A cadeia produtiva do leite e derivados é um setor de grande importância econômica e social para o Brasil.
Com um rebanho superior a 16 milhões de cabeças e produção de mais de 34 bilhões de litros de leite por ano, o Brasil destaca-se como produtor mundial de leite, sendo que essa produção ocorre nas mais de 1 milhão de propriedades produtoras de leite existentes no Brasil (IBGE, 2021).
A produção leiteira possui como um dos principais desafios a temperatura elevada, uma vez que o clima no Brasil passa por oscilações durante o ano todo, atingindo temperaturas de até 38 °C, fator este indesejado para a bovinocultura de leite (VITOR NETO; BITTAR, 2018).
De acordo com Silva (2000), pode-se definir o ambiente como o conjunto de tudo o que afeta a constituição, o comportamento e a evolução de um organismo e que não envolve diretamente fatores genéticos.
O mesmo autor ainda comente que, em se tratando de condições ambientais, o estresse térmico pode ser entendido como um fator que age sobre um animal levando-o a desencadear uma resposta fisiológica com força proporcional a aplicada sobre ele. O grau do estresse térmico induz os animais a modificarem seus hábitos alimentares, diminuindo a ingestão de matéria seca e a absorção de nutrientes, diminuindo assim o calor metabólico (KADZERE et al., 2002; SHWARTZ et al., 2009).
Muller (1989) comenta que um ambiente desconfortável, estressante, pode levar o animal a provocar várias respostas dependendo de sua capacidade em se adaptar. Logo, os mecanismos fisiológicos agem rapidamente na manutenção termorregulatória o que resulta num balanço energético negativo reduzindo a disponibilidade de nutrientes e energia para a produção e reprodução (BERNABUCCI et al., 2010; BAUMGARD; RHOADS, 2013).
Dentre os parâmetros fisiológicos sobressaem a frequência respiratória e a temperatura corporal cujas oscilações sofrem influência de variáveis intrínsecas ao animal como raça, idade e estado fisiológico ou por variáveis extrínsecas como horário, consumo de alimentos e de água, temperatura ambiente, velocidade do vento e estação do ano) (PERISSONOTO et al.; 2009; INDU; PAREEK, 2015).
Diante do stress térmico, os bovinos desencadeiam uma resposta fisiológica onde o animal se utiliza de mecanismos termorreguladores na tentativa de dissipar o calor. Os mecanismos inicialmente utilizados são a vasodilatação, a sudorese e a respiração, sendo que o primeiro sinal que se observa é o aumento da frequência respiratória. Quando a temperatura ambiente se soma a temperatura metabólica, o que se observa é um aumento da temperatura retal e sudorese com a finalidade de eliminar o excesso de calor (RESENDE et al., 2021).
Segundo Baccari (2001), o primeiro sinal visível em virtude do estresse calórico é a taquipneia, observando-se também um aumento na sudorese e na ofegação. Já a temperatura retal é o último mecanismo fisiológico utilizado pelo animal na tentativa de estabelecer a homeostase já que os outros não foram suficientes para a dissipação do calor (SCHARF et al., 2008).
Segundo Dalcin (2013), o estresse térmico causa mudanças na homeostase sendo mensurado através de variáveis fisiológicas tais como, temperatura retal, frequência respiratória e concentrações hormonais.
O hipotálamo é o principal termorregulador do organismo dos animais e através de uma sequência de mecanismos se observa a ativação hormonal e do sistema nervoso autônomo com a finalidade de preservar a integridade do organismo, assegurando a homeostasia (PIRES et al, 1998; RODRIGUES, 2006).
A frequência respiratória (FR) é uma forma do animal eliminar o calor corporal através da evaporação, sendo que o primeiro sinal visível em virtude do estresse calórico é a taquipneia, porém a sequência de mecanismos utilizados pelos animais para sua adaptação fisiológica seja a vasodilatação periférica, o aumento da sudorese e somente depois a taquipneia (BACCARI, 2001).
A frequência respiratória pode sofrer variações intrínsecas e extrínsecas, sendo as intrínsecas relacionadas a idade, raça, estado fisiológico e as extrínsecas relacionadas a fatores como hora do dia, ingestão de alimentos e de água, temperatura ambiente, velocidade do vento, estação do ano que podem ter relação com a temperatura corporal e também com a frequência respiratória (PERISSINOTTO et al., 2009).
Segundo relatos de Martello, (2006), de acordo com a intensidade e duração do estresse calórico, a FR pode aumentar ou diminuir.
Ferreira et al. (2006) afirmaram que em bovinos adultos os valores médios da FR podem variar de 24 a 36 movimentos respiratórios por minuto podendo ter uma amplitude de 12 a 36 mov/min. A partir de 12 mov/min já caracteriza carga excessiva de calor, sendo que acima de 160 mov/min medidas devem ser tomadas para diminuir essa carga sendo que acima de 60 mov/min seria a carga máxima que o animal suportaria (HAHN; MADER, 1997).
O início da troca de calor por meio da evaporação da umidade do sistema respiratório se dá pela ofegação (DALCIN, 2013). Segundo Cattelam et al. (2013) o bovino ofegante apresenta um aumento de sua taxa metabólica, gasta mais energia, podendo apresentar acidose respiratória e alterar o seu comportamento.
A temperatura retal é outro indicador de estresse térmico, sendo o último mecanismo fisiológico utilizado pelo animal na tentativa de estabelecer a homeostase já que os outros não foram suficientes para a dissipação do calor(SCHARF et al., 2008). Silva (2008) declarou que a temperatura não é uniforme em todo o corpo, variando de acordo com a atividade metabólica dos diversos tecidos de cada região anatômica.
De acordo com Head (1995) os bovinos possuem temperatura corpórea variando de 37 °C à 39 ºC. Já segundo Cattelam (2013), para bovinos leiteiros, a TC varia de 38 ºC a 39,3 ºC, sendo que medidas de TR acima de 39 ºC, são negativamente correlacionados com a produção de leite.
Diante do exposto, pode se considerar que nas regiões tropicais, a alta temperatura ambiente pode ser considerada como o principal fator limitante na produção da vaca leiteira, pois levam a alterações drásticas nas suas funções metabólicas, prejudicando o apetite e, consequentemente, diminuindo a ingestão de alimentos (ARANHA, et al., 2019).
Em relação as alterações comportamentais, os bovinos que encontram-se sob estresse térmico apresentam mudanças de comportamento sendo observado um aumento na ingestão de água e diminuição da ingestão de alimentos (RODRIGUES, 2021), diminuição da ruminação (PIRES; CAMPOS, 2008), diminuição do pastoreio diurno e aumento do pastoreio noturno e tempo de ócio (COSTA, 2000), busca pela sombra, distensão dos membros buscando aumentar a superfície de troca, procura por pisos frios e molhar a superfície corporal (PIRES, 1998).
Abreu et al., 2011 e Brasil et al., 2000, verificaram que o estresse térmico em vacas leiteiras também levam a alterações nas características do leite como diminuição nos níveis de gordura, de proteína, de lactose e de sólidos totais.
Os animais de produção, dentre eles as vacas leiteiras, requerem necessidades distintas que possam proporcionar-lhes bem-estar, tais como ambiente, ambiência, instalações, manejo e nutrição.
Em especial, necessitam de conforto térmico que deve respeitar fatores como clima da região e suas variações, raça, idade e seu desempenho de produção, evitando os efeitos negativos que o estresse calórico desencadeia nos animais. Com isso, o bem-estar animal poderá proporcionar maior produtividade e lucratividade a atividade leiteira.
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Autores
Zampieri, João Henrique - Discente em Produção Animal, Universidade Brasil, SP.
Brennecke, Kathery - Docente em Produção Animal, Universidade Brasil, SP.
Zeferino, Cynthia Pieri - Docente em Produção Animal, Universidade Brasil, SP.
Orlandi, Cassia Maria Barroso - Docente em Produção Animal, Universidade Brasil, SP.
Rerefências
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