Nos últimos anos, o setor de ingredientes e aditivos alimentares passou por uma mudança estrutural: não basta mais oferecer performance tecnológica ou vantagens funcionais. As empresas agora precisam demonstrar, com métricas concretas, como seus ingredientes contribuem para metas ESG (Environmental, Social and Governance). A busca por evidências mensuráveis tornou-se tão importante que influenciou todo o ecossistema — da indústria de alimentos às multinacionais de ingredientes, passando por certificadoras e investidores.
Esse movimento responde à crescente demanda dos consumidores e à pressão regulatória e financeira. Segundo o Global Sustainability Study 2023 (Simon-Kucher), 81% dos consumidores globais esperam que marcas de alimentos adotem práticas ambientais claras, e 66% preferem produtos com alegações sustentáveis comprovadas. Para a indústria de ingredientes, isso significa que não há mais espaço para mensagens genéricas: é preciso entregar dados verificáveis, auditáveis e integrados às metas ambientais das empresas.
Por que ingredientes ESG se tornam prioridade estratégica?
A pressão vem de várias frentes. Consumidores buscam produtos com menor impacto ambiental, enquanto varejistas e multinacionais exigem métricas rastreáveis. De acordo com o CDP Supply Chain Report 2022, até 90% das emissões de carbono de fabricantes de alimentos estão no Escopo 3, ou seja, na cadeia de suprimentos — onde os ingredientes representam parcela significativa. Isso torna os fornecedores peças centrais na descarbonização da indústria.
Ao mesmo tempo, investidores elevam a cobrança por transparência. O Morgan Stanley Institute for Sustainable Investing relatou em 2024 que 77% das grandes empresas de alimentos já possuem metas ambientais vinculadas a compromissos financeiros. Assim, oferecer dados ESG se tornou um diferencial competitivo, abrindo portas para grandes contas e programas de “compra preferencial sustentável”.
Como provar impacto ambiental positivo com dados?
O principal desafio é transformar práticas sustentáveis em métricas quantificáveis. Os indicadores mais relevantes envolvem impacto climático, impacto hídrico e impacto em biodiversidade e uso do solo. A ferramenta mais aceita para comprovar esses dados é a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV).
Segundo a ISO 14040/44, a ACV mensura impactos desde a produção do ingrediente (cultivo, extração, energia, água e resíduos) até sua entrega ao fabricante de alimentos. Hoje, empresas reconhecem que ACVs genéricas não bastam — é preciso produzir relatórios específicos por ingrediente e por aplicação.
O uso dessa ferramenta se tornou mandatório: o Life Cycle Initiative Report 2023 (PNUMA) mostra que a adoção de ACVs no setor de ingredientes cresceu 42% entre 2020 e 2023, o maior salto entre os setores avaliados. Esse avanço é evidente entre fornecedores globais de proteínas funcionais, enzimas, aromas naturais, polióis, fibras dietéticas e estabilizantes.
Do campo à fábrica: agricultura regenerativa como diferencial mensurável
Nos ingredientes agrícolas, a agricultura regenerativa tornou-se o maior diferencial ESG dos últimos anos. Em 2024, a Deloitte e o WBCSD apontaram que 39% das grandes empresas de alimentos já compram ingredientes provenientes de cadeias regenerativas — número que deve superar 55% até 2026.
Essa abordagem permite gerar dados como:
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toneladas de CO² removidas por hectare por meio do manejo do solo;
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redução do uso de fertilizantes sintéticos;
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incremento de biodiversidade, medido por espécies de insetos e microrganismos do solo;
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Melhora na retenção de água.
Para o setor, isso significa que fibras, amidos, proteínas vegetais, extratos botânicos e óleos especiais podem trazer valores numéricos que comprovam benefício ambiental — ganhando força em rótulos como “carbon-reduced”, “soil-positive” e “regenerative sourced”.
Certificações ESG: o novo passaporte comercial dos ingredientes
A consolidação de métricas abriu caminho para certificações específicas. Em 2024, segundo a EcoCert, o número de ingredientes certificados em selos ambientais aumentou 28%. Entre os mais relevantes estão: Carbon Neutral, Fair for Life, UEBT, Bonsucro, Non-GMO, Regenerative Organic Certified e certificações hídricas como AWS (Alliance for Water Stewardship).
Ao adotar certificações, fornecedores traduzem métricas complexas em sinais reconhecidos pelo mercado, reduzindo barreiras de compra, agilizando o onboarding e melhorando o posicionamento de ingredientes em plataformas de compras sustentáveis de grandes multinacionais.
Os impactos na indústria de alimentos e bebidas
Para a indústria, ingredientes ESG mensuráveis criam valor em diversas frentes. Marcas podem lançar produtos com claims auditáveis, como “redução de 30% de CO² por porção”, conquistando espaço em categorias premium — que crescem mais rápido. Segundo o NielsenIQ Global Sustainability Report 2023, produtos com claims sustentáveis cresceram 11% mais rapidamente do que produtos tradicionais, com forte destaque para bebidas e alimentos funcionais.
Além disso, grandes varejistas já incluem métricas de carbono e rastreabilidade nas negociações com fornecedores, o que leva fabricantes a buscar ingredientes com dados validados, reduzindo custos internos com auditorias e aumentando a previsibilidade da cadeia.
Para onde o mercado está indo?
O mercado avança para uma padronização de indicadores ESG para ingredientes. As ACVs devem se tornar obrigatórias em diversas categorias até o fim da década, especialmente para derivados agrícolas. O uso de blockchain para rastreabilidade também tende a se expandir. Segundo o World Economic Forum (2024), o blockchain na cadeia de alimentos crescerá 48% ao ano até 2030, impulsionado pela necessidade de rastreamento ambiental e social.
A tendência é que ingredientes passem a carregar “fichas ambientais” tão importantes quanto suas especificações técnicas. As empresas que investirem em dados ESG hoje garantirão vantagem competitiva em um mercado que exige transparência total.
As informações são do Portal Aditivos e Ingredientes, adaptadas pela equipe MilkPoint.