Já se passaram mais de 25 anos desde que dois pesquisadores da área de forragicultura (Sheath & Clark, 1996) propuseram uma pirâmide de prioridades para os sistemas de produção animal à base de pasto, e embora os sistemas de produção estejam em constante evolução e tecnificação, os fundamentos propostos a quase três décadas permanecem contemporâneos, pois suas raízes estão na ordenação dos fatores ligados à produção animal em pastagens.
A base da pirâmide (Figura 1) é descrita como os recursos físicos da propriedade, este patamar abrange fatores como o clima, topografia e o solo; logo acima encontram-se os recursos vegetais que são as plantas que compõem aquele ambiente, seguido dos recursos animais que designam o potencial produtivo dos animais, e por fim, o manejo do sistema subdividido entre o perfil do sistema e o manejo do pastejo.
É importante salientar que essa estrutura não se trata de uma escala de importância, e sim de prioridade, isto quer dizer que mudanças na ponta da pirâmide soam pouco efeito na produtividade quando fatores prévios são limitantes. A mudança deve ser realizada de “baixo para cima”.
Em termos de recursos físicos, como por exemplo o solo, toda e qualquer melhoria na fertilidade (química, física e biológica) influenciará nas demais castas da pirâmide. São os recursos físicos que definem quais espécies de plantas a área suporta, por exemplo, em regiões de média fertilidade e de clima frio, com geadas frequentes, o uso da hemarthria é uma opção, em regiões de clima quente e de alta fertilidade, gramíneas como o tifton 85 são adequadas.
Em outras palavras, nós, técnicos e produtores, determinamos a melhor espécie a ser cultivada somente dentro de um espectro de espécies permitidas pelas características físicas do meio (no caso de fertilidade do solo, podemos melhorar, clima, “não”).
A partir dos recursos vegetais disponíveis, é definido o mérito genético dos animais. As braquiárias, em geral, são espécies muito produtivas, entretanto, de valor nutricional limitado. Este tipo de recurso forrageiro não seria adequado para sistemas de produção de leite com vacas de alta produção, mas plenamente apropriado para sistemas de cria, nos quais as exigências nutricionais das matrizes são moderadas.
Por fim, temos o manejo do sistema, subdividido entre, o manejo do pastejo e o perfil do sistema. Os recursos forrageiros norteiam o perfil do sistema, em locais com produção de forragem bem distribuída ao longo do ano, sistemas leiteiros que precisam de uma oferta de forragem regular são mais apropriados, enquanto em regiões com acentuada estacionalidade forrageira, os sistemas de cria ou recria parecem equilibrar melhor a relação entre a oferta e demanda de pasto.
Em relação ao manejo do pastejo, este conceito trata exclusivamente da forma como permitimos o acesso dos animais ao pasto, é a ponta do triângulo, alterar o método de lotação por si só, de lotação contínua para lotação intermitente (piquetes), por exemplo, não vai solucionar um eventual problema de escassez de forragem.
Um equívoco comum em relação a esta escala, é a falsa percepção de que o emprego de tecnologias de diagnóstico, por si só, é capaz de assegurar a melhoria dos índices produtivos.
Para exemplificar, podemos tomar um exemplo da área agrícola, uma colheitadeira de grãos que gera um mapa de colheita heterogêneo e com baixa produtividade nos dá o diagnóstico de que a fertilidade da área agrícola é irregular, mas não resolve o problema, apenas diagnostica.
A informação e perde a função se a partir dela, medidas não forem tomadas. O raciocínio pode se estender a produção animal, com colares de identificação individual dos animais e vacas de baixa produção, por exemplo.
Para pensar: Já é realidade em alguns lugares do mundo, drones que estimam em tempo real a massa de forragem (kg de MS/ha) dos piquetes, o que permite um ajuste instantâneo de carga animal, acontece que, se há limitação de forragem o drone não vai resolver o problema, e possivelmente, o capital investido em objetos voadores poderia ser mais bem aproveitado se aplicado em manutenção da fertilidade do solo, por exemplo.
É preciso deixar claro que não condeno a adoção de tecnologias que informam em tempo real a atividade dos animais, pelo contrário, acredito ser extremamente útil em alguns cenários, sugiro apenas, que as melhorias, quando necessárias, devem ser priorizadas da base da pirâmide ao seu ápice. Quanto melhor a hierarquia inferior, mais relevante serão as mudanças nas categorias superiores.
Figura 1. Pirâmide de prioridades para sistemas de produção à base de pasto (Sheath & Clark, 1996). Fonte: Silva & Passanezi (1998).