Kennya Siqueira, da Embrapa Gado de Leite, fala sobre volatilidade e garantia de renda ao produtor de leite

O conteúdo dessa entrevista é referente à palestra que Kennya Beatriz Siqueira, da Embrapa Gado de Leite, ministrará no Fórum sobre Mercado de Leite na Mercoláctea, que será realizada 11 e 12 de maio, em Chapecó-SC. O evento contará também com um Fórum sobre Qualidade do Leite.

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O conteúdo dessa entrevista é referente à palestra que Kennya Beatriz Siqueira, da Embrapa Gado de Leite, ministrará no Fórum sobre Mercado de Leite na Mercoláctea, que será realizada 11 e 12 de maio, em Chapecó-SC. O evento contará também com um Fórum sobre Qualidade do Leite.

Quer saber mais? Veja aqui o programa e outras informações sobre o evento.

Figura 1


MilkPoint: Como você explica o conceito de volatilidade e qual seu efeito na cadeia do leite?

KennyaVolatilidade é um termo que está sendo muito usado ultimamente para indicar a variação no preço das commodities. Mas, o termo volatilidade tem uma conotação de instabilidade, de algo inesperado. Uma forma mais fácil de visualizar a volatilidade é traçar um gráfico da variação dos preços de uma commodity em mês em relação ao mês anterior. Fazendo isso para alguns produtos que são referência no mercado internacional lácteo, podemos observar picos de até 40% em certos momentos, e variações negativas de até 30% em outros momentos. Isso indica uma instabilidade, ou seja, uma volatilidade grande.

O cálculo do desvio padrão dos preços também é usado para medir a volatilidade de um produto. Porém, o método mais aceito e conceituado, um procedimento mais formal, que é o procedimento utilizado por agentes financeiros nas bolsas de mercadorias, é chamado de volatilidade histórica do preço. A volatilidade consiste basicamente no cálculo do desvio padrão de uma série logaritmizada da variação dos preços. Para o leite em pó da Oceania, por exemplo, a volatilidade histórica é de 21,4% ao ano, valor inferior ao de algumas commodities negociadas em bolsas de mercadorias, mas superior ao verificado para muitas commodities agrícolas.

No entanto, é importante lembrar que a volatilidade elevada é uma característica inerente de produtos agrícolas, de um modo geral. E, de acordo com a teoria, ela só é um problema para o produtor se ela ocorre apenas de um lado. Ou seja, se o preço dos insumos e o preço do leite forem voláteis na mesma magnitude, então isso não é um problema para o produtor. Mas o que verificamos no Brasil, é que os preços do leite têm oscilado em maior proporção que o preço dos insumos usados na produção. Isso dificulta o gerenciamento e planejamento da atividade produtiva, colocando o produtor em grande risco financeiro.

MilkPoint: Quais os instrumentos de mercado para redução desse efeito?

Kennya Ultimamente tem se falado muito dos contratos futuros como alternativa para lidar com a volatilidade. Muitos contratos futuros de leite foram criados no mundo. Mas a criação de um mercado futuro não reduz a volatilidade do preço do leite. Um exemplo disso, é que o preço do leite classe III negociado na CME é o produto lácteo que apresentou maior volatilidade nos últimos tempos.

Portanto, a importância do contrato futuro está no gerenciamento individual do risco de preço. Ou seja, se o contrato futuro tiver liquidez e for bem-sucedido, os agentes da cadeia do leite poderão atuar tanto no mercado físico quanto no futuro, fazendo o hedge, e com isso, reduzindo o risco de perdas com as oscilações de preços. Isso acontece, porque, os preços físico e futuro tendem a caminhar juntos e se uma pessoa toma posições opostas (i.e., compra em um mercado e vende no outro), ela se resguarda das variações dos preços.

Outra alternativa para lidar com a volatilidade são os contratos de opção, que também tendem a ser negociados numa bolsa de futuros. A ideia do contrato de opções é fixar um preço para o futuro, mas para isso, o indivíduo precisa pagar um prêmio.

Além disso, existem os contratos a termo que são comuns no mercado de soja e as CPR no mercado de café. Nos contratos a termo, a quantidade, tipo de produto, data, preço e local de entrega são estabelecidos no momento da celebração do contrato. E o pagamento é feito antecipado, mas a entrega do produto é feita no futuro. Esse mecanismo geralmente é feito entre duas partes que já negociam há algum tempo entre si e, portanto, já existe a tradição de confiança.

Estes 3 tipos de ferramentas são as mais comuns para gerenciar a volatilidade dos preços e garantir a renda do produtor. Porém, ao redor do mundo existem outras tentativas de lidar com a volatilidade do preço do leite. A Fonterra, por exemplo, lançou em 2008 um leilão eletrônico de derivados lácteos, que promove maior transparência e oferece certa previsibilidade dos preços futuros do leite. Alguns países, como o Canadá, por exemplo, continuam se apoiando na política de subsídios agrícolas para garantir renda aos seus produtores. E nos Estados Unidos tem sido propostos alguns programas de garantia de renda e estabilização do mercado.

MilkPoint: Esses, por si só, significam garantia de renda ao produtor?

Kennya Os contratos, sejam futuros, de opção ou a termo, garantem o preço. Mas, o lucro na atividade vai depender da capacidade de gerenciamento individual. Nos mercados futuros, por exemplo, o indivíduo tem que acompanhar diariamente a movimentação dos preços, assim como as mudanças estruturais e conjunturais do mercado para tomar decisão. Já os subsídios são políticas de garantia de renda.

MilkPoint: Existem projetos no Brasil bem sucedidos nesse sentido? E no exterior?

Kennya Os contratos futuros de leite dos Estados Unidos e os leilões da Fonterra têm funcionado bem. No Brasil, ainda não temos nenhuma experiência de contratos futuros, opções ou contratos a termo no mercado lácteo. Apenas tem se iniciado algumas tentativas de fidelização dos produtores. A BRF, por exemplo, tem o Clube do Produtor, que visa a redução dos custos de produção e melhoria da qualidade. Mas ainda não leva em consideração a fixação de preços, ou garantia de renda.

MilkPoint: O que acha que falta para viabilizá-los?

Kennya A fidelização e celebração de contratos de longo prazo ou contratos a termo é uma questão de negociação entre indústria e produtor. Portanto, precisa haver diálogo entre as duas partes. Para a indústria, os contratos podem ser garantia de quantidade e qualidade de produto ao longo do ano, enquanto que para o produtor eles podem significar garantia de renda. Eu acredito que, com o aumento da competição com produtos importados, a necessidade de inserção no mercado internacional e a entrada em vigor da IN51, a cadeia do leite no Brasil deve caminhar, mais cedo ou mais tarde, para a celebração de contratos. Pois, a época de contar com apoio e subsídios governamentais já passou. E a criação de um contrato futuro de leite no Brasil ainda necessita de mais tempo e estudos por parte da BM&FBovespa.

MilkPoint:Eles são a solução para as menores margens ao produtor? Garantia de lucro na atividade?

Kennya O produtor deve atuar como um empresário, olhando não somente o preço do seu produto, mas também os seus custos de produção. Gerenciar os custos de produção é também uma forma de minimizar os riscos na atividade leiteira. E atualmente, para o produtor de leite no Brasil é mais fácil controlar os custos do que os preços. Ele pode conseguir isso através da substituição de insumos ao longo do ano (comprando sempre o que estiver mais barato); através da compra de grandes quantidades (seja através de parcerias com vizinhos, ou associações, ou cooperativas, etc); ou até mesmo participando dos mercados futuros de insumos, como soja e milho.


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Guanambi Silva Junior
GUANAMBI SILVA JUNIOR

BELO HORIZONTE - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 29/04/2011

Prezada Kennya,


Parabéns pela linha de pesquisa e pelo artigo.


O Brasil precisa cada dia mais de Pesquisadores e Vozes como a sua para abrir a mente dos donos de Laticinios e nós produtores de leite, de que a relação não precisa ser como estamos hoje.


Espero um dia poder ver essa modalidade de negociação entre Laticinios e Produtores de Leite aqui no Brasil.


Em relação a questão de fidelização de produtor, eu concordo com o colega Clemente da Silva que essa questão de Clube do Produtor, Clube disso e daquilo é pura balela, pois hoje em dia o que fideliza nós produtores é preço de leite. Pergunta esses produtores que entregam leite para esses laticinios, se eles receberem 0,05 a menos por litro de leite em relação ao laticinio concorrente eles se lembrarão do tal Clube do Produtor.


Mas de qualquer forma, parabéns por sua linha de pesquisa!


Clemente da Silva
CLEMENTE DA SILVA

CAMPINAS - SÃO PAULO

EM 28/04/2011

Parabéns Kennya, o assunto é atual e de grande interesse aos produtores de leite de todos os recantos do Brasil. Infelizmente, o produtor de leite brasileiro acaba sempre dependurado no pincel (sim, a escada cai e ele tenta se apoiar no pincel). Seria uma maravilha, se a recíproca fosse verdadeira da parte das empresas receptoras do produto, oque não ocorre no Brasil. Além de não haver fidelidade por parte da industria e até mesmo de muitas cooperativas quanto a contratos futuros, o produtor não tem escapatória uma vez que assim como o frango vivo, o leite fluido não pode ser armazenado a espera de melhores preços. Esperamos que ao se confirmar a IN51 a partir de julho próximo, abran-se novas perspectivas aos produtores que ficarem no mercado, uma vez que muito provavelmente, venha a faltar mais leite. Porém, com um R$ "valorizadíssimo", é muito mais provavel, que esse sistema de  governo sem escrúpulos que  insiste em abusar da ingenuidade do povo em geral, libere mais e mais importações para impedir que o nosso leitinho de cada dia alcance o seu merecido lugar na escala de preços ao  produtor.`Por fim, quanto ao gerenciamento, é óbvio que cada vez mais em qualquer área, o gerenciamento será a artéria principal. Só que mais uma vez, o produtor de leite, cai na esparrela de sempre. Não há como gerenciar a compra de insumos individualmente e nem mesmo em pequenos grupos, uma vez que para as industrias não repepresentam volume. Quem deveria fazer isto seriam as cooperativas e a industria receptora do leite, mas, eles não estão nem aí para o produtor. Esse negócio de clube do leite, clube do produtor, é tudo balela no Brasil, já que a corrupção está muito arraigada em quase todos os setores, e muito mais, no de compras desse tipo, fazendo com que um produto que deveria chegar no cocho das vacas ou nas terras de produção de alimentos, acabe chegando muitas vezes até mais caros. E para terminar, seria ótimo se como você mencionou no inicio, houvesse volatilidade também na parte de insumos, oque nunca ocorre. Abraços e sucesso em sua palestra, pois o assunto vai dar panos para mangas.


Clemente.
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