basear em um profundo estudo do padrão de qualidade do leite brasileiro e lastreado no levantamento das médias, p.ex., de CCS e CBT, de seus respectivos desvios-padrão e distribuição regional. Pergunto: qual a estimativa da % de produtores de leite que não conseguiriam se enquadrar nas normas propostas casos elas fossem vigentes hoje? E se esse número for grande em 2001, qual será a punição e o destino desses produtores?

Além disso, qual a capacidade instalada de laboratórios para análise que o país dispõe hoje para analisar essa imensa quantidade de amostras de leite que deveria ser gerada caso o programa fosse cumprido integralmente? E a logística e controle dessas amostras? E qual a capacidade em termos de mão-de-obra para fiscalização do programa o governo dispõe?

Gostaria de ressaltar firmemente aqui que este não é um manifesto contra a melhoria da qualidade do leite no Brasil, mas apenas uma contribuição para a análise crítica de um programa extremamente oportuno e importante para o país. Apenas entendo que às vezes é melhor a carreta andar atrás dos bois.

Outro dia escrevi que há carência de estatísticas confiáveis sobre o setor lácteo brasileiro. As discordâncias são enormes, até mesmo quando se discute o número de produtores de leite neste país. Fiquei curioso com essa situação e fui até a prefeitura de Pirassununga para saber se eles dispunham da informação sobre quantos pipoqueiros havia na cidade. Estava tudo lá, registradinho, afinal o sujeito para vender pipoca precisa de um alvará da prefeitura. Perguntei se eles sabiam quantos produtores de leite havia no município, mas daí a coisa ficou complicada... Ah, parece que na realidade tem mais pipoqueiros em Pirassununga do que os que constam no registro da prefeitura, mas esses são chamados de "pipoqueiros informais" e ninguém sabe ao certo quantos são, mas essa parte da história é muito longa...

Talvez fosse prioritário saber quantos e quem são os produtores de leite antes de saber a CCS deles, certo? E talvez antes da lei exigir que esses heróicos cidadãos brasileiros, refiro-me aos produtores de leite, produzam um leite com menos de 1 milhão de células ou de bactérias (esse parece ser o número cabalístico!) fosse importante o estado gastar um troquinho para explicar para esses cidadãos brasileiros o que é CCS e CBT. Caso contrário o sujeito pode ser punido sem saber mesmo porque.

Aliás, na proposta original do Programa de Modernização do Setor Produtivo do Leite havia 3 grupos de trabalho, um encarregado de estudar o regulamento técnico, outro de estudar o resfriamento e transporte do leite a granel e um terceiro grupo era responsável pela qualificação e habilitação de mão-de-obra.

Pode-se dizer que dos dois primeiros grupos se tem notícia, afinal de contas há uma proposta final com as normas e regulamentos técnicos que já é final e oficial; além disso, sobre a questão do resfriamento de leite e transporte a granel já foi bastante divulgado o programa de crédito facilitado liberado pelo governo, o PROLEITE, para compra de tanques e equipamentos. No entanto, não se tem notícia do que diz respeito à qualificação de produtores e técnicos. E é aqui que a carreta entra na frente dos bois mais uma vez. Pois a meu ver, antes de se estabelecer punições ou normas rígidas, cabe explicar aos interessados do que se tratam tais normas, e mais do que isso, seria inteligente e de bom tom para com o futuro do país pensar em um plano de longo prazo que proporcionasse a modernização do setor lácteo, com melhoria dos índices produtivos e da qualidade do leite, baseado no incremento da capacidade técnica e gerencial do maior número possível de produtores, ou seja, um projeto includente. Julgo que para tal, o foco deve ser centrado na educação e repasse de tecnologia e informação aos produtores.

Conforme aponta o próprio documento intitulado "Programa de qualificação e habilitação de mão-de-obra para a cadeia produtiva do leite" que faz parte do "Programa de Modernização do setor produtivo de leite e derivados", o censo agropecuário de 1980 aponta a existência de 21 milhões de pessoas ocupadas em atividades rurais e 5,5 milhões apenas nas atividades pecuárias. Do total de estabelecimentos dedicados à pecuária, 56% indicaram dedicar-se à pecuária leiteira, sendo que esta atividade ocuparia no mínimo 3 milhões de pessoas. É lógico que estas informações já estão defasadas pelo tempo, mas servem como referência para mostrar que não podemos nos dar ao luxo de desperdiçar, sem esforço, um contingente de postos de trabalho desta magnitude, justamente num país em que vaga de emprego é uma mercadoria que vale ouro. Não tenho ilusão de que o setor primário perdurará como grande gerador de empregos, apenas acho que não podemos desprezá-lo e desperdiçar oportunidades onde elas existam. Além disso, a missão de inclusão social neste país é mister, para que possamos crescer e nos desenvolver como nação moderna. E volto a enfatizar, isto só ocorrerá quando privilegiarmos de fato a educação.

Com esta filosofia em mente, concluo apontando que um programa de treinamento e educação dos produtores deveria ser priorizado neste momento, para que o PNMQL tenha chances de gerar algum benefício concreto para o país, e desta forma, a tal proposta original de qualificação e habilitação de mão-de-obra, que previa a realização de 169.480 horas-aula para 8.000 turmas e 120.000 cursistas por ano, por um período de 5 anos, e envolvendo recursos públicos e privados da ordem de R$ 45.775.360,00 deveria voltar ao centro do debate.

LUIS FERNANDO LARANJA DA FONSECA

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