A região noroeste do Rio Grande do Sul tem produzido milho silagem, tipicamente, na ordem de 35 tMN/ha (toneladas de matéria natural por hectare) em anos normais. Em anos excepcionais, a média regional tem ficado em torno 45t e, em anos de estiagem, não ultrapassa 20tMN/ha.
Sabemos que os milhos modernos brasileiros são capazes de ultrapassar 80t em bons anos, marca esta já alcançada comercialmente por alguns produtores de leite do RS, por exemplo em concurso de produção de silagem realizado pela Cotrisal (Cooperativa Tritícola Sarandi Ltda., Sarandi-RS, 2014/2015), mas não ainda no noroeste gaúcho.
A Coopermil (Cooperativa Mista São Luiz Ltda., sediada em Santa Rosa), avaliando materiais em sua área experimental (2013/2014), obteve parcelas controladas superiores a 70t, demonstrando que é possível elevar em muito a produtividade do milho silagem na região (Sergio Schneider, comunicação pessoal, 2014).
Que fatores estão estrangulando a produtividade em lavouras comerciais do noroeste gaúcho?
Tentando responder esta pergunta, conduziu-se um estudo monitorando 24 lavouras de milho (safra 2015/2016), formadas por 5 híbridos, distribuídas em 5 municípios da grande Santa Rosa. Neste, foram avaliadas 50 variáveis (4 categóricas, 2 qualitativas e 44 quantitativas), listadas na Figura 2.
Para nossa surpresa, a principal causa por trás da variação na produção de silagem foram as variações em espaçamento entre linhas. A importância desse fator é bem conhecida e estudada, o que não era conhecido para nós é que as variações atualmente adotadas estavam causando tanta diferença em produtividade.
De forma geral, as produções das 24 lavouras variaram, num ano que foi bastante chuvoso, de 37,5 a 63,7t, com média de 53tMN/ha, uma amplitude bastante grande para propriedades de uma mesma região, numa mesma safra, adubadas e todas utilizando híbridos modernos.
Os espaçamentos utilizados pelos produtores variaram de 45 a 90cm. Percebeu-se que lavouras plantadas com menos de 65cm entre linhas produziram 22% mais (57,3tMN/ha) que lavouras com espaçamento maior (46,9tMN/ha). Veja Figura 3.
Que mais foi detectado?
A Figura 4 mostra os resultados em ordem decrescente de impacto na variação da produção de silagem. Barras vermelhas indicam impacto negativo, barras azuis, impacto positivo na produtividade. Os tons mais escuros de vermelho ou azul indicam que a variável foi estatisticamente significativa (maior confiabilidade dos resultados).
Houve também uma variação muito grande em densidade de semeadura e, consequentemente, em população de plantas na colheita, variando esta de 48.500 a 79.200, com média de 65.368 plantas/ha. No entanto, ao contrário do espaçamento, o impacto da variação em população de plantas nas variações de produção não foi estatisticamente significativa (ou seja, faltou consistência).
Por trás da importância do espaçamento está a constatação de que o peso das plantas, em média, não conseguiu compensar os afastamentos (perto = 792g; longe = 833g, não diferentes estatisticamente).
Consistentemente, solos com mais MO (matéria orgânica) estiveram associados com maior produção. Isso não foi nenhuma surpresa, visto seu papel em liberar N, reter umidade, permitir maior aeração, tamponar reações químicas etc. A média foi de 2,59%, típica de solos de lavoura na região, mas baixa se o solo for bem manejado e com gado de leite em pastejo rotacionado (amplitude foi de 1,8 a 3,7%).
Estas e as demais médias e amplitudes podem ser verificadas na Tabela 1, abaixo.
Tabela 1. Média, desvio padrão, mínimo e máximo encontrados para cada variável. Elementos químicos referem-se ao seu teor no solo (quando no fertilizante, este é indicado). As abreviações estão explicadas na Fig. 2.
A compactação de alguns solos foi bastante alta. Para este tipo de solo, valores acima de 1,2 kg/dm3 são considerados moderados e acima de 1,3 kg/dm3 são altos. A média geral econtrada foi de 1,63, variando de 0,25 (excelente) a 2,48 kg/dm3 (extremamente alta). O principal erro neste sentido é deixar os animais no piquete depois de atingirem a altura de resíduo ideal e o uso de máquinas com solo ainda encharcado.
Mesmo assim, esta variável (Fig. 4 e Tabela 1) não teve peso na explicação das variações. Ela possivelmente impediu produções maiores no geral, mas não esteve associada de forma consistente com as variações. Ou seja, não se pode dizer que se produz pouco na região porque o solo esteja adensado.
O mesmo vale para outras variáveis que são agronomicamente importantes para a produção, mas cuja variação a campo não se relacionou com a variação dos resultados.
Considerações finais
Para entender qual seria a melhor configuração, comparamos por contraste o grupo acima da média geral com o grupo abaixo desta (independentemente do espaçamento usado) e os denominamos "superior" e "inferior", respectivamente. A Tabela 2 mostra como foi a produtividade média, a população na colheita, a densidade de semeadura, o espaçamento médio entre linhas de cada grupo, a distância média entre plantas e o peso das plantas.
Tabela 2. Características do grupo que produziu acima (superior) e abaixo (inferior) da média de massa de silagem (kgMN/ha), com destaque para densidade de semeadura (sem/ha) e espaçamento (EntreLn em m).
Consistentemente, economias em semente têm refletido em perdas onde o produtor entende que haveriam ganhos. Isso é válido também em pastagens.
O próximo passo deste trabalho é repetir o estudo com todos os produtores plantando abaixo de 65cm. Isso permitirá que outros gargalos se revelem.
A ilustração clássica desse dilema é o barril proposto por Liebig ("a lei do mínimo"). A produção (no caso o volume de água do barril) é determinada pelo fator mais limitante (a madeira mais baixa na Fig. 5).
Se o maquinário de colheita não permite, deve-se fazer as contas. Quanto vale 22% mais silagem? Será que isso não pagaria a terceirização da operação, ou mesmo a aquisição de ensiladeiras que superem o problema mencionado na colheita?
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Notas de rodapé:
1. AGRADECIMENTOS: este estudo foi planejado e desenvolvido a campo com a valiosa colaboração do técnico agrícola Maurício Perin e do médico veterinário Marcos de Souza Freitas, ambos da Coopermil (Cooperativa Mista São Luiz Ltda.). Junto com estes colegas, agradecemos aos produtores de leite que colaboraram com o estudo e aos engenheiros agrônomos Milton Racho (gerente de política leiteira) e Sergio Schneider (gerente técnico), por sugestões e indispensável apoio.
2. ANÁLISE ESTATÍSTICA: Para aqueles mais interessados nos aspectos científicos deste estudo, a análise estatística baseou-se em regressão múltipla, passo a passo, com seleção à frente (stepwise regression with forward elimination), além de diversas análises de regressão linear e de variância, com e sem covariáveis, utilizando-se o pacote SAS 8.1.