![]() | Marco Antonio Parreiras de CarvalhoMarco Antonio Parreiras de Carvalho, 58 anos, casado. Formado em Medicina em 1975, doutor em Medicina em 1998. Professor Adjunto, Doutor da Faculdade de Medicina da UFMG. Pecuarista de leite desde 1994. |
MKP: Como é a sua propriedade leiteira?
Como não fiz curso especializado universitário, vou fazer um breve relato de como cheguei ao extraordinário padrão de manejo e de qualidade do gado, tudo com muita luta e com salário de professor universitário.
Fui criado dos 6 aos 17 anos em pequena propriedade rural, de meu pai, onde tirávamos 100 l/dia, no período chuvoso, e 60 - 80 litros na seca. Com 12 anos tirava o leite da tarde, prazerosamente. Aos 17 anos voltei a Belo Horizonte para fazer medicina, com o sentimento que um dia voltaria para a roça.
Consegui comprar, há 20 anos, 18 hectares de terra bruta em Belo Vale-MG e fui me preparar para "tirar leite". Fiquei sabendo da existência da EMBRAPA em Coronel Pacheco, onde passei um dia (em 1994), comprei muita literatura. Antes de começar a tirar leite, plantei 6 hectares de cana, 0,8 hectares de capim elefante e fui, aos poucos, plantando braquiarão na propriedade. No primeiro ano só tive dinheiro para 20 Kg de semente. Nos anos seguintes colhia as sementes, plantava milho e semeava braquiarão na capina do milho. Ao final de 3-4 anos tudo estava quase pronto. Nesta época tirava cerca de 180 litros de leite com 15-16 vacas. Em 1996 comecei a inseminar, fazia os acasalamentos de acordo com o que ia aprendendo com a literatura e visitas a fazendas de alta produção. Visitei muitas propriedades, no sul de Minas e outras regiões. Assino a Balde Branco há cerca de 10 anos, tenho pequena biblioteca veterinária. O fato de ser médico facilitou muito, muito. Fiz amizades com professores da veterinária da UFMG, para onde levava alguma vaca e bezerra doente quando, eventualmente, necessário. Passei a fazer diagnósticos difíceis com o meu e o gado de vizinhos, como deslocamento de abomaso, para a esquerda e para a direita (!), poliencefalomalácia (tese de mestrado do prof. Lobão) e assim por diante.
Fiquei 12 anos para decidir que raça gostaria de padronizar, porque amo todas as vacas e raças até que, finalmente, decidi pelo Jersey (estou em fase de associação), algumas holandesas na outra ponta e o jersolando. As holandesas, na primeira cria já produzem 8.000 Kg/leite, as Jersey acima de 5.000 kg na 1ª. lactação e as jersolando acima de 5.500Kg.
O regime adotado de manejo é de semi-confinamento, com piquetes especiais para novilhas. Bebem a mesma água que bebo na minha casa, passam o dia à sombra, têm muita dificuldade de adaptação em outra propriedade quando são vendidas (é o maior problema hoje), só querem ficar perto de todos nós que trabalhamos na propriedade. Trabalho lá de 5ª feira à tarde a 2ª pela manhã, junto com minha mulher. Tenho dois empregados, um deles foi o 1º emprego e o outro o 2º emprego! Recebem com dignidade pelo trabalho que fazem, além de amizade e respeito.
As bezerras são criadas até os 70 dias em piquetes de amendoim forrageiro, de tifton 85 dos 70 dias aos 120-130 dias e, depois, piquetes maiores de braquiarão com tifton ou andropogon. Nas águas, aos 10-12 meses vão para piquetes de mombaça ou de braquiarão. Foram adquiridos nos últimos 10 anos, aos poucos, mais 18 hectares de terra.
O trato no cocho para as vacas em lactação é verde picado nas águas (média de 5 vezes/dia) e, na seca, cana x uréia x sulfato de amônia 2 vezes ao dia (no mínimo). De acordo com a lactação, os demais tratos são assim divididos: até 4 tratos intermediários de silagem de milho. Quanto menor a produção naquele momento, os tratos intermediários de silagem são trocados por cana x uréia. Faço assim há 10 anos e quando chegam amigos procurando vacas para comprar imaginam que, como usam só silagem de milho, a produção irá aumentar. Aviso antes que tal fato não acontecerá.
Claro está que manejo + genética (uso os melhores touros das várias centrais) é muitíssimo importante. Mas a nossa grande diferença de tudo que conheço em pecuária de leite é o amor às vacas! Não gosto e não permito que novilhas, na primeira lactação, alcancem picos superiores a 35 Kg/dia, para não estragar o úbere. Não sou escravo do dinheiro.
Meu litro de leite na seca custou R$ 0,59 e, nas águas, em torno de R$ 0,50.
MKP: Breve descrição da atuação profissional.
Como médico, continuo professor de graduação e pós-graduação da UFMG. Continuo como pecuarista de leite e, importante recria de fêmeas. Esta recria se associa à lucratividade do Sítio Felicidade. Tenho, em média, 12 a 15 fêmeas em lactação, intervalo de partos de 12 - 13 meses. Por outro lado tenho, em média, 30 fêmeas sendo recriadas, geralmente a metade delas inseminadas, algumas com semem sexado.
MKP: Quais são as principais dificuldades que você vê na atividade?
Em primeiro lugar, a falta de compromisso da prefeitura em cascalhar, adequadamente, as estradas no período chuvoso. Aí reduzo a produção de leite em 40% entre novembro/dezembro a fevereiro/março.
Horário inadequado da coleta de leite pela Itambé. Às vezes, o caminhão chega durante a noite/madrugada porque a recepção de Sete Lagoas está ruim ou porque o caminhão estragou.
Evidentemente, nem sempre o preço pago ao produtor é suficiente, chegando, às vezes, a receber pouco menos do custo. Compenso com a recria de fêmeas de alta genética e rusticidade.
O problema da maioria dos pecuaristas também seriam os funcionários. Numa região como a minha, que não se constitui em bacia leiteira significativa, as pessoas não sabem o que é pecuária de leite. Resolvo porque os funcionários são os mesmos e estão sempre motivados!
Dependo de terceiros, particulares, para a ensilagem de milho, além de São Pedro. O PRONAF não funciona por vários motivos. Quem comanda e quem trabalha são humanos como se vê hoje na Internet e nos jornais. Uso o "climatempo" para plantar e para colher.
MKP: O que está melhorando no setor?
Nos últimos anos percebe-se que a comunicação está melhorando de forma geométrica. A Itambé fornece, por exemplo, a revista Balde Branco. Percebi que meus vizinhos não liam ou não compreendiam o que liam. Passei a conversar com eles. Como eu já assinava, meu empregado (Joel) disse para continuar assinando, a que a Itambé envia é dele! Tenho que ler a revista o mais rápido possível, porque o Joel me questiona os artigos!
Percebe-se, nitidamente, que a indústria, lentamente, procura maior aproximação com o pecuarista, no meu caso a Itambé, que respeito e prezo muito. Ainda não sabem bem como acelerar esta aproximação.
Órgãos como CNA, Senar e outros, estão trabalhando mais e melhor. A senadora Kátia Abreu é uma dádiva para nós.
A minha descoberta do MilkPoint também foi um achado, já fiz dois cursos muito bons, além das leituras variadas.
A EMBRAPA é um belíssimo órgão de sustentabilidade, de pesquisa, etc, na pecuária.
MKP: O que acha que falta no setor?
Para mim, pessoalmente, estrada bem transitável no período chuvoso. Penso que o governo do estado não sabe disto e está na hora dos órgãos formadores e divulgadores de opinião trabalharem nisto. Jamais vi algo nesse sentido.
Muito, muito importante a educação do produtor rural. Não é fácil, demanda tempo, mas pode e deve ser feito. Ao pequeno produtor, mostrar que sua vida não resolverá se mudar da Itambé para a "Associação" porque esta última não paga e/ou não pune por leite de má qualidade. Mas muitos estão tentando melhorar. Ao grande produtor e, isto é mais grave, educar no sentido de que mesmo que ele ganhe menos ao tratar as mastites, isto deve ocorrer. Parece-me que o ganho com a contagem boa de células somáticas é menor do que deixar estas células somáticas altas. É cruel para quem consome o leite.
Nós produtores teremos que nos capacitar para reduzir custos e trabalhar com a tonelada de leite em pó a US$ 3.000 - US$ 3.500. Não dá para ter alta produtividade e altos custos. A saída é melhorar a pastagem em regime de semi-confinamento e a utilização da cana de açúcar de forma estratégica. Tenho utilizado também subprodutos como fubá e polpa cítrica na recria de novilhas com ótimos resultados.
Fico horrorizado com os desmatamentos pequenos, que somados, ficam imensos, nas propriedades pequenas e médias. Mata ciliar, então, nem existe. Fora lixos que jogam nas nascentes e cursos d'agua!
Porque não ter os medicamentos genéricos? Para nós humanos, são fabricados por Medley, Sandoz, Novartis, etc. Laboratórios de referência mundial. Porque não medicamentos populares, como na medicina, onde temos antidiabéticos, anti-hipertensivos, anti-reumáticos e muitos outros? Poderíamos ter, na Medicina Veterinária, vacinas a preços populares. Imagine IBR/BVD/leptospirose a preços populares? Porque não antiparasitários, carrapaticidades, alguns antibióticos, etc? Como controlar isto? Através do cartão do IMA! Acho que há espaço até para medicamentos manipulados, fiz um comentário recente no "Giro lácteo" sobre este assunto.
MKP: Quais personalidades e empresas admira no setor?
Aqui, citar nomes torna-se difícil. Há muita gente boa tentando ajudar, crescer, etc.
Mas, vamos lá:
Hospital Universitário da UFMG - Prof. Último de Carvalho e Prof. Lobão;
Senadora Kátia Abreu;
Marcelo Pereira de Carvalho
MilkPoint
EMBRAPA
Revista Balde Branco
ITAMBÉ - Aqui, citaria um nome importantíssimo: Leonardo Braga, funcionário que atua na captação de leite na região de Moeda, Belo Vale, Itaguara. É difícil alguém com tanto amor ao trabalho, sempre disponível para ajudar ao produtor em várias áreas da produção de leite e não só na captação.
MKP: Dica de sucesso ou frase preferida
O sucesso definitivo só é alcançado com amor e comprometimento. É meu lema de vida. Só faço o que amo e gosto muito.
MKP: Quais os serviços do MilkPoint você utiliza mais, e como o MilkPoint lhe auxilia no dia-a-dia?
Não perco o Editorial, é sensacional. As dicas de sucesso são imperdíveis e muito educativas. Gosto das entrevistas, do Giro lácteo, etc.
Recentemente, fiz dois cursos.

